Antes de ir pra casa encostei numa lanchonete, pedi uma água e fiquei lá, pensando em nada e olhando a transparência o copo de plástico. Só consegui entrar no ônibus umas 15hrs, o sono que eu tinha, havia grudado nos olhos e virado olheiras de lembrança. O dia se arrastou, completamente. No dia seguinte era projeto na escola do turno da tarde. Saí de casa dizendo pra meu pai que ficaria pra assistir as apresentações e palestras que sempre tinham, mas deixei pra decidir se realmente ficaria, quando já estivesse lá.
As aulas do turno matutino foram normais, Lipe foi e tentei pensar em alguma coisa diferente de Natasha enquanto conversava com ele. Perguntei se ele queria ficar e ele disse que não daria, por que ele fazia parte do tima de futsal e teria uma pelada que ele não queria faltar. Pensei “essa não, vou ficar sozinha de novo” mas foi meio que bem pior que isso. Carine ligou e perguntou se eu queria pegar um cinema com ela, usei como desculpa que ficaria na escola e tal pra ela adiar, mas ela foi mais esperta e se convidou pra ir. Não pude negar, dizer “não, melhor você não vir que eu queria ver uma garota que não é a minha namorada”. Ela chegou 12:30 e estava sozinha novamente. O que até agora era maio difícil de acontecer. Ela não me olhou, eu estava na frente da lanchonete conversando com o rapaz de lá. Ela voltou e entrou na sala do diretor. Demorou muito tempo até sair, acho que era quase 13:50 por que eu toda hora olhava pro relógio de pulso e ficava inquieta por meu objeto de espionagem ter sumido da área de visão. Mas ela sumiu de novo.
A entrada para o projeto era até as 15 horas. Os amigos dela chegaram não muito depois disso. Estavam com ar de embriagados e me perguntei quem estaria embriagado aquele horário. Eles realmente eram desastrosos, vai ver ela fosse também. Carine apareceu e fui buscá-la na entrada, ficamos sentadas em um dos bancos na praça perto do pátio. Ela disse que eu estava agindo estranhamente. A única garota que eu conhecia que estudava pela tarde, Bianca, apareceu e ficou sentada conosco. Depois de algumas conversas aproveitei que Natasha tinha passado na lanchonete com os dois da barraca e seguido pro pátio. Estavam em nosso campo de visão. Carine estava deitada no meu colo com fones de ouvido.
- Quem são? - perguntei, apontando com a cabeça, olhando fixamente.
- Natasha, Marcos, e o outro é Rauan, o mais gato da escola (o que tinha pedido pra eu entregar a toalha pra Natasha).
- Algum deles namora? (ELA NAMORA?)
- Tá interessada em alguém, Lara? - ela falou alto intencionalmente pra ver se Carine escutava.
- Shiiiiiiii! Endoidou? - quase a belisco em repreensão.
- Aposto que não são os garotos o motivo de teu interesse.
- Carine! - ela cantarolava baixo e mexia no celular, tirei um lado do fone – tô indo comprar alguma coisa pra comer com Bianca.
- Tá bom amor.
Ela levantou do meu colo e eu saí puxando Bia pela mão. Fomos caminhando em silêncio, onde estavam só os três, no pátio, agora estavam um grupo de umas 11 pessoas jogando uno.
- Admito, me encantei! Eu não consigo pensar em outra coisa.
- Ela é problema Lara!
- Você a conhece? Digo, não só por vê-la... - empurrei ela pra sentar na escada e sentei de frente pra ela.
- 17 anos, teimosa, compõe músicas, gosta de bombom de morango, odeia quem joga lixo na rua, é encantadora, gosta de jazz, briga com os pais, bebe, fuma, joga basquete e está solteira – ela enumerava cada item em um dedo - sou amiga dela.
- Ela não sai da minha cabeça. Eu a vi 3 meses atrás.
Bianca era bi e estava namorando uma garota chamada Carol. (Me perguntei se era aquela Carol que Natasha confundiu comigo).
- Não sei nem o que te falar, Lara.
- Só não me fala pra desistir – segurei em sua mão – quero ela pra mim!
- Não machuque a si mesmo ok?!
- Acho que agora já é tarde.
Ela não disse nada e eu fiquei olhando pra Natasha. Ela jogava com uma garota que eu não tinha visto antes. Deveria ser a final já, todos os outros rodeavam em expectativa. E então com um movimento rápido a outra garota se livrou da última carta e ganhou. Natasha jogou as cartas que estavam na mão e xingou. Ela perdeu e ficou furiosa! Levantou e sairia depressa, se não fosse os garotos que puxaram ela pelo braço. Ela falou “me solta, só vou na lanchonete” mas como se fossem irmãos de alma teimosa dela eles foram atrás, o Rauan e Marcos.
Caminhei rápido pra chegar na lanchonete primeiro, pedi um doritus e um suco natural. Fiquei esperando o suco. Ela pediu café e uma fanta uva.
- Ficou chateada? - o Marcos perguntou, beijando seu mão, eles estavam esperando o café.
- Corta essa vai, ela roubou!
- Não era pra você ter aumentado o valor da aposta!
- Era o dinheiro que tínhamos pra beber hoje – Rauan falou roendo a unha, pelo visto eles não se preocupavam com a tal da reputação.
- Tenho 2 cigarros e a chave de casa – ela estendeu o corpo sobre o balcão levantando um pouco os pés, os dois meninos se olharam, o café dela chegou – valeu – ela tomou um gole longo e piscou – te pago quando levar aquela garota pra um quarto de motel e pegar meu dinheiro de volta!
Eles saíram rindo e foram em direção a saída/entrada. O Matheus, garoto que ficava na lanchonete sorriu também, saí sem pegar o suco e os segui. Eles saíram pelo portão e eu parei subitamente, meus pés pesaram. Carine. Que diabos! Aquela garota era tão inconsequente que me fazia esquecer da própria namorada só por existir. Voltei depressa, a vi de longe batendo os pés no chão, ainda com fones de ouvido. Passei o resto do dia lá, tentando não desejar que ali, no lugar de Carine, fosse Natasha. Me senti mal, realmente.
Depois de pensar um pouco, desisti dessa ideia maluca. Era insano tudo isso. Ela era realmente inspirada em Natasha do Capital.
Sempre me questiono, não tem muito sentido você se apaixonar assim. Eu não a conheço e o pouco que sei é desastroso. Ela destrói e si mesmo, o que ela faria comigo? E ainda sim, lá estava eu, pensando no dia que ajudei ela a tomar banho. Eu poderia tê-la beijado naquele dia, mas ela não lembraria mesmo, de nada adiantaria.
Uma semana depois, era recuperação de física. Eu tinha ficado em 3 matérias por que não tava muito bem naquele último bimestre, culpa minha. Sou fácil de desconcentrar. Fiz a de física nesse dia, quarta-feira.
Terminou umas 10 horas mas ainda não queria ir pra casa e fiquei no fim da escada com uma garota de outra sala mas que conversávamos às vezes. Tentei não falar sobre a prova, que tinha sido um fiasco. E lá Natasha sai da sala do grêmio estudantil, que fica quase de frente onde eu estava. Juro que o destino realmente estava de birra com minha cara. Ela sai conversando com uma outra garota, diferente de todas as garotas anteriores. Como fazia pra ter uma garota que tinha todo mundo?! Elas sentaram em um ponto cego aos meus olhos e foi difícil retomar a conversa. Cinco minutos depois resolvi sair. Fiquei na porta, já tinha combinado de ir pra casa com Carine, ela passaria lá. Fomos almoçar num restaurante lá perto. Bianca me ligou e pediu pra esperarmos ela sair da recuperação, falei que tudo bem. Uns 50 minutos depois voltamos pra escola, falei pra esperarmos na porta pra eu não ter que vê-la, mas lá vem ela, com um garoto e uma água mineral na outra. Não era Rauan nem Marcos. Eles sentaram uns 5 metros da gente. Mordi o lábio. Inferno!
Eles conversavam baixo e estavam bem próximos, ele pegou a bolsa dela e ficou segurando. Parei de olhar por um tempo. Carine olhava às vezes também. Olho de novo, Natasha se atira no garoto e ameaça uma mordida, seus lábios sorriram. Com as mãos escondidas, ela força mais um pouco e tira uma carteira de cigarros do bolso dele. Ela coloca um entre os lábios e ele se põe a acender. Continuaram conversando. Umas duas vezes ainda peguei ela olhando pra mim quando eu ia olhar pra ela. Chegou um garoto, encostou, depois outro e mais uma menina. Todos diferentes dos anteriores. Quis saber qual era a porção mágica que ela usava pra atrair pessoas, eu iria jogá-la fora, com toda certeza. Os que chegaram depois não demoraram pra seguir caminho e entrar na escola, deixando-os de novo a sós. Ela passou a perna e o puxou pra mais perto. Apoiou o rosto no peitoral dele, e olhou pra mim. Olhou mesmo. Deu um trago no cigarro (que já era o quarto) e levantou a cabeça, pegou no rosto dele e soltou a fumaça entre seus lábios, passando dela pra ele. Ele recebeu e soltou a fumaça. Ela sorriu e o beijou. Virei o rosto, queria morrer.