Acordei no meio da noite com o barulho da porta batendo, não dei muita atenção, Eduardo estava dormindo sobre meu peito como se estivesse abraçando uma pelúcia, não tive coragem de mover um único músculo, dormi após algum tempo. A claridade começou a me incomodar, já estava tarde, Eduardo não estava mais ao meu lado deixando apenas o seu cheiro na cama, levantei, caminhei até a sala, Adeline estava de roupão e óculos escuros com uma caneca na mão, provavelmente de café.
Adeline- Bom dia Daniel.
Eu- Bom dia.
Adeline- Espero não ter te acordado quando cheguei no meio da noite.
Apenas sinalizei um não com a cabeça, e comecei a procurar o Eduardo.
Adeline- Ele está lá fora. – com um sorriso e apontando para a porta.
Andei lentamente até a porta, lá estava, sentado olhando o céu, o mundo poderia acabar naquele momento que ele não ligaria. Passei a mão sobre seus ombros, lhe dei um beijo no rosto.
Eduardo- Bom dia. – me olhando nos olhos.
Eu- Bom dia. Algo te incomoda?
Eduardo- Precisamos conversar. – mudando o ambiente de doce para sério.
Eu- O que foi?
Eduardo- Meu pai está vindo para São Paulo amanhã.
Eu- Isso é uma notícia ruim?
Eduardo- Ainda não te contei. – olhando para o chão – Meus pais estão se separando.
Fiquei espantado e sem reação.
Eduardo- É melhor começar do começo. Há cinco meses atrás ele descobriu que eu sou gay, ficou furioso, mal conseguia ficar no mesmo cômodo comigo. Me mandou para um internato no interior da França, fiquei lá por volta de um mês, até minha mãe voltar de viagem. Quando ela foi me buscar eu presumi que a briga foi bem grande, pois ela só falava de se mudar, ela decidiu voltar para o Brasil e pedir o divórcio. Desde então ela me mantém afastado do meu pai, ele não é muito compreensivo, e tem um pavio muito curto. Amanhã eles iram decidir como será o divorcio.
Eu- Nossa, eu não tinha nem ideia disso, você nunca me falou dele. – disse colocando a mão sobre a dele.
Eduardo- Enquanto ele estiver aqui não posso estar envolvido com você. – seus olhos estavam vermelhos- não posso deixar nada acontecer com você.
Eu- Não precisa disso, eu sei me defender Eduardo.
Eduardo- Você não o conhece, não tem noção do que ele pode fazer. Já o vi acabar com famílias por muito menos. Por favor, tente entender, apenas enquanto ele estiver aqui.
Nesse momento Adeline sai pela porta.
Adeline- Daniel, dessa vez eu irei ficar do lado do Eduardo, é melhor vocês se afastarem até os papéis estarem assinados. Louis vem de uma família antiga da França, ele é bem tradicional, se ele souber que seu filho está namorando um menino não irá acabar bem, principalmente pra você Daniel.
Eu- Entendo.
Adeline- Como vocês estão conseguindo ficar nessa claridade toda. - mudando o clima da conversa.
Eduardo- Você foi a única que bebeu ontem mãe. – disse ele rindo da cara dela.
Acabei entrando no clima, Adeline conseguia transformar as situações de uma maneira mágica. Ela entrou, Eduardo levantou, segurou a minha mão.
Eduardo- É por pouco tempo. Eu ainda vou continuar sendo seu namorado.
Eu- É bom mesmo.
Entramos e fomos para a cozinha, ele estava me esperando para tomar seu café. Estava chegando a hora de voltar para casa, o caminho de volta foi um tanto melancólico, o clima estava tenso, Adeline calada, Eduardo segurando a minha mão, um silencio mortal pairava dentro do carro. Eduardo e Adeline desceram ao chegar na porta, entraram cumprimentaram minha mãe e logo saíram pela porta.
Eduardo- Te vejo na escola.
Eu- Até mais.
Aquilo pareceu uma despedida, me senti destruído por dentro, mas não podia fazer nada, até mesmo Adeline uma das pessoas mais alegre que eu já conheci estava intimidada com a chegada do ex-marido. Tomei um banho, coloquei apenas um short e deitei na cama, estava depressivo, os meus pensamentos ainda não tinham assimilado direito tudo aquilo sobre o pai, sobre não aceitar, tradição, não conseguia entender como alguém troca seu filho por esse tipo de pensamento. Acabei dormindo e acordando atrasado. Como iria agir na escola, ainda mais com ele sentando na minha frente. Me arrumei correndo, sai sem comer nada, e fui o mais rápido para não perder o primeiro horário.
Ao entrar pela porta da sala me deparo com ele sentado, chegado mais cedo que o normal, não era um bom sinal, podia sentir que não estava bem. Quando passei por ele, senti sua mão passando pela minha, me sentei e comecei a conversar com o Rafael que já estava na sala. Contei sobre o final de semana, ele me contou sobre o dele. As aulas começaram, normais, como um dia qualquer, no intervalo Rafael me carregou para o refeitório, passado o resto do dia, reparei que o meu dia voltou a ser normal, cheguei a imaginar que tinha sido um sonho todos aqueles acontecimentos, até o ver sorrindo de longe em minha direção.
Terça feira começou do mesmo jeito, até a hora do intervalo, estávamos eu Rafael e Raquel conversando, quando se escuta uma confusa no pátio da entrada. Normalmente não nós interessamos por isso, até escutar o nome do Eduardo, não pensei duas vezes e fui ver o que estava acontecendo. Tive dificuldades para conseguir chegar pois metade do colégio estava bloqueando o caminho, dei uma boa olhada, Eduardo com a cabeça abaixa com a bochecha roxa, na sua frente um homem de terno, magro, com barba por fazer, gritando com ele, não entendi muito pois era em francês, infelizmente a maioria da colégio sabia francês e logo começou a correr no meio da multidão. Aquele era seu pai, estava na escola pois descobriu que seu filho estava namorando um menino , seu único propósito era descobrir quem era e humilhar o Eduardo. Não podia ficar vendo aquilo, quando começo a ir em direção aos dois o Rafael segura meu braço.
Rafael- Não se envolva nisso.
Eu- Não posso deixar ele passar por isso sozinho, ainda mais para me proteger Rafael.
Rafael- Olhe pra ele.
Eduardo estava me olhando e balançando a cabeça de maneira sutil.
Rafael- Daniel, eu juro que eu te entendo, mas você acha que ele não estaria passando por isso se não fosse necessário. Vamos sair daqui, você ficar vendo isso só vai ser pior, ele aguenta. – me puxando pelo braço até a sala.
Rafael- Ele me avisou que algo assim poderia acontecer, e me pediu para não deixar você se meter. E eu sei bem o motivo.
Eu- Qual é esse motivo. – disse em um tom bem grosso.
Rafael- Meu pai conhece a família dele, na verdade ele está cuidando do divorcio dos pais do Eduardo. - disse sentando do meu lado- Quando disse para o meu pai que eu tinha encontrado uns amigos dele naquele dia na casa do Eduardo, ele acabou deixando escapar sobre os dois e o divorcio. Na segunda depois da aula que o Eduardo me avisou sobre seu pai, tive que perguntar ao meu se ele conhecia o pai do Eduardo, meu pai apenas me disse que não era uma pessoa boa para se meter e que até mesmo ele tinha medo de se meter com a família por parte do pai de Eduardo.
Senti medo quando escutei isso, conhecia o pai do Rafael e sabia do que ele era capaz, sendo um dos melhores advogados da cidade, mas até mesmo ele tinha medo daquele homem, o que seria de mim.
Raquel entrou na sala correndo.
Raquel- Estava te procurando, vocês já sabem o que está acontecendo?
Rafael- Podia demonstrar um pouco menos de animo.
Raquel- Está à maior confusão lá, a mãe do Eduardo apareceu, os dois discutiram, o pai dele quer levar ele de volta para a França, e saíram com o Eduardo. – procurando um lugar para sentar- A escola inteira já sabe que ele é gay e estão procurando saber quem é o namorado misterioso.
Rafael- Não se preocupe, meu pai da conta da conta do serviço. -olhando pra mim.
Eu- Espero que ele esteja bem. -disse suspirando de aflição.
Todos começaram a entrar na sala, o assunto do momento era a confusão, algumas meninas com cara de depressivas por descobrirem que ele era gay, enquanto o professor não entrou na sala a conversa não cessou.
Rafael- Presta atenção na aula, assim você ocupa a mente.
Eu- Vou tentar.
Mas a verdade e que eu não conseguia nem se eu quisesse, estava muito preocupado com o Eduardo, me senti um inútil, não podia fazer nada, apenas ficar olhando esperando, mesmo sabendo que eu não tinha culpa ainda sentia um peso na consciência, minhas perguntas pararam apenas quando o professor me perguntou se estava bem, Raquel colocou a mão sobre a minha testa, acenou apenas um não.
Rafael- Eu levo ele para a enfermaria, professor.
Rafael me ajudou a chegar à enfermaria, estava com febre, literalmente estava doente de tanta preocupação.
Rafael- Se acalma um pouco Daniel, não adianta nada morrer agora. – disse rindo da minha cara.
Eu- Eu sei, eu sei. – também rindo.
Passei o resto do dia lá, ao final da aula Raquel me deixou em casa, passei o dia deitado sem comer nada, não tinha estômago nem mente para mais nada a não ser me preocupar com o Eduardo. Decidi ligar pra ele.
Eduardo- Alô.
Eu- Como você está?
Eduardo- Estou bem, mas é você que me preocupa, fiquei sabendo que você estava passando mal.
Eu- Ele realmente te bateu?
Eduardo- Daniel não se preocupe comigo, já estou acostumado com ele, já passei por momentos piores do que aquele, sei do que ele é capaz do que ele pode fazer para conseguir o que quer.
Eu- Pensei que você não iria atender.
Eduardo- Não iria mesmo não, mas fiquei preocupado com você, queria saber como você estava e também ouvir sua voz. Essa semana está sendo muito difícil te ver e não poder fazer nada.
Eu- Concordo, está difícil ficar longe de você, me senti a pior pessoa do mundo por não fazer nada hoje.
Eduardo- Estou orgulhoso de você Daniel, você acreditou em mim e não se envolveu.
Eu- Isso foi apenas por causa do Rafael, ele não me deixou chegar perto, quase me amarou na sala.
Eduardo- Você tem um bom amigo, mas mesmo assim ainda estou orgulhoso de você. Preciso desligar agora amanhã a gente conversa. Beijos.
Não deu tempo de falar mais nada, ele já havia desligado. Fiquei contente por ouvir a voz dele, e principalmente por ver como aquilo não afetou em nada na nossa relação, ele era muito mais forte do que havia imaginado. Senti fome, era um sinal que estava voltando ao normal, comi algo fiquei com minha mãe na sala vendo TV, nada mais confortante que passar o tempo com mãe, em torno das dez horas fui dormir.