O caso todo era meio nebuloso, mas levava a crer que se tratava de uma overdose por cocaína. Tony soube que na véspera do Ano Novo, o Zeca esteve em diversas festas com amigos, onde certamente deve ter cheirado à vontade, se preparando para a virada do ano. Antes do horário da passagem de ano, ele desapareceu das vistas da familia, porem em meio à algazarra dos festejos tno hotel onde estavam, poucos deram pela sua falta. Quando foram procurá-lo era mais de meia noite e ele estava caido em frente à cama, morto por parada respiratoria. Encontraram sobre a pia do banheiro um pouco da droga usada, uma cédula de dólar feito como canudo e nas coisas dele na mala cerca de cem gramas de cocaína num saquinho.
A familia estava tentando abafar o caso para a imprensa, já que eram da alta sociedade, mas se Tony sabia daqueles detalhes, provavelmente outros tambem sabiam. Os pais do Zeca se diziam "perplexos", pois nunca perceberam nada, e ouvindo aquilo eu pensava na solidão abastada daqueles garotos que de certo modo podiam sofrer sozinhos sem que quase ninguem percebesse, nem mesmo quem convivia com eles.
Alex veio naquela noite e escutou a historia toda, estarrecido como eu fiquei. A nuvem escura que pairou em nós aquela vez em Ilhabela, como num prenúncio do pior , tinha de fato desabado sua tempestade e o que restou daquela noite em minha casa foi um silencio lúgubre, prolongado, escuro como uma catacumba. Nao houve LPs tocando nessa noite, nem baseado, nem uisque, nem risadas. Tony se foi mais cedo, sem dormir comigo, e Alex ainda ficou uns vinte minutos, quieto, preocupado.
- Ele estava abusando, mesmo_ disse ele e me olhou, sério_ Vamos parar com isso, Marquinhos.
- Mas a gente só cheira no final de semana, diferente do Zeca que fazia todo dia...
- Nem de vez em quando!_ disse ele numa determinaçao_ Já chega. Estava demorando para uma tragédia dessas acontecer. Todo sabado era aquele abuso, viciou o cara, daqui a pouco vicia outro de nós, e então? Outra overdose? Nao. Acho que nao preciso dessa porcaria para me divertir, para me sentir alegre. Uma alegria artificial, chega a ser ridiculo. Nao quero mais. É bom, sim, nao sou hipócrita de negar, porem é tambem perigoso. Não, não mais. E voce tambem, meu amor, me prometa.
- Não sou seu amor!_ falei com irritaçao.
- Sim, que seja. Mas me prometa, por favor. Nem que o Tony insista muito, se irrite, caçoe de você... Prometa pra mim, Marquinhos... _ disse ele numa súplica, me olhando com aqueles olhos bonitos e brilhantes.
Passei a mão pelos cabelos, num cansaço. O fato era que eu tinha ficado com muito medo, e tentava esconder isso.
- Como voce é chato... _ falei, olhando-o_ Prometo, caramba.
- Assim esta melhor_ ele abriu um sorriso agradecido, me fitando.
Quando Bruno voltou de viagem, cerca de vinte dias depois, já sabia de toda a historia pois a noticia tinha vazado. Nao pareceu ter lamentado muito a morte do amigo, ou ter ficado com medo, já que na primeira reuniao em minha casa apos sua volta, ele trouxe cocaína e maconha.
Passado o seu recuo inicial no consumo da droga, Tony logo voltou à ativa, para mostrar ao outro que nao tinha medo. Quando Alex e eu recusamos nossa dose, ambos riram de nós, nos chamaram de covardes, de mijões, e eu me constrangia ante tanta insistencia, vendo sempre Alex me fazendo sinais sutis de que "não", que nao cedesse. Acabaram por desistir de nos oferecer e ficaram loucos sozinhos, bebendo uisque, ligando o som alto, gritando e dando risada. Por um instante, observando-os, tive um vislumbre do quanto tudo aquilo era insano e desnecessario.
Em certa tarde em que fui ver Tony treinar boxe na academia, Bruno me perguntou se eu tinha "encaretado"
- Estou dando uma pausa_ desconversei_ Me assustei com a morte do Zeca.
- Aquele era um imbecil. O café da manhã dele era pó, claro que daria nisso_ falou Bruno, observando comigo Tony perto de nocautear o adversário, um brancão mau encarado_ Escuta, o Alex esta interessado em voce?
- Nao sei_ engoli em seco _ Porque diz isso?
- Porque nao é a primeira vez que vejo aquele moleque com olhar de peixe morto pra cima de você. Fica todo babão, deve estar com dor no braço de tanto bater pra você... Como nao percebeu nada? Acho que ate o Tony deve ter visto, mas ele nao é burro, sabe que voce gosta de homem de verdade, e nao de moleque.
- Sei lá!_ falei, irritado_ Mal olho na cara do Alex.
- Mas deve ter se esbaldado com varios na ausencia do Tony, né?_ disse Bruno baixinho, mordendo o labio_ Duvido que ficou sem homem esse tempo todo. Alias, estou doido pra te foder desde que voltei. Quando vai ser? Nao tem jeito?
- Só se voce matar o Tony_ respondi, olhando-o com desprezo.
- Não é má ideia_ ele sorriu, e gritou para o brancão, adversario do Tony no treino_ Ô, Murilo! Acaba com ele! Nao deixe nem farelo.
E deu uma gargalhada. Vi Tony, por um segundo, fita-lo com ódio, e investir contra o Murilo com fúria, nocauteando o cara com precisão . Saiu do ringue, carrancudo, tirando as luvas, fuzilando Bruno com o olhar. Me chamou ate o vestiario e aguardei que ele se lavasse e se trocasse para irmos embora.
Transamos até o começo da noite, ele fez no forno uns congelados e ficamos tomando vinho na sala. Vi quando ele mexeu nos meus discos e achou o Air Supply que Alex tinha dado.
- Nossa, Marquinhos! Ficou cafona agora, é?_ ele deu risada.
- Foi o Alex quem trouxe ,no Natal.
- Que horror _ ele olhou o disco por dentro e por fora_ Mau gosto daquele moleque. Joga fora!
- Não! Foi presente!_ exclamei, com raiva, indo tomar o disco de suas mãos para guardar de volta no lugar_ Por pior que seja, nao se joga fora um presente .
- Então se eu lhe der um disco de baião voce vai guardar porque é presente? _ ele riu mais, me irritando.
- Vou! O que tem isso?
- Tem que voce é um menininho bobo_ disse ele vindo me beijar, me apertando na parede, prendendo seus dedos nos meus, no alto_ Por isso fico louco com voce...
Sorri, beijando -o com vontade. Acabamos transando no sofá e ele dormiu ali mesmo, todo desajeitado, enquanto eu via TV e o olhava as vezes, pensando em Alex. Senti uma vontade forte de vê-lo, ficar sozinho com ele, nos divertirmos juntos em qualquer lugar, como bons amigos . Decidi telefonar para ele e passarmos o feriado juntos, talvez fosse muito bom.
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Obrigado a todos! Voces sao especiais! :)
divertirmos juntos em qualquer lugar, cqualquer luga
meia noite e ele es