“Mesmo trabalhando para um órgão que, a princípio, deveria privar pelo cumprimento das leis, eu já sofri homofobia. Sinto um certo afastamento por parte de algumas pessoas simplesmente pelo fato de eu não querer me esconder mais. Minhas opiniões e minha qualidade técnica são diminuídas por causa da minha orientação sexual. Por quê? Ser gay me tornou menos competente?
Sinto raiva de uma sociedade que tem medo de ver beijo gay na novela das oito, mas que se delicia assistindo às piores atrocidades nos noticiários sensacionalistas. Fico me perguntando: por que eu incomodo tanto? Por que gostar de alguém traz tanta violência? De onde vem esse ódio?
É muito difícil compreender por que a comunidade evangélica, por exemplo, é capaz de perdoar a assassinos ou bandidos que se converteram à religião e não aceitam que eu caminhe de mãos dadas com meu namorado pela rua. Qual é o crime de se caminhar de mãos dadas pela rua?
Há pouco perdi um de meus melhores amigos e sei que seu assassinato ficará impune. Estamos no Brasil e não vai ser a primeira vez que um crime ficará impune. Pior ainda se são crimes de homofobia ou crimes que a nossa homofobia internalizada não permite que sejam investigados.
Uma vez eu fui vítima de um golpe conhecido como ‘Boa Noite Cinderela’. Apesar de todos os protestos de que não devia fazer um B.O. (boletim de ocorrência), fui até uma delegacia. E lá realmente desisti de fazer o B.O.. Nunca fui tão humilhado em toda a minha vida. O policial que me atendeu teve uma crise de riso enquanto eu relatava o caso. Aposto que não seria esta a reação caso o evento tivesse ocorrido com um macho alfa. Eu desisti de denunciar, voltei para casa e me senti a pessoa mais impotente do mundo.
Em outra oportunidade, vi um grupo de adolescentes na saída de uma festa GLS agredindo um garoto que aparentava estar muito bêbado. Novamente, apesar dos protestos de um namorado da época, interferi e acabei me dando muito mal. Apanhei um pouco, pois nem tenho porte físico para enfrentamentos e, quando a polícia chegou, os três adolescentes foram protegidos, e eu quase fui parar na delegacia. Segundo os policiais, eu estava gerando desordem.
Já perdi a conta de quantos amigos, em Goiânia ou em Uberlândia, já sofreram agressões na rua por serem gays. Ao tentar denunciá-las, as vítimas foram ridicularizadas, e os agressores liberados. Eu não tenho mais coragem de procurar a polícia para denunciar qualquer forma de preconceito. Vivemos no nosso mundinho, disfarçados. Vivemos num ‘gayto’.”