Império - Um final para nós dois é um grande talvez - Parte 09 - Parte 3.
* * *
Acordo assustado, não sei onde estou nem faço ideia de onde esteja. Estava tendo um pesadelo, eu estava tentando liberta-me de correntes de prata, elas me queimavam, não sabia o motivo, mas doía, doía muito. Tudo no ambiente em que estava era escuro, e algo esguio sobre quatro patas encarava-me, o local cheirava a madeira molhada e óleo queimado. Senti a coisa vindo em minha direção, e encarei aqueles olhos amarelos, e os dentes afiados de sua boca, ele soltou um rosno que me fez tremer todo o corpo, entrei em desespero logo em seguida, tentando de qualquer forma tira aquelas correntes de mim, quando sinto algo pontudo me perfurando pelas costas e atravessando meu corpo, meus olhos revirando e ficando brancos, e minha alma desabitando o meu corpo.
Respiro fundo, sentado no colchão, percebo que estou em meu quarto, suor frio escorre de minha testa e passo a parte de trás da mão direita para limpar. Minha camisa gruda em meu corpo, me deixando um pouco desconfortável, odeio isso. Minha respiração volta ao normal depois de alguns segundos, deito-me novamente no travesseiro cobrindo os olhos com as mãos.
- você acordou. Finalmente - disseram. E logo reconheço a voz, é a voz do Andrew, filho do Cláudio.
- cadê seu pai? - é a única coisa que consigo perguntar.
- ah, ele ainda está lá. Discutindo, provavelmente, ele sempre foi bom nisso, ele tem lábia. Se importa? - pergunta ele apontando para a cama, provavelmente querendo senta ao meu lado, ou quase isso. Balanço a cabeça fazendo um sinal negativo, e ele por fim se senta.
- eu pensei que ele estaria aqui, cuidando de mim. Ai - protesto levando a mão esquerda a testa. - dói bastante, matarei aquele desgraçado assim que melhorar.
- não, ele só me mandou levá-lo a um hospital e continuou lá, disse que tinha assuntos pendentes a ser tratado.
- hospital? Mas por quê? Foi tão grave assim? - pergunto incrédulo. Mas é claro que é grave bicha, você bateu com a cabeça no chão e apagou, acorda né - grita minha voz interior.
- por sorte você não sofrerá nada, o médico me informou que não foi nada muito grave. Mas que também você precisa fica em repouso, pois você pode sofre alguns desmaios se passa dos limites, e isso não será bom. - disse ele de forma calma. Ele se parece tanto com o pai. Esse sim é o verdadeiro filho dele.
- o seu tio é um louco sem escrúpulos.
- corrija-se, não é mais meu tio. Não quero ter nenhum um tipo de relacionamento envolvendo qualquer uma daquelas pessoas. Nem a minha própria mãe, se é que eu posso-a chama assim. - sua voz agora carrega um tom triste.
- ok.
- você viu o desprezo no olhar da minha mãe? Quando ela perguntou se eu era gay? Ela disse com todas as letras que estava decepcionada comigo. - ele suspira fundo e relaxa os ombros que outrora estavam carregados de pesos.
- e você é gay? - não deveria ter perguntado, sinto que ele ficou desconfortável com a pergunta.
- sou. Namoro a alguns meses, meu amigo de faculdade - responde ele com firmeza.
- uau, e o seu pai? Ele sabe disso? Precisa saber.
- não, não sabe. E também não conte a ele, eu mesmo contarei, espero que não se importe.
- não me importo coisa alguma, o segredo é seu e você tem todo o direito de conta quando se sentisse disposto.
- antes, eu achava que ele era preconceituoso, mas agora não acho mais. Ele namora um homem, namora você - corrige-se.
- todos pensam dessa forma. Eu demorei muito para se assumir aos meus pais, e por incrível que parece aceitaram numa boa, já que eles eram meio "religiosos" - faço aspas com os dedos.
- você deve ter ficado bastante feliz.
- claro que fiquei, não é todo mundo que tem essa sorte. Tipo, de se assumir e os pais aceitarem, muitos dos pais possuem origem antigas, onde um homem não pode namora outro homem, porque isso é um crime diante dos olhos de Deus. Eu não acho, nunca achei. É simples ser gay, siga em frente e não deixe que o que digam atrapalhe-o, isso é inveja da oposição que não tem coragem de ser feliz como você está sendo, não deixe que nada, nada mesmo o atrapalhe. - falo a sobrancelha esquerda.
- você é tão inteligente. Parece que viveu por anos - disse ele rindo - você é um feiticeiro? Senhor, não sei nada sobre feiticeiros. - sigo a sua risada, ele é engraçado. - eu nunca consegui fazer isso.
- isso o quê?
- isso ai, com a sobrancelha, erguê-la.
- ah, eu acho que isso varia de genética a genética. Seu pai também não consegue, e ele me fez a mesma pergunta. Já meu pai, sabia fazer é minha mãe não.
- inveja. Seus pais, eles não moram aqui, moram? - perguntou ele.
- não, moram em outra capital, moram em São Paulo. Mas eu optei por Minas, porque eu acho aqui bem mais calmo do que lá, e também tinha alguns probleminhas lá que eu prefiro não cita muito.
- hum...
- aquelas vadias, não acredito que elas fizeram isso, essas cadelas no cio. Vagabundas, putas - resmungou Cláudio entrando no quarto.
- calma pai. - pediu Andrew.
- não tem como ter calma, aquelas vadias - ele suspirou fundo e continuou - Kleber, elas conseguiram, te destruíram de vez, mas não se preocupe, vamos dá um jeito nisso. Elas estão obrigando a você pagar uma taxa de dez mil reais, ou paga ou será preso. Você não deveria ter ido lá, eu fui burro, não deveria ter tê levado. - ele encarou o Andrew - deixe-me a sós com o Kleber, filho.
Ele se levantou da cama e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si.
- você não tem culpa alguma. Eu queria está lá, eu quis ir com você, não se culpe, não gosto disso.
Ele veio até mim e se sentou do meu lado na cama, só que mais próximo que o Andrew. Entrelaçou seus dedos aos da minha mão, e me encarou, o encarei também, e seus belos olhos azuis que sempre me acalmava, não estava funcionando. Ele puxou meu queixo com as pontas do dedo, e me beijou, foi um beijo demorado, é quente.
- o William. Não sei como, mas ele conseguiu uma prova de que você estava lá, ele e o Miguel, todos, estão querendo te destruir. Todos eles querem a minha infelicidade.
- não vão - acaricio a sua mão com os as pontas do dedo direito. - seremos felizes, escreve isto.
- eu arrumo este dinheiro, e sim seremos felizes - diz ele de forma calma.
- nem pensa, eu sei como arrumar esse dinheiro, vou vender meu carro e pronto, quitamos essa dívida e nos livraremos dos problemas alheios. Viveremos felizes.
- você bateu a cabeça com muita força mesmo, está alucinando? Não, não deixei que venda o carro.
- ele é meu, então eu que escolho. Vou vender sim, e você não irá me impedi. Vou vender hoje mesmo antes que anoiteça.
- não, hoje não. Você vai ficar relaxando, e amanhã você vai lá vender seu carro.
- não, tem que ser hoje, não ando com muita sorte ultimamente.
- você bateu a cabeça muito forte, não posso sair de casa, precisa de repouso. E não, não proteste contra isso, pois são ordens médicas. - diz Andrew da porta do quarto.
- tudo bem - falo - ficarei aqui e descansarei. Vamos comer, estou morrendo de fome. Vão na frente, irei toma um banho primeiro.
- tudo bem - eles falam em coro.
Meu pai sempre me disse uma frase da qual eu não me esqueço nunca, e acho que nunca esquecerei "não deixe para amanhã, o que se pode fazer hoje". Tiro o frasco transparente com um pó branco dentro, e coloco-o no bolso, troco de roupa e passo uma água no rosto e vou para a cozinha.
* * *
Aproveito que os dois caíram no sono por causa do sonífero que eu coloquei em seus sucos. Sei que o que eu estou fazendo é bastante errado, mas eu não posso, não posso vacila, não agora. Não quando se tem alguém em sua cola, que te vigia quase vinte e quatro horas por dia, amanhã meu carro pode amanhecer o que? Com o vidro quebrado? Pneus rasgados? Isso só me custaria mais, dinheiro que eu não tenho.
Abro a porta devagar e saio, olho para trás, sinto como se estivesse alguém me observando do lado de fora da casa. Ignoro e destravo as portas do carro, entro e sigo em direção à concessionária.
Assim que entro na BR 150, começo a cantarola uma música, não lembro a banda, não lembro quem canta.
"Logo eu que nem pensava
Eu não imaginava, te merecer
E agora eu sou o dono desse amor
Eu nem quero saber porque
Eu só preciso viver
O resto dessa vida com você"
Sinto uma tontura, e interrompo-me da cantoria. Os lados de minha visão escurece, balanço a cabeça para tenta esclarece-lá, mas não parece adiantar. Aperto no freio do carro, para que ele pare, mas não é isso o que acontece, ele ganha mais velocidade.
Sinto o carro se choca com algo na estrada, e em seguida saindo do chão, como se algo o tivesse empurrando contra o vento. Sinto-o girar no ar, o carro está capotando, meu estômago pesa, meu coração acelera, não consigo para de pensar na morte. Eu vou morrer - digo a mim mesmo.
Meu corpo é jogado para fora do carro, e percebo que estava sem sinto esse tempo todo. Mas agora já é tarde demais, meu corpo gira como se fosse uma marionete na terra, depois não sinto mais chão, sinto o vento batendo em meu rosto, abro os olhos, estou caindo, morrerei afogado, vejo uma imensidão de água se erguendo a minha frente. Levo os braços para cobri o rosto, e sinto meu corpo arde ao se choca com a água.
Sinto o barulho sonolento da água em meus ouvidos, e abro olhos, estou cercado por água, minha visão escurece outra vez. E desta vez deixo que meu corpo afunde mais, e sinto meus pulmões arderem, ele estão se enchendo d'água. Fecho os olhos, e espero, espero pela morte.
* * *
Até a próxima.