Ela veio me abraçar, perguntando onde eu tinha passado à noite toda, o que eu estava fazendo, se eu estava bem. Meu pai se levantou e se aproximou de mim. Eles não pareciam que iam brigar comigo. Mas estavam chorando muito.
Eles começaram a fazer inúmeras perguntas, sobre onde eu estava, com quem estava, e se eu estava bem. Eu respondi a todas as suas perguntas, no final do questionário eles me levaram para a sala. Olharam para a casa inteira, então meu pai disse:
- A gente vai ter que sair desse apartamento meu filho.
- Mas por que painho? Perguntei sem entender aquela revelação mais que inesperada.
- Por que a gente não vai ter mais como pagar. Disse minha mãe, chorava muito.
- Sabe o meu sócio, o Mario Sérgio? Indagou meu pai.
- Sim, o que tem ele? Perguntei.
Meus pais abaixaram a cabeça e choraram mais um pouco. Eu não aguentava mais sofrimentos, e eu sabia que ia sofrer ainda mais a partir daquele dia. Depois de algum tempo minha mãe falou:
- Ele deu um “calote” no seu pai, nos tirou a empresa que com tanto esforço construímos.
- Não pode ser! Disse eu.
- Pois é meu filho...
Eles me explicaram toda a situação. Nós teríamos que sair daquele apartamento. Meu pai e minha mãe estavam “desempregados” (ainda tínhamos algumas casas de aluguel), nossa renda mensal iria diminuir muito a partir daquele dia, mesmo com o suporte das casas de aluguel.
Fui para o meu quarto, deitei na cama. “Isso não pode estar acontecendo comigo”, pensei. “Porque justamente comigo?” Eu estava sofrendo muito, os problemas anteriores, à briga com o namorado da Cris, esses problemas pareciam que tinham ido embora, mas deram lugar a novos e ainda mais difíceis.
Eu não aguentava mais ficar naquele quarto, então sai de casa, na sala vi meu pai e minha mãe ainda chorando. Era uma hora da tarde, o sol da cidade estava tão forte que parecia um inferno, não um inferno pior do que aquele que eu estava passando. Fui para um fast-foot próximo a minha casa, lá serviam um milkshake muito bom.
No caminho decido ligar para o Gabriel. Ele atende e fala:
- Pedro desculpa pelo que aconteceu ontem.
- Tudo bem, eu queria conversar com você, pode ser? Perguntei.
- Claro, claro. De que horas? Indagou Gabriel.
- Agora, to indo aqui para o fast-foot perto daqui de casa, você pode vir?
- Tudo bem, to indo.
Sentei-me no restaurante e pedi um milkshake, depois de um tempo o Gabriel chegou de carro. Ele entrou no restaurante. Estava muito arrumado, muito cheiroso, nem parecia o Gabriel de ontem à noite.
- Foi mal pelo ocorrido. Disse ele, seu semblante era de tristeza.
- Não tem problema Gabriel. Disse eu.
- Eu queria desabafar com você, pode ser Pedro?
- Claro, comece. Disse eu.
- Desde que meu pai saiu de casa – ele abaixou a cabeça, parecia estar com um pouco de vergonha – eu me revoltei, não conseguia entender aquilo tudo, sabe Pedro, como ele podia me deixar aqui e ir para os Estados Unidos? Eu cheguei para ele, um dia antes de ele viajar e perguntei se poderia ir com ele. Ele disse que viria me pegar, que não me deixaria aqui, mas precisava ir só. Eu chorei muito. E quando ele foi embora eu passei a não entender mais nada. Eu não tinha motivos para estudar, ou para fazer mais nada. Foi ai que conheci alguns “amigos”...
- Continue. Disse eu.
- Então eu comecei a participar de certas tribos urbanas, de uma galera, e fui me identificando com aquilo. Pedro eu já roubei dinheiro de casa, já bati na minha irmã, já levantei a mão para bater em minha mãe, elas são pessoas que me amam muito, eu não às mereço.
- Claro que merece, você tem todo um potencial rapaz. Disse eu tentando elevar sua alta estima.
- Não sei não. Eu já pensei até em me matar, sei lá, assim eu acabava de vez esse sofrimento todo.
- Claro que você não vai fazer isso, claro que você não deve pensar assim. Vamos sair daqui, vamos para um lugar mais reservado. Propus.
- Sim, vamos pra um lugar mais reservado. Concordou Gabriel.
Subimos no carro sem falar nada, já dentro do veiculo Gabriel perguntou:
- Para onde vamos, queria um lugar particular. Disse ele.
- Parque das Dunas. Eu gosto de lá, é verde e tranqüilo.
- Tudo bem vamos! E ele dirigiu até lá.
No caminho para o Parque não falamos nada, eu apenas olhava para ele de vez em quando. Ele estava muito bonito, e ficava ainda mais bonito dirigindo. Assim como o coração do Gabriel, o meu estava a ponto de explodir tamanho eram os problemas. Chagamos no Parque das Dunas e nos sentamos na área de piquenique.
- Continue. Disse eu.
- Beleza. Seguinte, minha mãe já te falou que eu dei muito trabalho a minha família não foi Pedro?
- Já. Disse eu.
- Mas tem tantos problemas surgindo que eu não sei nem qual contar primeiro. Disse ele.
- Então os conte, você vai se sentir melhor. Disse eu.
- Eu perdi o emprego. Meu chefe descobriu que eu sou usuário de drogas, e me despediu. Minha mãe chorou muito quando soube, disse que seria difícil encontrar um novo emprego – seus olhos estavam marejados de lagrimas – eu precisava daquele emprego, estava me sentindo bem com ele.
Eu não sabia o que dizer, não sabia o que falar, apenas concordava, e dizia coisas como “sei”, “tô ligado”, “hum”. Ele continuava a falar:
- O principal motivo para eu trabalhar ali era que eu tenho uma divida Pedro, uma divida com um cara que vende maconha.
- Nossa! Exclamei.
- Eu tinha feito a divida já esperando o salário do emprego, recebi uma micharia, não vai dar para pagar.
- Caralho! Eu não sabia o que falar, eram muitos problemas ao meu redor, eram muitos problemas aparecendo de uma vez só.
Eu estava no banco oposto ao dele, me levantei e sentei ao seu lado. O abracei. Ficamos ali abraçados, ele já chorava, e eu também. Ficamos ali por um tempo que eu não sei contabilizar. Era muito bom sentir o cheiro do Gabriel, era muito bom sentir o corpo do Gabriel, afanar seus cabelos curtos... Eu nunca pensei que aquilo fosse tão bom.
Continua...