- Quem era no telefone, gatinha? Porque ficou assim? Vem ca, vem...
- Me solta!
- Cami, o que foi?
- Vai embora, Diego. Pra mim ja deu.
- Não deu ne, que broxada essa ligação, affz. Pelo menos me diz quem é...
- Ela não vai roubar a Gabi de mim. Eu não vou deixar. - Sussurrou Camila. - Amanhã você vem Diego, tenho que ir ajudar uma amiga, vai, sai.
A porta de saida bateu. Camila abriu uma gaveta e tirou uma arma, olhando sinistramente para ela, antes de guardar na bolsa.
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- Livre enfim?
- Pelo o que eu estava vendo você estava adorando a estadia.
- Dra., essa cama definitivamente se identificou comigo, rsrs.
- Posso te dar uma de presente e assim me livro de receber uma ordem judicial por causa do acidente.
- Não seria uma má ideia, mas acho que não ia caber dentro do quarto que eu divido na pensão com uma amiga.
- Ah, uma amiga...
- Sim, a Camila. Ela que vem me buscar. Você vai ver conhecê-la.
Radsha sorriu sem graça.
Na entrada do hospital Camila pediu informações, entrou no elevador, apertou o botão número 3. Alisou o coro da bolsa, dentro dela a arma carregada.
- Boa tarde.
- Cami! - Gabriela a abraçou.
- Linda... - Olhou para a médica, sorriu com posse e a abraçou com carinho exagerado. - Que bom que esta bem, querida. Fiquei muito preocupada quando você ligou, vim o mais rápido que eu pude.
- Obrigada por vir. Dra. Radsha, essa é minha amiga, Camila. Camila, esta é a Dra. Radsha.
Radsha estendeu a mão, sorrindo educada. Camila permaneceu com as mãos ao lado do corpo, olhando para Radsha com desprezo, disse:
- Não vou apertar a mão da pessoa que quis matar você.
- Camila! Você não é assim.
- Tudo bem, Gabriela.
- Desculpa, Dra.. Acho melhor eu ir.
- Qualquer coisa, liga.
"Essa piranha deu o telefone pra ela!?" - Camila mordeu o lábio de raiva.
- Vamos, Gabi.
Gabriela acompanhou Camila. No carro, Gabriela ficou muda, não olhou uma vez sequer para sua amiga ao volante. Dentro do quarto, ela sentou em sua cama, puxando Camila para sentar ao seu lado.
- Fala, agora.
- Falar o que, Gabi?
- Porque você ta agindo estranha comigo. Sobre o trabalho, sobre minhas amigas na faculdade e agora destratando as pessoas... Essa não é você.
- Pode ser TPM, estou atrasada uns dias.
- Isso não é bom, sua menstruação sempre foi regulada.
- Eu não posso ter um filho agora, isso acabaria de vez com meus planos de carreira futura. Ainda mais um filho de um "Zé Ninguém" de "uma transa só".
- O Diego gosta de você, seria um ótimo pai.
- Pára, não brinca com coisa séria. Vai "vir" pra mim, eu não estou gravida. Só estou anciosa, um pouco pegajosa e sem nenhuma paciencia. É isso.
"Isso tudo não deixa de ser verdade, Gabi. O motivo é outro, e faz tempo... Como você nunca me nota?" - Camila abaixou a cabeça, suspirou tristemente.
- Sabe o que vai ajudar depois de um dia pesado como esse? - Perguntou Gabriela.
- Chocolate! Brigadeiro!
- Vamos, Camila.
As duas foram abraçadas para a cozinha da pensão, pedir para a cozinheira fazer brigadeiro de sobremesa para o jantar.
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- Rad, posso servir o jantar?
- Melissa, estou sem fome. Senta aqui, tome vinho comigo.
- Patroa, não posso fazer isso. Primeiro por que estou trabalhando, segundo por que eu não bebo bebidas alcoolicas e por ultimo, e não menos importante, esta cedo para beber, Senhora.
- São... 20h. Tem razão, é cedo. Por favor, traga duas taças de suco. Preciso conversar um pouco e eu não tenho ninguém pra isso.
Melissa levou a taça de vinho, trazendo duas taças com suco de maracujá. Serviu a patroa, pegou a outra taça, se sentou ao lado da patroa.
- Olha pra mim e diz o que você ve, Melissa.
- O que a Senhora quer que eu diga?
- Apenas a verdade. Seja ela qual for a sua visao, diga. Não se preocupe com seu emprego, não encontrei alguém que faz um purê de batata mais gostoso que o seu, rs.
- Eu vejo uma mulher bem sucedida nos negócios, educada, dedicada, porém sem amigos de verdade. Solitária.
- Que droga. Não o suco, perdão. O suco esta delicioso. A vida. Seu olhar me diz um ditado popular; "chorando de barriga cheia".
- Dra. eu não posso falar da sua vida, não me diz respeito. Se eu pudesse falar, iriam ser só coisas boas. Uma médica exemplar, uma pessoa caridosa, verdadeira, gentil... Seu sorriso merece um flash. Lindo. A Senhora é maravilhosa.
- Adjetivos positivos de mais. Me desculpe, mas suco é muito fraco pra esse tipo de conversa.
- Quer que coloque o que em seu suco?
- Pode deixar Melissa, eu me sirvo. Obrigada. - Levantou, foi ao bar da sala de estar, colocou um pouco de Uisque no suco. Provou. - Hummm, agora sim. Prossiga. Fale. Os conselhos.
- Após a morte de seus pais a Senhora se trancou para o mundo. Seu mundo se tornou o hospital, você vive a vida de seu trabalho 24h. Ou seja, sem amigos, um amor, sem uma familia sua.
- Um amor... Eu poderia amar alguém, Melissa?
- Todos nós.
- Eu sou lesbica.
- Conta uma novidade.
- Você sabia? Oh.
- Senhora, eu trabalho aqui há alguns anos, eu limpava o seu quarto. Sem querer ser indiscreta, eu recolhi algumas peças intimas femininas pelo chão do seu quarto, e não eram suas. Quando a Senhora estudava e trazia "suas amigas" para fazer trabalhos da faculdade e elas dormiam aqui.
- Sinto muito.
- Da primeira vez eu estranhei, na segunda eu suspeitei, na terceira vez a menina me perguntou se eu vi um sutiã jogado em algum canto do quarto. Me lembro, eu estava limpando o seu quarto, a Senhora estava no banho e a moça entrou no quarto mastigando uma pizza da noite passada, tomando coca-cola, vestindo short curto e os seios de fora. Ali eu tive certeza sobre o que andou acontecendo naquele quarto durante a noite.
- Agora eu me lembro desse dia... A Paulinha disse que você era linda, para eu te chamar para "brincar" conosco qualquer dia.
Melissa ficou vermelha.
- Acho que papai desconfiava de mim, uma vez ele disse que me queria feliz independente de quem eu escolhesse. Ele não me exigiu um marido. Já mamãe sonhava com um principe encantado para mim. Hoje, eu vivo para o trabalho, salvo a vida de pessoas que eu nunca vi antes e nunca mais verei depois,e, de noite eu acabo indo dormir sozinha, imaginando que amanha o dia será melhor. Talvez eu ate encontre o amor de minha vida por acidente. Isso ainda não aconteceu. Quando eu estou com muita vontade eu vou a uma boate alternativa e fico com alguma garota que provavelmente no outro dia ira embora sem reclamar ou cobrar nada. Fala alguma coisa, Melissa.
- Dra. a Senhora esta exagerando na bebida, amanha cedo ira operar de manha, precisa estar sobria. Vou servir o jantar, agora.
- Só se você comer comigo.
- Por favor, Senhora, não.
À mesa, filé de frango grelhado regado à limão, arroz branco, salada de alface com tomate, mingau de leite salgado com milho, ervilha e cheiro verde. Suco natural de frutas para acompanhar.
- Senta, Melissa, por favor.
- Não é bom esse tipo de intimidade entre patrao e empregado.
- Será que vou ter que demití-la para você se sentar? Aqui há comida para duas de nós.
- Com licença. - Se sentou e se serviu.
- Ótima comida! Deliciosa!
- Obrigada!
- Se quiser fazer faculdade de Gastronomia, eu te ajudo.
- Cozinhar é ótimo, mas faço por amor, não me daria bem fazendo isso por profissão. Não tenho mais idade para passar horas sentada em uma cadeira, em uma sala de aula. Obrigada, a Senhora é uma mulher muito boa.
- Não tão boa para ter uma namorada.
- A Senhora não tem procurado, só trabalha. Oh, me desculpa. Perdão, Senhora. Viu? Por isso eu disse que não devia me dar liberdade, estava demorando para falar algo que não devia. Vou me retirar.
- Senta ai, esta tudo bem. Maravilhoso esse frango, hummm. Hoje eu atropelei uma moça. Ela esta bem, relaxa. Ela é tão linda, engraçada, disse ate que o meu hospital parecia um SPA e que minha cama tinha se identificado com ela.
- Cuidado. Pode ser um golpe.
- Foi bem real quando eu bati o carro nela, rs. Ela tem uma amiga, argh. Não gostei dela.
- Como ela se chama?
- Gabriela.
- Falou o nome dela sorrindo, rs.
- Quero vê-la de novo. Trocamos números de celular. Tomara que ela ligue.
- Se ela não ligar, ligue você.
Terminou o jantar.
Radsha pegou o celular e decidiu ligar, o relógio na comoda marca 23h. Toca uma, duas vezes, no terceiro toque alguém atende.