O Casarão - Parte 14

Um conto erótico de Whirled
Categoria: Homossexual
Contém 3552 palavras
Data: 12/08/2014 09:37:21
Assuntos: Amor, Gay, Homossexual, Sexo

Ainda no salão principal, olhou para o teto como se pudesse enxergar através do concreto e tentou visualizar Igor. Tomou fôlego e subiu as escadas, mas ao chegar ao quarto, Igor não estava lá. Deu de ombros e foi tomar banho. Demorou debaixo do chuveiro, deu para si um tempo de relaxamento e depois saiu para o quarto.

Igor esteve esse tempo todo na cozinha fazendo o seu jantar. Um sanduíche caprichado, feito com os mantimentos que ele mesmo comprou. Após ter feito essa refeição rápida, porém reforçada, subiu para o quarto com o resto da comida que havia sobrado e com a frigideira que usou. Pedro assistia a cena com surpresa e um pouco de arrependimento. Nada daquilo teria acontecido se não houvesse rixas entre eles; talvez Igor cozinhasse algo para os dois. Aliás, ele já fazia isso, mesmo quando as suas diferenças já estavam bem delineadas. Pedro teria que fazer sua própria comida.

Desceu para a cozinha só de cueca e caçou nos armários e na geladeira o que comer. Achou salsichas no refrigerador, então decidiu comê-las com pão. Ao colocá-las na panela com água, esperou o cozimento, mas não fazia ideia de como saber quando elas estariam prontas. A água começou a amarelar, então achou que já estavam cozidas. Pôs no pão e mordeu. Com duas mastigadas, percebeu que nem as salsichas estavam no ponto e nem o pão estava fresco. Cuspiu no lixeiro e jogou todo o resto. E agora, o que comer? Procurou novamente nos armários pelo macarrão instantâneo, mas não tinha mais do produto. Não conseguiu imaginar o que faria com os alimentos que tinha a disposição, pois nem mesmo poderia fritar um ovo, afinal não teria acompanhamento. A cozinha, por sua vez, que não era mais higienizada, estava a cada dia que se passava ainda mais inutilizável para a preparação de qualquer refeição.

Voltou ao quarto para usar o telefone celular e pedir uma pizza. Igor, nesse momento, tomava banho. Quando Pedro já tinha feito o seu pedido, o companheiro de quarto saiu do banheiro também de cueca e seguiu para a varanda estender a sua toalha. Pedro o seguiu com os olhos e pela primeira vez reconheceu aquele corpo. Associou-o a noite em que dormiram juntos na van e se lembrou de que aquelas pernas estiveram grudadas as suas. Não soube, contudo, interpretar o que sentia naquele momento. Não soube se responder sobre o motivo de ter se lembrado daquilo.

Igor seguiu para a sua cama e se sentou com as pernas cruzadas uma sobre a outra. Pôs os óculos e começou a interagir com a internet. Pedro assistia-o com os braços cruzados, de pé, enquanto esperava a pizza. Eles não poderiam perceber, mas estavam naquele momento tão enquadrados numa situação homoerótica, que qualquer gay que os vissem se sentiria atraído. Pedro e Igor vestiam apenas cuecas e dormiam no mesmo quarto, sem que ninguém os atrapalhassem ou os impedissem de fazer o que quisessem; além disso, tinham acabado de tomar banho; eram jovens e bonitos; e agiam com tanta naturalidade diante dessa situação, que pareciam acostumados um ao outro, como se fossem um casal bem resolvido.

Mas não eram. Estavam longe disso. E continuariam longe se dependesse deles e dos outros. Antes que a pizza chegasse, o celular tocou:

- Alô?

- Oi, Pedrinho, tudo bem?

- Quem é?

- Não reconhece mais a minha voz?

- Desculpa...

- É a Tati. Tudo bem, gatinho?

- Tudo, e você?

- Bem... O que você vai fazer hoje?

- Hoje? Acabei de chegar de viagem.

- É, eu sei. Sua irmã me contou. Mas está assim tão cansadinho?

Se tinha uma coisa que Pedro não conseguia se desprender era de seu ego, quando lhe impunham um desafio como prova a sua masculinidade. Mesmo gay, Pedro era antes de tudo homem.

- Cansado nunca estou.

- Hum, gosto assim.

- No que você está pensando?

- Estava pensando em passar ai na casa onde você está dormindo...

- Aqui no casarão?

- Sim. Ai só dormem você e Igor não é? Acho que ele não se importaria.

- Não, acho que não.

A intenção não era provocar ciúmes. Era algo muito mais incomodativo que isso. Até porque, Pedro nem mesmo sonhava em namorar Igor. Na verdade, muito anterior a tudo isso, Pedro não desejava tocar nenhum homem. Sua homossexualidade ainda não era algo real e, em sua cabeça, ainda era algo que poderia se reverter ou simplesmente ser um momento pelo qual passava, devido aos últimos acontecimentos.

- Então... Como eu chego ai?

Pedro a indicou pontos de referência e se despediu no telefone. Vestiu uma roupa e saiu com a van. Igor continuou suas atividades, sem se importar com nada do que ouviu, ou pelo menos do que pôde perceber. Quando Tatiana desceu do ônibus, Pedro já a esperava no ponto. A garota entrou no automóvel e seguiram juntos de volta ao casarão. O casal entrou aos risos no quarto, sem se importar com o internauta ali presente.

- Oi, Igor, tudo bem?

- Tudo, gatinha, e você?

- Tudo ótimo. Eu vou dormir aqui essa noite, você se importa?

- Não, não. Fique a vontade.

- Ah, obrigada.

Igor olhava para Tatiana com um estranhamento absurdo. A garota estava tão efusiva, que até parecia engraçada. O menino então a achou muito divertida naquela noite e até participaria da pequena reunião, se não fosse por Pedro. Decidiu apenas admirá-la e ficar no seu canto. Pedro, por sua vez, já percebeu que seria necessário muito mais que isso para irritar o seu companheiro de quarto.

- Tati, você se importa com o fato de o Igor estar de cueca?

- Eu? De maneira nenhuma, vocês estão na casa de vocês. Eu sou só a visita.

- Então também não se importará se eu também ficar de cueca, não é?

- Não, não mesmo. – disse animada.

Mas quando Pedro começou a tirar a camisa, a pizza chegou.

- Eu vou buscar a pizza. Me espera, ta?

- Não vou fugir, prometo!

Pedro então a beijou nos lábios rapidamente e desceu com a carteira. Tatiana, por sua vez, sentou-se na cama vazia.

- Vocês devem adorar viver aqui, não é?

- Adorar? – perguntou Igor.

- É. Eu adoraria morar sozinha com uma amiga.

- Eu também iria adorar morar com um amigo.

- E então. Não foi o que eu disse? – Igor riu um pouco – O que vocês dois não devem aprontar juntos...

- Nós dois juntos? Bem, eu não sou muito de aprontar não.

- Mas o Pedro deve ser.

- Não sei, pode ser. Eu nunca o vi aprontando.

- Sei... Essa fidelidade masculina entre vocês homens é algo realmente incrível. Nós mulheres deveríamos aprender.

- O que quer dizer com isso?

- O Pedro deve trazer muitas garotas para cá e você deve acobertar todas elas, não?

- Na verdade você é a primeira garota. Moramos aqui há um pouco mais de duas semanas e ainda não tivemos tempo de ganhar uma rotina.

- Sei... Então não há outras?

- Não que eu saiba.

- Hum, interessante.

- Você me diverte muito, Tati.

- É? Que bom. No que depender de mim, virei mais vezes te divertir.

- Economize a alegria para o Pedro, é melhor.

Enquanto aqueles dois riam, Pedro chegou com a pizza e o refrigerante. Pôs a caixa em cima da sua cama e o refrigerante no chão.

- Eu vou pegar os copos...

- Não, Tati, eu já os trouxe. Estão nos meus bolsos de trás.

Ele então puxou os copos e abriu a garrafa. Tatiana começou a se servir de uma fatia e, ao dar a primeira mordida, perguntou.

- Igor, quer que eu te pegue uma fatia?

- Não, obrigado, eu já jantei.

- Mas eu quero, Tati. Pode me dar?

- Na boca?

- Bem, eu não havia pensado nisso, mas...

- Antes, você precisa tirar a roupa, para não sujá-la.

- Ah é mesmo, esqueci.

Imediatamente Pedro tirou a camisa e a jogou na cama de Igor. O menino então olhou a peça de roupa e pensou “Esse é o melhor que ele pode fazer?”. Após isso, a bermuda já estava em cima da cômoda e Pedro já de cueca.

- Bem melhor, Pedrinho.

- E você, não vai tirar também?

- Não, está um pouco frio.

- Que besteira...

- Quem sabe mais tarde?

Os dois continuaram comendo, bebendo e se beijando. Quando a pizza acabou, Pedro não pensou duas vezes: deitou Tatiana em sua cama e continuou beijando-a. Igor olhou o casal e só pensou na diversão que era assistir aquilo tudo sem o menor pudor do casal. Mas ignorou e continuou a se entreter com a internet. Estava ocupado com os amigos e com as músicas que ouvia através dos fones de ouvido. Quando Pedro já estava bastante excitado, sem querer visualizou o menino, que estava bem ali ao seu lado, com o rosto iluminado pela tela do computador. Foi um pequeno flash. Sentiu-se, por fim, incomodado com aquela presença.

Pedro desceu da cama e desligou a luz. Ao voltar para o lado de Tatiana, olhou para Igor, esperando uma reação, mas não obteve. Igor continuou a teclar, mas mesmo assim não pretendia ficar ali muito tempo, pois não queria perturbar ninguém. Fechou o computador e desceu com ele. Convencido de que já tinha incomodado o bastante, Pedro dedicou atenção total para a sua companheira da noite. Porém, minutos depois, Igor reaparece no quarto e, com um pouco de esforço, puxou o seu colchão para fora do cômodo, irritando a Pedro por completo.

Igor desceu com o colchão pelas escadas e o pousou em cima do banco de madeira onde já tinha dormido há alguns dias atrás. De lá, continuou suas atividades normalmente, como se nada estivesse acontecendo. Achou até divertida a coragem de Tatiana por ter tomado iniciativa, mas não se ocupou muito com isso, pois agora poderia ficar sozinho e ir dormir confortavelmente quando quisesse. Pedro, por sua vez, não conseguiu mais ter o mesmo prazer de antes. Queria Igor ali, assistindo a tudo, ou irritado com a situação, mas não conseguiu.

Quando o relógio anunciava as quatro horas da manhã, Pedro despertou de mau humor por sentir suas pernas presas pelo corpo de Tatiana. E se tinha algo que incomodava muito o seu sono era sentir as pernas presas. Com certo esforço, tentou se livrar da garota e sair da cama. Estava ele nu, mas não se importou com isso. Enquanto descia os degraus da escada, escutou um barulho de teclas de computador. Igor, mesmo amanhecendo, ainda se ocupava com a internet. Pedro então passou a pisar ainda mais forte no chão, expressando o seu ódio por não ter provocado nada em seu rival.

Tanto na ida, quanto na volta, Igor nem mesmo percebeu que Pedro estava nu, devido ao seu desinteresse total pelo companheiro de quarto. Ele, por sua vez, foi apenas tomar um copo d’água e voltou rapidamente para as escadas. Ao passar por Igor, o olhou com atenção e notou que ele ainda estava de cueca e na mesma posição de sempre quando usava o computador no quarto. Nada mudava, nem mesmo a sua atenção. Pedro então seguiu chateado para o quarto, onde se deitou tentando não acordar Tatiana e passou os minutos que lhe restavam, antes de voltar ao sono, olhando para a cama vazia de Igor. Era como se faltasse algo, mesmo que fosse uma coisa que ele sempre odiou.

Pedro e Igor esperavam ganhar uma rotina logo, algo que fosse previsível e que acalmasse os dias que estavam por vir. Mas parece que nada queria ser monótono e não estava nas mãos deles todas essas surpresas.

- Vai fazer o que hoje, Igor?

- O que você quiser!

- Hum, qualquer coisa?

- Ah, não, sem malícia Rafinha.

- Ta bom, ta bom. Posso passar ai, então?

- Pode. Eu vou me arrumar enquanto você vem.

Igor foi então tomar banho e tentar mais uma vez se livrar da presença desagradável de Pedro, que estava na cozinha, analisando a sujeira que eles deixaram se instalar. Ele caiu em si de que morava ali e de que não tinha mais mãe ou irmã que limpasse e cozinhasse para ele. Precisava então entender que desfilar pela casa de cueca não era mais a sua única responsabilidade no casarão. Sem a menor prática, começou a varrer a cozinha. Quase em vão. Sem habilidade nenhuma de usar uma vassoura, acabou levantando a poeira e espalhando-a ainda mais. O ar ficou tão poluído que ele teve que sair um pouco para poder respirar. “Assim não vai dar certo!”. Minutos depois, ele voltou e, com um pouco mais de delicadeza, entendeu como a vassoura funcionava. Não limpou o chão de fato, mas conseguiu ao menos aprender a varrer.

Após isso, começou a limpar a pia e a mesa, tirando o pó e os restos de cimento velho. Na pia, passou um pano úmido, seguido de sabão líquido e, por fim, enxaguou. Na mesa, o mesmo processo, só que com um pouco mais de agressividade, pois era de madeira. Quando ainda esfregava a mesa, alguém bateu no portão.

- Igor? – não obteve resposta – Igor, tem gente no portão!

Seguiu então para o salão principal e conseguiu ouvir o barulho de chuveiro. Estava Igor ocupado no banho, então Pedro foi conferir quem batia a porta. Ao ver que era Rafael quem perturbava, fechou-se em raiva e foi atendê-lo, mas não abriu o portão, olhou-o entre as brechas.

- Oi, Pedro, você poderia chamar o Igor, por favor?

- Não.

- Por que?

- Porque ele não está. E se você me der licença, eu estou muito ocupado!

- Mas ele acabou de...

- Não quero saber, Rafael. Vá, porque você está me atrapalhando!

- Mas...

- Tchau.

Pedro deu as costas e Rafael, sem entender, continuou no portão, surpreso com aquela grosseria. Pensou então em ligar para Igor, que, por sorte, acabava de sair do banheiro, enrolado em uma toalha.

- Oi, Rafa, já chegou?

- Já. E você, onde está?

- Eu? Estou aqui no meu quarto.

- Pedro me disse que você não estava.

- Hã? Olha, espera aí um pouquinho que eu já estou descendo.

Desligou o telefone e vestiu rapidamente uma camiseta. Desceu as escadas as pressas e foi ao jardim. Pedro já alcançava a porta quando Igor apareceu. Eles se olharam rapidamente, mas não disseram nada. Igor continuou caminhando em direção ao portão e o abriu.

- Vem, Rafa!

Segurou-o pela mão e o puxou pelo braço. Pedro continuou ali perto da porta, parado, enquanto Igor passou por ele e entrou junto com Rafael. Subiram as escadas e foram para o quarto.

- Igor, já pode soltar meu braço? Está me apertando muito.

- Desculpa, Rafa. Senta aí enquanto eu me arrumo.

- Para onde você quer ir?

- Qualquer lugar que tenha comida.

Pedro, que agora estava duplamente irritado, também subiu as escadas para acessar o quarto. Rafael, ainda de pé, foi se sentar na cama do rival de Igor, mas foi impedido a tempo.

- Não senta nessa cama imunda. Senta ali na minha.

- Imunda?

- É a cama do Pedro. E ontem ele fez coisas ai. Um nojo.

- Coisas?

- É, transei com uma mulher. Você sabe o que é isso, viadinho? – disse Pedro ao chegar ao quarto.

Rafael o olhou com medo e depois olhou para o amigo e não sabia como reagir ou o que dizer. Sentiu-se constrangido e extremamente atacado.

- Rafael, senta ai na minha cama. Me arrumo rapidinho.

Igor não deu a mínima para a presença de Pedro e continuou a procurar roupas na mala.

- A gente poderia ir naquele restaurante que inaugurou mês passado lá na orla. Está fazendo o maior sucesso.

- É, mas dizem que, pra frequentar, a consumação mínima é de cinquenta reais.

- Besteira, queridinho, eu tenho grana.

- Ah é? Sendo assim, então vamos, porque já fazia um tempo que eu estava doido pra ir lá.

- Muito glamour, não é, senhor Rafael?

- Muito!

Pedro ouvia tudo calado, sentindo-se como mais uma das paredes naquele quarto, tamanha era a sua relevância ali. Dois gays juntos e tão próximos eram uma ameaça ao seu bem estar. Era incômodo e não sabia o motivo. Igor tirou a toalha, ficando só de cueca, em seguida tirou a camiseta e pegou duas peças de roupa.

- O que acha dessa bermuda com essa camisa?

- Ta legal, mas você vai com o tênis, não é?

- Sim, aquele ali. – apontou.

- Então vai ficar gatinho.

- Seu pai iria amar ouvir vocês dois de chamego aqui no quarto. Não têm vergonha não?

Igor então se aproximou de Rafael, puxou-o por um dos braços e o beijou na boca. O garoto ficou em choque quando aqueles lábios o tocaram e não soube corresponder. Igor insistiu, enfiou a língua dentro da boca do amigo e investiu ainda mais no beijo, abraçando-o com força. Não restou escolha para Rafael senão dar vida a farsa criada por Igor.

Pedro, que nunca tinha visto um beijo entre dois homens antes – exceto o seu com Igor – sentiu todos os pelos de seu corpo arrepiarem como se um vento frio tivesse passado. Sua boca se abriu e sílabas começaram a se aglomerar em sua garganta. Mas nenhuma palavra foi emitida. Seus olhos começaram a pesar em seu rosto e a língua ficou seca. Não apenas o coração, mas toda a sua caixa torácica era impulsionada para frente. Era um mundo novo que se abria diante de seus olhos, mas sua carne também era aberta com uma agulha de seringa, que lhe injetava medo e desesperança.

Quando Igor parou de beijar o amigo, vestiu rapidamente a roupa, sentou-se na cama para pôr os tênis e puxou Rafael mais uma vez pela mão até a porta do quarto.

- Quanto ao dinheiro, amor, não se preocupe. Eu ganhei uma comissão ótima na minha última venda, porque eu sim sei ser competente. Vamos!

Passaram pelo corpo morto de Pedro e desceram as escadas. Ganharam a rua e sumiram.

- Igor, pirou?

- Viu a cara dele? – gargalhou – Ele parecia uma estátua grega.

- Eu vi o tamanho da mão dele e do braço. Ele poderia ter nos matado!

- Matava nada. Cansei de ouvir o Pedro me ameaçando disso e daquilo. Rafa, eu não vou ser um encubado não, eu quero viver e ser feliz, eu mereço.

- Eu sei que merece...

- E então? Não vou deixar que o mundo me pare, muito menos o Pedro, que não significa nada para mim.

- Eu sei, eu entendo.

- Mas você ficou chateado comigo por causa do beijo?

- Não. Até que você beija bem, sabia?

- Tonto. Você também não é mal. Quer namorar comigo?

- Eu e você? Juntos? É, você pirou!

- Mas bem que a gente poderia dar umas beijocas assim na frente dele mais vezes, não é?

- Não. Nunca mais. Eu tenho medo dele, Igor.

- Que medo o quê, Rafa? O Pedro é um bananão, um idiota. Ele não consegue nem me destratar na frente dos nossos pais. Ele me intimidou no inicio, mas não mais.

- Você tem tanto ódio dele...

- Muito ódio!

- O que ele te fez pra você sentir isso?

- Nada... Quer dizer, ele faz essas coisas desagradáveis como hoje. Ele vive ameaçando contar para o meu pai, mas nunca conta.

- E você não tem medo disso?

- Não. Ele não teria coragem de fazer isso e, mesmo que tivesse, não vou, Rafa, já disse, não vou me frear mais. Nem pelo meu pai, nem pelo Pedro, nem por ninguém. Eu já passei minha infância toda brincando sozinho dentro do meu quarto enquanto os outros meninos da rua saíam para pular na chuva. Eu não quero mais ter medo de chuva. Se é pra se molhar, que seja o corpo todo e não só o dedo mindinho do pé!

Pedro ainda estava hipnotizado pelo beijo e continuou de pé no quarto. Olhou para a varanda e viu a luz que invadia o recinto, iluminando tudo. O que Pedro viu, na verdade, não foi um beijo comum, mas sim o beijo entre dois seres magníficos. Assim como Igor um dia o viu apenas de cueca iluminado pelo sol, Pedro assistiu aqueles dois radiando desejo, sentimento, felicidade e liberdade. O corpo dos dois tinha a silhueta desenhada pelos raios do sol e, em especial, o corpo de Igor estava ainda mais atraente após o beijo. Igor poderia ser alguém desejável. Pedro desceu as escadas, foi para cozinha, sentou-se em um dos bancos e chorou. As suas lágrimas também o ajudaram a lavar a cozinha.

O choro, contudo, foi interrompido pelo toque de seu telefone.

- Oi, pai.

- Pedro, sabe a fossa nova lá no quintal?

- Sim, o que tem?

- Veja ai pra mim, meu filho, se os pedreiros a tamparam, porque eu acho que não. Pode ser que chova e inunde.

- Mas é verão, pai!

- Mas também chove no verão, Pedro.

- Certo, eu vou dar uma olhada.

Mas não iria agora, pois estava ocupado com suas lágrimas e com o aperto que sentia no peito. Sua solidão nunca foi tão percebida como naqueles dias. Pedro era só e sabia disso, mas não se importava. Mas antes achava normal que um rapaz como ele fosse assim. Agora era diferente, pois simplesmente tudo havia mudado, inclusive ele mesmo. Seria normal que esse novo Pedro fosse solitário? Enquanto chorava sentado no banco da cozinha, o sabão que ele havia esfregado cobria toda a mesa. Com o dedo indicador, começou a desenhar em cima da espuma. Desenhou um sol, depois um coração. Passou então a escrever. Escreveu as palavras “sol” e em seguida “coração”. Seguiu com o dedo ziguezagueando sobre o sabão até que escreveu a palavra “Igor”. Mas estava tão ocupado com as lágrimas que nem percebeu. Escreveu “Igor” três vezes. Esqueceu, por fim, de cobrir a fossa.

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Comentários

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Ta quase tudo a mesma desde o inicio,ai tem uma pergunta:quando o Igor vai se ferrar?

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Ótimo como sempre,você postou cedo rs...

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Por favor mais um hoje nem que seja a noite não me deixa assim só mais um você é malvado me deixa aqui quase morrendo de curiosidade isso não é justo seu conto e um dos poucos que me fazem ficar ansioso pela continuação

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