- Pedro... acorda!! - gritou o Mauricio. - Eu não consigo me soltar!!!
- O que?! Onde?! - perguntei abrindo os olhos. - O que aconteceu?!
- A gente capotou... vamos sair daqui... - ele disse tirando o cinto de segurança.
- Mas... - falei ao ver o Márcio passando em nossa frente, ele abriu a janela do carro e sorriu. - Cadê o Paulo? - perguntei.
- Vem! - disse Mauricio me ajudando.
Saímos do carro e vimos uma cena horrível. Paulo entre as ferragens do carro. No seu olhar vi o pânico e agonia já conhecida por mim há um ano.
- Vamos tirar ele!!! - gritei.
- Precisamos esperar a ambulância.
- Não... você é médico!! Faz alguma coisa. - falei batendo no Mauricio e chorando.
- Precisamos manter a calma... Pedro!!! - ele gritou. - Precisamos manter a calma.
Depois que a ambulância chegou... meu irmão conseguiu dizer algumas palavras. Ele pediu o celular. Retornei e ao chegar perto do carro sou arremessado na direção contrária.
- AAAAGGGHHHH!!! - gritei acordando o Mauricio.
- Amor?! Está tudo bem? - ele perguntou ligando o abajur.
- Eu...
- O que aconteceu?!
- Sonhei com o acidente. - falei chorando e encostando minha cabeça no peito dele.
- Tá tudo bem... já passou. - ele disse fazendo carinho em mim.
- Não. Eu não vou conseguir viver com o Márcio próximo... ele sempre vai estar em algum lugar.
- Pedro... já superamos tantas coisas difíceis. Está com certeza iremos abater. - ele disse me beijando na testa. - Agora dorme amor... vou ficar aqui. Nada de ruim vai acontecer com você. Eu prometo.
Me perdi no carinho e na voz do meu marido. Despertei e ele já não estava ao meu lado. Desci e meus filhos já estavam tomando café da manhã.
- Papai... olha o que eu fiz ontem. - falou Patrick me entregando um caderno.
- Que bonito desenho filho. Lindo o coelho. - falei o beijando.
- Mas é um elefante. - ele disse visivelmente chateado.
- Lindo elefante querido. Está lindo.
- Obrigado pai. - ele disse correndo para a sala.
- Pai?! - perguntou Judith.
- Oi princesa. - falei colocando suco em um copo.
- Semana que vem vai acontecer uma oficina de teatro aqui na cidade. Eu queria muito participar.
- Claro. Só me passa as informações. - falei tomando o suco.
- Tudo bem. Obrigada. - ela disse indo em direção a escada.
- Seu Pedro... o senhor tá abatido. - disse Dora.
- Tenho tido pesadelos horríveis.
- Nossa. Mas... é...
- É com o meu irmão, o Márcio. Me sinto obrigado a gostar dele... mesmo depois de tudo o que ele fez.
- É compreensível. Afinal ele lhe causou uma dor grande... mas, seu Pedro cá entre nós... o seu coração é grande por demais. Deixe isso pra lá... a vida é curta.
- E pior que eu sei... pior que eu sei.
Ezequias perdeu uma grande oportunidade de ingressar em uma banda. Ele ainda estava debilitado devido ao corte na coxa. Sua mãe fez uma visita para saber as novidades.
- Filho... os meninos da igreja tem perguntado muito por você. - falou Eleonora.
- Eu sei. Eles me ligaram, mas parece que alguns pais não ficaram felizes por isso. - disse o jovem.
- É... mas, tudo bem.
- É tudo bem. - ele respondeu. - Mas, graças a Deus... a senhora e o papai estão... compreendendo a minha situação.
- Apesar de não aprovar... e até mesmo abominar... você é meu filho... que mãe da as costas a um filho?
- Mamãe. A senhora não conhece o mundo. - respondeu Ezequias.
- Me conte... tentou convencer o dono do bar para refazer a audição? - ela perguntou.
- Ele já escolheu...
- Filho... eu não acredito. Você se deu por vencido? - ela perguntou.
- Mãe. É difícil. Sou o tipo nerd... eles esperam um cara descolado.
- Para com isso. Você é lindo... afinal... outro homem... gosta... gosta de você. - ela disse timidamente.
- Mas, com o Phelip é diferente. Vai além de atração física. Afinal, não enfrentei tudo o que enfrentei por causa de sexo.
- É verdade. Enfim... o Phelip vê algo bom em você. Tire proveito disso. - ela disse sorrindo.
- Quem diria dona Eleonora... a senhora conversando comigo sobre meu relacionamento.
- Pois, é... parece que é. - ela disse rindo. - Mas, é o nosso segredo.
- Mãe.
- Brincadeira.
Sim... Ezequias estava em uma boa fase com sua família. As resistências eram quebradas devido ao amor materno. E Eleonora não deixaria seu filho sofrer. Ela foi até a empresa do meu pai para conversar com Phelip.
- Olha. Tivemos nossos desentendimentos no passado, mas quero falar sobre o bem estar do meu filho. - ela disse se sentando de forma desconfortável na cadeira.
- É o que eu procuro diariamente. - falou Phelip.
- Ele anda meio chateado por não ter conseguido ingressar na banda daquela casa de show... e cá entre nós... o Ezequias é talentoso, mas falta confiança.
- Sei muito bem disso... já falei, mas ele é teimoso. - comentou Phelip.
- Que tal... mudarmos ele aos poucos? Tipo... o estilo... o repertório das canções...
- Dona Eleonora? A senhora está bem? - perguntou Phelip assustado.
- Olha... pesquisei na internet mais sobre o homossexualismo. Passei da fase do espanto... negação... agora quero ver o meu bebê feliz... mais ainda acho que você o deixou gay.
- Tudo bem. Posso viver com isso.
Fernanda e Osvaldo estavam enfrentando os problemas da vida adulta. Eles começaram a trabalhar e a distância afetava cada dia mais o relacionamento.
- Amoor?! To com saudades. - disse Fernanda falando ao telefone.
- Eu também. Hoje a noite terá uma cirurgia muito bacana, mas prometo que amanhã teremos o dia juntos.
- Claro. Sempre a medicina. Não quero viver em segundo plano...
- E quem disse que você é segundo plano? - perguntou Osvaldo.
- Ninguém... apenas os teus atos. Puxa... depois da nossa viagem... eu quase não te vejo.
- A viagem foi justamente por causa disso. Eu sabia que o estágio e o teu emprego atrapalharia.
- Ei princesa... vamos com calma. Escuta... vamos dar um jeito é apenas questão de tempo. Vou fazer uma força para te ver hoje. - ele disse.
- Tá... tudo bem. - ela disse. - Bem. Preciso ir... te amo.
- Também te amo. Beijos.
Na escola, Paulinho fazia um trabalho de ciência quando a professora chamou a atenção de todos.
- Então... o dia dos pais está chegando. E queremos fazer uma festa para todos os papais.
- Ebaaaaaa. - gritaram todos.
- Diga Paulo? - perguntou a professora ao ver meu filho com a mão levantada.
- Professora. Eu tenho dois papais.
- Dois?! Como assim?o papai Mauricio e o papai Pedro.
- Bem... querido. Infelizmente você só pode trazer um deles.
- Mas... eu tenho dois pais. - rebateu o menino.
- Conversamos depois sobre isso... ok?
- Tudo bem.
Estava deitado na cama. Quando Paulinho pulou em cima de mim.
- Papai... papai... vão fazer uma festa especial para os papais... e só pode ir um de vocês.
- Mas, filho... falta muito para o dia dos pais.
- Não pai... é o dia da profissão. Tenho que levar um pai, mas eu queria levar vocês dois.
- Hum... acho melhor levar o papai Mauricio. A profissão dele é mais emocionante. - falei o abraçando.
- Eu queria que o senhor fosse também... vai... vai....
- Amor. É apenas um pai que precisa ir.
- Ahhh... porque?
- Porque a família convencional... tem pai e mãe... e geralmente é o papai que trabalha. Lá da sua sala vão apenas os pais... tudo bem... eu fico tranquilo com isso. - falei o beijando na testa.
- Olha festinha sem mim? - perguntou Mauricio entrando no quarto e jogando o jaleco em cima da cama.
- Sim! - disse o menino pulando em cima dele.
- Oi para você também meu amor. - falou Mauricio o abraçando.
- Paulinho! Vem tomar banho! - gritou Isabel do quarto dele.
- Xiii parece que alguém ta sujo! - brincou Mauricio.
- Já to indo Isabel!!!
- Vai logo moleque! - disse Mauricio batendo no bumbum de Paulinho.
- Ai... ai... - reclamou o menino sorrindo. - Já vaiii!!!! - ele continuou correndo para fora do quarto.
- E ai? Alguma novidade? - perguntou Mauricio.
- Sempre... semana que vem será o dia da profissão na escola dele... e ele quer levar os dois papais para lá. Ele insistiu com a professora. Mas, precisa ir apenas um de nós.
- Entendi... você vai... é claro. - ele disse sentando ao meu lado.
- Não amor... você faz algo mais grandioso. - falei o beijando.
- Mas, você é o melhor ser humano que eu conheço e quem faz o profissional é sua personalidade. - ele disse me abraçando.
- Pode ser, mas sempre vai haver esses atritos para eles... dia das mães... dia dos pais... festinha de escola...
- Amor... até onde eu percebi nossos filhos não tem nenhum tipo de preconceito. E nem devem. E se tiverem temos que aceitar do mesmo jeito... mas, com amor... isso não vai acontecer. - ele disse me acalmando.
Sim... talvez eu tivesse viajando e me deixando afetar pelos preconceitos alheios. E o que aconteceria colocaria tudo o que eu imaginei a prova.