Ás cinco da tarde algumas
pessoas caminhavam pelo deck do
navio aproveitando o sol morno e
o ar marítimo. Algumas crianças
brincavam com suas babás, no
fumódromo da segunda classe os
mais velhos aproveitavam cigarros
e charutos enquanto soltavam
longas baforadas durante as
conversavas. Algumas mulheres
conversavam mais afastadas com
suas sombrinhas e suas joias
semipreciosas que brilhavam a luz
do sol. Enquanto isso, Thomas
olhava o mar e tentava não ficar
enjoado com o sobe e desce do
Titanic. As senhoras mais velhas já
se dirigiam para o salão a fim de
degustarem o famoso chá das
cinco. Por mais que fosse um
costume britânico, Thomas não
quis saber disse e voltou para seus
aposentos. Ainda não havia passado
nem uma hora direito no quarto e
pelo jeito o outro passageiro com
quem iria dividir o quarto não
subiu abordo ou está em outro
aposento, já que quando entrou no
navio, uma das auxiliares
informara que iria dividir com
alguém de Southampton mesmo,
mas pelo jeito desistira da viagem,
o que significava que teria o
aposento só para ele.
Entediado e meio tonto,
Thomas resolve dormir um pouco
até o jantar ou então até o navio
atracar na cidade de Cherbourg na
França. Logo adormeceu olhando o
céu por uma abertura no canto
mais alto da parede á direita e seu
sonho o levou de volta á dois anos
atrás;
O beijo de Kenneth foi o
suficiente para diversas coisas
surgirem em sua mente. Depois
que ele se afastou continuou
olhando nos olhos. Exibia um leve
sorriso e estava levemente
vermelho. Thomas não sabia o que
dizer e foi salvo por uma frase dita
primeiramente pelo professor.
- Desculpa por isso
Thomas. Eu não sei o que
aconteceu foi inesperado.
E-Eu só queria te ver feliz.
- Parece que leu a
minha mente, pois eu
sempre quis que isso
acontecesse. - declarou.
- Jura? Como assim?
- Kenneth eu gosto de você,
porém o que sinto é maior do que
a amizade ou fraternidade. É como
se eu estivesse apaixonado por
você.
Thomas sentia seus olhos
arderem e as lágrimas começaram
a brotar. “Por que estou
chorando?” perguntava-se enquanto
tentava encarar o amigo que se
mantinha de pé com as mãos nos
bolsos com um misto de susto e
dúvida:
- Thomas você ainda
é jovem para entender o
que está acontecendo. -
disse
- Mas professor eu
tenho 18 anos! - levantou a
voz se assustando com a
mesma e surpreendendo-se
quando a tem abafada ao
ser abraçado novamente.
- Thomas não se preocupe
com esse sentimento. Você sabe a
situação na qual nos encontramos,
mas o que posso dizer é que tudo
tem seu tempo e que nunca te
esquecerei.
Confuso estava e confuso
ficou. Aquela situação foi tão
intensa que quando deu por si já
estava saindo do colégio. O sabor
da boca de Kenneth ainda estava
presente e a marca do puxão em
seu braço denunciava que nada foi
coisa de sua imaginação. Porém
ainda se sentia mal pelo seu amor
não ser correspondido.
- “Mas se não foi
correspondido por que ele me
beijou?” - pensou enquanto
caminhava pela rua. - “E o que ele
quis dizer com que ‘tudo tem seu
tempo’? Será que no fundo ele
sente o mesmo que eu.”.
Mesmo incrédulo sobre seus
pensamentos, Thomas sabe que não
será fácil lhe dar com esse
sentimento já que é possível não
voltar a vê-lo tão cedo, ou talvez
nunca mais. Mas o que poderia
fazer?
Thomas despertou com soar
alto e forte do apito do navio. Pela
pequena janela no alto da parede já
era possível ver as estrelas no céu
escuro. No relógio da escrivaninha
o os ponteiros marcavam oito e
quinze da noite. De banho tomado,
Thomas se arruma para o jantar
novamente no salão e tenta afastar
da cabeça seu amado. Porém não
está fácil. O sonho que teve parece
não querer sair de sua cabeça e
enquanto caminha para o salão
lembrava-se da última vez que vira
Kenneth:
Depois da declaração na sala
de aula, Thomas e os outros alunos
foram juntos com a professora
Milla, que organizou um passeio
que também iria passar no porto
para que pudessem se despedir do
professor. E lá estava ele. Vestido
de com um terno preto e um
chapéu que o deixava com um ar
mais sério e maduro que mudou
quando os viu e abriu um belo
sorriso mostrando também estar
surpreso. Como o navio partiria em
menos de vinte minutos, a
conversa fora rápida, porém
amigável. Thomas o observava
conversar com os alunos, receber
abraços e presentes de despedida.
Mas quando Kenneth viu o amigo
parado e meio cabisbaixo, pediu
licença e aproveitando que os
alunos também estavam
interessados no mar e no navio,
deixou-os e se aproximou de
Thomas.
- Está tudo bem? -
perguntou
- Sabe que não...
Mas no fim vai dar tudo
certo. - respondeu ainda
olhando para o mar.
- Você deve estar
com a cabeça dolorida... -
riu
- Você acha isso
engraçado? Acho que quem
tem 18 anos aqui é você...
– debochou um pouco
irritado.
- Se isso te ajuda, eu
não dormi desde ontem,
pois sabia que você estava
confuso e que estava
chateado. - disse pondo a
mão no ombro do amigo.
Thomas nada disse, somente
encostou a cabeça no peito do
amigo e disse:
- É melhor você ir
ou perderá o navio.
- Você tem razão.
Mas antes eu tenho que
dizer algo – Kenneth pôs se
de frente para Thomas e
segurou-lhe pelos ombros
de forma que ficassem
frente a frente. Olhos no
olhos.
- O sentimento que está
aqui. - indicou pondo a mão no
peito do amigo – É o mesmo que
está aqui. E se ainda se pergunta
por que lhe o beijei é por que no
fundo, foi uma forma de lhe dizer
que também gosto de você da
mesma forma que você gosta de
mim. É mais do que amizade o que
sentimos.
Thomas olhava nos olhos
azuis que pareciam refletir o mar
enquanto digeria cada palavra
ouvida. Ao mesmo tempo, sentia o
rosto queimar e imaginava estar
vermelho diante daquela situação.
Seu coração estava acelerado mais
tinha algo diferente naquilo tudo.
Pensou que choraria, mas nenhuma
lágrima foi derramada. Pensou que
tremeria, mas continuou calmo
assim como seu coração que voltou
ao batimento normal. Era como se
tivesse sido levado a um mundo de
paz ou hipnotizado por algum
encantamento. Era quase surreal
aquela declaração que no enfim era
realidade. Sua reação foi sorrir e
abraçá-lo enquanto dizia que
queria que isso tivesse acontecido
antes e o quanto gostava dele, mas
ao mesmo tempo sabia que talvez
nunca fossem ficar juntos.
- Thomas. - disse ao
pé do ouvido. - Quem sabe
um dia nos encontramos e
passamos mais tempos
juntos... Gosto muito de
você, mas também quero
que você continue com a
sua vida, pois ela é cheia
de surpresas e não
sabemos o que o futuro
guarda. Mas tudo pode
mudar.
- Eu queria você
aqui. – disse Thomas
apertando-lhe a cintura
como se não quisesse
larga-lo. - Mas sei como a
vida é. Sei que tenho 18
anos e que nada é fácil.
Vou seguir seus conselhos
por que te admiro e
considero muito. Espero
que um dia possa lhe ver
novamente, mas tenho
medo de como iremos
reagir depois de tanto
tempo. Vai ser difícil... -
Thomas já sentia a boca
seca, engoliu a seco e se
afastou dois passos para
trás. - Desejo tudo de bom
para você na França. Tenha
uma boa viagem Kenneth.
- Toma cuidado
Thomas. O mundo é
perigoso, mas sei que você
vai ficar bem. Au revoir.
- Au revoir mon
ami. (Adeus meu amigo)
Kenneth estende a mão e
Thomas o aperta fortemente e logo
depois ajeita o chapéu fazendo uma
leve referência e se distanciou em
direção ao navio. Meia hora
depois, o gigante metálico iniciou
sua viagem. Do porto todos
acenavam e no alto do navio,
Kenneth acenava com seu chapéu
deixando o cabelo loiro ao vento
embora sua feição não fosse
possível ver. Thomas acenou e
sentiu que não o veria cedo, e se
um dia o visse novamente não
sabia o que aconteceria.
De volta ao presente, depois
de jantar novamente sozinho na
mesma mesa em que havia
almoçado anteriormente, Thomas
sobe até aonde era possível ver o
mar aberto e ver a cidade de
Cherbourg iluminada e com uma
grande massa de pessoas pronta
para entrar a bordo do Titanic.
Observando aquilo sentiu um
arrepio ao vir à mente que aquele
era o país onde Kenneth estava. E
de repente pensou:
- “E se eu visse Kenneth
subir a bordo”
Mas logo afastou a ideia
rindo da pegadinha provocada pela
sua mente – ou seria uma intuição?
Thomas poderia ser um
adolescente calmo e amigável, mas
por trás de todo anjinho sempre
tem um pequeno demônio que
adora confusão e parece que dessa
vez ele estava a fim de aprontar.
Cansado do clima de tristeza que
estava sentindo, ele então resolve
passear pelo navio e tentar
encontrar alguma distração, caso
contrário iria endoidar ali.
Enquanto caminhava pelos
corredores, percebeu a presença de
guardas dentro da embarcação o
que indicava que qualquer
confusão estaria sobre controle se
eles estivessem por perto. Mesmo
assim deixavam muitas brechas
abertas. Como por exemplo, deixar
a chave de uma das portas que
levavam ao andar superior, ou seja,
primeira classe na fechadura da
porta. Depois de certificar que a
chave também abria a porta no
convés superior, Thomas mesmo
receoso, volta a sua cabine, se
veste com os melhores trajes e
volta até a porta. A chave em sua
mão vibrava com a excitação de
estar fazendo algo errado e
impulsionado pela coragem, ele
gira a maçaneta, entra no corredor
e tranca novamente. O caminho
até o andar superior se resumia a
um pequeno corredor e uma
escadaria branca com várias
tubulações da mesma cor que
cruzavam o caminho. Quando
chegou ao topo da escada, ouviu
burburinhos em francês o que
indicava que os novos passageiros
já estavam a bordo. Quando os
sons diminuíram, Thomas abre uma
pequena fresta e certificando que
não havia ninguém por perto, sai
de seu esconderijo e se mistura
entre as pessoas de classe. Algumas
mulheres andavam com echarpes e
emanavam perfumes adocicados
enquanto os homens andavam com
seus smokings impecáveis e
chapéus altos. Seguindo as pessoas,
chegou até a parte aberta do navio
onde estava um grupo de músicos
e seus instrumentos. O céu estava
limpo e estrelado e grupos de
pessoas conversavam por todos os
lados.
Depois de serem
surpreendidos pelo apito alto e
forte do navio, todos se despedem
dos entes queridos no porto da
cidade e se espalham pelo local.
Thomas percorre o deck e sobe até
a parte mais alta do navio ficando
no parapeito protegido por barras
de ferro branco. Encostado com os
cotovelos e de costas para frente
do navio olhou para a grande
chaminé mais acima, e voltou a
dar atenção ao mar gigante à
frente. Era negro e tão
profundamente triste e misterioso,
que se debruçou no ferro frio. Lá
embaixo na primeira classe as
pessoas encaravam o frio vindo do
mar, enquanto degustavam
coquetéis de luxo. E de repente
uma delas se vira e como se uma
onda gélida lhe tivesse atingindo
Thomas se surpreende ao ver que
as palavras ditas á dois anos atrás
estavam para se realizar naquele
exato momento;
Lá de baixo, estava ele
vestindo um sobre tudo preto e
chapéu curto. Quando retirou de
sua cabeça, deixou os fios
aloirados e cumpridos balançarem
com o vento. Mas como se algo o
chamasse a atenção pelas costas,
olhou ao redor para ver o que o
incomodava, mas quando olhou
para cima seus olhos azuis se
tornaram evidentes. Thomas sentiu
gelar da cabeça aos pés e de sua
boca a única palavra fora o
provável nome da pessoa;
- Kenneth!? Será possível?