- O senhor não pode me pedir isso! – eu entrei em desespero total.
- Não só posso, como esta é a única condição que você tem! Ou vai passar um tempo com seus tios fora daqui, ou denuncio aquele marginal e ele vai pra cadeia.
- Mas o Enzo tem um filho pra cuidar. E eu sou apaixonado por ele. – eu gritei!
- Como ousa ser tão atrevido em me dizer isto na cara? – meu pai me bateu. Todos na sala apenas assistiam a cena, sem se meter. O meu coração estava em frangalhos. Eu não sabia o que fazer... Eu não conseguiria viver longe dele, porém, eu também não podia deixá-lo ir preso, e eu sabia que o meu pai não brincava em serviço e conseguia tudo que quisesse.
- O senhor é cruel! Este tapa, não é porque eu me envolvi com o Enzo; é porque o senhor não suporta a idéia de ter um filho gay. Sabe que eu nunca vou lhe dar um neto de sangue, sabe que nunca vai me ver entrando numa igreja ao lado de uma mulher... Esse é o seu ódio. O seu filhinho amado lhe deu um filho, uma nora, trabalha ao seu lado... Eu sou apenas o quê para o senhor? Um lixo? É. Talvez um lixo. Algo qualquer que veio ao mundo, apenas pra te causar dor. Não é isso que o senhor pensa?
- Não fala assim meu filho. – minha mãe chorou.
- Por amor, por todo o amor que eu sinto por aquele homem- eu comecei a chorar... Eu vou fazer a sua vontade. Vou viver eternamente na minha solidão sem fim, sofrendo todos os dias, sendo infeliz a cada instante... Não se preocupe, PAI! Eu viverei conforme o senhor sempre desejou: sozinho, triste, amargurado. Talvez desta maneira, eu te faça feliz.
Eu não agüentei ficar mais um segundo ali, e corri para o meu quarto. Me joguei na cama e chorei sem parar. A minha alma doía muito. Eu só queria ser feliz. Meu Deus, porque me castigas tanto. As lágrimas escorriam do meu rosto, e as lembranças, os momentos mais especiais que eu tive ao lado do Enzo, só me fizeram chorar ainda mais... Lembrei da nossa primeira vez, como foi tão lindo meu amor. Seu toque, seu cheiro... – eu dizia abraçado ao travesseiro. Espero que você um dia possa entender que o que eu estou fazendo é por amor a você. Eu jamais permitirei que te afastem do seu filho. Nunca! Mesmo que este sacrifício custe te abandonar.
O dia seguinte veio como uma nuvem preta sob a minha cabeça. Senti uma dor tão forte no peito. Eu preciso estar pronto para me despedir do Enzo.
- Bom dia meu filho. Venha tomar o seu café. – eu fiquei em silêncio.
- Aonde você pensa que vai? Posso saber? – a voz do meu pai, me irritou profundamente, ao ponto de querer matá-lo.
- Será que eu posso ao menos eu posso me despedir dele? Ou até isso é proibido?
- Claro que é! Quando eu disse que você viria mais aquele bandido, eu estava falando sério! Amanhã mesmo você embarca pra Londres. Hoje cedo liguei para o seu tio, e ele ficou super feliz. Já até preparou o seu quarto.
- Mas é só um adeus. Eu não vou voltar atrás. – eu estava quase chorando.
- Eu disse não! Esqueça aquela cara. Na Europa você vai aprender o que é ser civilizado. Eu garanto que em um mês, você nem se lembrará mais dele.
- Eu te odeio! Eu odeio você! Seu monstro. Eu quero que você vá para o inferno!
Eu gritei loucamente e voltei para o quarto. Ele veio atrás de mim, mas foi em vão. Como ele podia ser tão cruel? Não me deixar ver o Enzo? Eu precisava agir. Eu precisava ligar para a Vivi e o Victor. Eles eram a minha única salvação.
- O quê? Você vai embora? Como assim?
- É isso mesmo amiga. Eu vou morar um tempo em Londres. O meu pai me obrigou.
- Mas você nunca foi de acatar ordens do seu pai? O que aconteceu?
- Ele descobriu tudo. Sobre o Enzo, sobre o seqüestro... E me chantageou. Ou eu sumo do Brasil, ou o Enzo vai preso.
- Mas Guilherme, você não pode pagar pelo erro do Enzo.
- Vivi, até você? Eu já te expliquei o real motivo deste maldito seqüestro. E se o Enzo for preso, quem vai sustentar a mãe dele e o João? Ele tem um filho de apenas quatro anos. Você já imaginou um longe do outro?
- E eu? E o Victor? Somos um trio, esqueceu? Não vamos conseguir ficar sem você.
- Não chora minha linda. Onde quer que eu esteja, sempre estarão comigo. E um dia eu volto.
- Não há nada que a gente possa fazer? E se eu for aí conversar com o seu pai?
- Não adianta. Oh, eu te liguei, porque preciso que você me ajude a me encontrar com o Enzo. Você é ótima pra criar idéias, e eu preciso muito vê-lo, antes de ir embora.
- Mas ele não vai aceitar isso!
- Ele não tem querer. Vai me ajudar?
- Claro amigo. Sempre. Eu te amo viu? O Victor vai chorar muito quando souber.
- Cuida daquele viado por mim. Põe juízo naquela cabecinha levada.
- Pode deixar. Eu já sei o que vou fazer. Vai pra sala agora.
- Ok! Confio em você.
Fiz o que ela pediu. Sentei no sofá e fingir lê alguma coisa. De repente o telefone toca. Os meus pais ainda estavam na sala de jantar, quando a minha mãe atendeu.
- Alô. Oi Viviane. O Guilherme não está podendo falar. – era claro que eu podia. Mas os meus pais estavam irredutíveis.
- Oi dona Marli. É que eu já fiquei sabendo que o Gui,vai viajar, e eu to ligando pra avisar, que ele precisa passar na faculdade pra assinar o termo de afastamento. Só o próprio Guilherme pode assinar. Se ele vai ter que trancar a faculdade, nada mais lógico, não acha?
- Hummm... Claro! Pode deixar que eu aviso ao Guilherme. Obrigada por ter avisado.
- Quem era? – perguntou meu pai.
- A amiga do Guilherme. Disse que ele precisa passar na faculdade para trancar e ter de assinar um documento.
- Sei. Mas quero que alguém vá com ele. Vou pedir a Michelle.
**************
No carro.
- Olha Gui, eu sei o verdadeiro motivo da sua ida a Faculdade. Você na verdade quer se encontrar com o rapaz, não é?
- Por favor, Michelle! Não me negue isso. Não fala nada pro meu pai. – eu supliquei.
- Eu poderia impedir isso, afinal, o tal rapaz, seqüestrou o meu marido. Mas eu sei que ele não é perigoso como dizem, e sei o quanto você está sofrendo com tudo isso.
- Eu te adoro sabia? Você é a cunhada mais especial que existe.
Partimos para a favela do Borel, onde morava o Enzo. Meu coração palpitava e uma angústia invadia meu corpo.
- Não demore. – disse ela ao me deixar na porta da casa dele. – Eu vou dar uma volta e daqui a pouco te pego.
A porta estava encostada, e eu entrei. – Olá! Tem alguém em casa? – ninguém respondia. Fui até o quarto, e vi o Enzo brincando de capitão com o seu filho. Aquilo me emocionou muito. Eles se amavam tanto.
- Oi. Desculpa ter invadido, é que... A porta estava aberta.
- Deve ter sido a minha mãe. Ela foi ao mercado. O que você quer aqui? Não temos nada pra conversar.
- Temos sim. E talvez possa ser a nossa última conversa.
- Hã? Como assim?
- Eu estou indo embora do Brasil. Amanhã viajo para Londres, e não volto mais.
-O quê? Por que isso? Você não... – Ele gaguejava.
- Meu pai me obrigou a ficar longe de você. – as lágrimas vieram novamente. Ele ameaçou te colocar na cadeia, se eu não me afastasse de você. E a minha única solução, é ir embora daqui.
Enzo ficou parado. Sem cor. Seu coração acelerou, e sua saliva sumiu.
- Ele não pode fazer isso. Eu não vou deixar que arranque você de mim. Não vou!
- Eu já fiz a minha escolha. Não adianta mais.
- Meu amor, eu te amo tanto. – ele em abraçou e me beijou na frente da criança.
CONTINUA...