Ele obedeceu e partiu. Ao chegar em casa, mal falou com sua mãe e foi direto para o quarto. Se jogou debaixo do chuveiro, e por alguns momentos, ele começou a rir. Tinha que confessar para si próprio, que o Fábio era um homem atraente e que despertava seus desejos mais íntimos. – Ai Davi, o que você vai fazer?
**************
- Eu esqueci completamente do coral. E o pior é que eu só tenho uma semana pra ensaiar. – Dizia o Davi se sentando no chão do quarto e de frente para o amigo.
- E a excursão do colégio? Você vai né?
- Por incrível que pareça, o meu pai deixou.
- Jura! – Rafa deu um abraço espalhafatoso no amigo. Vamos nos divertir horrores. Vamos aprontar todas!
- Pode ir parando. Você sabe que este comportamento não combina comigo.
- Dessa de ser chato, Davi! Eu também sou da igreja e nem por isso deixo de viver. Ter fé não significa martírio. Todos nós somos pecadores. Quer saber? Eu espero que desta vez você não perca a oportunidade de dar o seu primeiro beijo.
Davi tossiu, lembrando o beijo esquisito que o Fábio lhe roubou.
- O que foi? – perguntou o Rafa desconfiado.
- Nada. Eu só fiquei assustado com esse teu jeito maluco.
- Eu queria pegar o Felipe do 2° ano. Nossa, ele é uma delicia.
- Você age como se fosse uma periguete.
Os dois riram.
- É como se fosse, só que na versão masculina. Eu já percebi como o Diego olha pra você. Todos desconfiam que ele curte sair com rapazes.
- Você vê coisa onde não existe. É melhor mudarmos de assunto.
- E os seus pais vão mesmo viajar? – perguntou o Rafa.
- Sim. Neste final de semana.
- Cara, você vai ficar quatro dias sozinho? Eu nem acredito!
- Até parece. Você acha mesmo que o meu pai ia dar esse mole? Óbvio que ele já falou com a tia Flávia pra ficar aqui no período que eles tiverem fora.
- Mas a tua tia é a mesma coisa que nada. Ela nem fica pegando no pé.
- A tia Flávia é doidona. Mas ela é espeta, e se eu vacilar, ela abre o jogo com o meu pai. Apesar de que eu não vou aprontar nada mesmo.
- Daqui até lá eu penso em algo pra gente fazer. Bom, deixa eu ir, porque eu fiquei de sair com a minha mãe. – Rafael se despediu dele.
- Eu te levo até o portão. – Davi o acompanhou e se despediram novamente. Ao virar para entrar viu o Fábio aparecer da janela do prédio ao lado. O outro por sua vez, o provocou, lhe mandando um beijinho.
- Idiota! –Davi bufou e entrou porta adentro.
FIM DE SEMANA...
- Ai pai, eu já disse que vou obedecer à tia Flávia. Poxa, eu não sou mais um bebê!
- De olho nele hein Flávia. E o que precisar é só ligar.
- Pode deixar meu irmão. Agora vão de uma vez, senão vocês vão perder o voo.
- Beijo filho. Se cuida. – A mãe dele o beijou em sua testa.
- Vai com Deus mãe. Tchau pai. Boa viagem para os dois.
Eles se abraçaram mais uma vez e enfim o Davi pôde ficar sozinho, quer dizer, quase sozinho. Aquele seria quatro dias de longa reflexão; sem nenhum tipo de cobrança e pressão imposta por seus pais. Iria aproveitar para dar pontos às frases incompletas que existia em sua vida. Desde pequeno, foi muito regrado... Quase um regime militar, pra ser mais exato. Mas não porque seus pais eram ruins, e sim, pelo simples fato de serem religiosos fervorosos e acreditarem mais no que as pessoas dizem, do que na própria razão dos fatos. Davi cresceu e junto com ele o seu desejo por outro homem também. Por mais que quisesse, não poderia arrancar de seu coração, esta orientação sexual, que como o próprio nome já sugere não se trata de escolhas certas ou erradas, e sim, o fato de ter nascido desse jeito. Um jeito que o faz ser igual a todos os outros, mas que muitos ignorantes preferem não enxergar.
O Fábio surgiu do nada na vida dele, e em poucos dias, já foi o suficiente para mexer com sua estrutura emocional e física. Chegou a ter um sonho com outro, depois do primeiro encontro de ambos. Ele não podia ir muito longe uma vez que o Fábio jamais seria aceito por ninguém de sua família, por dois motivos: ser homem, e ter um jeito largado, com muitas tatuagens espalhadas pelo corpo.
- Davi. Davi.
- Hã? Oi tia, desculpa! Eu estava pensando alto.
- Tô vendo. Ficou tão distraído. –ela franziu a testa.
- Desculpa tia.
- Eu pensei aqui comigo... Será que o meu sobrinho lindo não faria um enorme favor de ir à padaria comprar sonhos para nós? Eu estou com tanta vontade. – ela fez uma cara de súplica, que o fez rir.
- Claro tia. Seu desejo é uma ordem. Mas só se me deixar ir à casa do Rafa depois, e...
- E... O quê? Lá vem você. Quando faz esta cara...
- Na verdade tia, eu queria dormir na casa dele. Meu pai nunca deixou eu dormir na casa de um amigo.
- Ah, é isso? Claro que pode meu querido. Mas agora, vá comprar os meus sonhos, porque estou quase morrendo de tanto desejo.
- A senhora é dez! – ele saiu para rua com tanta alegria.
*************
- Moço, me vê cinco sonhos, por favor!
- Eu posso ser o sexto? – o Fábio surgiu atrás dele. Parecia que ele sentia o faro do Davi.
- O que você está fazendo aqui? Vai ficar me perseguindo agora?
- Vim fazer a mesma coisa que você; comprar alguma coisa.
O balconista entregou o pedido do Davi e ele se virou para ir embora.
- Obrigado.
- Espera!
- Ué! Você não disse que ia comprar alguma coisa?
- É... Não tem o que eu quero. Vamos? Vou andando junto com você.
- Você está louco? Meu pai pode ver a gente! E eu não quero a sua companhia.
- Seu pai viajou que eu sei. Agora, querer minha presença perto de você, eu sei que você quer. Eu consigo mexer com você. Vem pra minha casa, eu to sozinho.
- Cara, quantas vezes eu vou ter de repetir que eu não sou o que você está pensando? Se quer um garoto de programa, vai caçar em outro lugar.
- Eu não quero isso, na verdade, eu quero um amor!
O jeito como ele falou, deixou o Davi sem reação. Quando eles passaram por um lugar da rua mais deserto, o Fábio pediu mais uma vez ao Davi.
- Me perdoa por ontem. Vamos lá em casa. Me deixa eu te mostrar que não sou nenhum estrupador.
Ele ficou pensando na proposta e não deu outra: caiu em tentação.
- ok. Eu vou. Me deixa só entregar isto aqui a minha tia.Me espera na esquina que eu já desço.
Ele entrou rapidamente dentro de casa, e entregou o pacote para a tia, que estava no sofá. Foi até o quarto, preparou rápido sua mochila e retocou seu perfume.
- Ei! Não vai ao menos comer um?
- Não tia. Eu to com pressa. Amanhã eu to de volta.
- Cuidado na casa desse tal amigo, hein! – ela gritou mais era tarde.
********
- Você demorou. Humm... Vai dormir lá em casa?
- Claro que não. Eu estou indo para casa de um amigo, por isso preciso ser breve.
Como o Fábio morava ao lado do Davi, ele tomou o máximo de cuidado, para que ninguém da rua o visse entrando no prédio do Fábio.
- Você bebe alguma coisa?
- Só uma água. Davi percorria os olhos pela casa. Nossa, era linda! Desde a mobília, até a decoração das paredes.
- Aqui está a sua água. Posso te fazer uma pergunta?
- Depende. – ele respondeu seco.
- Você é sempre assim, tímido?
- É o meu jeito.
- Eu sei. E vou te confessar uma coisa, eu amo teu jeitinho meigo e delicado. Dá vontade de e abraçar e te fazer carinho.
- Vai começar com esse papo de novo? – Davi mostrou impaciência.
- Eu preciso te dizer Davi. Eu estou apaixonado por você. Eu quero você para mim.
Fábio se aproximou dele, na beira do sofá, e o beijou pela segunda vez. E desta vez, o Davi abriu a boca, permitindo que a língua quente do outro invadisse o céu de sua boca.
CONTINUA...