Essa história se passa numa época imprecisa e irrelevante, basta dizer que era um tempo em que as florestas eram muito mais selvagens, fechadas e úmidas; em que a névoa ainda era comum a todas as noites de inverno; em que os animais ferozes podiam nunca ter visto um ser humano, porque não precisaram fugir da mata para procurar comida nas cidades provincianas que começavam a se formar.
Também não importa dizer em que país essa história se passa, pois nela não haverá pátria, nem nomes, nem idioma, nem História, nem nada além de urros e pulsares.
Basta dizer que havia um homem que em meio a mata ouviu a revoada de pássaros que partia em disparada para o sul riscando o céu acima das árvores, e ele lá embaixo olhou para o alto e viu as pequenas aves partindo, que era o sinal de que o inverno inadiavelmente chegou e que aquela seria mais uma noite fria, e ele olhou outra vez para baixo no chão, porque seus ouvidos aguçados escutaram algo se mover por entre arbustos e ele preparou o galho reto e afiado que tinha em mãos para atingir a caça, mas esperou, aproximando-se sorrateiro do arbusto, espreitando, até o momento certo de atacar.
Esse homem ainda era jovem, nenhum fio branco surgira na sua cabeça, barba ou peito, aproximadamente vinte e seis anos, e que estava naquela floresta desde a mais tenra e imemorável idade, porque embora ele não soubesse, tivera no passado uma mãe assim como todos aqueles animais que via ao redor, mas ele não era como eles, sua mãe não vivia naquela mata, era uma freira que caíra em tentação e pecado, e engravidara no mosteiro que só recebia visitas poucas vezes ao ano, e que não podendo ter um filho onde vivia e não tendo para onde partir, isolou-se na torre do mosteiro e esperou dar a luz com a ajuda de algumas poucas irmãs, amamentou a criança até o segundo ano de vida (porque não queria desapegar-se dela) mas quando já não era sustentável mais aquele segredo, precisou sair escondida no meio da noite e levar a criança até o bosque, abandonando-a lá que pensava ser o mesmo que entrega-la a morte, sem saber que foi ela própria que se entregou ao fim, uma vez que, depois de voltar ao mosteiro, a consciência lhe pesou tanto que não resistiu nem até a primavera seguinte, sendo sepultada nos fundos do lugar. Mas a criança resistiu. Sabe-se lá com que desenlace do destino, a criança que já andava começou por alimentar-se de frutas das árvores rasteiras, e plantas suculentas que encontrava, sendo vista por linces e raposas e certa vez até por um puma sombrio, mas não sendo atacado, o menino cresceu, aprendeu que se quisesse mais força como os animais mais ferozes, precisava, como eles, alimentar-se de carne e ainda na segunda metade da infância passou a caçar pequenos bichos como coelhos e peixes, esquecendo de sua mãe e de toda a parca memória de outros iguais a ele que existiam em algum lugar além dali. Uma vez um lobo negro surgiu na sua frente em meio a noite, com aqueles olhos predadores e pelugem imponente, e ele pensou que era daquela espécie, porque também via em si aqueles olhos castanho amarelados, aquele ímpeto de predador e impiedade. Quando a maioridade lhe chegou, o cabelo negro cobriu-lhe o queixo, os maxilares e o pescoço de forma densa, mas acima dos lábios crescera menos, indo descer pelo tórax ao logo do peitoral que na puberdade se avantajou e desbotou os dois mamilos rosa-escuros, descendo ainda mais, pela barriga reta e marcada por magras, porém consistentes, massas musculares, de quem precisa batalhar muito para conseguir um tanto de alimento; as pernas também eram grossas e, em medida bastante menor, tinha seus pelos negros nas coxas brancas e nas panturrilhas fartas, pelos esses que ficavam menos visíveis nas nádegas abundantes, redondas quando relaxadas e quadradas quando corria e o exercício exigia delas, e mais visíveis no púbis, que descia pendurado entre as pernas, grande e relaxado como um fruto de árvore alta.
Quando chegou ao arbusto, num lance de poucos segundos, atirou o galho que lhe servia de lança e atingiu o animal que ali estava, sem chance de resistir, era um cervo gordo e vistoso. Precisou ainda acertar-lhe mais algumas repetidas vezes com a ponta do galho para conseguir matar o animal, que seria seu alimento pelos próximos dias. Quando conseguiu, seu corpo tinha respingos de sangue e a adrenalina nas veias fizera com que o pau inchasse um pouco de excitação, embora não o bastante para que endurecesse.
A noite se aproximava, o céu nublado já mudava seu tom de um cinza para outro, um pouco mais sombrio, e ali o frio vinha com grande intensidade. Arrastou o alimento pelas patas traseiras, fazendo grande força e exercitando muito o corpo em sua complexa musculatura, por isso os braços lhe eram tão fortes e vigorosos, por isso as costelas eram macias e rijas, por isso os pés tinham tanta flexibilidade e força, com dedos de cabeças grossas.
Chegou até o rio mais próximo e deixou o alimento na margem para entrar na água e se banhar, se estivesse sujo de sangue poderia atrair predadores durante a noite. Depois, com as força das mãos rasgou a pele do animal e passou a separar as carnes que podia comer das que não podia, lavou-as na água limpa e gelada e partiu na direção da grande árvore que tinha entre suas raízes uma discreta reentrância, formando uma caverna, que servia de morada para ele.
Quando a noite caiu acendeu uma fogueira do modo que aprendera ainda na adolescência, ao ver um raio dizimar uma árvore e como aquilo gerara um confortante calor, além de afastar os animais. Nas beiradas da fogueira deixara a carne crua porque gostava da casca queimada e crocante que aquilo gerava, sob seus olhos castanho-claros, quase amarelos, que não perderam a inocência diante do que parecia ser uma vida insustentável, a chama ardia e ele estava feliz e ansioso.
Mesmo com o cheiro bom espalhando-se pela mata, nunca animais ferozes se aproximavam porque aquela região havia sido marcada por ele ao longo dos anos, matara muitos que tentaram pegá-lo desprevenido e aos poucos os ataques foram ficando mais raros, até que praticamente se extinguiram.
Mas.
Outra vez seus aguçados ouvidos perceberam a aproximação de algo e ele se levantou, olhando atento ao redor. Curiosamente, o animal que se aproximava não parecia querer ser discreto, pisava com força nos galhos do chão e movia arbustos de modo visível. Pegou o galho afiado e se preparou para ataca-lo, quando para sua surpresa viu por fim a identidade de quem se aproximava, e que não era um animal como os outros, parecia-se muito com ele, embora não fosse idêntico, andava em duas pernas também e tinha pele com poucos pelos, mas esses pelos eram claros, dourados e existiam em muito menor quantidade pelo corpo, outra diferença era a estatura um tanto maior, os músculos mais desenvolvidos, e a pequena tanga de pele de urso que vestia como uma cueca em seu corpo, cobrindo apenas as genitais. Esse outro homem estava ferido, um grande corte descia desde a o principio do peito direito até o primeiro osso do quadril, e sangrava bastante por ali.
O lobo (vamos chamá-lo assim, diante de suas características), não sabia se devia atacar alguém já ferido ou se queria fazer isso a um semelhante, permaneceu com o galho na mão, levantado, porém sem coragem de seguir adiante. E o outro, cambaleou mais um pouco, tentando chegar até a fogueira provavelmente, mas caiu na metade do trajeto, devido ao ferimento, e acabou por desmaiar.
O lobo decidiu que seria melhor ajuda-lo em vez de mata-lo. Foi até ele e arrastou-o pelos braços para dentro da árvore onde se abrigava, tentava com a mão conter o sangramento do corte mas não conseguia, felizmente com o homem deitado o fluxo diminuíra um pouco, ele estava suando e o lobo passou a mão pela sua testa para seca-lo, depois a mão deslizou pelos grandes músculos do peito que também estavam encharcados de suor e a mão do lobo ficou cheirando a leão.
O cabelo loiro estava sujo de terra, a barba cheirando a suor e pele, os músculos das coxas e dos braços cheios de veias latentes devido ao grande exercício que praticara para chegar até ali. O lobo aproximou-se da tanga do outro sem entender para o que aquilo servia, pensava que era mais uma diferença entre o corpo dos dois, mas se surpreendeu quando viu que podia tirar aquela vestimenta do outro e quando o fez se deparou com o pau mole do seu semelhante, cheirando forte assim como o seu as vezes cheirava, mesmo em repouso era grande e ia até o umbigo, com a cabeça protegida pela pele, e o lobo tocou naquele órgão, segurou-o com a mão direita para analisa-lo, e com a mão esquerda segurou seu próprio pau, querendo saber se o homem inconsciente podia sentir a mesma sensação boa que ele sentia quando se tocava daquele modo.
Mesmo desmaiado, o leão se contorceu um pouco, seu pau deu um pequeno pinote. O lobo começou a fazer movimentos de vai e volta para revelar a cabecinha rosada e esconde-la outra vez, e fazia o mesmo em si próprio. A boca do leão se abria e dentes pequenos se mostravam rangendo de prazer. Suavam. O lobo já não conseguia ir devagar, e pela primeira vez ele foi além naquela brincadeira de tocar-se em si próprio, e acelerou o movimento, tanto mas tanto que o leão abriu um pouco os olhos e mesmo debilitado segurou a mão do lobo e o fez punhetá-lo mais forte, mas rápido, mais intenso, até que gozasse todo em cima do seu próprio peito, e depois o lobo gozou também, gemendo, uivando, e caiu deitado ao lado do leão ferido para descansar e o leão com seus olhos verdes olhou turvamente para o rosto do lobo, passou de leve a costa das mão pelo rosto para ter certeza de que era real o que via, depois fechou os olhos outra vez, desmaiado.
Algum tempo depois, o lobo saiu da toca para pegar a carne que estava no fogo e traze-la para dentro, apagou a chama batendo nela com galhos molhados, e comeu um pouco, deixando mais da metade para o leão que repousava ali. E ficou a noite toda velando o seu sono, as vezes tocando-lhe o peito para ter certeza se ainda estava respirando. Estava. Sobreviveria.
O leão sonhou de forma febril, era-lhe um pesadelo lembrar de tudo o que acontecera: quando ainda era criança, sua mãe ficara viúva de um dia para o outro, tendo seu pai falecido de um mal súbito, na vila em que moravam não havia outro parente para ampara-los e logo ela teve que arranjar alguma forma de conseguir dinheiro, procurando a coisa mais fácil de se vender, o corpo. No começo não foi difícil encontrar homens jovens ou velhos, solteiros ou casados, que seguissem até a sua casa e lhe pagassem alguns tostões de bronze para tê-la, e o pequeno menino ficava escondido num canto da casa, porque sua mãe não queria que os homens o vissem nem que ele os visse. Não demorou porém e uma das esposas desconfiou que o seu marido estivesse indo visitar a viúva da cidade, e tratou de denunciá-la como meretriz, o que era algo inédito na pequena vila e condenável com a morte segundo as mulheres de família. Pegaram sua mãe na sua frente, arrastaram-na para a praça e ele viu quando a amarraram num tronco de madeira, iriam chicoteá-la até a morte, ou apedreja-la ou qualquer crueldade do gênero, o pequeno já contava seis anos, já sabia falar e correr, e quando viu o rosto de sua mãe para ser morta, notou que os lábios moviam-se dizendo para que fugisse, e foi ela dizer isso e uma das mulheres de família viu o menino e gritou que era filho da meretriz, que não tinha pai, que era fruto daquela imundície e merecia morrer também, e quando alguns homens correram em sua direção ele fugiu, embrenhando-se na mata até um ponto que já não saberia voltar, e quando percebeu que estava para anoitecer e estava perdido e sozinho chorou, a primeira noite passou encolhido e só no dia seguinte que suas lágrimas secaram, tentou construir com palha uma casa igual aquelas que conhecia da cidade, mas era muito novo e fraco e acabou por dormir embaixo da chuva na segunda noite, e na terceira passou fome, e na quarta passou frio. Demorou muito para que conseguisse se adaptar minimamente, aprendesse a pegar peixes, colher frutos e raízes, mas sobreviveu. Depois, já na adolescência, percebeu como seus músculos ficavam maiores quando fazia exercícios puxados, seja correndo de algum predador ou esforçando-se para arrastar um animal pesado, e isso o deixava mais forte, então começou a fazer exercícios de propósito depois das refeições, longas horas de corrida e intensos movimentos de braço e peito, porque sabia que na natureza força era tão importante quanto esperteza. Aos vinte e cinco anos já era um homem grande, robusto, com a barba dourada e o cabelo loiro, tinha mais feições animalescas que humanas, mas os olhos não eram selvagens, neles havia uma consciência, uma fragilidade que as dificuldades do bosque não puderam arrancar, e foi quando apareceram aqueles homens em excursão pela mata. Era um circo que fugira de uma cidade por não querer pagar a devolução do valor dos ingressos depois de um show medíocre, e o leão pensou que aqueles homens, seus semelhantes, iriam ajudá-lo e correu até eles, que assustados não reagiram na hora, mas depois o enganaram e amarraram e o prenderam numa jaula como um atrativo do circo, o homem selvagem. A mulher do dono do circo ficou surpresa e encantada com o porte e o tamanho do pau do selvagem que a essa altura ainda ficava a mostra, e seu marido percebendo a forma com que ela olhava para o homem e seu membro, tratou de arranjar uma tanga para que vestisse, o que não bastou para cessar o desejo da mulher, que mais tarde, no meio da madrugada foi nua até a jaula e tocou no rosto do leão que dormia e ele acordou assustado, fez um carinho no rosto dele para ver se o excitava, mas o leão olhando para o corpo dela não sentia tanto desejo, talvez porque a mulher não era mais tão jovem nem bonita, ou talvez por outro motivo, e antes que ela pudesse tocar no pau no qual queria sentar, ele se levantou a empurrou e saiu pela porta que a mulher deixara aberta, e ela gritou e todos acordaram e a viram nua e sabiam o que ela estava querendo, inclusive seu marido, que foi quem tirou a faca do cinto e conseguiu alcançar o leão e lhe fazer o corte, fazendo com que corresse sangrando pela floresta, seguindo o cheiro de carne sendo assada em algum lugar ali por perto, onde uma fogueira ardia.
O leão acordou na manhã seguinte se sentindo melhor, olhou primeiramente para o ferimento, que estava limpo e se fechava aos poucos, visivelmente o homem que o ajudara havia passado a noite limpando o sangue daquela região e pressionando-a para facilitar as fibras na cicatrização, mas o leão sabia que se levantasse acabaria abrindo a ferida outra vez. Olhou ao redor e viu seu benfeitor, o lobo, dormindo num canto, de costas para cima, com a cabeça recostada nos próprios braços. A bunda era cheia e parecia muito macia, o leão passou um bom tempo olhando para ela, como a perna direita do lobo estava dobrada e a esquerda esticada o anus ficava a mostra, protegido pelas musculosas nádegas, e o pau do leão reagiu a seu desejo, o leão tentou ajeita-lo na tanga, mas não conseguia ficar confortável e decidiu por rasgá-la de vez, ficando nu e percebendo o quando estava ereto com a situação, o pau pulsava, grande como um braço. Mas não queria tocar-se como o lobo fizera na noite anterior, não sabia que aquilo podia ser feito por ele próprio, julgava que um prazer tão grande como aquele só podia ser sentido se fosse dado por outra pessoa, então voltou-se para o outro lado, encontrou o alimento que o lobo deixara ao seu alcance e alimentou-se, deixando que o pau voltasse a amolecer.
Horas depois o lobo acordou, o leão estava esperando ansioso para que isso acontecesse e quando o lobo abriu os olhos a primeira coisa que viu foi a felicidade nos olhos do outro. Sem roupas seus corpos se mostravam um para o outro sem disfarce, os mamilos do lobo eriçados com pequenas bolinhas ao redor das esferas principais, o pau do leão subitamente desperto embora ainda não ereto, tinha metade da cabeça rósea voltada para fora o prepúcio. Hálito condensado escapando das bocas.
O leão ia se levantar para mostrar que já se sentia melhor, que se o lobo quisesse poderia mandá-lo ir embora. Mas o lobo o impediu, tocando-lhe o peito e o mantendo deitado. Apontou a ferida do leão, que já parecia melhor, porém longe de ter cicatrizado. O leão tocou a mão do lobo que tocava seu peito, segurou-a, e os olhos amarelos e verdes cruzaram-se por um segundo, num agradecimento da parte do leão que até então não conhecera naquela floresta ninguém que o tivesse ajudado; puxou a mão do lobo para cima, deslizando-a pelo seu tórax de leve, até que chegou ao seu rosto, ainda de olhos bem abertos, sentindo o toque do outro na face, nos lábios, cabelos, pelos, deslizando de leve pelos afiados dentes. O momento duraria muito mais se o lobo não tivesse um instante de distração em que notou que já não havia comida nem água por ali, e estando ferido o leão precisaria se alimentar muito mais.
Apartou-se dele e deu as costas para ir caçar outra vez, no que ouviu um resmungo magoado do outro, que não entendia porque ele estava indo embora, e o lobo virou-se, pegou a lança num dos cantos, aproximou-se outra vez do leão e tentando dizer-lhe que estava tudo bem, que voltava, não iria demorar, só precisava conseguir alimento, mas sem saber usar palavras para expressar isso tudo, apenas acolheu a cabeça do outro num abraço, enterrando seus dedos no cabelo dourado e deixando o rosto do leão grudado a seu peito, que o leão cheirou profundamente e tocou os lábios com vontade não de comer, mas de sentir, de provar, de encontrar um outro modo de consumir, um modo que não ferisse, apenas invadisse, porque o leão sentia a necessidade de ter aquele outro, de possuir-lhe, tornar-se algo dentro de algo, e ele também não saberia explicar nada disso, porque não era com palavras que sentia, era com o corpo, o corpo. E seus braços abraçaram o lobo também, rodeando-lhe as costas nuas e aproximando-o mais. O espírito selvagem dentro do leão rugia e uma mordida de leve causou um arrepio no lobo. Mas ele tinha que caçar e se afastou outra vez, agora sem olhar para trás.
O céu do inverno ainda cinza e os animais um pouco mais magros, por isso o lobo não atacou o primeiro cervo que viu, precisava encontrar um que fosse maior, que pudesse alimentar a ele e ao leão. Enquanto procurava sua cabeça vagava longe, imaginando o que poderia ser isso, essa força que o arrastava em direção ao outro, o drenava como se fosse outro principio básico do qual não podia fugir assim como alimentar-se ou dormir, o leão era algo que ele precisava para continuar dali em diante. Por quê? Não sabia. Só sabia que parecia estar queimando quando estava próximo dele, deixando a barba dele ralar seu peito, os braços grossos dele enlaçá-lo, seu corpo todo toca-lo, queria mais mas não sabia por onde conseguir, que via do seu corpo poderia permitir mais do leão em sua vida. Um dos grandes cervos bebia água na beira do rio e quando foi perfurado pela lança caiu sobre a água e seu sangue misturou-se a corrente, fluindo.
Naquele dia e nos dias seguintes o lobo cuidou do leão, comiam e bebiam juntos, o lobo sentado ao lado do leito que o leão repousava, as vezes tocavam-se na barriga ou no braço para tentar mostrar alguma coisa para o outro, às vezes pegavam-se olhando um para o outro, as vezes sonhavam um com o outro, abraçando-se tão apertado a ponto de fundir-se numa só pessoa, completa. Às vezes velava o sono do leão e tinha vontade de subir em cima dele e ficar lá, sentindo-o grudado.
Mas com o passar dos dias a ferida do leão finalmente cicatrizou completamente e ele já podia andar, correr e tudo mais de antes. Nada os mantinha unidos agora, e ainda assim eles saiam de manhã para caçar cada um numa direção e voltavam todos os dias para a caverna, felizes em ver um ao outro.
Certa vez, sem querer, o cotovelo do lobo resvalou no pênis do leão enquanto os dois comiam sentados, como nenhum dos dois pensava naquela parte do corpo com algum tipo exclusivo de pudor, o cotovelo continuou lá, e o leão olhou para o lobo enquanto este, que não percebia nenhuma diferença, continuava comendo. O leão então pegou a mão do outro, besuntada na gordura da carne que comiam, e a pos firmemente no seu pau, como uma vez o lobo havia feito por vontade própria mas que nunca ousou repetir. E a mão do leão guiava os movimentos do lobo, para cima e para baixo, olhos nos olhos, pegou o pau do lobo também, eram iguais, sentiam a mesma coisa e podiam provocar um no outro os mesmos abismos. Quando o pau do leão endureceu já mal cabia na mão do lobo, que parecia muito menor diante dele, embora também fosse dono de um grande membro.
O leão urrava com os lábios cerrados e o lobo arfava de boca aberta, as mãos ficavam mais ágeis, brincavam, se permitiam, e num ultimo momento, quando a vontade de estourar estava chegando, o leão não soube agüentar e se jogou sobre o outro, deitando-se sobre ele, e olhando de cima para o rosto do lobo, seu lobo, enquanto a mão do lobo continuava a toca-lo, o pênis do leão foi se ajeitando harmoniosamente para perto da bunda do lobo, sem tentar penetrar, e o gozo se aproximava do lobo também, que com sua mão livre apertou o braço do outro, os músculos das costas, arranhou as costelas. Rosnaram chegando ao ápice e gozaram um no outro. Pela primeira vez o orgasmo de ambos despertos e conscientes, o último prazer. Suados, deixaram seus corpos se aninharem respiraram no ouvido um do outro, sentindo o cheiro um do outro, até chegar à satisfação.
Tomaram banho de rio, água gelada e cristalina. Sentiam-se mais íntimos que nunca, as vezes tocavam no pau um do outro por baixo da água, o leão apertou a bunda do outro e deixou marcas vermelhas das pontas dos seus dedos. Riam e brincavam sob o olhar de animais camuflados na mata, voltaram para a caverna e pegaram no sono mais cedo que de costume.
No dia seguinte o lobo procurava pescar no centro do rio corrente, lançando sua lança com precisão nos peixes que atravessavam seu caminho e enquanto isso o leão seguiu para um ponto mais profundo da mata, onde procurava algum animal cujo sabor eles ainda não conhecessem e no meio desse trajeto deparou-se com um gigantesco campo aberto a poucos quilômetros de onde a caverna ficava, era uma planície natural revestida por um tapete de grama alta onde viviam pacatamente algumas dúzias de cavalos selvagens, animal que ele já tinha visto carregando as carruagens do circo que o prendera, mas esses aqui eram diferentes, eram livres, sem marcas de chibata nem medo nos arregalados olhos, e o leão mal caminhou pela grama que passava da altura dos seus joelhos e decidiu que não iria matar nenhum deles para comer, aqueles animais eram a vida pura, em sua forma mais bela e selvagem, e mata-los seria sacrificar essa beleza toda, então apenas os observou por alguns minutos, embasbacado pela imponência deles, e viu quando um cavalo branco, de crina lisa e dentes brilhantes, subiu nas ancas de um outro, cavalo marrom, que relinchou mas sem muita resistência, de onde estava, o leão não via o sexo dos animais, porém compreendeu o cruzamento deles e o quanto aquilo era importante para a vida de ambos, o cavalo branco era certamente pesado e ainda se apoiava no marrom que também recebia-o inteiro, até que minutos depois acabou e eles correram na mesma direção, na direção do leão, que não fugiu nem se amedrontou com a proximidade deles, continuou em pé no mesmo lugar, e os cavalos passaram próximos do seu corpo, o marrom de um lado e o branco do outro, a centímetros de distância. Naquele dia, só comeram os peixes que o lobo pescou.
Depois de comerem novamente se lançaram ao rio, o que já estava tornando-se um habito diário porque lá enquanto nadavam, sentiam a estranha sensação de mais liberdade, de poder tocar mais no corpo um do outro, de poder sentir melhor o verdadeiro cheiro um do outro, pele e pelo, e num momento em que o lobo estava mergulhando sob a superfície por entre as pernas do leão, algo que ele gostava muito de fazer, o leão o pegou pelas pernas, abertas e firmes, bem a sua frente, e a cabeça do lobo emergiu primeiro e olhou para trás para ver o que o seu companheiro estava fazendo, depois seu corpo todo foi surgindo da água, primeira as massas circulares da bunda, duas montanhas com um rio preenchendo o desfiladeiro do centro, depois as costas, e assim o seu corpo formava precisamente o formato de uma tesoura, que o leão segurava e controlava, e os olhos verdes do felino ardiam vermelhos pela água gelada e a gana de possuir, e ele foi puxando as pernas do lobo para trás, trás, trás, encaixando-se assim no centro daquela tesoura, seu corpo precisamente posto no espaço entre a bunda e o saco do lobo, sentindo as pernas um do outro, e o pau duro do leão foi procurando seu caminho, o norte, e alcançando o rego do lobo por cima da água, sendo muito bem aceito pelo lobo que se abria com esforço, enquanto ainda estava flutuando na água, sendo segurado pelo leão para não vagar a deriva, e o pau ia e voltava no rego, abrindo e fechando a pele do prepúcio, mostrando e escondendo a cabeça rosada e brilhante, e a mão direita do leão soltou a perna do lobo para segura-lo pelo baixo ventre e empinar sua bunda, revelando assim o cuzinho róseo e fechado, e o pau foi tentando invadir-lhe do modo que o leão já imaginava ser a saída para essa fome de lobo que ele vinha cultivando desde que o conheceu. Mas a medida que a cabeça tentava entrar era preciso que o lobo se segurasse em alguma coisa para ficar parado, mas ele estava boiando e o impulso acabava jogando-o para frente embora ele também quisesse, muito, ir para trás, deixar entrar, aceitar. E o leão então o levou até uma das margens, sobre uma rocha plana e circular e o deixou deitado de rosto para cima para que pudesse ver seus olhos e as pernas abertas, por onde retomou o seu encaixe, e dessa vez o atrito foi vencido e o membro começou a invadir o cuzinho, penetrar, tomar, dilacerar, apropriar, fincar sua bandeira em novos territórios, e o lobo abriu a boca de dor mas também abriu as pernas de desejo, e foi se permitindo, passi (onalmente) vamente, até que as coxas gigantescas do leão alcançaram sua bunda, e o leão ergueu a cabeça para o céu, dentro, finalmente seu, aquele corpo, aquela vida, retirou o membro quase todo e o meteu outra vez, com velocidade, estocando o som de choque, impacto, os olhos do lobo marejados, as abas da bunda abertas ao limite para acolher o membro tão grande e impiedoso, do seu leão, seu gigante calado, seu selvagem de olhos de menino. Indas e vindas, vai e vem, bunda, perna, braço, peito, unha, arranhão, olhos, luz. S E X O . O leão deitou-se sobre o lobo, tirando-lhe o ar com seu peso, continuou metendo com força, urgência, majestade, cervos, cavalos, touros, dinossauros. Sua boca mordia de leve a bochecha do lobo e o lobo mordia forte seu ombro, a ponto de marcar a pele, as mãos do lobo tão fortes sobre as costas do leão que linhas vermelhas ficaram riscadas de alto a baixo, o leão olhou para o lobo arfante embaixo de seu corpo, seus lábios rosados úmidos ainda, e segurou com os dentes o lábio inferior do lobo, puxando-o, depois o lobo segurou o seu lábio superior para em seguida os lábios todos se cruzarem de vez, permitindo acesso às línguas, lábios rosa grudados, mamilos rosa grudados, pênis de cabeça rosa e ânus de porta rosa grudados. Mais de uma hora segurando a explosão com medo de que ela levasse à morte, e o leão conseguiria segurar ainda mais se não tivesse percebido o rosto do lobo ficando mais úmido, e sua mão acariciando o próprio pau, pronto para gozar, e por isso o leão se permitiu gastar-se todo numa explosão estelar, depois juntar os cacos em sua supernova azul, mais três fortes estocadas para o lobo gozar como nunca, e a partir daí mais uma para que o mesmo acontecesse ao leão, que se plantou em liquido dentro do outro e desabou, arfante, nunca tão semelhante a um leão de verdade, e o lobo deslizou sua mão pelas costelas do outro, suas grandes costas cheias de músculos de ferro agora tão frágeis como as de um filhote bezerro, e teve vontade de ampara-lo, adota-lo, como tivera quando tratou de seus ferimentos, e tê-lo sob sua proteção, ou talvez sendo protegido por ele, pelo resto da vida.
O inverno caminhava para o fim, dali a poucas semanas uma primavera viva incendiaria a floresta com suas cores quentes e seus pequenos pássaros para o norte, enquanto não acontecia, o leão e o lobo experimentaram o que havia de mais intimo entre dois seres vivos, a partir daquele dia no rio, eles passavam pelo menos duas horas por dia provando dos limites, sempre ao acordar e antes de dormir, o leão experimentava formas cada vez mais intensas de se chegar ao âmago do outro, o que só aumentava a sua fome e fúria, a cada dia mais precisavam intensamente do outro. O lobo também domou o leão algumas vezes, sentiu as grandes massas do corpo do leão a sua disposição, sentiu o felino gemendo sob o julgamento do seu pau, como ele também gemia para o outro.
Certa vez o leão decidiu levá-lo ao campo dos cavalos selvagens, que foi o lugar onde entendeu a forma de chegar dentro do outro, porque secretamente o leão também queria provar do lobo lá, naquele lugar, onde vira animais do seu porte mostrando a resposta para o que ele buscava, e assim mostrar que também era um deles, também tinha seu dono e sua propriedade, e ainda assim era livre, como aqueles cavalos.
Em meio ao campo nenhum cavalo se assustou com a presença dos dois, nus, caminhando pela grama, e o lobo muito deslumbrado pelo lugar mal percebeu quando o leão a sua frente deitou-se no chão, então olhou para ele, esparramado na grama, lindo e jovem, de pele dourada mesmo há semanas sem sol, com o pau já duro erigido como um eucalipto na planície da floresta, alto e perfumado, belo e imponente, o leão das árvores, e o lobo deitou-se sobre ele, e o beijou todo, a extensão do rosto e tórax, os circulo maiores e menores do peitoral, barriga, costelas, pelos e pau, que ele lambeu e chupou pela primeira vez, de um modo que quem visse acharia diferente do que se faz normalmente, mas ninguém via, não importava os outros, eles acharam a sua própria forma de fazer as coisas, desceu pelas coxas, joelhos, pernas, panturrilhas, calcanhares, pés e dedos. O leão girou o corpo e o jogou no chão, deitado, repetindo o mesmo ritual que recebera do lobo, com a mesma paixão, e a única exceção era a de que depois de terminado ele voltou para o centro do corpo do outro, levantou as suas pernas e também provou da sua farta bunda, beijos, línguas, dedos, arrancando suspiros do outro.
Cavalos passeavam por muito perto quando o leão começou a entrar no lobo com seu pau irrigado por veias azuis, vivo, um músculo trabalhando na máquina do ser, e entrava ainda dolorosamente porque o leão aprendera muito e já sabia fazer o pau entrar mais devagar, fazer o lobo sentir aos poucos seu corpo ser preenchido, e assim ter tempo de mordê-lo com sua bunda voraz, fazendo latejar de prazer, e quando estava todo dentro seus rostos ficaram frente a frente, vis-à-vis, apenas tocando a ponta dos narizes, e o lobo sorriu, fazendo abrir assim um sorriso também no rosto do leão, beijou seus dentes, o leão massageava o pau do lobo e subia e descia de corpo inteiro, como se fizesse flexões de um braço só, suando e cheirando seu cheiro mais característico, músculo e pele, cabelo e barba.
Ao longe, relinchos.
O lobo, com uma força que não sabia de onde tirou, voltou para cima jogando o leão na grama, que sorriu surpreso, com o pau ainda muito bem encaixado, e o lobo cavalgou nele, com força e desejo, cavalgou no seu leão, o seu garanhão, com as costas sujas de grama, as mãos sobre o tórax do leão que fechara os olhos, cavalgou olhando ao redor, o rosto um pouco acima da altura da grama, os cavalos a vista, em todas as direções, com alimento de sobra eram fortes e gordos, serpentes de vento rodeando-lhe o rosto e o corpo, cavalgou tanto tempo que sentiu o gozo vindo, aproximando-se cada vez mais, e o leão sentiu seu pau ser massageado pela bunda em movimentos nervosos, e isso o excitou e puxou também seu gozo, fazendo com que jogassem o rosto para cima e vissem juntos a luz do sol surgindo por entre as nuvens sobre eles, e por um instante se cegassem pela luz e pelo orgasmo, e o lobo deitou-se ao lado do leão, de olhos fechados, saboreando o silêncio de ter o corpo totalmente satisfeito, silêncio esse que só foi interrompido segundos depois, de forma uníssona e antinatural. Um som. Um disparo. Abriu os olhos e notou ao seu lado o leão ferido no peito, um pequeno furo sobre o pulsante coração, sangrando, e o lobo olhou ao redor e viu ao longe, no fim do campo, sobre uma árvore, um outro homem, que não parecia com animal da floresta, era um homem-homem, com uma espingarda em mãos, e o lobo não o reconhecia, nunca o vira antes, por isso nunca saberia que aquele era o dono do circo que viu sua autoridade e respeito acabarem quando sua mulher o desgraçou, e que jurou que a mataria, como de fato o fez, assim como o homem-fera, o homem-leão, que na sua cabeça era tão culpado quanto ela, e que vinha procurando-o na mata esse tempo todo e que quase o matou da primeira vez que o viu nesse mesmo campo, semanas antes, mas não conseguiu por não ter mira, ainda assim continuou aqui, esperando, sabendo que um dia ele voltaria, e aí sim teria sua vingança.
Mas o lobo não sabia de nada disso e só viu o seu leão já morto com o tiro certeiro, e no principio não acreditou que estava mesmo findo, mas depois que compreendeu isso chorou e chorou e chorou sobre o corpo do leão, esperando que algum daqueles cavalos que corriam em disparada assustados com o som do tiro passasse por cima dele e o matasse também, o que não aconteceu, passaram todos muito perto mas sem tocá-lo, e sumiram para longe, deixando o lugar silencioso outra vez, a exceção do choro do lobo, que fechou os olhos de dor e não viu as outras janelas se abrirem nas nuvens do céu, trazendo mais luz para o campo, onde logo nasceriam girassóis, o inverno também morria. E a única coisa que o lobo fez foi uivar, um uivo como nunca antes dera, profundo e cortante, que foi ouvido e compreendido por todos os demais animais da floresta, pois era uma mensagem de dor sem palavras, palavras que o lobo nunca aprendeu e nem precisava, mas se pudesse aquele uivo ser traduzido para línguas humanas seria algo como:
– Para sempre, meu amor, meu leão...
fim.
"...eu serei forte como a alma de um animal e quando eu falar serão palavras não pensadas e lentas, não levemente sentidas, não cheias de vontade e humanidade, não o passado corroendo o futuro!, o que eu disser soará fatal e inteiro!"
Clarice Lispector, Perto do Coração Selvagem.
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PRIMEIRAMENTE, A QUEM ESTIVER LENDO ESSA NOTA NO FIM, MUITO OBRIGADO PELA LEITURA. EU SEI QUE NÃO ESCREVO "NORMAL", POR ASSIM DIZER, E QUE MUITA GENTE DEVE TER DESISTIDO ANTES DA METADE, JÁ TENTEI DEIXAR O MEU JEITO DE ESCREVER MAIS SIMPLES E LIMPO, MAS GERALMENTE ACABO VOLTANDO A ESSE ESTILO MAIS REBUSCADO, POR ISSO SEMPRE TIVE MUITA INSEGURANÇA EM MOSTRAR MEUS CONTOS, MAS EU VI QUE AQUI NO SITE PESSOAS QUE ESCREVEM DE FORMAS DIFERENTES SÃO SEMPRE BEM-VINDAS, POR ISSO DECIDI POSTAR AQUI ESSA HISTÓRIA, E VOCES DEVEM IMAGINAR O QUANTO É IMPORTANTE PARA MIM SABER A OPINIAO DE VOCES SOBRE O TEXTO ACIMA. DESDE JÁ AGRADEÇO MUITO!