Conversar com o Pedro via Facebook, por sem dúvidas, tornava-se um prazer que somente ia crescendo a cada palavra trocada entre nós dois. Quando ele disse que gostaria de me conhecer melhor, não nego que um largo sorriso de contentamento formou-se em meu rosto. Se por um lado ele demonstrava ser um completo babaca na faculdade, resvalando em uma chufa de comentários e ações que transmitiam asco e sordidez, pelo chat ele se transmutava num cara sensível e bom de papo.
Certo, isso é, no mínimo, estranho. Já vou logo dizendo que o Pedro nunca nutriu uma dupla personalidade, mas apenas por analisar seus ataques de heterossexual e manias indecorosas já seria o suficiente para eu me afastar. Sou direto, às vezes rígido e impassível. Seleciono quem eu acho digno, que ao menos partilhe afinidades em comum, para entrar no meu seleto círculo de amizades. Porque o embasamento para uma duradoura amizade é, certamente, as afinidades em comum. Mas o Pedro alquebrou esse meu pensamento de maneira rápida e eficaz. Primeiro ele surgiu com um convite de amizades, depois nossas conversas foram se desenrolando e não demorou para que ele começasse a revelar mais de sua vida. Mantive sempre um pé atrás em tudo o que vinha de sua boca, e, aos poucos, fui descobrindo que temos gostos semelhantes.
Músicas em comum... ok. Mesmos hobbies e ser mais caseiro... ok. Gostar de animais mais do que do ser humano... ok. Gosto por manifestações culturais artísticas... ok. Gostar de viajar e querer conhecer o mundo (menos Paris, porque esse doido a acha feia) ... ok. Filmes? Gostamos muito de terror, mas preferimos os clássicos (jamais assisto um filme por mero entretenimento. Analiso as atuações, sonoplastia, fotografia, roteiro e edição. Sou quase um jurado do Oscar)
Sobre a vida do Pedro ele me revelou que morava com os pais e irmãos. Eu acho engraçado um homem de 36 anos ainda morar com os pais, e mais engraçado ainda outros dois irmãos, na mesma faixa de idade, também viverem com os pais sob o mesmo teto. Ele se formou em gastronomia e, durante algum tempo, viveu na Nova Zelândia sendo chef de cozinha do restaurante de um hotel. Disse que nos primeiros meses trabalhou duro, sobretudo por causa do idioma que era um verdadeiro impasse. Contou-me que foi pegando fluência à medida que saía a noite e foi conhecendo melhor os caras de lá... (se é que vocês me entendem ^^).
Mas a saudade da família e a frieza dos habitantes daquele país fê-lo retornar ao Brasil. Aqui sua vida tornou-se uma verdadeira fossa. Não conseguiu trabalho na sua área e, por conseguinte para se sustentar, virou diretor de uma autoescola. Ficou com alguns caras, porém nunca mais rolou um namoro sério, o que ele me confessou que sentia muita falta. E à medida que eu o ia conhecendo, cada vez mais um fascínio anormal recaía sobre mim. Na faculdade ele era o mesmo Pedro indecente e corrompido por gargalhadas homéricas, todavia no Facebook e mais recentemente por telefone ele se manifestava afável e cortês.
Já rumando para o meu namoro, este não poderia estar melhor. O Matheus tornava-se cada vez mais amoroso, carinhoso e companheiro. Sinceramente? É, não sei se o mereço. O Matheus é um cara que trabalha desde novo para, além de ajudar os pais, sustentar pequenos luxos que nunca pôde ter na sua infância. E isso voltejava sobre mim, uma vez que ele sempre me surpreendia com presentes e mimos. Contudo no âmbito lojas de roupas ele evita o máximo me levar! Ele sempre diz que, se dependesse de mim, eu compraria a loja toda.
Por telefone brigávamos por coisas bobas, idiotas mesmo, por exemplo a vez em que eu queria dormir e ele conversar, ou da outra vez que eu elogiei um ator bonito e ele se converteu num poço de ignorância e grosseria. Ai, ai. Entretanto quando estamos juntos, seja nas ruas ou na cama de um motel, os anjos recitam poemas trovadorescos e os deuses do amor nos abençoam. Como ele sabe falar coisas bonitas... Como ele sabe me abraçar com ternura e calor. Caralho, como o filho da puta sabe me comer gostoso! Aqui vou ser direto e revelar que o pau dele tem 20 centímetros, grosso, com veias. Nas primeiras vezes que íamos ao motel era apenas para dormirmos juntos, porque eu nunca aguentava transar. Sério, tentávamos e tentávamos, usávamos um tubo cheio de lubrificante, mas a dor era tamanha e a preocupação dele em não me machucar acabava desfalecendo nossos planos de sexo. Graças a Deus isso não é mais assim!
Sobre o dito acima o Matheus adorava me provocar. Sempre que eu pedia para irmos a um motel, ele rebatia dizendo que eu não aguentava... que eu sou fresco e sensível... que sempre fica com pena de mim. E ele sempre ria para me subjugar ainda mais. Dizia que eu pagava maior onda de macho, falo grosso, que eu não tenho o mínimo de trejeito, porém na cama eu amarelava e virava uma fruta. Contudo como supracitado, graças a Deus isso mudou. No entanto o filho da mãe até hoje nunca me deixou comê-lo. Acreditam? Diz que é só ativo mesmo. Sempre reclama e blá, blá, blá. Tenho certeza que vai gritar horrores quando eu o pegar de jeito.
Sou assumido, mas foram poucas as vezes em que eu trouxe o Matheus na minha casa. Minha família me respeita, mas é com aquela condição: “eu te respeito se não fizer nada na minha frente”. Minha mãe gosta muito dele, de vez em quando conversam por telefone. Meu pai terminantemente o odeia e nutri as esperanças de eu namorar uma garota. Minhas irmãs conseguem ser mais chatas do que minha mãe no quesito ideais religiosos. De vez em quando eu encontro com uma delas comentando algumas coisas a respeito da abominação dos homossexuais, pecado imperdoável e que ainda vão me ver “exaltado sob a graça do Senhor”.
Já a família do Matheus não sabe a seu respeito, embora a cada dia que passe desconfie ainda mais. Seu pai, por execrável exemplo, vive brigando com ele justamente por virtude desse assunto, colocando-o contra a parede, fazendo perguntas e o provocando, indagando quando ele apresentaria uma namorada e coisas afins.
Ai, que patético.
Mas enfim, na faculdade eu cada vez me destacava. Mas uma eventualidade fez um dos professores que mais gostava da minha pessoa colocar-me na sua lista negra. Era uma aula sobre o classicismo/renascimento. Fiz apenas um comentário de que Shakespeare não era um autor do romantismo, uma vez que ele nasceu justamente quando o classicismo estava em vigor. Mas ele arrumou uma confusão! Ficou vermelho. Rebateu meu dito de imediato. Disse que eu estava ficando louco, como eu podia dizer que aquele grandíssimo autor que expõe demasiado sentimentalismo e ideais românticos podia ser classicista. Arrumou um maior fuzuê e umas garotas do sexto período interviram e olharam a data de nascimento e morte dele. E para evitar mais discussões, eu disse que ele foi classicista sim, porém a inspiração para os escritores da escola literária do romantismo.
Esse professor replicou, mas prosseguiu a aula. Já no final ele mostrou pelo projetor uma imagem que, ao explica-la, disse que era impressionista. Tal quadro é simplesmente do artista Munch, denominado “O Grito”. Gente, pelo amor de Deus, como um professor universitário pode ousar dizer algo assim? Eu tinha prometido a mim mesmo não mais fazer observações em sua aula por causa do seu ataque de fúria por virtude de Shakespeare, mas sem querer, algo de súbito mesmo, fez minha boca enorme dizer que ele era expressionista. Eu sei que eu estava certo, porque quando cheguei em casa fui conferir na internet e em um dos meus livros de história da arte. Claro que eu estava certo: já que aquelas cores quentes e aqueles traçados rijos jamais recairiam na arte impressionista. Resumidamente: como ele, um professor entendido do assunto, quase um poço de sapiência, poderia confundir expressionismo com impressionismo?
É pessoal, a resposta foi que ele disse que não iria tolerar minhas manifestações de rebeldia e, por fim, expulsou-me da sala. Simples assim. Vocês já podem até imaginar a cara que eu fiz. Foi uma cara de cu mesmo. Peguei meu material e saí como ele solicitou. Bateu-me uma vontade terrível de chorar, mas não fiz para sustentar minha dignidade. Que porra, eu estava certo e ele equivocado!
No pátio conversei com alguns conhecidos, mas não contei sobre o ocorrido. Ah, sei lá, logo, logo toda a faculdade iria ficar sabendo mesmo, então nem me dei ao trabalho de contar a minha versão. Mas a minha surpresa foi o Pedro aparecer com sua mochila e vir ao meu encontro.
– E aí, você está bem? – Ele perguntou. Sua voz é tão gostosa de ouvir. Ainda mais sabendo de sua preocupação para comigo.
– Ah, não muito. Você viu o que aconteceu.
– Você também devia ter ficado calado. Aluno não pode replicar professor não.
– O que eu podia fazer? Deixar ele falar merdas lá na frente? Mas é bom que eu aprenda mesmo a ficar calado. O que importa é que eu sei. Ele ensinando errado ou não nem ligo. Quem sai perdendo são vocês.
– Calma, Lipe.
– Estou calmo. E já disse pra não me chamar de Lipe!
O Pedro riu.
– Não, você não está calmo. E não se preocupe, pois sei que você estava certo. E também sei de um lugar que vai te animar.
– Que lugar? – Eu perguntei. – Não é boate não, né? Nem se dê o trabalho de me convidar.
– Você vai ver, apressado. Mas vamos ter que matar o segundo horário. Está disposto?
Naquele momento eu liguei o fodas e, na companhia do Pedro, retirei-me da faculdade e fomos ao tal lugar.
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Bom, cambada, tá aí mais uma parte. Devo demorar a postar a próxima, pois vou dar aulas particulares nas próximas semanas. Então é isso, comentem sobre o que acharam e vão estudar sobre o impressionismo e expressionismo pra deixar vocês moços e moças inteligentes e não cometer o erro do meu professor.