Descemos para o segundo andar do prédio, onde ficamos entrando e saindo de corredores até chegar à sala do professor de história.
Entramos na sala e se já não estivesse muito impactado minha boca teria se aberto novamente em um “O”. :D. A sala era gigantesca, as cadeiras eram dispostas em fileiras, como manda a tradição. Havia um quadro branco na frente, tinham também alguns armários, umas estantes com livros e um esqueleto de dinossauro que devia ter, no mínimo, três metros e meio. Sentamos no meio da turma, no fundo estava o Guto, ao lado dele um lado que ele aparentemente havia reservado para o Jean, que ainda não havia entrado. Nylo e eu ficamos jogando papo fora. Depois de um tempo, o professor chegou. Era jovem, devia ter no máximo uns 35 anos e era charmoso. Uns olhos claros que matavam você!
- Bom dia turma.
- Bom dia, Brian – Entoou a turma em coro, monotonamente. Como eu não sabia o nome dele apenas respondi um pouco baixo – Bom dia!
- Então, ano novo... Novos horizontes... Novas metas... Novas esperanças... Novos conhecimentos – Falava o professor enquanto retirava de um dos armários um controle. Após pressionar um dos botões um telão gigantesco desceu do teto e ocupou todo o lugar da lousa. – Bem, parece que temos algumas carinhas novas aqui esse ano, não? – Falou me fitando – Bem, meu jovem, espero que você possa aprender conosco e que essas aulas te seja proveitosas – Fiquei vermelho e apenas acenei discretamente.
Nessa hora a porta da sala se abriu e Jean estagnou na porta. Ele e o Brian se olharam então o Brian falou:
- Oras, antes tarde do que nunca ehm? Jean? Entre, tenho certeza que temos um lugar para você na nossa humilde sala. – Jean entrou de cabeça baixa e foi direto pro fundo onde se sentou na cadeira que para ele, fora reservada.
- Vamos começar esse ano estudando mais a fundo a Pré-história. Ele passou uma hora e meia apenas explicando coisas e mostrando gravuras, mapas e outras coisas na tela. Foi uma aula muito interessante. A turma inteira prestava atenção, o que demonstrava que o professor era realmente muito bom. Parecia que eu bebia cada palavra que saia da boca do cara, Nylo rivalizava comigo. Como eu amo coisas interessantes e aquela aula tava perfeita..... Tipo juntou o banquete com a fome... :D. Era tanta coisa interessante que ele falava que eu até desisti de fazer anotações. Pois sempre que eu tentava escrever o que ele falava, ele já falava outra coisa e eu não entendia bem. :D.
E assim passou meu dia, indo de sala em sala e tendo uma aula mais impressionante que a outra. Se antes, já tinha bastante assunto pra discutir com o Nylo, agora então nem se fala... Não parávamos de discutir coisas referentes às aulas. Verdadeiro papo de nerd! :D. Mas eu adorava, tá bom?
À tardinha, eu já conhecia mais ou menos a escola. Depois da última aula, andei um pouco pelo pátio a esmo. Estava absorto nos meus pensamentos imaginando como deveria estar o Vitinho e a minha mãe. Certamente a Rejane devia estar fazendo da vida deles, sobretudo do meu irmão, um caos. Minha única esperança era a educação. Eu deveria estudar muito para conseguir algo da vida e tirar meu irmão desse aperto. Havia chegado numa área isolada, próximo dali vi uma linda fonte de água feita de marfim. Sentei na borda, enquanto água jorrava da boca de dois lindos anjinhos que entrecruzavam os braços dançando um eternizado balé. Peguei meu celular e tentei, em vão, fazer uma chamada, mas era impossível, pois nem meu irmão e nem eu tínhamos saldo ou créditos promocionais. Vi uma foto do meu irmão, da minha mãe e do meu avô no meu celular, uma foto já bem antiga de um almoço que fizemos num domingo lá na minha casa, no nordeste. Nessa foto, minha mãe brigava com o Vitinho porque ele estava fazendo umas traquinagens enquanto eu e meu avô ríamos da situação. Quanta coisa aconteceu.... Quanta coisa mudou... Sem querer, uma lágrima caiu dos meus olhos.
- O que você faz aqui sozinho? – Uma voz perguntou.
Fiquei com medo e instintivamente tentei limpar minhas lágrimas. O que só piorou a situação porque agora o Jean sabia que eu estava chorando. Se eu tivesse pensado rápido saberia que ao crepúsculo, com pouca luz, não dá para ver a distância que uma pessoa está a chorar.
- Por que você estava chorando? – Ele perguntou invasivamente.
- Não te interessa, Jean, por que quer saber dos meus problemas? – Me permiti ser bem grosso.
- Também não precisa me tratar com tanta hostilidade, não precisamos ser inimigos.
- Acontece, que você é o cachorrinho de balaio de uma pessoa extremamente intragável. E pior, de uma pessoa extremamente intragável e que me odeia.
- Eu não sou o cachorrinho de balaio de ninguém – Ele falou irritado – Guto é meu amigo.
- Ahh – Eu ri debochado – Realmente o Guto tem uma forma muito carinhosa de tratar os amigos, percebi isso lá no banheiro.
- Ele estava irritado – Ele falou carrancudo – E além do mais, só brigamos porque eu o impedi de te dar uma senhora surra.
- É mesmo? – Suavizei – Bem... Obrigado então. Sabe, a primeira vez que te vi pensei que você era um cara bacana. Sinceramente, ainda penso assim... Mas é como diz o ditado, diga-me com quem andas e direi quem tu és. Você não precisa ser aceito por pessoas como o Guto. Que não sabem valorizar sua amizade. Pessoas como ele têm expectativas e vivem cheios de uma vida completamente vazia. Sem sentido de existir. Daí o motivo de tentarem viver sempre no limite. É melhor, você tomar cuidado ou vai acabar enveredando pelo mesmo caminho.
- E você, o que é? Psicólogo por acaso? – Ele falou de uma forma meio debochada.
- Não, não sou psicólogo. Só não sou cego e não tenho dificuldade alguma em enxergar o que está absurdamente óbvio.
- Olha, você vai me contar porque estava chorando ou não? – Ele cortou.
- Claro que não vou – Falei.
- O que te aconteceu? – Ele falou num tom muito calmo e suave que me desarmou.
- Olhei no fundo daqueles olhos muito azuis e disse com os olhos vacilantes – Só me deixa em paz, tá bom? Não quero problemas com você e nem com seu amigo Guto. Sabe, Jean, ao contrário de você eu nunca tive nada fácil. Tudo o que eu conquistei na vida, e não foi muito, foi fruto de muito esforço. Nem todos têm empregados servindo café da manhã na cama quando acordam... Sou pobre mesmo e me orgulho disso, sabe por quê? Por que a vida me mostrou o quanto é honroso e o quanto é digna a pessoa que consegue subir sem nenhum tipo de ajuda, benefício ou alguém pra ‘facilitar a vida’. Eu já sabia que seria discriminado por ser pobre aqui... Mas quer saber? – Ele só ouvia – Vocês me discriminam por minha classe social e eu discrimino vocês por serem cabeças de vento sem N-A-D-A a oferecer, nada a dizer, nada que valha a pena parar para ouvir. São só filhinhos-de-papai que tiveram a sorte de pegar carona em cima daquilo que já foi conquistado pelos outros.
Saí dali a largos passos antes que ele pudesse me dizer qualquer outra coisa e comecei a subir os lances de escadas para chegar ao meu dormitório. Onde planejava passar um bom tempo estudando, revisando conteúdos, refazendo anotações e me divertindo muito (Nerd, eu sei. :D). Mas tem gente que ficava feliz jogando videogame, ou futebol ou lendo uma revista de fofocas. Eu ficava feliz estudandoNós compomos uma sociedade heterogênea, e cá entre nós, isso é fascinante!