- Lucas! – Igor exclamou do meu lado.
Eu estava petrificado em meio à porta. A cena que eu via era como um filme amador mal feito de qualquer cineasta brasileiro em início de carreira. Havia um cheiro horrível de vômito no quarto, Bernardo estava jogado no chão do lado da cama com toda aquela sujeito à sua volta e sua boca salivava muito.
Haviam toalhas, vasilhas com água e detergente por todo o quarto. O cheiro do vômito era de embrulhar o estômago. Impressionante foi o que me abateu naquele momento.
Eu não tive reflexo imediato. Talvez pelo choque. Eu não sei... Eu devo ter demorado mais ou menos um minuto pra tudo aquilo fazer sentido na minha cabeça e eu finalmente cair na real. Escutei o choro desesperado da Amanda da sala ao lado do quarto caminhando de um lado pro outro com as mãos na cabeça olhando pro chão.
Eu tentei evitar o cheiro. Corri e me ajoelhei ao lado do Bernardo. Tudo parecia passar em câmera lenta. Bernardo estava caído de bruços, o virei e peguei uma toalha com água com água para limpar o rosto dele. Igor ajoelhou do outro lado. Coloquei a cabeça do Bernardo na minha perna e chamei por ele. Eu não sei direito se alguém alí do lado entendia o que eu falava. Mas eu devo ter gritado como um desesperado. Chamei pelo nome dele várias vezes quase rasgando o que eu tinha de garganta pra isso. Os olhos dele estavam virados e eu só via a parte branca no pequeno espaço da pálpebra. O corpo dele tinha espasmos e um som estranho e grave saia da sua boca. Eu chorei sem saber o que fazer.
Igor como num reflexo rápido me tomou o corpo do Bernardo. Eu estava tão aéreo que não protestei, só sabia chorar e nada mais.
- Eu vou chamar o SAMU... – eu disse.
- Não. Não adianta!
Não adianta? Como assim não adianta?
- Não... Não pode ser...
- Lucas chama o Kaio! Chama o Kaio pra ir pro hospital, diz pra ele trazer o carro agora! Anda!
- Igor...
- VAI!
Ele enfiou o dedo na boca do Bernardo e puxou a língua dele. Ela estava enrolada, Bernardo estava sufocando, por isso o som do peito.
Eu levantei e corri pra sala. Amanda estava sentada com o rosto nas mãos, chorando.
Assim que saí no corredor do prédio Kaio vinha entrando.
- A gente precisa ir pro hospital. Pega o carro rápido!
Eu falei tentando não soluçar. Ele voltou correndo. Eu voltei pro quarto e Bernardo já estava na cama. O rosto e os ombros, muito sujos antes, agora estavam limpos. Igor saiu do banheiro enxugando as mãos.
- Cadê ele?
- Vem vindo... Foi trazer o carro.
Eu fui pra cama. Bernardo estava mais quieto, os olhos não abriam direito mas aquele som estranho do peito parou. O rosto dele estava meio roxo.
Se nós não chegássemos ele iria morrer. Mas o que estava havendo alí? Bernardo passa mal na festa, dois caras e a Amanda o pegam e ele vem convulsionar na casa dela?
- Lucas, ajuda o Kaio! – Igor falou. Eu nem percebi que o Kaio já havia chegado e estava tentando levantar o Kaio.
O levamos pro carro e partimos pro hospital. Se tivéssemos chamado o SAMU demoraria muito para que explicássemos tudo e eles chegassem. Era melhor agir por conta própria mesmo.
No caminho eu chorava com o Bernardo “semi-desmaiado” no meu colo e pedia pra o Kaio ir depressa até lá. Tivemos que entrar numa rua que era contra mão, mas era necessário.
Fomos pra um hospital que eu nem sabia que existia. A equipe logo veio nos atender e levaram Bernardo numa maca pra dentro. Eu vi uma mulher preparando um balão de oxigênio. Eu fiquei na sala de espera caminhando de um lado pro outro enquanto o Igor e o Kaio conversavam algo na recepção.
- Lucas, eu preciso dos dados dele.
Eu fui até o atendimento e prestei tudo que me perguntaram. Mas ficha enorme pra ser preenchida, mas ao menos ele já estava sendo cuidado. Terminei de preencher aquilo e voltei pra sala de espera com os meninos.
- Tem algo que não tá fazendo sentido aí... – Igor disse perto da porta de saída.
- O que? – eu perguntei limpando o suor do meu rosto com a camisa.
- Lucas... Porque o Bernardo iria convulsionar na casa da ex dele?
- Eu pensei a mesma coisa. Eu não sei... Ela levou ele da festa com outros caras.
Kaio saiu da sala.
- Bernardo passou mal de repente Lucas. Depois você me disse que ele toma algo controlado mas a bebida era fraca. Não explica ele passar mal assim! O que ele comeu por último antes de ir pra festa?
- Sanduiches... sei lá.
Kaio voltou com um copo de água pra mim.
- Ele tem algum problema de refluxo?
- Não... Não que eu saiba... Cadê o médico?
- Tá lá dentro com ele.
- A gente vai poder entrar quando?
- Não sei...
Ficamos quase uma hora esperando por notícias e nada. Aquilo já estava acabando comigo. Eu chorava de dez em dez minutos com medo do pior acontecer. Bernardo estava muito mal. Eu nunca tinha visto alguém assim.
- Eu não aguento mais... Ninguém dá satisfação aqui não? – Eu gritei.
- Eeei... fala baixo! Calma. O médico deve vir logo.
- Já faz uma hora Igor!
- Foi grave né Lucas! Calma!
Eu voltei a me sentar chateado. Kaio saiu pra caminhas dizendo que se não fosse iria dormir na cadeira.
Uma enfermeira veio meia hora depois.
- Quem são os familiares de Bernardo Junior?
- Eu. Eu sou... a única pessoa que ele tem na cidade agora.
Mentira. Bernardo tinha tios e primos. Mas a notícia não tinha se espalhado.
- Bom... então tudo bem. Seu nome?
- Lucas Melo.
- Só você?
- Eu sou só amigo... – Igor disse.
- Então só vocês dois?
- Sim! – eu falei impaciente.
- Me acompanhem por favor.
Passamos pelo corredor e eu estranhei o fato de não ter doentes nos corredores, nem macas espalhadas. Tudo tão organizado. Nem parecia um hospital púbico.
Ela nos levou pra um elevador. Elevador?
- Igor, esse hospital é público?
- Você queria que o Bernardo morresse esperando atendimento? Claro que não é público Lucas...
- Nós não temos como pagar!
- Relaxa. Vamo cuidar do Bernardo primeiro.
Depois daquela noite eu e Bernardo iríamos dever pro resto da vida...
- Podem esperar aqui agora. Eu chamo já. – A enfermeira entrou em um quarto nos deixando num corredor.
- Vocês são muito amigos não? Eu vi sua preocupação.
- Bernardo e eu... sabe...
Ele soltou um risinho.
- Sei sim. Eu percebi. Você tem muita sorte. Seu namorado quase morreu hoje. Ele estava sufocando.
- Eu sei... Obrigado. Obrigado mesmo. Você e o Kaio ajudaram muito. Até demais. A propósito, você e ele... são tipo...
- Sim. Somos. A gente tá junto há um tempinho. Eu ajudei porque me senti meio responsável. Eu o deixei sozinho passando mal daí descobri que dois caras o levaram!
- Eu suspeitei mesmo...
- Entra você primeiro. Ele deve tá querendo te ver. Ele mandou eu te chamar naquela hora na festa.
Eu respirei fundo.
A porta do quarto se abriu.
- Podem entrar. – a enfermeira disse.
- Vai... – Igor disse sorrindo.
Eu entrei no quarto e Bernardo estava na cama com aquelas roupas de hospital, soro na veia e com cobertores até a cintura. O rosto mais pálido que o normal. Eu me aproximei da cama e ficamos em silêncio por um tempo. Não sabíamos o que dizer.
Logo estávamos chorando. Era como se o choro fosse pra desabafar tudo que tinha acontecido nas últimas horas. Que reviravolta meu Deus!
- Lucas me desculpa... – ele disse entre o choro.
- Mas não foi sua culpa.
- Eu mandei você sair.
- Para de tentar achar um jeito... tá tudo bem. Que convulsão foi essa Bernardo?
- Eu não sei... Só comecei a passar mal. Só lembro até pouco depois que o Igor saiu de peto de mim pra ti chamar. Depois são só borrões. Minha cabeça ainda dói.
- O Igor ajudou muito.
- Eu sei. Tenho que agradecer depois.
- Ele tá aqui fora até agora.
- Chama ele.
Eu enxuguei o nariz e abri a porta. Não havia ninguém no corredor.
- Ele saiu...
- Deixa... Depois eu falo com ele.
- Depois que eu saí você bebeu algo?
- Mais um drink daquele que a gente tomou quando chegou. Mas era fraco...
- Pessoas que tomam medicação controlada não podem beber.
- Eu sei... Mas eu não bebi Lucas. Foram só dois drinks. Um deles super aguado porque eu discuti com o barman.
Ele tossiu um pouco.
- O que te deram aqui?
- Algo que me fez vomitar muito. Aplicaram esse soro aí e disseram que depois vão me dar algo que vai me fazer perder o cu de tanto cagar.
Eu o olhei assustado. Ele riu e limpou os olhos. Eu ri junto. Começamos a chorar de novo e eu abracei o peito dele.
- Fiquei com medo de você acabar...
- Já era. Passou. Pensa nisso não. – ele deu um tapinha no meu ombro.
- Te disseram quando você pode ir pra casa?
- Não. Mas eu já me sinto melhor. Só a cabeça que ainda dói.
Eu suspirei e me sentei na cama ao lado.
- Que noite viu...
- Nem me fale.
- Como a gente vai pagar isso Bernardo?
- Não sei. Vou falar com minha mãe. Você avisou pra ela?
- Não. Ainda não.
- Então deixa pra avisar mais tarde. É capaz dela pegar o carro e vir parar aqui agora.
A enfermeira entrou no quarto.
- Preciso que você tome esse comprimido Bernardo. Vai doer um pouco pra engolir porque sua garganta tá machucada da força pro vômito, mas é preciso. Vamo lá? – ela falava como se estivesse tratando com uma criança.
Rimos porque lembramos do que ele havia falado há pouco sobre o que ainda ia tomar.
- Toma aí. Eu vou chamar o Igor e dizer que você tá bem. – eu disse me levantando.
- Você tem algum gosto ruim na boca? – ela perguntou pra ele.
- Ruim é pouco.
- Então tem que tomar o laxante mesmo pra limpar o intestino por que o gosto ruim são restos da droga.
Eu estava pegando na maçaneta da porta até escutar isso.
- Droga? Restos da droga? – eu perguntei vendo Bernardo engolir o comprimido.
- O doutor vai explicar. Eu não posso falar com vocês ainda sobre isso.
- Cadê esse médico?
- Deve estar chegando.
A porta abriu e um senhor magro, muito magro e alto entrou. Atravessou a sala e colocou uns papéis em ordem ajustando os enormes óculos na ponta do nariz. A enfermeira saiu.
- Muito bem. Bernardo como se sente?
- Bem. Só sinto dor na cabeça.
- Hum... Você é o Lucas, o amigo que mora com ele, certo?
- Sim senhor.
- Eu sou o Dr. Alexandre. Eu preciso ter uma conversa séria com vocês dois. Com o Bernardo especialmente.
Nos olhamos sem entender.
- Eu vou ser direto. Não precisa ter vergonha de falar. Estamos aqui pra ajudar. Bernardo, há quanto tempo você faz uso de drogas e entorpecentes?
- Como? – eu perguntei. Ele me repreendeu com o olhar.
- Doutor eu não uso drogas.
- É normal você responder isso agora. Mas eu quero que saiba que estamos aqui pra ajudar meu jovem. Você é um menino jovem, bonito, tem uma vida toda pela frente. Não precisa estragar tudo isso com drogas.
- Doutor, eu não sei do que o senhor está falando.
- Bernardo nós encontramos facilmente no seu sangue e nos restos dos seu vômito vestígios de remédios que se tomados em quantidades altas causam dependência e entorpecem.
- Sim, eu tomo remédios controlados mesmo e eles são receitados. Só que nunca haviam me feito mal.
- Rupinol? – ele perguntou.
- Rupinol não! Eu nunca tomei isso. Tá doido?
- Os exames atestaram Rupinol no seu sangue.
- Doutor eu sei o que Rupinol faz, eu nunca tomaria uma coisa dessas.
- Bernardo, você precisa entender que há a possibilidade de clínicas de reabilitação. Elas existem pra isso. Pra ajudar pessoas a se livrarem desses vícios.
- Doutor, eu não tomaria essas coisas. Não tomaria!
- E como isso foi parar dentro de você?
- Não sei!
- Olha, você vai ter toda a assistência que precisar. Tome seus remédios, você precisa ficar em observação até o fim da tarde. Depois tem alta e pode ir pra casa. Pode sentir um desconforto no estômago nos próximos dias por conta da medicação para forçar o vômito. Não volte a aprontar isso rapaz.
- Doutor... desculpe interromper. – eu falei. – Eu acho que já sei o que houve. Eu conheço o medicamentos do Bernardo. Ele não toma isso não. O senhor acha que alguém pode ter colocado isso na bebida dele?
Ele pensou um pouco.
- Já ouvi falar que colocam pra depois poderem assaltar a pessoa. Além disso essa medicação as vezes causa amnésia.
- Entendo... – Agora sim. Tudo se encaixou. – Termine a conversa com o Bernardo. Eu preciso ir em um lugar...
- Que lugar? – Bernardo perguntou.
- Nada... Eu não demoro.
Saí do quarto. Respirei fundo de raiva. Meus olhos encheram. Agora a coincidência do Bernardo passar mal e ser justamente a Amanda quem estava lá se explicou! Óbvio!
Atravessei o corredor com passos pesados em direção à sala de espera. Eu sabia que já tinha usado e abusado dos meninos, mas eles teriam que me levar na casa da Amanda imediatamente!
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Oi oi gente!
Agora sim estamos no fim. Não demora muito não.
Drica (Drikita): O Lucas me mostrou ela um dia pra mim. Sim, ela é linda. Não deveria fazer esse tipo de coisa.
mille***: kkkkk Tenta!
Junynho Play: Ôh se poderia. Nem me lembre! Eu vi o estado que ele ficou e isso não é brincadeira. Não se faz isso.
Gossip Boy: Obrigado! Espero que goste dos próximos.
Drica Telles(ametista): Foi muito perigoso. ELe poderia ter morrido mesmo porque segundo o médico no momento da convulsão o sistema nervoso dele entrou todo em pane por conta da junção dos remédios dele mais o rupinol. Pessoas morrem ao ingerir rupinol sozinho, imagina com outros remédios tarjas pretas.
Obrigado a todos os comentários. snoob, love31, Sr. Crítico, De Souza, Geomateus, Agatha1986, esperança, Higor Melo, Jhoen Jhol, Wyllia Paes, Fernando_Mocelim, DavidH, juniormoreno.
Espero que tenham gostado do conto de hoje. Eu vou almoçar, tô saindo agora da empresa. Olha, fica aqui o meu apelo. Não aceitem bebidas nem nada oferecidos por outras pessoas em baladas e festas. O rupinol mexe com o sistema nervoso e você fica sem reflexo algum. Normalmente ele faz efeito em 30 minutos e o assaltante pode tomar o celular da sua mão e você entregar numa boa olhando pra ele porquê não tem consciência de nada.
É assim que muitos assaltos estão ocorrendo, ninguém por perto nota porque o cara chega numa boa como se fosse teu amigo e pega teus pertences na frente de todo mundo. Não há como gritar, como reagir. Você não tem reflexos. É terrível. Se você já toma outro medicamento é pior ainda, pois pode haver rejeição do corpo à droga. Além disso ele causa amnésia temporária e você não vai nem saber como perdeu tudo o que tinha no dia seguinte quando acordar jogado dentro de alguma moita por aí.
Cuidado pessoal!
Até o próximo conto. Abraço.