Um Café - Parte 2 - Latte com Baunilha e Pães Italianos

Um conto erótico de Dr Jeremiah
Categoria:
Contém 1042 palavras
Data: 13/07/2013 06:06:29

[AVISO - Este texto NÃO contém sexo. Ele funciona como elo de ligação para uma terceira parte mais 'caliente'. Ele sequer contém erotismo. Se quiser seguir a história leia. Se quiser apenas as cenas quentes, espere pela próxima pate.]

Carolina foi para os fundos; o garçom limpava a mesa e a cadeira dela; e Saulo levado ao banheiro masculino pelo barista para se lavar.

Enfim só, ele começou a pensar sobre o que estava acontecendo. Carolina, obviamente, também era praticante, refletia enquanto cheirava seu perfume, misturado ao café. E esta tinha sido uma das experiências mais intensas da sua vida. Sorriu ao perceber que a tinha feito gozar antes de saberem seus nomes. O que é um nome afinal? 'Um dos vários rituais de conhecimento e reconhecimento do grupo social a que pertencemos', a aula de Introdução à Antropologia respondeu na base do crânio. Não pode deixar de rir. As malditas aulas de antropologia vivam resumindo tudo a modelos básicos, simplistas, reducionistas. Tinha destruído um relacionamento assim. Aspirou fundo uma última vez o perfume impregnado em seus dedos antes de abrir a torneira. Deixou escorrerem pelo ralo uma constelação de perguntas e segurou para si apenas duas certezas. "Não racionalize demais" e "Hoje é seu de de sorte".

Quando saiu o banheiro a mesa ainda estava vazia. Foi ao balcão.

"Um latte, vocês fazem com baunilha certo?" o garçom acenou positivamente com a cabeça enquanto lavava as mãos. "E para comer...? Acho que tinha uma cesta de pães no menu..."

"Pães italianos com grãos. Linhaça, girassol..." o garçom entrou em modo automático, repetindo o texto decorado.

"Uma dessas também." Respondeu interrompendo a lista de sementes, antes que ele começasse a falar dos benefícios de cada uma. Tinha se decidido a voltar para a mesa quando perguntou "A Carolina gosta de latte?"

"Sim, sempre toma pela manhã." o garçom respondeu.

"Acho que pode trazer um para ela." Pedir uma bebida para ela, no café dela. Isso era estranho, pensou enquanto voltava à mesa. Pegou a pasta e trouxe para junto de seu novo assento.

Era dia de aula. Uma única aula às seis e meia. Talvez o primeiro azar. Tinha o que? Uma hora antes de precisar ir? Menos ainda. No que se ocupar? Não fazia sentido aguardar lendo a Sofi, não fazia sentido não fazer nada. Pegou o livro entre as mãos, examinando mais que lendo as páginas enquanto aguardava que ela voltasse.

"Acho que eu compraria pela barata na capa, mesmo sem ler a sinopse." Carolina disse às suas costas. Saulo se virou imediatamente. Ela vestia uma camiseta preta, Teatro Mágico e Rosa Luxemburgo, outra saia, dessa vez jeans.

"Com certeza, alguns livros vale comprar pela capa." respondeu abrindo espaço para que ela se sentasse em seu antigo lugar.

"Me empresta quando terminar?" Carolina perguntou enquanto ajustava a saia.

"Claro, se quiser até hoje mesmo. Tenho um monte de livros pela metade."

"Não, prefiro que você termine. Tenho que terminar A Idéia da Decadência para um seminário sexta."

"Na Fafich?" Como introduzir o assunto? Pouco tempo e muitas banalidades.

"Sim. Você também?"

"Faficheiros. Estranho não nos encontrarmos lá."

"Preferi aqui."

Agora.

Mas o garçom chegou com a bandeja.

"Com licença" Cesta de vime, cumbucas mini, tamanho hotel, de geleia, amarela, vermelha e quase preta, mais duas iguais com manteiga.

Garçons tem um timing perfeito para atrapalhar.

"Bom que pediu comida." Carolina vasculhou a cesta em busca de um pão específico.

"Dá uma fome..." Agora sim.

"E como!" ela passava quase toda a geleia amarela, provavelmente damasco, no pão selecionado. "Sabe, eu..." pausa.

"Sim?"

"Eu estive pensando na melhor forma de dizer isso." terminou de besuntar o pão, mas não fez menção de comer. Tensa, tesa, presa. "Eu não quero e não vou assumir um compromisso."

Isso? Quem se preocuparia tanto com isso?

"Nós nos conhecemos há uma hora. Quem pediria um compromisso?"

"Bem, eu..." Insegura. Alívio, mas medo. A criança que não sabe se vei receber ou não uma bronca. Olhos desamparados, voz fraca. "Olha... não quero dizer que você é... ou que eu ache que você é!" acrescentou abrupta "muitos Doms são idiotas." concluiu mais baixo, mais rápido. Talvez medo que os empregados ouvissem, talvez medo que ele reprovasse. "Acham que a gente tem que largar tudo, deixar eles decidirem tudo, e estar totalmente disposta desde o primeiro encontro."

Toda a cena era meio patética. Carolina, desamparada como a criança que rabiscou as paredes com giz de cera, aguardando a bronca, o castigo, as chibatas; e Saulo achando os desenhos lindos. Expectativas desencontradas.

Saulo pôs a mão sobre o punho dela na mesa. Fechado, gelado, ao contrário de suas pernas há pouco. Talvez tremesse um pouco.

"Althusser."

"O que?"

"Minha palavra de segurança." Carolina riu.

"Eu sei, é ridícula. E ele matou a mulher." Saulo concordou "Mas agora eu vou dizer o que eu quero e você vai responder 'Althusser' se não concordar, ok?"

"Ok."

"Eu quero o seu telefone." Ela respondeu com a cabeça. Sim. Feito. Alívio. Dos dois.

"Eu quero te encontrar de novo." Sim. Feito. Relaxar, mas só Saulo. Carolina voltou a retesar os dedos. Talvez esperasse uma progressão; telefone-encontro-vontade-vida. Talvez tivesse apenas se excitado com a imagem do encontro.

"E eu quero que você coma esse pão antes que seu latte esfrie." Relaxamento. ambos. Acabado. Risos, punho largado. Negociação finda, acordo feito.

Enquanto ela ria Saulo aproveitou para provar o seu latte. Encorpado, cremoso, bem feito. Era um bom barista.

"Obrigada." Carolina disse com a boca cheia. "Foi tudo muito rápido. E tem gente que é... meio maníaca; já convivi com gente maníaca."

"Sempre tem um idiota para estragar sua reputação." Saulo respondeu blasé.

"Isso!" Carolina concordou enfaticamente antes de levar a taça aos lábios. E rir, engasgar, quase sufocar, quase virar um chafariz, pousar bruscamente a taça na mesa, derramar muito, buscar um guardanapo, conseguir não se cobrir de café, de novo, e rir. Livremente rir, gargalhar, ignorar as três primeiras perguntas de 'o que foi' para então responder ofegante:

"O café..."

"O que tem o café?"

"Ele é baunilha!"

Demorou ainda alguns segundos para que Saulo entendesse a piada. E então gargalhasse, fazendo renascer o riso, já quase extinto de Carolina.

Atrás deles, o garçom e o barista se entreolhavam, sem saber o que fazer.

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Comentários

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Soube usar bem a sua hora que faltava conseguindo outro encontro! To adorando a maneira que vc escreve... 8-)

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