No Domingo eu acabei indo pra uma chácara com a minha madrinha, passei o dia praticamente incomunicável. Na verdade foi muito bom eu ter ido com a minha madrinha, o ambiente me ajudou a relaxar. Voltamos por volta das 18 da noite e ao chegarmos em frente de casa, vi um carro que eu conhecia bem.
Minha madrinha olhou pra mim, piscou-me um dos olhos e sorriu. Ela era a única pessoa que sabia da minha orientação sexual, e me dava todo o apoio do mundo. Desci do carro enquanto minha madrinha entrava na garagem de casa com o carro.
- Oi - ele disse sem graça.
- E ai - respondi.
- Você tá ocupado?
- Não, por quê?
- Quer, sei lá, dar uma volta?
- Hum, pode ser. Deixa só eu avisar aqui e já venho.
Fui até dentro de casa, avisei minha madrinha que iria sair e que voltaria cedo. Ela me deu a benção, uma quantia em dinheiro e me liberou. Fui andando em direção ao carro do Neto, que já estava ligado.
Entrei no carro e ele sorriu pra mim. Me perguntou se eu estava com fome, e eu apenas respondi que sim. Ele me levou até o shopping e fomos no McDonald's.
- Então... - falei.
- Então? - ele arqueou as sombrancelhas.
- O que você quer comigo? Ou simplesmente veio até minha casa me chamar pra comer?
- Ah, é que você pareceu meio grilado ontem quando te deixei em casa e na moral, eu curto tua amizade. Eu sei que nos conhecemos pouco, mas dou valor a tu - ele sorriu. - Os moleques da faculdade sempre falam que tu é gente boa, mas sempre te achei meio reservado, então nunca procurei papo contigo. Mas agora vejo que tu é muito top.
- Hum - foi tudo que falei. - Tudo bem, só não tolero preconceito perto de mim.
- Fechou, não vai acontecer de novo - ele beijou os dedos e me fez rir.
Ele me deixou em casa e depois disso, seguiu pra sua própria casa.
Os outros meses seguiram sem nenhum acontecimento importante. O Neto tinha começado a namorar com uma menina da faculdade, acho que ela fazia o curso de tradução. Nós tínhamos virado praticamente melhores amigos, ele frequentava a minha casa e eu a dele. Sempre almoçávamos juntos, mas não saíamos mais a noite como era de costume. A tal namorada dele era muito grudenta e ciumenta, e ele não tava conseguindo mais namorar com ela por conta desses defeitos chatos dela. O problema é que ele não conseguia terminar com ela.
- Bixo, que raiva - ele sentou vermelho na mesa onde eu estava com uns amigos na cantina da faculdade.
- Qual foi? - perguntei
- A Laysa é um saco, bixo. Não aguento mais.
- Por que tu não diz que é viado? - Pedro, um amigo nosso, sugeriu.
Todo mundo começou a rir, inclusive o Neto. Começamos a conversar e alguns minutos depois a Laysa apareceu.
- Oi amor - ela deu um selinho nele.
- Oi - ele foi seco.
- Amor, tava pensando em hoje a gente ir no shopping, o que você acha?
- É, Laysa, eu tenho uma coisa pra te falar... - ele falou e todo mundo da mesa parou pra ouvir
- Diz, amorzinho
- É... eu sou viado
Todo mundo teve que se segurar pra não rir, a cara que ela fez foi impagável.
- Deixa de idiotice, Neto - ela lhe deu um tapa no braço.
- É sério
- Aham, tá bom. Escuta, você passa as 19 pra me pegar em casa, pode ser?
Neto me olhou com aquela cara de "me ajuda" e eu tive uma ideia muito louca.
- Oh Laysa, recalcada, escuta aqui, o Neto não vai a lugar nenhum com você porque agora ele tem dono - entrelacei meu braço no seu e lhe dei um beijo no rosto. Laysa abriu a boca e mesmo assim, fingiu não se importar.
- Vocês são muito engraçados mesmo.
Eu já tava me irritando com ela, então peguei o rosto do Neto e virei com tudo em direção com o meu e lhe dei um "selinho". Na verdade eu coloquei a mão na frente e beijei mas seu rosto, mas algum pedaço dos nossos lábios se encontraram. Terminei o "beijo" e soltei um sorrisinho pra ela, que saiu furiosa, mas não antes sem soltar uma pro Neto.
- Você nunca mais chega perto de mim. Não acredito que namorei um viado - ela passou a mão na boca e foi embora.
Caralho, todo mundo que estava com a gente riu muito. Ainda bem que ninguém de fora tinha visto. Eu me sentei na mesa e o Neto ficou em pé, talvez tentando processar o que tinha acontecido.
- Qual foi? - perguntei, ainda rindo
- Tu é doido, mermão? Não sou viado. E se ela sair por aí espalhando pra todo mundo que eu to namorando contigo? Valeu por foder minha vida - ele saiu andando.
Eu nem liguei pro que ele tinha dito, continuei conversando com os moleques e rindo do acontecido.
As aulas passaram voando e ele nem me olhava, sentou longe de mim e eu nem ligando. Ele parecia tá muito puto porque ele passava a mão no rosto direto, parecia impaciente.
A aula terminou e minha madrinha foi me buscar na faculdade. Eu nem havia tido sinal dele depois que a aula acabou, mas eu nem tava ligando. Tinha mais problemas pra me preocupar.
A semana passou e ele não me dirigia a palavra, e o clima tava começando a ficar chato. Como eu acabei ficando próximo dos moleques que ele andava, ele se afastou de todo mundo e começou a passar o recreio sozinho. Todo mundo perguntava o que tinha rolado e eu só dizia que ele tava com uns problemas, e nenhum dos moleques ousavam a dizer o que realmente tinha acontecido.
O lado bom é que a Laysa parecia não ter espalhado nenhum boato pela faculdade, o que me deixou feliz. O que eu menos queria era ter fama de viado pela universidade pelos próximos 5 anos.
No sábado todo mundo combinou de jogar bola no clube que o Pedro era sócio. O problema é que nós eramos 9, e precisávamos de mais uma pessoa pros times ficarem equilibrados. Eles chamaram o Neto, mas ele disse que não ficaria no mesmo lugar que eu. Eu ri na hora que eles me contaram, mas no fundo fiquei mal. Ele tinha virado um grande amigo nesses últimos meses. Na verdade, eu podia afirmar que ele foi o primeiro amigo de verdade que eu fiz e não podia perde-lo assim por leseira.
Quando a aula acabou, disse pra minha madrinha que voltaria de ônibus e acabei indo procurar por ele por todo o campus da universidade. Eu o achei entrando em seu carro, então gritei por ele, que me viu e fingiu não ter visto. Eu corri até o seu carro e ele já estava saindo, então me pus na frente do carro.
- Vai ficar nessa criancice mesmo? - perguntei.
- Sai da minha frente, viado - ele gritou, colocando a cabeça pra fora da janela do carro.
- Se quer sair tu vai ter que passar por cima de mim
Ele pisou na embreagem e em seguida saiu em disparada com o carro em minha direção. Eu sabia que ele não passaria por cima de mim, mas acho que a raiva tinha tomado conta dele. Eu pulei pra direita numa tentativa rápida de me esquivar do carro e por pouco ele não passou por cima de mim. Na queda, acabei machucando um pouco minha perna e tive que ir até a parada de ônibus mancando.
- Obrigado, Jesus - eu falava sozinho no meio da rua.
Por fim, acabei pegando o ônibus e, quando cheguei em casa, levei uma bronca da minha madrinha. Tive que inventar uma desculpa qualquer pra ela e disse que tinha caído da escada. Se ela acreditou, eu não sei, mas pelo menos ela me deixou ir dormir sem fazer tantas perguntas.
Acordei no sábado com a perna ainda doída, mas nada que fosse insuportável. Fui até o banheiro, tomei um bom banho e pude ver que a minha perna tinha ralado um pouco (e a calça também). Sai do banheiro e fui até a sala, cumprimentei minha madrinha e a Marta e então fui até a padaria da esquina, mesmo mancando, comprar meu café da manhã. Aos sábados ninguém come nada que seja feito em casa, ou seja, compramos tudo.
Quando voltei, vi que o carro do Neto tava na frente de casa. Excelente - pensei - o cara tenta me atropelar e agora deve ter vindo completar o serviço.
Entrei em casa e o Neto tava no sofá conversando com a minha madrinha como se nada tivesse acontecido.
- Ta ai, chegou - minha madrinha disse a Neto.
- Posso saber do que estavam rindo? - perguntei, esvaziando a sacola de plástico que estavam enrolados os meus salgados
- Estava contando pro Neto que você caiu da escada ontem e chegou todo ralado em casa
- Ah, claro, cai sim - lhe lancei um olhar ameaçador e pedi pra ele me seguir até meu quarto.
Ele se sentou na minha cama e eu sentei-me na cadeira da mesa do PC, de costas pra ele.
- E então? - perguntei.
- E então...
- O que tu quer? Se veio terminar de me bater, vai em frente - fiquei em pé na frente dele.
- Cara, deixa de ser criança. Eu vim ver se tu ta bem.
- Tu quase me matou ontem a noite e depois vem ver se eu to bem? Faça me o favor, né - disse bem perto dele.
- Fala baixo, quer que tua madrinha ouça? - ele sussurrou e eu pude sentir seu hálito de menta.
- Tá, você já viu, eu to legal. Agora pode me dar licença - disse eu abrindo a porta do meu quarto.
- Já vi que não dá pra conversar direito com você, pirralho - ele saiu do meu quarto.
- É, não dá mesmo, viado encubado - praticamente cuspi essas palavras nele.
Ele me lançou um olhar mortífero e eu sabia que tinha falado merda. Ele voou em cima de mim e nós dois caímos em cima da minha cama.
- Repete, repete se tu é macho - ele se preparou pra me dar um soco.
Só senti a pressão no meu rosto, ainda bem que tinha sido na parte da bochecha. Eu não ia deixar aquilo barato, também lhe dei um murro na boca que fez ele cortar os lábios.
- Viado... - foi tudo que ele disse.
Minha madrinha veio até meu quarto assustada junto com os outros empregadas e viu ele com a boca sangrando e eu com o rosto vermelho.
Depois de praticamente nós dois levarmos uma surra de minha madrinha, ela sentou eu e Neto no sofá da sala como se fossemos duas crianças. Eu até tentava argumentar, mas tudo que conseguia era levar um cascudo dela.
- Isso que vocês fizeram não tem perdão. Brigar como dois selvagens, e dentro da minha casa?
- Madrinha, eu não sou mais criança
- Não é mais criança, Carlos Eduardo? E brigar com seu melhor amigo te faz mais adulto? - abaixei a cabeça.
- Os dois, façam as pazes
- Nem pensar - dissemos nós dois em um coro.
- Ou façam as pazes agora, ou se um dia vocês fizerem as pazes, não quero mais você aqui, Neto.
- Desculpa - nós dois soltamos num coro.
- Excelente. Como dois adultos. Apertem as mãos - ela ordenou.
Ele se levantou e ficou de frente pra mim, que estava sentado no sofá.
- Me desculpa - ele estendeu a mão em minha direção.
Eu apertei a mão dele e ele me levantou e acabamos nos abraçando. Era a primeira vez que eu abraçava alguém que não era da minha família, e pela primeira vez eu pude sentir um cheiro de perfume invadir minhas narinas.
Minha madrinha nunca soube que o Neto tentou me atropelar, mas depois ela cuidou dos ferimentos de nós dois. Em seguida, Neto foi pra casa e eu tive que aguentar mais diversas horas de sermão. O problema é que o cheiro do perfume dele não saia das minhas narinas. Que puta perfume gostoso...
Salve, pessoal. Que recepção, hein??? Valeu mesmo por todos os comentários e notas, continuem assim. Deixem suas dúvidas, sugestões, críticas que é pra eu poder melhorar o conto.
A respeito do tamanho do conto, eu acho que esse tamanho padrão está bom. Fica chato escrever mais que isso, e ainda tem a questão do tempo e tal. Espero que entendam.
Um grande abraço, amigos.