No dia seguinte, Thomas tentava afastar a cara de sono e cansaço da noite anterior. Foram tantas emoções que mal dormira e quando finalmente conseguira pregar os olhos, já era hora de levantar e quando lembrou para onde estaria indo, sentiu o coração dar um salto e a dúvida veio á cabeça:
- Será que devo mesmo ir? – Pensou sentado na cama olhando para a porta. – Acho melhor não acabei de reencontrá-lo... Mas ele fez tanta questão... Droga tomara que isso dê certo.
Reencontrar Kenneth também trouxe á tona uma série de questionamentos e dúvidas; Por mais que o amor por ele nunca tenha sido esquecido, algo mudou. Revê-lo foi totalmente diferente do que imaginava: em seus sonhos, corria como louco desesperado e o abraçava tão forte que quando acordava os braços pareciam estar doloridos. Mas na realidade foi tão frio e inesperado que parecia uma nevasca depois de um dia ensolarado. Thomas não sabia se fora por causa da surpresa ou se algo a mais influenciou essa ação. Tudo aquilo que imaginou que faria quando o visse, transformou-se em poucas palavras, um abraço sem jeito e uma resposta fria no meio da noite.
Mesmo assim saiu vinte minutos antes, como se fosse um passageiro de primeira classe. Lá fora o sol não era o suficiente para espantar o frio e criava uma sensação térmica agradável, assim como nos corredores. Como de costume, infiltrou-se na classe superior e fora ao lugar combinado aonde ele já o aguardava. Quando Kenneth o viu sorriu e cumprimentaram-se com aperto de mão:
- Bom dia, que bom que veio. – disse sorridente.
- Oi. - disse Thomas caçando palavras para completar uma frase digna, mas nada veio á mente.
Thomas sentia a cabeça dolorida enquanto pensava o que estava acontecendo consigo; o amor que sentia por Kenneth pareceu ter se jogado no mar á milhas atrás. Não conseguia sentir nada além de alegria em vê-lo. Kenneth, ao contrário, o guia até um espaço aberto cheio de mesas confortáveis e com vista para o mar. Um dos garçons com forte sotaque italiano deu-lhes boas vindas ao que dizia ser o Café Parisiense. Ali estavam um público particularmente jovem, que aproveitavam o dia namorando ou tendo conversas amigáveis.
- E então Thomas, como você está? - iniciou propondo que a conversa seria boa.
- Bem, estou bem. Um pouco assustado com sua presença, mas estou bem – disse nervoso.
- Relaxe. Está tudo ótimo. - riu. – Conte-me. O que vai fazer na América?
Como esperado, Thomas e Kenneth conseguem manter uma conversa que dura até depois das duas. Passaram a maioria do tempo ali conversando o que se passou nos últimos anos: Kenneth contara que desde o dia em que saíra da Inglaterra, tem vivido bem na França como professor em um instituto de línguas. Ao ser perguntado, por que não mandara notícias, Kenneth o surpreende dizendo que havia mandado cartas por cinco meses seguidos, mas como nunca havia recebido notícias parou de enviá-las. Pensando ter se mudado. Thomas surpreso, não sabia dos envios e nem sabe aonde foram parar, mas pensava em procurar no correio central de Londres quando voltasse. Kenneth revelou que pensou que Thomas o havia esquecido ou que não queria mais saber dele e quase fez o mesmo, mas a vontade de revê-lo nunca passou e que estava feliz em reencontrá-lo, pois iria para Nova York lecionar por seis anos e estava preocupado em nunca mais o revê-lo.
- E como vai Ravona? - disse Thomas tímido e quase sussurrando.
- Deve estar bem. Terminamos a cerca de seis meses. - disse cabisbaixo.
- Lamento, vai encontrar alguém melhor... - consolou-o surpreso com a notícia.
- Sim. Espero que sim. Está ficando frio, não quer pegar um casaco mais grosso? – disfarçou Kenneth trocando de assunto.
- Meus aposentos estão tão longe. – lembrou-se da condição em que estava.
- Vamos. Eu te acompanho. - disse levantando. - Qual o número do quarto?
- Ahn... - engoliu o resto da bebida de uma só vez – Sabe, e-eu estou na segunda classe.
Kenneth segurou o riso, mas caiu na gargalhada deixando Thomas mais vermelho ainda.
- E como veio parar aqui, se é proibido?- perguntou enxugando as lágrimas.
- Encontrei uma chave que abre uma porta que liga até aqui. - disse enquanto o outro ria.
- Você é incrível mesmo.
Momentos depois ambos estavam no quarto de Thomas, onde foram somente buscar um casaco:
- Está aqui sozinho? - perguntou sentando na cama oposta e vazia.
- Sim. E você. Como conseguiu passagens de primeira classe? - perguntou enquanto procurava o casaco.
- Quanta sutileza – riu – Bem. Foi um presente da nova escola para onde vou. Mas revelo que trocaria tudo pra ficar aqui. Não me sinto confortável lá. Não faz parte do dia a dia.
- Verdade? - riu Thomas – sentando ao seu lado. - Vem pra cá então.
- É um convite? - disse Kenneth se aproximando.
- Sim. - respondeu se levantando por mais que a tentação quisesse o contrário. - Vamos?
De volta ao espaço aberto do navio, Kenneth e Thomas andavam calmamente em direção á parte mais alta do Titanic. Enquanto conversavam Thomas reparou que os jovens envolvidos no incidente da noite anterior estavam conversando em um dos corredores enquanto olhavam o mar e minutos depois estavam disputando um tipo de competição de cuspe á distância do qual pareciam estar gostando, por mais estranho que parecesse. Quando chegaram ao convés mais alto, onde os botes salva vidas ficavam, Kenneth indicou uma espreguiçadeira dupla que estava posicionada para o incrível por do sol; O astro alaranjado coloria o mar deixando ainda mais belo. Em seu interior, Thomas não sabia o que fazer se que toda aquela conversa e tempo juntos levassem a algo mais. Já havia muita dúvida no ar.
Porém, permaneceram ali, lado a lado juntos e quietos por alguns minutos até Kenneth puxar assunto:
- Senti sua falta... – disse do nada.
- “Droga. Meu coração está acelerando de novo. Ou estou re-apaixonando ou tendo um ataque cardíaco” - pensou abaixando a cabeça e mordendo o lábio. Tinha que dizer algo. - Eu também senti muito... Sua falta. - disse timidamente apertando as mãos.
- Ainda não entendo por que parece tão triste? - perguntou Kenneth se aproximando e virando para observá-lo.
- Ahn... Desculpa. - lamentou ao ser pego de surpresa pela pergunta. - Ainda estou abalado pelo meu pai, mas estou tentando vencer uma batalha comigo mesmo.
- Se quiser posso te ajudar. O que tanto te atormenta?
Thomas respirou fundo e percebeu que não tinha saída. E a mesma sensação de quando fora beijado dois anos atrás veio á mente. Aquela dúvida e paixão proibida estavam consumindo-lhe e então revelou:
- É você! Você é o único que poderá me ajudar. Pois você é o motivo da minha tormenta. – explodiu em um a tormenta de palavras pegando Kenneth de surpresa.
Thomas queria saber o que ele estava pensando enquanto o observava com uma expressão de surpresa. As últimas palavras ditas com a voz trêmula ainda estavam em sua cabeça deixando-o tonto e com vontade de se atirar no mar devido á vergonha. Mas a voz de Kenneth o trouxe de volta a realidade.
- Mesmo com vinte anos, você continua com o mesmo pensamento de dois anos atrás. - riu deixando-o mais vermelho ainda. - Thomas. Acho que temos algo em comum. Sabe qual foi um dos motivos de eu terminar com Ravona? – perguntou devorando-o com os olhos azuis. - Chamar seu nome enquanto dormia... - riu
Thomas não sabia o que dizer. Enquanto ele era uma pilha de nervos, Kenneth parecia o mar ao redor: Calmo, bonito e indiferente.
- Thomas por que é tão difícil para você assumir que o que tanto te atormenta se chama amor? – disse tornando-se sério.
- Desculpa...
- Não se lamente! Faça algo para que não se sinta mal.
E foi assim que Thomas tomou coragem e soltou o que estava preso na garganta há dois anos.
- Kenneth eu te amo!
As palavras saíram juntas e ao mesmo tempo Como se tivessem sido disparadas por uma arma de fogo. E logo depois veio o silencio esmagador e atordoante. Tinha algo ali que dizia que aquele sentimento poderia ser mútuo, mais muita coisa acontece em dois anos. Sua cabeça girava e as palavras “eu te amo” rodopiavam gritando e ecoando pelo espaço ao redor. Mas tudo acamou quando a mão quente de Kenneth tocou em seu queixo e seu rosto aproximou o suficiente para sentir o perfume de sua loção pós barba.
- Eu também sinto o mesmo por você... - sussurrou.
Sorte que dessa vez estava sentado. Thomas não teve que se preocupar em sentir suas pernas tremerem ou desmaiar. Nada mais importava depois que Kenneth o envolvera com seus braços e beijou-o com paixão. Com os olhos semicerrados espiou se era verdade mesmo, e a expressão de Kenneth era um misto de prazer e satisfação. Sentia o toque das mãos dele em suas costas e braços e seus beijos eram molhados e excitantes que demoraram mais do que o último contato que tiveram assim como também fora diferente a retribuição positiva de Thomas. Quando finalmente terminaram, permaneceram juntos com as testas encostadas e expressavam um sorriso tímido.
- Esse momento me deixou vários dias sem dormir. - revelou Kenneth.
- Eu sempre quis te dizer isso. E nunca te esqueci desde a última vez que te vi. - disse Thomas mal acreditando que tinha finalmente se declarado.
- Eu sei que é cedo, mas quer jantar comigo? Vai ser tipo um encontro e vai te deixar mais calmo... - avermelhou-se
- Sim eu aceito... Que horas?
- Ás sete e meia. Me encontra na grande escadaria, aquela que você gostou devido ao teto ser transparente e de ferro.
- Certo...
Mesmo com os joelhos tremendo, Thomas levanta e é guiado por Kenneth até suas acomodações na segunda classe onde se despediram novamente com um beijo. Quando fechou a porta desabou no chão e pôs o rosto entre as mãos ainda trêmulas. Estava tão nervoso que teve ânsia de vômito. Na cabeça ainda havia dúvidas sobre o que estava fazendo. Sempre ouviu que relações desse tipo eram atos de pecado e condenação, mas, o que poderia fazer se já estivesse se envolvido, e pior; gostando?