Capítulo 40
Segunda feira a noite... e eu estava um bagaço só.
Tínhamos passado o fim de semana inteiro na mudança, e como dava trabalho, cacete!
Apesar de parecer pouca coisa, várias viagens foram necessárias prá colocar tudo dentro do meu "apertamento". E preferimos não recorrer a pessoas de fora, então fizemos tudo devagar e acabamos no Domingo a noite.
Eu tinha trabalhado prá caramba e já estava em casa. Estava ansioso em vê-lo chegar ao nosso ninho. Graças à Deus e à maneira que decidimos encarar o acontecido com a garota, a retomada vinha sendo bem mais tranquila que pensei que pudesse ser...
Claro que em alguns momentos ainda lembrava. Em outros o silêncio era constrangedor. Ele sempre dava um jeito de quebrar partindo prá sacanagem, ou pro carinho. E no final de semana em si, aí nem tivemos tempo de lembrar de nada.... Correria total.
Estava acabando de ajeitar algumas coisas no armário quando o ouvi abrindo a porta. Sorri de leve e ali fiquei. Veio o barulho de suas coisas sendo deixadas no sofá, e passos leves entrando.
- Bruno?
- Aqui no quarto Dani...
- Oi meu lindo...
- Bem vindo ao nosso canto.
- Ah, que sonho... Como foi seu dia?
- Cara, tô podre, só o pó... Mas muito feliz.
- Eu também. Muuuuito feliz.
Ele me abraçou por trás e beijava meu pescoço, me apertando contra seu corpo.
- Calma moleque... Temos todo o tempo do mundo agora.
- Eu sei. Mas todo o tempo do mundo é pouco. Temos que aproveitar tudinho. Cada segundo.
- Olha... poeta agora. Vamos jantar?
- Vamos.
Jantamos numa boa curtindo muito aquele momento.
- E você Dani, muito trampo?
Diante de tudo que acontecera, eu não tinha me inteirado de suas primeiras semanas no banco. Sabia que estava tudo bem, mas sem detalhes.
- Ah, tá legal. Claro que é muito mais puxado que a guarita, mas é muito melhor.
- E a galera?
- São legais. Mas como te falei, a gente mal tem tempo de se conhecer, trocar ideia. Cada dia um pouquinho... Tô focado em fazer tudo direito.
- Tá certo.
- Mas tô cansado velho. Tudo junto, ao mesmo tempo. Foda.
- Cara, sabe o que eu acho?
- Fala...
- Diante de tudo que a gente passou, a gente merece se dar um presente...
- É ? Oba...
- Vem mais um feriado aí. Vamos viajar?
- Ah, Bruno... Adoraria cara. Mas tô duro. Tinha muito pouco tempo na empresa, o que eu peguei de acerto já foi nas coisinhas aqui... E salário, só mês que vem
- Meu presente.
- Bruno...
- Psiu.
Ele fez aquilo. Daquele jeito. Parou tudo, assumiu aquele ar sério e responsável.
- Bruno, me fala uma coisa...
- Diz.
- Tu não tem receio de eu estar te explorando...?
Eu estava aprendendo com ele. Retribuí na mesma altura.
- Dani, você alguma vez já me explorou?
- Não.
- Por que estaria me explorando agora?
- Não disse que estou. Te perguntei se não tem medo disso.
- Não, não tenho.
- nenhum ?
- Nenhum.
- Por que?
- Ah, Dani....! Sei lá. Porque não. Sigo minha intuição, meu coração, sei lá... eles dizem que não tenho que temer isso. Isso não.
- O que então ?
- Ei... Você não acha que esse papo tá ficando sério demais prá nossa primeira noite morando juntos ?
Tive que concordar. Rimos juntos e prometi continuar depois.
- Mas e aí, vamos viajar?
- Você quer aventura ?
- Hummm... seria bom. Juntinhos.
- Onde ? Rio de novo...?
-Não. Quero que venha comigo prá Salvador.
- Uau. Porque lá?
- Porque sim. Tenho minhas razões.
Ele deu uma piscada sacana, se levantou e gingou como um Baiano. Se remexeu num ritmo sensual e safado. E me puxou pro quarto.
Dois anos antes eu tinha feito uma viagem a trabalho à Salvador. Fiquei na terra da magia por uma semana, sozinho, hospedado em um grande hotel no Rio Vermelho, bairro boêmio da capital da Bahia.
Me lembro que fiquei encantado com a vista do hotel, pendurado em rochedos debruçados no mar. Todos os quartos com sacadas e varandas com vista para aquele mar de cor indefinida. Todo o recorte do litoral soteropolitano se descortinando até o Farol da Barra mais ao longe. Adorei minha estadia lá. E prometi a mim mesmo que um dia voltaria acompanhado, para curtir aquela vista, aquela varanda, aquele barulho das ondas se arrebentando nas pedras.
Desde que fomos ao Rio e vivemos tudo aquilo, prometi a mim mesmo que iria lá com Daniel. Veio a turbulência, e agora eu achava que merecíamos um pouco de descanso, de tempo juntos e de lenha no nosso lance. Lenha entre nós, e não intrusos.
Planejamos a viagem e passamos a semana já em ritmo de folga. Ele estava ansioso, seria sua primeira vez em Salvador.
- Bruno... Vamos fazer nossa listinha de lugares prá visitar?
- Ihhhh Dani, acho melhor não cara. Serão só três dias e se te conheço bem, você vai querer aproveitar com outras coisas...
- Olha isso! Quem diria heim...
- Tô brincando. Onde você quer ir?
- Pelo menos no Pelourinho e em Itapoã.
- Hehehehe. Como você é básico! Salvador tem muito mais...
- Eu sei, deve ter mesmo. Mas tu tá me podando.
- Tô não bobo. A cidade é grande, você vai ver. Mas a gente se ajeita e vai desbravar alguns cantos legais...
- Oba. Vamos provar o tempero Baiano!!!
- E se não.
Percebi em seu olhar que eu tinha despertado de novo nele aquela tara adormecida. Ele estava em devaneio, e sabia que já bolava altas aventuras.
E eu estava gostando daquilo.
E já nem me surpreendia mais.
Era Sexta Feira, hora do almoço.
Eu já estava muito mais prá lá do que prá cá. Ritmo a zero, louco prá viajar, descansar e sumir. Não só os acontecimentos da semana anterior tinham me consumido, mas o trampo também estava pesado.
Estava almoçando com Marcos. Ele tinha me dado a maior força no lance com a Ana e tinha comemorado pacas o desenrolar da coisa. Eu me sentia no dever de compartilhar com ele meu momento de felicidade agora.
- Poxa cara, quando eu voltar quero que vá jantar um dia com a gente lá em casa.
- Demorou velho, é só marcar. O Daniel não vai ficar com ciúmes?
- Que isso cara... Nem tem. Ele sabe que você me deu a maior força, e ele não é ciumento não. E sabe que você não curte da fruta...
- Então tá. Me chama e vou sim. Mas e a Ana, nada ?
- Nem sinal de fumaça velho... às vezes isso me dá medo, tá muito quietinha. Foi mais fácil que eu imaginava. Eu, na verdade, não tive que fazer nada, você notou?
- Ah Bruno, não foi bem assim. Você foi estrategista cara. Não cair na dela no primeiro momento, quando ela inventou aqueles lances sobre ele e dar o bote final quando ele te contou, mandando que ele se decidisse... eu diria que você fez sim. Bastante.
- É. Mas tudo foi em reação aos atos dela. Ela se ferrou sozinha...
- Mais ou menos. E você contou pro Dani do que ela inventou e falou dele ?
- Então velho. Não contei ainda. Fico pensando se deveria, agora que ela se foi... O que acha?
- Acho que você deve contar, mas não agora. Não de forma que possa soar vingança ou ainda mágoa. Deixa passar. Deixa a coisa voltar ao normal... Ai conta sim. Ele precisa saber dela...
- É. Acho que sim...
- Você quer que eu os deixe em Congonhas ?
- Relaxa cara, precisa não. Vamos de táxi.
- Já sabe, se precisar...
- Valeu grande.
Voltamos ao trampo e o dia passou.
Era hora de voar prá Salvador!!!