Eleonora resolveu procurar uma ajuda para tratar seus problemas internos... e não... ela não procurou um psicólogo. Naquela manhã de quinta-feira, a mãe de Ezequias atravessou a rua e tocou a companhia.
- Olá? - falou minha mãe ao abrir a porta. - Eleonora que surpresa. Aconteceu alguma coisa com os meninos?
- Não. Eu... eu... estou bem... é... é.. posso entrar?
- Claro. Fique a vontade. - disse minha mãe a levando para a sala.
- Então... nossa fico sem graça em falar essas coisas... meu filho é... é...
- Gay... homossexual...... bichinhaviado... existem vários nomes. Você precisa se habituar. - falou minha mãe na defensiva.
- Ia dizer especial.... mas, essas palavras cabem nessa frase também. Enfim... a dois dias fui até o centro da cidade pela madrugada, pois, devido ao acidente com a mesa, o Ezequias não pode fazer o teste da banda... e durante a minha 'aventura' conheci uma moça muito bonita, da pele negra e...
- Ohh Deus.... você é lésbica? - perguntou minha mãe.
- Não... - ela disse fazendo o sinal da cruz. - Sou mulher... 100%... deixa eu terminar de contar a história que você vai entender. Conheci essa moça que me ajudou a encontrar a tal boate onde consegui falar com o gerente e consegui uma chance para o Ezequias.
- Nossa... sério.... que atitude incrível. Não esperaria isso de você. - falou minha mãe impressionada.
- Paula... querida... também sou mãe. Estou me acostumando... ou você aceitou os seus filhos em primeiro momento?
Minha mãe ficou pensativa por alguns minutos e balançou negativamente com a cabeça.
- Verdade... fui dura com o Pedro... sei que ele sofreu com a minha indiferença, mas somos mães...
- Depois que consegui o teste do Ezequias agradeci a Luaine... a moça, mas ela não era mulher... era homemtravesti.
- E o que você fez?!
- Ohh Deus... o expulsei de casa. - falou Eleonora colocando a mão no rosto.
- Eleonora... que coisa feia.
- Queria sua ajuda... quero me redimir.
- Já sei o que podemos fazer... - falou minha mãe se aproximando de Eleonora.
Eu e Vinicius fechamos contrato para fazer a sede da nossa ONG. Daríamos apoio para jovens com dificuldade em assumir a sexualidade. Tínhamos médicos, psicólogos e pessoas de bom coração para nos ajudar. Compramos alguns móveis e contratamos alguns marceneiros para dividirem a garagem em várias salas, onde aconteceriam os tratamentos.
- Essa semana vai ser longa, mas graças a Deus que tudo deu certo. - disse Vinicius.
- É mas, não vamos carregar todas essas caixas sozinhos. Jean e Mauricio terão que ajudar. - falei colocando mais uma caixa na sala.
- Pedro... pensa bem no que estamos fazendo... nossa cidade nunca mais será a mesma...
- É, mas, existem pessoas iguais aos pais de Ezequias... preconceituosas.
- Pedro Soares... as pessoas podem mudar. E para isso vai ser a ONG Pôr do sol.
- Desculpa... ainda não consegui dormir direito...
- Os pesadelos ainda?
- Todas as noites. - falei sentando sobre uma das caixas. - Acho que é a pressão de ver o Márcio.
- Pode ser. Mas, não se deixa abater amigo. Lute até o fim.
- Sim... eu preciso. Ei... preciso ir... meu horário de almoço está acabando.
Bernardo e Judith continuavam a buscar atores para a peça. Eles decidiram abrir as audições para todas as crianças do orfanato. Muitos não tinham o menor talento para atuar, outros surpreenderam a dupla.
- Gostei muito desse. - falou Judith pegando uma foto.
- Eu também, e ela arrasou. - concordou Bernardo mostrando outra foto.
- Caramba assim vai ser difícil montar esse elenco.
- Vai sim amor... estudamos bastante. Sabemos tudo sobre roteiro, atuação e filmagem. Vai ser maravilhoso.
- Ainda bem que temos a ajuda dos nossos pais. Eu fico pensando... como tivemos sorte.
- Sabe Ju... eu também. Posso te confessar uma coisa? - ele perguntou deixando a pasta de fotos na mesa e sentando ao lado dela.
- O que?
- Morri de inveja no dia que o Pedro e o Mauricio falaram que iriam adotar você... no seu aniversário de quinze anos...
- Puxa amor... eu também fiquei triste, pois, sei o quanto você almejava uma família. - falou Judith o abraçando.
- E hoje cá estamos nós... eu sou seu tio e namorado.
- Não enche. - falou Judith o beijando.
- Se eu morresse hoje... morreria feliz.
- Para... odeio quando você diz essas coisas mórbidas.
- Amor... não vamos virar pedras... um dia iremos morrer... sobre isso não tenho medo. A única coisa me deixaria triste é ver você sofrer.
- Xiii... para com isso ok.
Sim... Judith tinha medo de certos assuntos... e Eleonora tentava encarar os seus principais medos. Ela e minha mãe decidiram ir ao Centro da cidade. Elas queriam encontrar Luaine. Andaram bastante até que uma mulher informou onde ficava o apartamento dela. Ao chegar no local, as duas ficaram um pouco chocada, pois, o lugar era bagunçado e totalmente sujo. Eleonora demorou para criar coragem e bater na porta. Foi praticamente empurrada por minha mãe. Depois de alguns minutos Juliano atendeu.
- A senhora? - ele perguntou surpreso.
- Eu... eu...
- Não bastou me humilhar na sua casa... quer me humilhar aqui também?! - perguntou ele.
- Vim me desculpar... sou nova nesse lance de ser mãe gay... ok.
- Não preciso de pena... fui para lhe entregar um presente, pois, sabia que para a senhora não é fácil.
- Luain.... digo... qual o seu nome mesmo? - perguntou Eleonora.
- Moço... ela quer se redimir. - interveio minha mãe.
- Me chamo Juliano...
- Então... Juliano... eu gostaria de pedir desculpas pela minha ignorância. Estou tão envergonhada. - ela disse abraçando o jovem.
- Não se preocupe. Estou acostumado.
- Não.. esse que é o problema... as pessoas não podem se acostumar... precisamos lutar... lutar pelos nosso ideias.... pela nossa liberdade. - declarou minha mãe.
- A Paula está certa... você quer se vestir de mulher... se vista... o importante é ser feliz.
Juliano caiu no chão aos prantos. Ele foi expulso cedo de casa e nunca teve carinho de mãe ou pai, viveu... na verdade sobreviveu por muitos anos sozinho e encontrou na prostituição um jeito de vencer na vida. Envergonhado, o jovem se recompôs e contou sua história de vida para minha mãe e Eleonora.
- Ohh Deus... - falou Eleonora emocionada.
- Juliano. Nossos filhos estão criando uma ONG que pode te ajudar. - falou minha mãe.
- Sim... sim... você não precisa ser meretriz... ou... garota de programa... é tão estranho falar isso para um homem... enfim... você pode parar de se vender... um jovem tão bonito.
- Obrigado senhoras... eu agradeço bastante.
- Vamos almoçar? - perguntou Eleonora.
- Desculpem, mas... eu... eu... não tenho quase nada de comida aqui... posso fazer ovo frito?
- Acha que somos desprevenidas? - perguntou Eleonora mostrando uma sacola com comida.
- Você vai adorar... é de um restaurante novo.
- Deixa eu pegar os pratos lá na cozinha. - disse o jovem.
- A gente poderia dar uma faxina nessa casa também. - falou Eleonora para minha mãe.
- Nova amiga. Não exagera. Não exagera.
Até a minha mãe já estava fazendo novas amizades. No hospital, meu marido que agora era gente importante, se encontrava todo feliz com os novos medicamentos. Era um novo calmante, que fazia a pessoa dormir em menos de um minuto.
- Ele age diretamente nos sensores do corpo e vão adormecendo. É incrível... meu novo bebê é incrível. Foram 5 reuniões, 14 telefones e 24 negociações, mas aqui está. - ele disse todo orgulhoso.
- Leoparizan?! - perguntei ao ler o frasco.
- Parece um idiota né?
- Não. Está certíssimo... se eu também conseguisse trazer a droga dos segundos para o hospital estaria pulando. - falei batendo palmas.
- Para...
- Ei... essa vitória é sua. Agora os pacientes que entrarem em cirurgia vão se acalmar mais rápido.
- Olha só. - disse Mauricio bipando um estagiário do hospital.
- O que você vai aprontar? - perguntei.
- Estou aqui Dr. Elias. - disse um jovem que chegou na sala ofegante.
- Hélio? Você ama a medicina... não ama? - perguntou meu marido.
- Sim... e muito.
- Faria um experimento para nós agora?
- Claro.
Sem avisar, Mauricio injetou uma seringa no menino. Que automaticamente caiu no chão. Com o susto soltei um grito meio boiola, mas que não afetou minha integridade, pois, o menino já estava dormindo.
- O que aconteceu? - perguntei.
- Ele está dormindo... o tempo para passar o efeito é de 30 minutos.
- E se ele tiver alguma alergia? - perguntei.
- Esse é o melhor o Leoparizan é compatível com qualquer tipo de sistema imunológico... e olha que eu coloquei apenas dois dedos.
- E se você colocar, por exemplo, a seringa toda? O que acontece? - perguntei.
- A pessoa dorme pelo menos três dias seguidos. - ele falou.
- Nossa que tenso.
- Sim... agora vamos? Preciso ir para outra cirurgia.
- Ei... não esquece que essa semana é a reunião do dia da profissão na escola do Paulinho. - falei lhe dando um selinho.
Phelip tentava mostrar serviço para o meu pai na empresa, uma vez que ele seria o mais indicado para seguir com os trabalhos da família. Ele começou de baixo e foi galgando os passos de qualquer funcionário.
- Quer dizer que o filho do dono da empresa que cuida das nossas finanças? - questionou um funcionário.
- Sim... ele e outra moça a Luciana. - comentou outro.
- Sei não... essa história é difícil de engolir.
- Deixa de tolice o seu Phelip é jovem, mas muito responsável. - falou uma funcionária.
- Precisamos ficar de olhos abertos... tenho três filhos para sustentar. - disse o homem.
- Boa tarde? - perguntou Phelip fingindo não ter ouvido a conversa.
- Boa tarde. - falaram todos juntos.
- Gente... hoje vai ter uma reunião no auditório. Espero vocês lá. - disse meu irmão.
Alguns minutos depois, ele se preparava para discursar pela primeira vez em público. Ele estava um verdadeiro homem de negócios, além dos funcionários a diretoria da empresa estaria presente também.
- Luciana é... é... melhor eu desistir. - falou Phelip.
- Desistir? Então você não é o Phelip que eu conheço. - disse Luciana dando forças a ele.
- Meu discurso é chato... ninguém vai gostar... ontem o Ezequias dormiu enquanto eu falava para ele.
- Phelip... deixa disso... você trabalhou bastante para encontrar essas soluções... agora vamos enfrente. Coragem... em 5, 4, 3, 2,disse Luciana se aproximando do microfone. - Boa tarde... como vocês sabem... a nossa empresa está passando por pequenas mudanças... e queremos que vocês escutem as nossas metas para este ano... por favor... recebam o gerente Phelip Soares.
- Obrigado Luciana... bem... eu preparei algumas coisas para dizer... são alguns papeis... - ele disse gaguejando e deixando todos caírem no chão.-
- Xiii... - gritou um dos funcionários fazendo alguns outros rirem da situação.
- Bem... sei que alguns de vocês pensam que sou imaturo e festeiro... mas, estão enganados... vocês não me conhecem e eu não conheço vocês. - disse meu irmão olhando para o meu pai que consentiu com a cabeça e sorriu. - Assim como vocês eu dependo dessa fábrica para sobreviver... quero formar minha família também... estudei bastante para chegar até aqui... e tive que passar por todos os setores da empresa até a gerência. Não foi fácil. Nosso plano é elevar o nível de excelência dos nossos produtos... já fechamos contrato com empresa de vários países e agora podemos oferecer uma melhor qualidade de trabalho para vocês... teremos nosso benefícios nesse ano, mas teremos que mostrar a qualidade do nosso serviço. Então aqueles que quiserem vir comigo... eu agradeço... estarão não só ajudando ao desenvolvimento da nossa empresa como o crescimento de vocês também.... - ele disse feliz do que havia acabado de falar.
- Parabéns. - falaram Luciana e meu pai.
- Agora o plano para esse mês é diminuir o uso de copo descartáveis... ao invés disso personalizamos canecas com o nome de cada um dos senhores... dessa forma iremos alcançar mais um prêmio 'o de empresa sustentável', além de usar o dinheiro revertido em copos, para a melhorias na fábrica. Os copos serão distribuídos amanhã... então espero a cooperação de vocês... por que além de colegas de trabalhos... somos amigos... uma equipe... - finalizou meu irmão.
- Olha só... viu como ficou nervoso por nada. - disse Luciana o abraçando.
- Filho... até eu quero uma caneca para ajudar no desenvolvimento da empresa. - falou meu pai o abraçando também.
- Aprendi com os melhores. - disse ele sorrindo. - Aprendi com vocês.
Márcio chegou em casa após um dia exaustivo de trabalho. E percebeu que não tinha nada para comer. Ele pegou algum dinheiro e decidiu se presentear com um jantar. Afinal, fazia tempo que ele não provava uma boa comida. Ao chegar no restaurante, ele se depara comigo e o Mauricio jantando. Ele ficou na porta por alguns segundos olhando para a gente.
- Eles parecem felizes... porque... porque... a vida teve que ser injusta comigo? - ele disse saindo em seguida.
Márcio parou em uma praça e sentou... logo ele lembrou da primeira noite na prisão. Era frio e úmido. Ele estava deitado em um colchão duro. Quando ele sente alguém o abraçar.
- É o seguinte... aqui ou você morre ou respeita as regras. - disse um homem.
- Me solte por favor. - disse Márcio se esquivando.
- Olha ele é saidinho Ryan. - brincou um dos presos.
- Ele vai se acalmar... me diz garoto o que tu fez? - ele perguntou.
- Eu matei uma pessoa. - disse Márcio.
- Fala direito porra... tira o pau da boca. - disse Ryan batendo na cabeça de Márcio.
- Eu... eu... matei uma pessoa! - disse Márcio.
- Então é um dos nossos... fala pra gente... tu curte um quiabo no rabo? - perguntou Ryan.
- Eu... eu...
- Curte sim... ouvi um dos guardas comentarem. - falou um preso.
- Não se preocupa gatinho... vou te proteger... mas, você terá que fazer coisas para nós... para todos nós...
- Por favor... não me machuque.
Sim... Márcio pagou pelos erros da pior maneira possível, mas fantasmas iriam voltar para assombrar... mas, não apenas a ele... a mim... minha família e principalmente... meu marido.
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