Abel ria alto:
- Relaxa, imbecil! É só um sustinho pra você aprender que eu posso ser muito pior que você. Pensa duas vezes antes de me atacar de novo. Agora sai! - desamarrava as cordas de Felipe - Poderia até comer o seu rabo, mas isso não seria um castigo e sim um presente.
Já solto Felipe avançou sobre Abel com todo o ódio que sentia:
- Maldito! Filho da puta! Desgraçado! Vou te matar! Demônio!
Abel apontou a arma pra ele:
- Não me provoca!
- Essa merda nem tem bala!
Abel atirou na parede:
- Dá o fora daqui, Felipe.
Felipe pegou as suas roupas e saiu.
No caminho chorava ao perceber que esteve a um passo da morte. Sentia ódio e medo de Abel. Será que ele era realmente capaz de lhe matar?
Pedia carona à beira da estrada até que um carro parou:
- Ei! Tudo bem? - um homem de pouco mais de quarenta anos abaixou o vidro.
- Oi! Estou meio perdido. Você pode me dar carona até a cidade?
- Claro! Entra aí. Estou procurando informação pra chegar lá.
***
De manhã Cauê acordou dentro do depósito, olhou ao lado e não viu Joaquim, somente um bilhete:
"ADEUS, CAUÊ. PARA SEMPRE!"
- Pois que vá. Cansei. - murmurou Cauê enquanto levantava.
Janaína apareceu:
- Você dormiu aqui?
- Sim, fiquei preso, mas o guarda já abriu pra mim. Tudo bem? Você parece triste.
- Como não ficar? Ele se foi. - Janaína começou a chorar.
Cauê a abraçou forte. Sentia o mesmo que ela. A dor do abandono. O descaso. Se sentia usado. Olhou em seus olhos:
- Fica assim não, Jana! Você vai superar e eu vou estar aqui pra te ajudar.
Ficaram por um bom tempo se olhando até que Janaína o beijou.
O beijo foi rápido e logo se separaram. Sem ter o que dizer, Janaína saiu correndo. Cauê ficara intrigado. Não sabia o que sentia. Podia jurar que havia gostado do beijo. Será mesmo?
***
Dentro do carro o homem misterioso tentava puxar assunto com Felipe:
- Ei! O que aconteceu com você? Você tá um lixo.
- É, eu sei. Olha, me leva logo pra casa. Não quero falar sobre esse assunto.
Depois de uma longa pausa em silêncio:
- Posso saber o seu nome?
- Felipe. E o seu?
- Antônio.
Apesar de estar muito acabado, Felipe deu uma checada em seu benfeitor. Era ruivo, tinha os olhos castanhos e a pele bem sardenta. Um pouco gordinho, mas sem perder o charme. Quando sorria com uma pequena fenda entre seus dois dentes frontais... Era estonteante.
- Ei! Algum problema?
- Não. Só dirige. Olho na estrada!
***
- Então, Doidera? Quando você vai quitar a sua dívida? - um homem acompanhado de seus capangas confrontou Doidera.
- Eu tô com um problema com um cliente aí, mas já, já ele me paga. Eu prometo, Mangalô.
- A mesma conversa há meses. Sabe, Doidera? Minha paciência acabou. Minha droga não é de graça. Usou tem que pagar. E se você não tem dinheiro, o jeito vai ser outro...
- Não, Mangalô! Pelo amor de Deus! Não me mata! Eu vou dar um jeito.
- Acabem com ele. - ordenou Mangalô.
Os capangas de Mangalô espancaram Doidera.
- Chega! - gritou Mangalô - Quero ele vivo! Agora você, Doidera, vai atrás desse tal cliente pegar a minha grana. É a minha grana ou a sua vida, entendeu? Vá e leve meus capangas para ajudar.
***
- Mas me conta, o que você veio fazer aqui? - perguntou Felipe ainda no carro.
- Estou procurando um garoto... Afilhado meu.
- Qual o nome dele? Talvez eu conheça.
- É Abel. Conhece?
- Não! - Felipe congelou - Conheço não...
- Ah, que pena! É muito importante. Ele está em perigo. Preciso ajudá-lo.
Quem diria que a vingança de Felipe chegaria assim tão rápido?
- É muito urgente mesmo? - Felipe indagou com curiosidade.
- A cada minuto que passa fica mais. Por onde eu entro?
- Entra na direita. - Felipe havia mentido. O caminho para a cidade era pela esquerda. - Pobre Abel... - sussurrou com ironia.
***
Cauê entrou no banheiro para tomar banho. Tirou a roupa, abriu o chuveiro e, enquanto a água molhava o seu corpo, lembrava da última noite que passara com Joaquim.
Sentia seus beijos, suas mãos, o corpo molhado dele contra o seu... Porém logo afastou esses pensamentos. Joaquim não merecia nem o seu ódio.
Saiu do banho e recebeu uma ligação:
- Alô? Jana, tudo bem? - era Janaína do outro lado da linha.
- Não. Precisamos conversar.
- Pode falar. Você está chorando?
- Tem que ser pessoalmente.
- Olha se for sobre o que aconteceu hoje mais cedo, pode...
- Não, Cauê! É algo mais sério. Tô te esperando na praça.
- Ok. Tô indo.
O que Janaína queria?
***
Já era noite quando Doidera e os capangas de Mangalô chegaram à casa de Abel:
- É aqui que ele mora. - disse Doidera.
- Se for mentira, você paga com a vida.
- Tô falando sério.
Entraram pelos fundos e logo encontraram a avó de Abel na cozinha. Doidera apontou a arma para ela:
- Cadê o Abel? - Doidera gritava.
- Não sei! Meu Deus! Socorro! - dona Carmen estava desesperada.
- Cala a boca ou vai ser pior pra senhora! Desembucha! Onde ele se escondeu?
- Ele fugiu! Sumiu fazem dias! Saiu e não disse pra onde ia. - Dona Carmen tentava acobertar seu neto.
- Já que é assim, Doidera, diga adeus à vida. - um dos capangas atirou.
Doidera puxou dona Carmen para se proteger e o tiro acertou ela. Pulou a janela e fugiu.
Os capangas de Mangalô foram atrás dele deixando o corpo agonizante de dona Carmen no chão.