Capela cheia, pessoas chegando sem parar. Thiago se aproximou da urna funerária, colocada sobre cavaletes. Deu um abraço em dona Lucia a mãe da falecida, dizendo o de praxe: ¨-Meus pêsames¨.
Ainda fora do clima, tentou colocar sentimento, e tudo que veio à mente, era que a interlocutora se chamava CBF e quem tinha morrido era o futebol brasileiro depois de levar de 7 da Alemanha.
Olhou para dentro do caixão. O corpo coberto de flores brancas. Nos pés, um chapéu branco de crochê ornamentado com pequeninas flores do campo, vermelhas que ela sempre usava. Combinando com o batom rubro e vivo que emoldurava os lábios bem feitos, realçando dentes alvos que surgia junto com um sorriso e doces palavras.
Seu olhar percorreu para onde estaria o quadril. Ancas largas que deveria conter um vertice inchado na altura da vagina. Piscou e meneou a cabeça, afastando pensamentos impolutos, fazendo-o sentir-se vil e desrespeitoso. As mãos apareciam, entrelaçadas em pose de oração.
Depois viu o rosto, branco e sereno como estivesse a dormir. Lembrou da figura que ilustrava o livro que seus pais leram tantas vezes para ele, antes de dormir. Se na infância causava medo da bruxa má com sua maçã envenenada, agora era raiva. Ódio por ter feito Marcela adormecer de forma perpétua.
Marcela, ah, Marcela. Lembrou quando a viu pela primeira vez. Tinha seis ou sete anos? Não tinha certeza. Foi quando deixaram a casa alugada, a quatro quarteirões. Haviam comprado uma nova e estava tentando auxiliar na mudança. Carregava miudezas e se viu perdido, sem saber onde estava. Tudo que pode fazer foi chorar em desespero.
O céu escurecido, ameaçador. Nada lhe era familiar. Foi quando surgiu aquele anjo, como uma luz. Teria ela quinze? Branquinha com cabelos negros, elegante nos gestos, ar de moça fina. Morava na casa ao lado da sua nova residência. O conduziu até sua mãe e ao despedir, lhe deu um abraço. Abraço aconchegante, tão protetor como o amplexo materno. Em sua mente pueril, ela havia salvo a sua vida!
Filha única, durante anos, Thiago foi seu irmãozinho. Decorou e passou a amar a musica ¨Für Elise¨ de Beethoven, de tanto ouvi-la tocar no piano. A janela do seu quarto, dava para a janela do quarto dela, separado por um muro baixo. Quarto que visitou tantas vezes, enfeitado por bichinhos de pelucia. Que exalava seu adorado cheiro.
Foi quando tinha treze? Quinze? Marcela passara dos vinte e começou a namorar o doutor Henrique. Logo na época das primeiras ejaculações. Quando os pêlos pubianos se fecharam, como copas de árvores emaranhadas numa floresta densa. Sentia desejos por Marcela. Tocava punhetas diárias e seguidas, pensando em sua musa. Estava apaixonado por ela. Seu primeiro e único amor.
Que ódio daquele filho da puta! Marcela apaixonada por aquele engomadinho, dono de um carrão possante. Nem dava para sentir inveja, tão forte a raiva daquele desgraçado! Sem mesmo saber se foi ela ou, ele mesmo quem se afastou, tomado por cíumes adolescentais (se não existe, passa a existir).
E agora a sua princesa jazia ali, morta e linda como sempre, bela adormecida! Sentiu que as lágrimas estavam vindo. Um soluço incontido indicava que ia chorar copiosamente. Se afastou rápido, temendo o vexame. Foi para um canto e de costas, chorou.
Um pranto forte, sentido e solitário. De alguém que perdera, pela segunda vez, a pessoa mais importante da sua vida. Quando ela casou com o doutor Henrique, teve vontade de chorar. Mas conseguiu conter. Sentiu-se traído, abandonado. Como consolo o semblante da sua deusa, resplandecendo felicidade radiante.
Desta vez não. Porque jamais ouviria novamente sua voz. Aquele corpo delicioso, até mesmo aquelas mãos que tantas vezes o afagaram, seriam destruídos pelos vermes, sete palmos sob a terra!
Se recompôs, colocando os óculos escuros para esconder a vermelhidão dos olhos, marejados pelas lágrimas que insistiam em sair. Deixou o recinto, passando pelas rodas de pessoas que conversavam em voz baixa. Numa delas escutou alguém dizendo:
¨- Que pena, tão nova!¨. E outra maldosa concordando: ¨- Pois é, com tanta gente ruim neste mundo, Deus resolve levar logo essa menina. Não dá mesmo para entender¨.
Pensamentos blasfêmicos passaram pela sua cabeça. A injustiça de Deus. Algo que um religioso tentaria explicar, como fêz Julio Cesar (não o romano e sim, o goleiro da seleção), tentando explicar o inexplicável. Poderia ter levado por exemplo o velho Ulisses, o encrenqueiro do bairro, odiado por todos pela sua arrogância.
Nisso uma das comadres, aponta para o centro do velório e diz:
- Olha lá o viuvo! Coitado, chorando pela esposa!
- Coitado nada! É um fingido, isso sim! Se o safado está chorando, são lágrimas de crocodilo! Vou te contar! Sabia que esse doutor Henrique anda saindo com a secretária? Minha sobrinha trabalha como camareira no motel e já viu ele com a amante várias vezes...
¨Filho da puta!¨ foi a exclamação mental de Thiago. Então o canalha traía sua doce Marcela! Que crocodilo? Coitado é o crocodilo! Só chora porque quando devora a presa, ao passar pelo céu da boca comprime seus canais lacrimais. O patife comia a secretaria e agora soltava lágrimas enganatórias (que também passa a existir).
Já no cemitério, antes do caixão ser fechado pela ultima vez, teve vontade de pegar aquele chapéu de crochê como recordação. Que ela usava desde solteira, comprado em uma viajem ao nordeste. Quando voltou bronzeada e explendorosa, como uma deusa mitológica. Tantas lembranças!
Naquela noite o sono não vinha. Agitado, Thiago virava para direita. Voltava para esquerda. Tentava não pensar na Marcela. Em vão. Trazia à mente a final da Copa do Mundo, mas, a cabeça esvaziava. Para Marcela, Marcela que havia falecido bem no dia que morreu o sonho do hexa. A humilhação não foi nada, perto do ¨Marcelanazo¨ , naquele fatídico dia 8 de julho de 2014, que jamais será esquecido.
Lembrou da ultima vez que estivera com ela. Foi quando acompanhou a mãe em visita ao hospital. Fazia dois anos que não a via tão de perto. Sob o lençol, deitada na cama, esbanjando beleza que doença nenhuma no mundo conseguiria tirar. Seu ar triste. Seria porque sabia do caso entre seu marido e a secretaria?
Ela queria ir ao toalete. Apertou o botãozinho chamando a enfermeira. Que veio, soube o que ela queria e de forma insensível, disse que já voltaria. Como deve ser odioso e horrível depender dos outros!
Sua mãe se dispôs a ajudá-la. Pediu que também ajudasse. Como se preciso fosse. Abraçou o corpo tão desejado, que em sua fragilidade, espamarrou pelo seu peito, encostando firmemente os seios redondos e bem feitos. A bata branca deixava à mostra as pernas alvas e torneadas. Com a mãe, carregou-a até o toalete. Aguardou fora e depois, novamente, usou sua robustez para recolocá-la na cama, sentindo o calor que emanava daquele corpo doentio.
Marcela, olhando em seus olhos, disse:
- Então, Thiaguinho. Lembra que quando criança, você vivia dizendo que iria casar comigo?
Claro que lembrava! A vontade era de bradar o quanto a amava. Que casaria com ela ontem, hoje, agora, amanhã, nessa e até mesmo em outra vida! Mas a timidez e o constrangimento o inibiu. Fêz-se desentendido. Como se Thiaguinho não fosse ele e nem estivesse ali.
Na despedida, ao beijá-la no rosto, pensou em dizer ¨- Melhore logo¨, mas, sem querer, o rosto vermelho, balbuciando, deixou escapar duas palavras:
- Te amo!
Puxa, só pode dizer aquilo. Ou tudo aquilo. Queria dizer que seu coração, há muito era dela. E mais, que a desejava. Que gostaria de amá-la, com todo amor que um homem pode dar. Até mesmo na cama. Que a desejou por anos e anos. Que melecou as mãos centenas ou milhares de vezes, imaginando depositar aquela porra em seu corpo.
Sentiu o pênis inchar. Ereção que exigia uma vez mais o ritual, tantas vezes cumprido, de se masturbar por ela. Abaixou a cueca e tirou o pau para fora. Um pau enorme, grosso, que assustava as biscatinhas. Que fêz até uma puta rodada gemer. Que se fosse dela, seria só dela, Marcela. Que jamais a trocaria por nenhuma secretária do mundo!
Adormeceu. Despertou bruscamente, desorientado. O pau ainda duro. Alguém chupava ele de forma carinhosa. Como saboreando um picolé. Subia e descia na vara gigantesca, em toda longa extensão. Demorava na cabeçona rombuda, lambendo cada reentrância, abocanhava por inteiro, levando a ponta até dentro da garganta.
Quem seria? Colocou a mão na cabeça da boqueteira e sentiu os cabelos lisos, macios. A única mulher em casa era sua mãe, que tinha os cabelos encaracolados. Nisso ela se levantou. A claridade tênue que entrava pela janela iluminou o vulto. Era Marcela, com um vestido de noite.
Subiu na cama. Com as pernas abertas, os pés ladeando seu quadril. Tirou a calcinha, se equilibrando de forma graciosa. O rosto sereno e compenetrado. Sem nada dizer, ergueu a barra do vestido, levando à altura da cintura. As coxas alvas, lisas, daquelas pernas bem torneadas era a visão do paraiso.
Que quadril lindo tinha ela! Arcado como a parte mais larga do violão. O baixo ventre com pentelhos negros e delicados, como um ponto de exclamação! Acompanhando o capô de fusca que terminava num grelho proeminente. A boceta delicada, de lábios finos.
Prendendo o tecido com as duas mãos, veio agachando. Pouco flexionou os joelhos ao encostar a vulva no seu mastro ereto.
Com uma das mãos, posicionou a ponta do cacête na entrada da xoxota. Desceu mais, de forma vagarosa, rebolando para recebe-lo dentro das suas carnes. A fricção que aquela bocetinha apertada causava era incrível. Avanço que provocava ondas de prazer.
Apoiando as duas mãos em seu peito, ela cavalgava empalada na sua pica. Thiago começou a estocar forte, de baixo para cima, tentando penetrá-la mais fundo ainda. Gemia forte a cada metida na mulher dos seus sonhos. Sentia um prazer sobrenatural ao pensar que finalmente estava comendo Marcela, a mulher da sua vida!
Ela mexia as ancas, para cima e para baixo, num ritmo frenético. Os lábios que molduravam a xoxota deveriam estar arregaçados, envolvendo seu caralho grosso. Com certeza formava dobras de pele a cada entrada e nova saída. O gozo logo veio, de forma intensa, liberando todo o tesão acumulado.
Segurou firme a apetitosa bunda da Marcela, puxando com toda força para baixo, prendendo-a no seu cacete enfiado até o colo do útero, enquanto ejaculava jatos de porra, um atrás do outro, a rola com vida própria, pulsando sem parar, marcando aquele cobiçado território como seu. Ela inclinou o tronco para frente, a cabeça encostando na sua, pousando os lábios macios no seu. Deixara o mais ansiado de todos para o final: um beijo de amor!
Sentiu as palpebras cerrar, a alma em paz infinita. Tudo era surreal. Perdera a noção do tempo e do espaço. Dizem os físicos que eles estão interligados por várias dimensões. Os metafísicos concordam e afirmam que o espirito podem trafegar entre eles. Seria seu desejo tão poderoso a ponto de tê-lo levado a ela? Ou Marcela teria vindo a ele?
Acordou com estranha sensação. O pau ainda duro, molhado e babado de porra que tinha escorrido até os pentelhos. Passou a mão e sentiu alguns pêlos colados, onde alguma gôta do seu sêmen já tinha secado. Só podia ser um sonho surreal! Tinha feito amor com Marcela e gozado dormindo!
Adormeceu de novo, odiando por ter despertado. Que interrompeu momentos mais incríveis da sua vida! Preferia ter morrido e jamais acordado, para ficar eternamente comendo Marcela. Se dormisse, talvez sonhasse outra vez com a mulher que tanto amava.
Amanheceu. Não sonhou de novo. Que decepção! Saco! Os primeiros raios de sol surgindo fulgurante, anunciando um novo dia. O sentimento de frustração era tudo que o acometia. Thiago se comparou como os jogadores da seleção, acordando no ¨Day after¨, na Granja Comary.
Foi quando sentiu um vento frio, trazendo certo arrepio. A lufada tétrica, mais do que a sensação térmica, causou um tremelique incontrolado:
Do criado mudo, lentamente, caiu um chapéu branco de crochê, ornado com florzinhas vermelhas...
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(Dedicado à Narceja, uma das melhores autoras da casa, que infelizmente, retirou todos seus contos).