Esquecer era tão fácil. Facil demais se deixar levar pela vida boa, as idas à boate, os finais de semana no litoral, as reuniões em casa regadas à doces, bebidas e drogas, o sexo abundante, sempre necessário. Talvez fosse melhor mesmo pensar que estava tudo bem. E eu começava a acreditar fortemente que estava!
No começo de dezembro, porem, a nossa turma de sala foi avisada da morte de Mauro. Eu olhei estarrecido para o professor que nos deu a noticia com um pesar superficial, ligeiro, logo passando a materia para nós. Vitor nao estava presente nessa noite, decerto por esse motivo, e durante toda a aula nao prestei atençao em coisa alguma, só pensava no Mauro morrendo, derrotado por aquela doença cruel.
Eu tinha um "encontro" com um cara no banheiro quebrado, um menino quieto, moreno e baixo, namorado de uma das moças da minha turma. Tinha recebido de mim um sexo oral rápido outro dia, e agora queria o serviço completo. Mas nao fui ao banheiro onde ele decerto me esperava, fiquei num canto mais afastado do pátio, sentado sozinho no banco de concreto, lembrando do Mauro com tristeza.
Meu primeiro amigo ali dentro, e foi simpatia à primeira vista. "Os iguais se reconhecem", dizia ele dando aquele sorriso de dentes pequenos como de criança. Nessa epoca estava apaixonado por um garoto do prédio dele, que nunca cheguei a ver, mas que recebia dele cartas anonimas apaixonadas, caixas de doces finos e vinhos. Foi tudo inutil: o rapaz foi embora da cidade com a familia e logo Mauro curou aquela dor nos braços de outro, porque sempre havia alguem atras dele. Eu chegava a inveja-lo por isso. "Você nao arruma homem porque nao quer, Marcos. É bonito, bacana, tem esse jeitinho de anjo...", falava ele. Um dia me disse que o ruivo da nossa sala olhava muito para mim, meio disfarçando. "Aquele? Nunca reparei", eu tinha respondido, surpreso. "Acho o senhor muito desatento para um veado em inicio de vida acadêmica, meu caro", disse ele me censurando. "Estou dizendo. O rapaz te devora com os olhos, e é bonito, hein? Porque nao tenta uma "amizade" com ele?". "Ah, Mauro, ele tem os cabelos alaranjados! Acho tão esquisito!", respondi ganhando um tapa dele no braço. "Se voce dispensar um homem como aquele, juro que arrumo um velho sem dente e mijão para você beijar". Quando enfim Vitor e eu nos acertamos, ele ficou radiante, se achava o padrinho daquele namoro e dizia ter orgulho de nós. "Casal lindo que eu adoro!", falava sempre, nos abraçando naquela efusividade típica dele.
Dei um suspiro, sentindo os olhos marejados com aquelas lembranças. A verdade era que desde que ele sumiu da cidade eu sentia falta da nossa amizade, mesmo sem ter uma consciencia concreta disso. Só agora eu me dava conta da importancia dele em minha vida, agora que o tinha perdido para sempre.
Tony recebeu aquela noticia da morte de seu ex namorado com frieza. Nem deixou de baixar a agulha no LP do The Police que ele tinha comprado recentemente.
- Voce nao diz nada?_ perguntei, olhando bem para ele.
- Quer o quê? Que eu chore?_ disse ele, jogando-se no sofá_ Veja se sou homem de chorar, caramba.
Nao respondi. Senti um desprezo por ele que foi crescendo a um nível insuportavel, me fazendo detestá-lo naquele momento. Que grande egoista! Mas talvez eu tivesse embarcado naquela vida com ele também por isso: egoísmo. Nao estávamos juntos por acaso. Deviamos ser bem parecidos um com o outro.
As aulas se encerraram uma semana depois e nao demorou para o Natal se aproximar. Os rapazes iriam viajar com suas familias naquele final de ano, exceto Alex que permaneceria na cidade. Mas de todo jeito, eu passaria o Natal e o Ano Novo sozinho no apartamento.
Na vespera me encheram de presentes, um punhado de discos, livros, jaquetas, cestas de Natal, bebidas. Tony me deu um relogio Bulova que devia ter custado caro, pois era feito em ouro amarelo. Bonito, mas ainda assim fiquei com raiva por ser deixado sozinho ali em casa naquele final de ano. Planejei um belo dia só pra mim, com muita bebida, televisão, doces e discos, contudo logo cedo, na manhã do dia 25, me tiraram da cama com o som da campainha. Abri e dei um suspiro de tédio, deixando Alex passar, carregado de outra cesta de Natal e um embrulho verde escuro com fita dourada.
- Nao devia estar com sua familia?_ perguntei, caindo no sofá de pijama, ligando a TV.
- Já passei a ceia com eles, é o quanto basta_ ele colocou os pacotes na mesa da cozinha_ Nao podia deixar voce sozinho hoje. E tem tanto parente lá em casa que nem darão pela minha falta.
- Nao precisava_ sorri, ainda sonolento, batendo no meu lado do sofá_ Senta aqui, entao. Já que é Natal, vamos esquecer nossos desentendimentos, nossas frustraçoes e voltarmos com aquela amizade bonita que a gente tinha.
Ele veio todo alegrinho, meio ansioso. Sentou-se e como antes, deitei com a cabeça em seu colo, assistindo o Especial de Natal para Crianças, enquanto ele me acarinhava na cabeça.
- Ainda estou com sono_ falei, bocejando_ Depois vejo seu presente, está bem?
- Sim_ ele sussurrou_ Pode dormir. Fico aqui cuidando de você.
Inclinou-se e beijou meus cabelos, mas nem me importei. "Ele não perde uma", pensei fechando os olhos, embalado pelo zumbido baixo da televisão.
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Valeu, galerinha! ;)
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Beijao em todos, ate a proxima!