CAPÍTULO 2: O RITUAL.
- Você está bem?- Ele parecia preocupado. Sua voz era rouca e sedutora. Suas mãos pousaram sobre meu rosto, ele me apertou contra seu corpo e logo em seguida chamou por socorro. Eu queria dizer que estava tudo bem, más eu simplesmente não conseguia me mexer, era como se estivesse sobre algum tipo de transe, meu corpo simplesmente não me obedecia.- Fique calmo, a ajuda já está à caminho...- Disse ele dando um lindo sorriso.
Juntei todas as minhas forças e percebendo que com apenas a força de vontade eu não conseguiria, então usei a força física. Ergui o punho direito com dificuldade e então o lancei contra meu próprio rosto, fazendo com que eu afundasse o rosto em seu peito.
No mesmo instante senti meus membros relaxarem e por fim, eu podia me mover normalmente.
- Você está bem?!- Disse ele me virando de peito para cima.
- Sim...- Coloquei a mão sobre o rosto e me sentei a sua frente.
"Droga! Nem eu sabia que tinha tanta força."- Pensei. E de fato não sabia mesmo. Meu rosto queimava e parecia que meu maxilar havia sido esmagado.
- Tem certeza?- Sua expressão preocupada me derretia todo. Balancei a cabeça em sinal de positivo e apoiei as mãos no chão para levantar. Ele imediatamente passou um dos braços ao meu redor e me ergueu. Uma de minhas mãos repousou em seu braço e pude sentir os músculos se contrairem por baixo da roupa grossa.
Ao levantar o rosto, nossos olhares se encontraram e corei ao encará-lo. Seus olhos eram como duas lagoas, azuis e brilhantes.- Você consegue continuar?
- Sim...- Disse baixo. Começamos a andar pela ponte de cristal branco e ele ainda me mantinha colado em seu corpo, me dando apoio. Eu não precisava mais de ajuda, más negar aquilo era um crime que eu não poderia cometer. Ao fim da passarela, havia um tipo de altar redondo, rodeado por cinco pilares.
À frente de cada um deles, estavam sentados cinco pessoas, cada pilar possuía um cristal de cores diferentes ao topo e aos pés, seus sacerdotes.
No pilar de cristal azul, eu reconheci a moça que me recebera mais cedo ao sair do túnel, ela olhava para o centro do altar, onde se posicionava em pé a rainha.
Continuamos andando e ao chegar próximo ao altar, senti minha perna direita travar. Tipo, ela simplesmente ficou dura, e não saiu do lugar. Eu não entendia o que estava acontecendo com o meu corpo, ele não obedecia meus comandos. Olhei para baixo, em um canto à direita, em meio a multidão, havia um homem. Ele estava com parte da cabeça coberta por um capuz preto e o rosto à mostra. Ele me olhava fixo e seus lábios se moviam rápido, como se estivesse falando. Más não saia nenhum som de sua boca. De repente, vários guardas apareceram do nada e começaram a arrastar o homem para fora do local, a figura se debatia e protestava contra o ato, até que foi jogado contra uma porta e a mesma logo se trancou.
Minha perna novamente voltou ao normal e foi como se desgrudace do chão, fazendo com que eu desse um tranco para a frente levando o rapaz junto. Más ele se firmou e me segurou forte pela cintura me mantendo no lugar.
Ele apenas deu um sorriso e continuamos a caminhada.
- É aqui que o deixo...- Disse ele ao chegarmos no meio do altar onde haviam quatro pessoas ajoelhadas em frente à rainha. Suas roupas eram parecidas com a que eu usava e eles mantinham o olhar aos pés da rainha, que me olhava curiosa.
- Obrigado...- Sorri tímido. Ele se afastou e foi para trás da rainha enquanto eu me abaixava, ficando na mesma posição que os demais.
- Irmãos e irmãs. Aqui à vossa frente, estão os cinco escolhidos pelos espíritos.- Disse a rainha dando uma pequena pausa enquanto o povo gritava enlouquecido.- Eles foram os escolhidos para nos proteger das trevas e manter o equilíbrio em nosso mundo.- Eu levantei a cabeça apenas o suficiente para tentar espiar o rosto dos que estavam ao meu lado, más eles mantinham o capuz bem abaixo escondendo totalmente suas feições na sombra do pano.- Eles foram presenteados com a habilidade e o dom de controlar e se unir aos quatro elementos da natureza e ao mundo dos espíritos. Estes serão os guardiões desta geração e nos manterão à salvo dos perigos que nos sercam fora dos portões de Hounturan.- Outra pequena pausa foi feita e as figuras ao meu lado se levantaram devagar, e eu os segui fazendo o mesmo.- Guardiões, vocês prometem honrar e dedicar cada dia de suas vidas à serviço do bem de seu povo?
"Sou obrigado, fazer o que..."- Pensei enquanto tirávamos os capuz, deixando agora, todos os rostos à mostra.
- Sim, eu prometo.- Falamos todos juntos. Ao olhar para o último à direita, dei de encontro com o olhar de um garoto de cabelos dourados. Ele me encarava de um modo estranho, sua feição era seria, ele mantinha os olhos imóveis e o maxilar trincado. Ele era tão lindo quanto o de alguns segundos atrás. Este, como já disse, possuía os cabelos de um dourado vivo e seus olhos eram de um azul intenso e penetrante. Ele era alto e músculoso, o rosto era de uma mistura incrível de delicadeza e rigidez, que lhe davam uma sensualidade incomparável. Os lábios rosados contrastavam perfeitamente com a pele bronzeada e limpa. Era instigante o jeito que seus olhos me fitavam... Pareciam ver através de minha alma...
- Muito bem...- Disse a rainha me chamando a atenção. Ela se virou e foi ao encontro dos sacerdotes que se posicionavam em seus tronos e logo se voltou ao nosso encontro.- Os sacerdotes tomaram suas decisões. Os espíritos viram seus desejos, seus medos e seus pontos fortes. Viram suas fraquezas, suas habilidades e por fim, suas almas... Os cristais escolheram quem será digno de carregar o poder de cada elemento e, se, saberá usar com inteligência, e principalmente, cautela.- Ela olhou para cada um de nós e se virou, indo até a lateral do altar e se sentou em um trono de cristal.
O lindo rapaz de antes veio até o local que ela, antes se localizava, e parou à nossa frente.
- Quando eu chamar seus nomes, dêem um passo à frente.- Ordenou e logo em seguida seus olhos pousaram nos meus. Ele abriu um pergaminho, procurou algo nele e então ergueu a cabeça.- Bloondie.- Uma garota de cabelos longos e negros deu alguns passos e parou à frente do rapaz, que se retirou um pouco ao lado.
Todos ficaram apreensivos, esperando para ver quem dos sacerdotes se levantaria. Então o deus Martino ficou de pé e andou lentamente ao encontro da pequena garota. Ao se posicionar em frente a garota, o homem com cabelos negros ergueu a mão esquerda e o cristal de cor rosa flutuou magicamente até sua mão e pairou no ar, em meio aos dois.
Ele disse alguma coisa que só ela pode ouvir e a garota pôs as duas mãos ao lado do cristal, que se iluminou imediatamente, fazendo o local todo ter uma sensação de paz e tranquilidade inexplicável.
A garota retirou as mãos e o sacerdote voltou ao seu lugar acompanhado pelo cristal, que subiu ao topo do pilar novamente.
- Aqui lhes apresento a guardiã do coração. A mensageira da paz e do amor...- Todos começaram a gritar em louvor da garota, enquanto o belo rapaz a cumprimentava curvando levemente a cabeça.- Ela será a navegadora. Aquela que manterá o equilíbrio entre os guardiões. Será a voz da razão e da compaixão; será a única capaz de estabelecer contato direto entre o mundo dos mortos e dos vivos.- O povo aplaudia frenéticamente enquanto a garota voltava ao seu lugar com uma expressão de felicidade no rosto.
- Muito bem...- Disse ele fazendo com que o barulho abaixo cessasse.- Christopher.- Um garoto alto e magro, com cabelos também negros deu um passo à frente.
Após alguns segundos, a sacerdotiza Mantha, prosseguiu o ritual dando ao mesmo, o poder do espírito do ar.
- Enzo.- O garoto de cabelos dourados foi presenteado pelo dom do fogo, e ao voltar ao seu lugar, novamente me encarou sério.
Por fim, sobraram apenas eu e uma garota de cabelos louros. Ela olhava tudo de nariz em pé e pelo belo rosto e corpo que possuía, sua beleza lhe dava o poder de esnobar qualquer um que não lhe enteressasse. Ela parecia feliz pelo que seus lábios demonstravam, pois, um largo sorriso se abrira em seu rosto.
Restavam os cristais da água e terra. Todos de certa forma já sabiam qual seria o desfecho. Halon me contou que desde que os cristais foram criados, o espírito da água só escolhia mulheres para guardar seu poder. Eu não fazia a menor idéia do porquê, más que era de certo, isso era.
- Erin.- A garota andou até o meio do altar e cruzou os braços à espera do que lhe era por direito. Todos olhavamos para a mulher abaixo do cristal azul e por alguns segundos, todos permaneceram imóveis, como estátuas.
Então aconteceu algo totalmente inesperado. O sacerdote Denon se levantou.
Pude ouvir os suspiros de surpresa vindos de todos os lados. A garota descruzou os braços e olhou indignada para a deusa do cristal azul, como se esperasse ainda que ela levantasse.
O homem de feição seria se aproximou da garota, junto ao cristal, e não tendo outra escolha, a garota prosseguiu o ritual.
- Hizel...- Disse baixo o rapaz me chamando ao meio. Todos me olharam como se eu fosse alguma espécie exótica que veio de outro mundo. Era como se todos quisessem saber o que se passava em minha mente naquele exato momento.... Confesso que até eu queria.
Meus pensamentos estavam em completa desordem, eu não pensava coisa com coisa, e minhas mãos estavam gélidas e doendo.
Passei o olhar por todo o local e me deparei com Halon me observando ao longe. Ele sorria e acenava positivamente para mim, me encorajando a seguir em frente. E foi o que fiz.
Fui até o meio do altar e ergui a cabeça em meio a tantos murmurios que pairavam pelo local.
A deusa Arya levantou e veio em minha direção com um leve sorriso no rosto. Admito, eu estava tremendo e quase mijando nas calças de nervosismo. Apenas uma coisa fazia sentido em minha cabeça: porque, eu?
Ela parou e convocou o cristal, que logo se posicionara entre nós.
- A água é o elemento da mudança. O elemento da fluidez e da vida. Quando calma, a água pode ser transparente e delicada. Más quando agitada, se torna a mais destrutiva e impiedoza arma já criada pela natureza. Sua capacidade e poder dependerá apenas de você mesmo. O espírito da água lhe escolheu, agora, faça jus ao dom lhe concebido.- Disse a bela mulher em um tom baixo e logo depois sorriu.
Ela estendeu o cristal, que era um pouco maior que minhas mãos e balançou a cabeça para que eu o tocasse. Assim que o fiz, algo que eu nunca senti antes aconteceu. Minhas vestes começaram a subir no ar e meu cabelo arrepiou com uma rajada de vento que passou pelo local. Uma corrente elétrica atravessou meus braços e desceu até os pés me dando vontade de gritar. Eu sentia uma energia me preenchendo o corpo todo e vi meus olhos ganharem uma luminosidade incomum no reflexo do cristal. Eles ganharam um tom azul-safira brilhante, e acenderam como duas lanternas. Era a coisa mais incrível que eu já sentira até então.
Olhei para a moça a minha frente e sua feição era como a de uma criança, seus lábios se emolduravam em um sorriso largo e seu olhar era de pura adrenalina. Vendo aquilo, uma felicidade inexplicável tomou conta de mim e ambos começamos rir. Olhei para baixo e vi meus pés deixarem o chão por alguns instantes e então o vento foi parando e tudo voltou ao normal lentamente.
- Uau!- Disse retirando as mãos do cristal. Olhei ao meu redor e todos nos observavam fixamente.
- Ham... Aqui lhes apresento o guardião da água. O líder e o mais forte entre os cinco espíritos sagrados...
- O que? Líder?!- O interrompi sem pensar. Eu não iria ser líder, não mesmo. Eu mal liderava a mim mesmo imagina aos outros...
- Sim, é a tradição o espírito da água ser o líder, já que é o mais dotado entre os cinco.- Ele me olhou apreensivo e abaixou o pergaminho em suas mãos.
- Eu não quero ser líder.- Quando disse isso, todos, inclusive a rainha, soltaram um suspiro de espanto e logo os murmurios entre o povo começaram.
- Por que não?
- Por que... Não.- Falei a última palavra quase sussurrando.
- Então você revoga o posto de líder?
- Sim...- Disse após alguns segundos.
- Ok... O guardião da água revoga do direito de ser líder!- Ele gritou ao povo e todos puseram as mãos na boca surpresos. Direcionei meus olhos aos outros guardiões e eles me encaravam com as sobrancelhas arqueadas, como se aquilo fosse um crime.- Como você seria o líder, é seu dever escolher outro para ocupar o seu lugar.- Ele se aproximou e disse baixo.- Quem será?
- Hum...- Pensei por algum tempo e passei meus olhos em cada um deles. Todos logo ficaram com a postura reta e aguardaram o meu veredito. Olhei o garoto de cabelos dourados e o observei mais detalhadamente.- Eu escolho o guardião do fogo.- Ele direcionou o olhar direto para mim e depois desviou.
- Muito bem, o novo líder é o guardião do fogo!- Todos aplaudiram e o garoto foi até o centro para se apresentar. Havia algo nele que me chamava muito a atenção. Não era só a beleza, más, acho que algo no olhar, no jeito... Algo que eu não sabia identificar.
Nos apresentamos para o povo e o rapaz com a coroa na cabeça pediu que o seguissemos até o lado de dentro do palácio.
[...]
- Esperem aqui, por favor. Logo lhes levarei até a rainha.- Falou ele nos deixando em uma sala vazia e saiu.
Fui até uma das janelas e olhei a imensa floresta que se formava logo após o castelo.
Me virei novamente para os outros e em um canto, o garoto misterioso e a garota de cabelos loiros conversavam, Erin e Enzo, eu acho...
Retirei a capa branca que vestia e retornei os olhos aos dois, que agora me encaravam sérios. Enzo se curvou um pouco para ficar na altura dos ouvidos da garota, e disse algo escondendo a boca com as mãos.
Mantive o olhar firme e retribui, os encarando de volta sem êxitar.
A garota tinha um ar de superioridade que me irritava profundamente. Então mexi a cabeça como quem fala "O que foi?" E fui em direção à porta, passando pelos dois. Quando a abri, dei de contra com o lindo rapaz da coroa. O impacto foi tão forte que voltei no mesmo instante e caí no chão.
- Você está bem?!- Disse ele me ajudando a levantar.
- Sim.- Pude ouvir o riso irônico da garota loira e então Enzo deu um empurrão fraco, a fazendo parar. Ele era tão gostoso... Opa!
- Venham, a rainha está a espera de vocês.- O seguimos pelo corredor e ao chegar no fim, entramos em uma outra sala.
A rainha se posicionara em um trono no fim da sala e ao lado, os sacerdotes. Quando olhei para a deusa Arya, ela deu um sorriso e reverênciou com a cabeça.
- Guardiões. Vocês foram escolhidos e agora, são, de fato os protetores de Elementary. Vocês deveram manter o equilíbrio entre os reinos e nos manter a salvo das trevas que tentam nos destruir à cada segundo que se passa. Sei que todos vocês conhecem a história de minha vida, e sabem também, que entre mim e meu irmão se formou um conflito que a anos venho tentando romper. Ele jurou dedicar cada segundo, até o resto de sua existência, a me caçar e destruir tudo o que construi até hoje. Eu sei que não será nada fácil, e por isso peço que nos ajudem a extinguir todo o mal que ele causou. Eu sozinha não posso com ele... Conto com vocês para manter vivo a chama da esperança que nosso povo tem em vocês e em suas habilidades.
Vocês serão levados até um templo, onde terminarão seu treinamento e aprenderão a dominar seus novos poderes. O capitão Ian,- Ela fez mensão ao rapaz com a coroa e o mesmo se curvou- será responsável pelo seu desenvolvimento em batalha e com a ajuda dos sacerdotes, que também irão com vocês, lhes transformarão em guardiões completos. Vocês devem partir agora mesmo, não temos tempo a perder, a cada segundo que perdemos, ele se fortalece mais. Devemos correr contra o tempo e nos tornarmos mais fortes que ele.- Todos nos curvamos e em seguida o capitão Ian veio até nós.
- Vamos.- Disse ele passando entre a gente.
[...]
Já estávamos à quatro horas de viagem e Enzo não desgrudava os olhos de mim um só segundo. Eu e os outros quatro íamos na mesma carruagem, enquanto os sacerdotes iam em outra um pouco mais atrás. À nossa frente, Ian abria caminho montado em seu cavalo e por todos os lados guardas faziam a segurança de nosso "pilotão da salvação".
Havíamos passado por vales, florestas, penhascos, pântanos e tudo o que se possa imaginar. Seja qual for o lugar, é tão bem escondido que duvido que mesmo se fugissemos saberíamos voltar.
- Eu estou com fome...- Disse a garota baixa dos cabelos escuros.
- Eu também.- Lhe respondi em um tom baixo. Eu, ela e Christopher estávamos sentados no mesmo sofá, e os outros dois à nossa frente. O que me deixava desconfortável, já que Enzo não parava de me olhar. Era tentador o jeito que seus olhos se estreitavam quando eu retribuia o olhar. Ele era sexy... Muito sexy; ainda mais quando saíamos da sombra das árvores e a luz do sol pairava sobre sua pele, fazendo com que seus olhos azuis brilhassem me seduzindo.
Eu disse mesmo isso? Más o que está acontecendo comigo? Eu nunca pensei isso de alguém, muito mesmo de um garoto... Não sei muito sobre amor, más pelo que sei; garotos foram feitos para garotas, e visse versa. E agora? Seria eu anormal? Mais ainda?
Continua...