A Toyota 4x4 rumou para o deserto. Corações batendo forte.
Meia hora depois, o asfalto deu lugar a um chão branco vermelhado. A cidade, a civilização, ficara, para trás. Na nossa frente, uma gigantesca planície branca de perder de vista. Ao longe de tudo, se via montanhas.
O carro, a 80 km/h, ia, aos poucos, adentrando o deserto, cujo chão branco ia gradativamente ficando cada vez mais branco, um branco intenso que refletia o sol, tão forte, que ofuscava a vista.
Foi então que, depois de percorrido dez minutos dentro do deserto, o motorista recomendou:
- É melhor vocês colocarem seus óculos escuros... Todos vocês tem óculos escuros? Tem alguns pares no porta-luvas para quem não tiver...
E ele prosseguiu falando:
- É que o chão do deserto reflete o sol, é uma claridade muito forte, faz mal para os olhos.
E ele estava certo. Em pouco tempo começou a ficar insuportável ficar de olhos abertos. Peguei meus óculos escuros na minha mochila e assim fizeram também Ferdinand e os argentinos.
- Você está lindo com esses óculos. – sussurrou Ferdinand nos meus ouvidos e eu tomei um susto, olhando para os lados para ver se alguém tinha escutado aquilo.
Ferdinand também tinha ficado muito gato, ele tinha um óculos esportivo parecido com o meu, que ficava extremamente charmoso nele.
Os argentinos também ficaram lindos de óculos escuros e, naquele momento, minha mente teve pensamentos indecentes, desejando luxúrias com os rapazes que estavam dentro daquele carro (tirando o motorista, que não tinha nenhum atributo atrativo).
Pablo, o argentino de 16 anos, era o que especialmente mais me chamava a atenção. Ele estava assentado do meu lado (eu estava no meio, no meu outro lado estava Ferdinand) e estava ficando difícil resistir a tentação, eu escutava a voz dele conversando com a gente e ficava imaginando como seria o gemido dele na cama, a bunda lisinha, o cuzinho apertadinho, o rostinho de prazer em sentir o meu pau dentro dele... Ahhh...
Meu pênis ficava duro só de imaginar essas coisas e então eu desviava meus pensamentos, olhando pela janela e admirando o incansável branco que nos rodeava.
A paisagem era, de certo modo, hipnotizante. Um branco tão vasto, tão amplo, que fazia nossos olhos se perderem na imensidão e no horizonte infinito.
Em contraste com o branco, havia o céu azul, do mesmo jeito imenso e arrogante, límpido e extremante infungível, fazia eu me sentir pequeno e insignificante.
Depois de 30 minutos percorrendo o deserto, o motorista fez a primeira parada, para que pudéssemos ter a nossa primeira apreciação daquele cenário tão único.
Ferdinand abriu a porta e saiu do carro. Logo em seguida, eu também saí, olhando para o chão, sem acreditar que aquilo tudo era sal... Quantos milhões de toneladas de sal haveria de ter ali naquele deserto?
Afastei-me do carro, dando passos vazios numa direção arbitrária, pois qualquer direção daria no mesmo, no horizonte branco do deserto. Parei e fiquei olhando a paisagem na minha frente de forma contemplativa, quase que de modo metafísico, abstraindo-me dos meus outros sentidos, como o auditivo e o sensorial, concentrando-me apenas na visão. Os gritos, barulhos e algazarras que os argentinos faziam pareciam apenas um sussurro longínquo e muito distante, muito mais distante do que os quinze metros que nos separavam.
Ali, naquele instante, tive meu momento egoístico de introspecção, quando a gente entra num estado meio vegetativo, de não estar nem lá, nem cá, de estar num meio caminho, em que a gente se questiona, de forma escassa e sem coerência, as razões da nossa própria vida...
- Marcos? MARCOS?
Subitamente volto à realidade, trazido pela inconfundível voz de Ferdinand.
- Posso ficar aqui com você? – ele pergunta.
- Claro.
E assim ele fica do meu lado, também em silêncio, sem trocar palavras. Repentinamente a voz baixinha dele corta suavemente o ar.
- Só pra avisar, eu pedi para o motorista bater uma foto nossa, se você não se importar... (http://images.orkut.com/orkut/photos/OgAAAPehM0cd9dK8hqxJFxmcFYL-HmBOPNB4ECywwXGuzbObddPoSMJWiuQOJlSMgmS4fDC3Cx6UeD1_zAXV1MW62FQAm1T1UAGt5ClqdB6q8_c2jTbIjCqUA-ag.jpg)
Meu pênis ficava duro só de imaginar essas coisas e então eu desviava meus pensamentos, olhando pela janela e admirando o incansável branco que nos rodeava.
A paisagem era, de certo modo, hipnotizante. Um branco tão vasto, tão amplo, que fazia nossos olhos se perderem na imensidão e no horizonte infinito.
Em contraste com o branco, havia o céu azul, do mesmo jeito imenso e arrogante, límpido e extremante infungível, fazia eu me sentir pequeno e insignificante.
Depois de 30 minutos percorrendo o deserto, o motorista fez a primeira parada, para que pudéssemos ter a nossa primeira apreciação daquele cenário tão único.
Ferdinand abriu a porta e saiu do carro. Logo em seguida, eu também saí, olhando para o chão, sem acreditar que aquilo tudo era sal... Quantos milhões de toneladas de sal haveria de ter ali naquele deserto?
Afastei-me do carro, dando passos vazios numa direção arbitrária, pois qualquer direção daria no mesmo, no horizonte branco do deserto. Parei e fiquei olhando a paisagem na minha frente de forma contemplativa, quase que de modo metafísico, abstraindo-me dos meus outros sentidos, como o auditivo e o sensorial, concentrando-me apenas na visão. Os gritos, barulhos e algazarras que os argentinos faziam pareciam apenas um sussurro longínquo e muito distante, muito mais distante do que os quinze metros que nos separavam.
Ali, naquele instante, tive meu momento egoístico de introspecção, quando a gente entra num estado meio vegetativo, de não estar nem lá, nem cá, de estar num meio caminho, em que a gente se questiona, de forma escassa e sem coerência, as razões da nossa própria vida...
- Marcos? MARCOS?
Subitamente volto à realidade, trazido pela inconfundível voz de Ferdinand.
- Posso ficar aqui com você? – ele pergunta.
- Claro.
E assim ele fica do meu lado, também em silêncio, sem trocar palavras. Repentinamente a voz baixinha dele corta suavemente o ar.
- Só pra avisar, eu pedi para o motorista bater uma foto nossa, se você não se importar...
O passeio prosseguiu na Toyota, conhecemos o processo de extrair e embalar o sal e depois fomos para a “Isla del Pescado” (Ilha do Peixe, em português), o nome de ilha era apenas metafórico, porque era um pequeno monte que ficava cravado no meio do deserto de sal, então ficava parecendo uma ilha envolta pela ‘água’ de sal. A ‘ilha’ era bem bonita, cheia de formações de cactos, alguns chegando a mais de 2 metros de altura.
Foi lá que nossa cozinheira, Lidia, preparou nosso almoço. Pra quem está acostumado com a comida brasileira, o almoço da Lidia estava uma bosta, mas em todo caso, as russas ficaram elogiando a comida dela aos quatro ventos. Eu particularmente achei a comida dela muito chifrin, um arroz seco, uma carne dura. Todos os outros lugares que eu tinha comido na Bolívia tinham sido melhores... Mas enfim, era aquela comida ou aquela comida, não havia outra escolha.
Depois do almoço voltamos para os carros e terminamos de cruzar o deserto de sal, chegando nas proximidades do deserto do Atacama. O cenário mudava completamente, a predominância da cor branca dava lugar a um marrom de terra desbotado.
Era por volta de 18h00min quando chegamos no lugar onde iríamos dormir. Era um vilarejo no deserto, um lugar bem simples e extremamente rústico. Jantamos e depois ficamos de conversa com o grupo da viagem. Os argentinos, apesar de gostosinhos, eram meio infantis, as russas, igual eu falei, eram metidas, o francês e o casal da Alemanha eram gente boa.
Foi escurecendo e resolvemos fazer as divisões dos quartos. Cada quarto cabia três pessoas. Então num quarto ficaram as duas russas e a mulher alemã; no outro ficaram o alemão, o francês e um dos motoristas; no meu quarto ficaram eu, o Ferdinand e o Pablo; no outro quarto ficaram os outros três argentinos. O outro motorista e a cozinheira eu não sei onde foi que eles se arranjaram, mas acho que ficaram com outra excursão que também estava lá...
Eu e Ferdinand resolvemos ir para o quarto mais cedo, aproveitar que os argentinos estavam entretidos conversando com as russas, e podermos namorar um pouco com privacidade enquanto Pablo estava lá fora com eles.
Estava frio. Assentei na minha cama, olhando para Ferdinand que estava na minha frente.
- Você não quer ir morar no Brasil, não? – eu perguntei.
- Eu queria... – ele respondeu sorrindo. – Sol todo dia...
- Hahaha. Nem é bem assim. O Brasil inteiro não é o Rio de Janeiro. – eu falei com um sorriso opaco.
Ferdinand percebeu que eu meio triste.
- Marcos, o que foi? – ele perguntou.
Eu estava um pouco sem graça de dizer o que eu estava sentindo. A verdade era que eu tinha me dado conta que eu nunca acharia alguém como Ferdinand no Brasil, e pior, a gente nem tinha ainda se separado e eu já estava sentindo saudades antecipadas dele.
Preferi guardar esse sentimento pra mim. Eu não sabia como é que Ferdinand iria reagir se eu declarasse pra ele que eu estava começando a ficar apaixonado, criando planos mirabolantes na minha cabeça para ele vir morar no Brasil. Ele certamente me acharia um doido, um fora da realidade. Eu não sabia como era que ele se sentia em relação a mim... Provavelmente eu era apenas um peguete na viagem dele...
Disfarcei minha aflição, de forma bem ambígua, respondi.
- É que eu quero aproveitar bem esses momentos com você. Lá no Brasil não tem austríacos lindos assim dando sopa tão fácil.
Ferdinand fez uma falsa cara de zangado.
- Eu fui tão fácil assim? – ele perguntou fingindo que estava bravo.
- Você foi extremamente fácil. Ninguém resiste a mim. – eu falei rindo e avançado para dar um beijo naquele garoto lindo e meigo que estava parado na minha frente.
Ferdinand retribuiu o beijo durante alguns segundos, mas logo interrompeu.
- Se o Pablo entrar aqui? – ele perguntou.
- Ihh, vai demorar. Ele tá lá conversando com as russas. – eu respondi.
- Tem certeza? – perguntou Ferdinand olhando sem graça para a porta do quarto.
.
Não foi, assim, sem surpresa alguma, que Pablo estava parado na porta do quarto, estampando um sorriso safado no rosto ao invés de uma expressão de surpresa e nojo.
Tão pouco foi preciso muitas palavras para que, em poucos instantes, aquele moleque argentino de 16 anos, com pose de skatetista e um rostinho de tirar o fôlego, estivesse de joelhos na nossa frente, com a língua pra fora, igual um cachorrinho.
De pronto imediato ofereci a ele o meu pau, que ele aceitou com felicidade e começou a chupá-lo com paixão, enquanto eu trocava beijos com Ferdinand.
Resumo da ópera, eu e Ferdinand comemos Pablo. O garoto tinha cara de ingênuo, mas não era nada inocente, rebolava no pau de um enquanto chupava o cacete do outro, a cuzinho dele era lisinho e piscava inquieto toda vez que a gente tirava o pau de dentro dele, implorando para ser arregaçado mais um pouquinho.
Foi meu primeiro e único sexo “grupal”, e foi muito bom. O menino argentino tinha mó cara de machãozinho pegador das menininhas, o que me dava mais tesão ainda em comer o rabinho dele.
No dia seguinte, acordamos cedo e fomos conhecer as lagunas. Foram várias lagunas, cada uma mais bonita que a outra. Laguna Verde, Laguna Colorado e várias outras, no final do dia eu já não agüentava ver mais lagunas. As lagunas era uma espécie de lagoas e tinham uma cor vivaz por causa do reflexo do sol. A Laguna Verde, por exemplo, tinha uma cor verde que parecia um quadro surrealista, de tão psicodélica que era a tonalidade.
De noite, pairou toda aquela expectativa entre mim, Ferdinand e Pablo, de repetirmos a diversão da noite anterior. Mas quando chegamos no lugar onde iríamos dormir, por sinal, tão rústico quanto o outro, nosso desejo logo ficou frustrado, iríamos dormir sete no mesmo quarto, eu, Ferdinand, o quatro argentinos e o rapaz francês. Eu ainda pensei numa possibilidade de um sexo à sete...
Mas Pablo logo tirou as minhas esperanças, falando que era melhor não tentar nada com os colegas dele, porque era arriscado. Ele não tinha certeza nenhuma se os amigos curtiam esse tipo de diversão.
No terceiro dia no deserto, conhecemos os “gêiseres”, as piscinas térmicas naturais, o cemitério dos Trens e voltamos para a cidade de Uyuni. Foi um dia bem cansativo, porque a viagem de volta foi bastante demorada.
Chegando à cidade, eu e Ferdinand, para ganharmos tempo, decidimos pegar o ônibus que sairia de noite para a cidade de La Paz.
Em La Paz, aproveitamos muito, assistimos a um campeonato de luta livre de Cholas, visitamos o centro histórico, os museus etc. Teve um dia que até chegamos a esbarrar com Chantelle na rua, foi um encontro meio incomodo, mas não merece maiores detalhamentos.
Finalmente chegou o dia que eu e Ferdinand teríamos que nos separar. Ele iria para o Peru e eu teria que voltar para Santa Cruz de La Sierra, onde eu pegaria o meu vôo de volta para o Brasil.
Confesso que chorei na despedida, Ferdinand tinha me cativado de um jeito diferente e, de alguma maneira, ainda plainava na minha cabeça algum sonho de eu e ele vivermos juntos, fosse no Brasil ou, melhor ainda, fosse na Áustria. Eu notei tristeza também nos olhos de Ferdinand, como se ele também tivesse feito os mesmos planos que eu. Mas de alguma forma, nem eu, nem ele, tivemos a coragem de declarar nossos sentimentos, de expormos nossos sonhos. Nem eu, nem ele, tivemos a bravura de falar que tinha um plano louco, um plano de fuga... Isso me fez lembrar a vez que Guilherme propusera que eu fugisse com ele...
Eu e Ferdinand, depois de uma longa pousa (como se um estivesse esperando do outro a idéia de fugir) demos um longo, acalentado e demorado abraço. Senti, pela última vez, o cheiro gostoso do perfume de Ferdinand e o arrepio que o abraço dele fazia o meu corpo sentir. Demos um selinho e fizemos promessas de mantermos contato por e-mail...
O ar estava preso na minha garganta, minhas pernas estavam paralisadas. Um silêncio perturbante pairou sobre nossas cabeças durante alguns minutos, até ser subitamente chacoalhado pelo ensurdecedor grito de Monise, que ecoou desesperado em nossos tímpanos.
Monise correu até o local onde estava caído o corpo de sua irmã Tais, embrenhando-se entre as lonas e as redes que estavam misturadas no chão.
Eu estava despido de qualquer reação, completamente incrédulo.
Meus olhos assistiam, passiveis, Monise se ajoelhar na frente da irmã e começar a gritar por socorro.
Finalmente consegui retomar a minha consciência, peguei meu celular e disquei para a emergência.
Percebi que o namorado de Tais, Diogo, continuava parado no mesmo lugar.
- Desliga isso daí! – eu falei para ele, que continuava com a filmadora da câmera fotográfica ligada.
Era demasiado sinistro pensar que ele tinha filmado a queda da própria namorada, ainda mais se tivesse acontecido o pior...
Corri ao encontro de Monise.
- Eu liguei para a emergência. – eu falei. – Vou avisar ao posto de emergência do show, acho que eles tem uma ambulância lá.
- Faça isso, por favor, Marcos... – assentiu Monise com a cabeça, entre soluços, fazendo força para conseguir pronunciar as palavras.
Vi o corpo de Tais atirado ao chão, como se fosse uma boneca mal tratada. Antes que eu pudesse me deixar paralisar por aquela imagem mórbida, balancei a cabeça e corri em direção ao posto de atendimento médico do show, que não era exatamente perto dali.
Poucos minutos depois, eu voltava com uma ambulância ao local do acidente.
Monise e Diogo foram afastados do corpo de Tais.
Monise se debatia desesperada, inconformada e incontrolada... Querendo ficar próxima da irmã de qualquer jeito. Já Diogo, o namorado de Tais, ao contrário, parecia uma criança perdida; quieto e hipnotizado.
Os paramédicos colocaram o corpo de Tais dentro da ambulância, em seguida eu escutei apenas o barulho das sirenes reverberarem pelo ar.
Monise não estava em condições de fazer nada. Então fui eu que liguei para mãe dela, avisando que Tais estava sendo levada para a Santa Casa de Misericórdia.
Nesse meio tempo, o show da Ivete continuava no palco principal, a maioria das pessoas só saberiam do acidente no dia seguinte, no jornal. Monise chorava freneticamente, não havia meios de consolá-la.
Pouco tempo depois, a policia chegou no local e deu voz de prisão em flagrante aos dois operadores do brinquedo.
Uma das viaturas da PM nos levou ao hospital, chegando lá encontramos com os pais de Monise. A notícia que se seguiu não foi nada boa. Tais havia falecido, já chegara no hospital morta. Tinha sido morte instantânea com a queda.
Não havia muito que conversar. Diogo, namorado de Tais, parecia sem saber como reagir, era visível o seu sofrimento e abalo. Os pais de Tais e Monise estavam estáticos.
Naquele dia, só fui chegar em casa às 8 horas da manhã.
Desabei direto na cama, pois naquele mesmo dia haveria o velório na casa de Monise de noite.
Era difícil conseguir dormir, a cena de Tais caindo do “Queda-Livre” e indo parar direto no chão não saia da minha cabeça. Porém meu cansaço era muito grande, toda a agitação de ir no hospital e de ficar dando apoio para Monise exigira muito das minhas energias. Então, quando eu menos percebi, eu já havia caído no sono.
Lá pras 11 horas, o meu descanso foi interrompido pelo barulho do meu celular, que estava tocando. No visor, um número sem identificação.
Com os olhos semi-abertos, estiquei meu braço e atendi o celular.
- Alô? – minha voz saiu sonolenta.
- E aí, como foi? – perguntou a voz do outro lado da linha, estampando ansiedade e euforia.
Demorei a reconhecer quem era.
- Para de fazer mistério, dodói. Você terminou com ela, afinal? Você já é meu, só meu, exclusivo? – perguntou Guilherme. – Você contou pra ela sobre a gente? Ahhh!!! Que saudade que eu tô de você! Que voz é essa? Você tá dormindo?
.
Falei para Guilherme que eu não tinha terminado com Monise, expliquei sobre o acidente fatal com a irmã dela.
Seria uma total insensibilidade da minha parte terminar o namoro com Monise naquele momento.
- Sim, mas não enrole muito véi. – pediu Guilherme. – Tão logo dê para terminar com ela, por favor, termine. Não sei explicar, mas eu estou com um péssimo pressentimento sobre isso tudo.
- Calma cara. É só por alguns dias, no máximo algumas semanas. Até ela estar melhor. As duas eram muito ligadas, ela irá sentir muita falta da irmã, eu tenho certeza.
- Então que seja só alguns dias. Apenas o imprescindível!
- Você é muito lindo com ciúmes.
Disse ao Gui que haveria o velório no final da tarde e coisa e tal e depois encerramos a ligação.
Meu coração ficava apertado de saber que ele estava longe de mim, mas eu estava feliz. Guilherme voltara a ser meu namorado e era isso que importava, eu o amava, amava as birras e paranóias que ele tinha, as caras e bocas que ele fazia, até os planos estúpidos de ir para Irlanda que ele fazia, eu amava, por mais que tivesse me machucado, no final das contas, eu sabia que ele tinha feito isso tudo pensando na gente...
Tentei voltar a dormir, no entanto não consegui. A imagem de Tais caindo no ar era recorrente na minha cabeça.
Passei o resto do dia meio desligado, meio avoado, pensando na vida, em como ela é frágil, ninguém tem controle de nada, basta um instalar de dedos, um piscar de olhos, e uma vida de repente não existe mais. Até ontem, Tais estava viva e eu estava com ódio dela, agora ela simplesmente não estava mais entre nós. Era muito estranho.
Ao mesmo tempo, eu me flagrava pensando na sorte que eu tivera com isso tudo. Eu poderia terminar o meu namoro com Monise sem precisar falar para ela do meu envolvimento com Guilherme. Mas logo em seguida, eu me censurava, um absurdo era eu ficar pensando nas vantagens pessoais que a morte de Tais me proporcionaria.
No final da tarde, eu, meus pais e meu irmão Marcelo, fomos para a casa de Monise, onde seria feito o velório de Tais.
O clima era do mais baixo astral possível. Comentários do tipo “Era tão jovem...”, “Tinha toda uma vida pela frente...” era a tônica entre os murmúrios das pessoas que observavam o sofrimento dos pais de Monise.
Eu me mantive em silêncio. Não havia muito o que falar. Dei um abraço no pai e na mãe de Tais, depois peguei na mão de Monise e fiquei ali do lado dela, mudo, como um fiel escudeiro guarda-costas, apoiando-a naquele momento difícil. Eu sabia que o meu silêncio naquele momento era muito mais importante do que qualquer palavra que soasse vazia ou sem conteúdo.
A sala de jantar da casa estava sem a mesa. No lugar, havia um pequeno altar de mármore, decorado com margaridas, que era a flor predileta de Tais, uma foto dela sorrindo no tamanho de um quadro, e o caixão que estava semi-aberto, com o corpo dela dentro.
Vê-la ali de olhos fechados me trazia alivio e ao mesmo tempo desespero, quando eu voltava a lembrar que ela não estava dormindo, mas morta. E então eu esquecia e voltava a achar que ela estava simplesmente dormindo.
Dei mais um abraço em Monise, um abraço forte, caloroso, sincero!
Um pouco depois, Monise começou a falar palavras desconexas, jogadas ao ar, fazendo remissões fora de cronologia de sua infância com Tais, que a irmã sempre a protegera, que a ensinara a fazer maquiagem etc. Eu simplesmente concordava, sem realmente prestar muita atenção, perdido que eu estava nos meus próprios pensamentos.
Monise então me pediu para ir com ela no quarto da irmã, dado o fato de que ela não teria coragem de ir lá sozinha. Em princípio, pensei em censurá-la. Não parecia uma boa idéia ir no quarto de Tais nesse momento. Porém, logo em seguida, achei que quem tinha que decidir isso era a própria Monise e não eu.
Subimos as escadas da casa em direção aos quartos.
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Entramos no quarto de Tais. Tudo intocado, do jeito que ela deixara antes de irmos para a Festa Country.
Parecíamos dentro um set de filmagem, como se aquele quarto fosse um cenário de algum filme.
Roupas jogadas em cima da cama, algumas sandálias espalhadas pelo chão. Via-se que Tais era uma garota que não preconizava exatamente pela organização do quarto, embora a desorganização também não fosse nada exagerada.
Vários cadernos, apostilas de vestibular e livros encimavam a estante de estudos. Foi com um grande susto que meus olhos avistaram um singelo livro no meio de uma das pilhas, intitulado “O Príncipe”.
Meu coração congelou imediatamente.
Se Monise resolvesse pegar o livro para folhear? Ou sei lá, se desse na cabeça dela de olhar as últimas páginas?
Comecei a imaginar várias coisas.
Tentei manter a calma. Não havia motivo para pânico... Quais eram as chances dela resolver pegar o livro?