Chamo-me Eric, e tenho 20 anos. Vivo com a minha família em uma cidade do interior do Mato Grosso do Sul, rodeada pelas árvores e com um clima bem definido, quente no verão e frio no inverno, com variância de temperatura tanto na primavera como no outono. Comigo moram: Pai, Mãe, Irmão mais velho, o primogênito, e a minha irmã do meio, sendo eu caçula.
Uma característica que define a minha família, não só meus pais e meus irmãos, mas também todos os meus parentes, que são muitos na cidade já que não é tão grande assim, são nossas estranhas desaparições pelo menos uma vez ao mês obrigatoriamente no período de lua cheia.
Sem contar que somos todos bem parecidos, nossa pele morena amarronzada herdada dos índios que antecedem a minha família, nosso cabelo tão negro quanto a noite e lisos na maior parte dos membros, e ainda nossos estranhos costumes, um deles e que ninguém procurou saber a fundo é de que minha família simplesmente não se relaciona com membros de uma outra família muito específica, a dos lenhadores.
Certa vez quando ainda criança, meu pai e eu estávamos na casa de um amigo dele, os dois conversavam alguma coisa sobre trabalho que não fiz questão de prestar atenção, não importava esses assuntos para uma criança de cinco anos. Foi então que outro homem chegou, ele era alto, branco e de porte imponente, empunhava um machado de lenhador de dois gumes.
Aquela visão me fez ficar com medo, o homem avançou com o machado em posição de ataque para cima do meu pai, que até então estava paralisado com o que via. Seu amigo o empurrou para o lado e ao mesmo tempo se jogou para o outro, evitaram o ataque furioso do lenhador.
Meu pai, então, por questão de sobrevivência não podia mais esconder o seu segredo, ali mesmo suas roupas foram rasgadas em muitos retalhos com a transformação em lobisomem quase que instantânea. Ele assim avançou contra o lenhador e quebrou o cabo do machado com uma mordida separando sua lâmina e arremessando-a para longe.
O lenhador que se viu agora desarmado tentou fugir, porém a figura de um menino da minha idade, branco de cabelos castanhos encaracolados e com olhos dourados usando um boné branco, entrou correndo assustado pela porta aberta chamando por um nome. O lenhador olhou para o filho e correu a protegê-lo da nova investida do lobo, porém este não queria saber da criança seu alvo era outro.
Quando o lenhador chegou perto do filho puxando-o para trás de si, meu pai atacou-o com uma mordida que pegou seu ombro esquerdo rasgando e fazendo o sangue jorrar quente, o garotinho que ficou agarrado ao pai o tempo todo sentiu cair sobre a cabeça o líquido espesso e quente que tingiu de vermelho escarlate seu boné antes branco.
Quando o lobo soltou o ombro do lenhador este pegou um pote de sal que havia sobre uma mesa ali perto e despejou todo conteúdo sobre os olhos do meu pai que o fez parar, desnorteado, os ataques. Então foi a primeira e última vez que vi o garotinho da mesma idade que eu, sair porta afora seguro pelo braço bom de seu pai correndo junto com este.
Desde aquele dia eu entendi que ser um lobisomem estava previsto para minha vida também, e que os lenhadores são inimigos mortais. O amigo do meu pai ficou em sigilo e nunca contou o segredo, que depois ficou sabendo, era de toda a minha família. Porém desde o mesmo dia eu não esqueci aquele par de olhos dourados, um dia gostaria de poder reencontrá-los, talvez seja o meu fim ou talvez seja o começo de algo muito forte.