Já era agosto, voltas às aulas. 2º semestre do 2º ano, tinha acabado de terminar o namoro com o André Filipi, eu fui o mais sincera possível. Estava em dúvida se doía mais dizer que acabou o amor ou que tinha me apaixonado por outra pessoa. Foi uma terrível noite, pra ambas as partes. Fazer papel de monstro também me custava caro.
Mas parece que o cachê de bobo apaixonado é sempre o mais procurado, prometo que quando eu descobrir o motivo, conto.
Tinha mudado um pouco o visual no período das 4 semanas de férias, o cabelo que estava em luzes loiras, tinha se transformado em um loiro platinado e o tempo gasto na academia que servia tanto pra passar o tempo quanto pra manter a mente ocupada, tinha surtido efeito.
Assim que começaram as aulas ainda tivemos umas aulas juntas na sala de vídeo com o professor de biologia, ele juntava as duas turmas e usurpava de 2 horários, e ainda saía “ganhando” dando mais assunto em um dia, já que era o mesmo assunto. Ela não prestava atenção à aula. Um fone compartilhado com Isaac e uma hora ou outra soltavam uns risinhos que realmente não me deixava concentrar. No fim da aula o professor ainda fez uma pergunta pro “casal” que passara a aula inteira de conversa e a garota ainda teve cara pra responder. Certo. Até o professor surpreendeu-se, nem eu que... É, pra falar a verdade eu estava mais concentrada nela do que no reino das plantas, narrada pelo professor.
Depois de um tempo ela passou a frequentar bastante a minha turma, tinha feito “amizade” com um garoto de lá, Alan. Ela entrava e nos horários vagos eles ficavam conversando, e ele passou a fazer parte do trio mais bombástico de toda escola: Camila+Isaac+Alan.
Virou um alcoólatra tal como os outros dois.
Era uma sexta-feira, eu acho, eu estava esperando Laís do lado de fora, já tinha escurecido.
Eles estavam lá, eram uns 7 a 8 e bebiam uma vodka ou sei lá o que era aquilo. Ela tinha acabado de voltar de detrás de um dos carros estacionados lá na frente com uma caloura loirinha. Diagnóstico: conversa. C.O.N.V.E.R.S.A. C-O-N-V-E-R-S-A C\O\N\V\E\R\S\A.
Ela colocou o cigarro entre os lábios e virou pra pegar o isqueiro com a tal loirinha. Então ela me olhou, olhou mesmo. Deu uma boa e longa olhada, sorriu e piscou. Como aquele sorriso dela era cínico. De quem tá sempre aprontando, como que diz “vou ferrar com sua vida”. Mas não era só o sorriso, os olhos em um tom de preto profundo parece que tiravam raio x da nossa alma. Parecem sinceros, mas de uma coisa que eu tinha quase certeza: Mila era uma boa mentirosa, nível hard mesmo.
Então sendo puxada pela mão que segurava o cigarro ela saiu andando com os dois homens dela.
No dia do estudante sempre tinha uma festa no centro da cidade, que consequentemente era a dois passos da escola. Depois de muita insistência de Laís decidi ir, afinal estava mesmo precisando esfriar a cabeça e curtir um pouco.
Eram umas 4 horas da tarde quando fomos pra lá. Como era ao ar livre e estava fazendo maior solzão fui de short curto e uma blusa de seda preta e uma sapatilha. Laís foi praticamento do mesmo jeito, só trocando as cores e uma blusa polo e um namorado ao lado. Me senti mega a vontade. Mentira. Mas ela era minha amiga e eu relevava, era o mínimo que eu poderia fazer. Tinha uns dois palcos, música “ambiente” tocando, como forró, funk e essas coisas e muita, muita gente. Adolescentes especificamente. Sentamos em uma mesa um pouco afastada e começamos a beber uma cerveja de leve. Até que eu estava achando legal, Thiago o garoto que estava acompanhando Laís era um carinha bem interessante, sabia conversar e nos fazia sorrir. Já tínhamos bebidos umas 8 cervejas quando eu olhei ela. Ela usava uma blusa branca 3 vezes maior que o tamanho dela,. Um short que estava ali em algum lugar debaixo daquela blusa, um tênis vermelho que pode acreditar: estava combinando e óculos escuros. Ela tentava amarrar uma bandana em um dos braços e não estava fumando. Incrível. Eu só olhava ela não-fumando dentro da escola. Acho que o dinheiro que ela gastava com cigarro dava de comprar um apartamento mobiliado pra... gente.
Ela estava com o mesmo pessoal de sempre e mais uns que eu nunca tinha visto antes. Eles sentaram em um outro bar lá ao lado e juntos completavam mais de 2 mesas juntas. Pediram cerveja mas estavam concentrados mesmo era em um whisky caro. Então como tudo que é bom acaba, ela tirou um cigarro de um porta-cigarros prateado.
Depois de umas 2 horas, minha cabeça já estava doendo daquela barulheira toda, eu já queria ir embora. Não aguentava ver aquela guria se matando de tão perto mas de tão longe. Eles já pareciam um pouco alterados, o tom da conversa estava mais alto e eles riam por tudo. Thiago falou que iria rapidinho no estacionamento que um amigo dele tinha acabado de chegar, “chegou atrasado” pensei. Laís falou que iria com ele que aproveitaria pra comprar um engov na farmácia lá perto. Falou que traria um pra mim também. Ótima mas me deixou pras cobras ali sozinha. Olhei pra mesa onde Camila estava pra ver se já tinham ido porque o som da zoada que eles estavam fazendo tinha cessado. Levei um susto quando olhei a figura dela a poucos metros à minha frente, gelei e a única coisa que consegui fazer foi pegar o copo de cerveja que tinha virado aquário na minha frente e descer garganta abaixo.
- O-oi. - falei ao sentir o forte cheiro de whisky e cigarro mentolado.
Ela puxou uma cadeira e sentou de frente pra mim. Seu perfume era doce, ela sorriu cinicamente.
- Não sabia que você bebia.
Tentei sorrir.
- Você é quem bebe. Eu apenas finjo.
Ela abaixou a cabeça e deu uma analisada em mim, quando chegou de volta aos meus olhos deu um sorriso torto seguido de uma arqueada de sobrancelhas. Ela sempre fazia aquilo.
- Sabe, eu levo bem a sério a frase “a minha vida é uma festa”.
- Percebi – foi a coisa mais inteligente que conseguir pensar. Nada de “o que você quer?” “por que você não repara em nada ao teu redor?” ou melhor “por que você desapareceu depois de dizer que gostava de mim?”
- Tá, chega.
Foi a frase mágica pra ela se aproximar ainda mais, e me puxar pra um beijo bem covarde. Suas mãos eram quentes apesar de o tempo ter esfriado bastante depois de escurecer. Seus lábios eram macios e ela beijava bem ritmado. No compasso mais perfeito do mundo, como se os lábios dela tivessem sido feitos simetricamente alinhados aos meus. Um beijo demorado. Ela que se afastou me dando selinhos e mordeu pra fechar e acabar com meu psicológico de vez.
Ela olhou pra mim, sorriu e tirou o porta-cigarros do bolso e acendeu um.
- O que foi isso? - perguntei meio sem saber o que falar.
Ela soltou calmamente uma chaminé inteira de fumaça.
- Um idiota da minha mesa falou que só ia chegar na Danny se eu chegasse em alguém – pausa pra um sorriso - conhece o Alan? É da tua sala não é?
Meus lábios secaram imediatamente.
- O quê? Não acredito... - falei sorrindo – você é a garota mais estúpida do mundo inteiro.
Levantei e ela apagou o cigarro e se lentou mais eu já tinha virado as costas e saído andando e com tanta gente ali ela não iria dar de cara comigo tão rápido.
Depois de andar o que me pareceu um século inteiro, esbarrei em Thiago que estava com o tal do amigo dele um pouco antes de cair ao choro no caminho de volta do estacionamento. Pedi, por favor que ele me levasse em casa. Ele, sem entender muito falou pro Carlos, o amigo dele, encontrar Laís na frente da farmácia e dizer o que tinha acontecido. Fomos o caminho em silêncio e umas duas lágrimas ainda caíram sem o meu consentimento.
Camila não merecia nem um pensamento inconsciente meu, mas eu tinha me apaixonado por um furacão e é isso que furacões fazem: destroem tudo pela frente, e o que resta, quando resta, são destroços.