CAP. 13
Os planos do meu pai mudaram ainda naquela noite, após receber uma ligação ele descobriu que primeiro teria que encontrar um de seus clientes em Goiânia e só depois de resolver as pendências que possuía ele poderia ir até Brasília. E, para o meu azar, só descobri isso quando já transitava em meio aos idênticos prédios da Asa Sul, com a típica arquitetura candanga . Tempo perdido, meu pai ainda tentou me tranqüilizar na ligação, afirmando que no outro dia, no máximo no final da tarde, estaria lá comigo. Mas eu já conhecia meu pai, e seus pepinos, que na maioria dos das vezes eram bem complicados de serem resolvidos. Resolvi que iria embora de manhã bem cedo, no primeiro ônibus que saísse pra Goiânia, pois eu não ia correr o risco de um dia todo sozinho, e ainda mais a pé naquela cidade em que tudo parecia estar a 100 km de distância.
Agradeci o funcionário do meu pai por ter me levado e entrei no prédio. Eu sentia uma agonia dentro de mim, queria muito estar perto do Caio, e já me arrependia por ter inventado de viajar. Passei a noite inteira pensando nele, assim como eu havia passado toda a viajem. Eu simplesmente não podia acreditar que eu estava guardando sentimentos que não se restringiam apenas aos que um amigo sente pelo outro dentro de mim. Eu não me permitia. Nem se quer eu conseguia pensar na frase “estou apaixonado pelo Caio”. Pois além desse turbilhão de novas sensações, eu ainda carregava o medo de explicitar o que estava acontecendo e ser rejeitado, e ainda por cima perder o irmão que eu havia ganhado, e que me tratava com tanto carinho e apresso.
Com muita dificuldade eu consegui dormir, e com maior dificuldade ainda consegui acordar cedo para embarcar em algum ônibus. Com muita luta consegui sair de BSB às 7:30 da manhã, e cheguei em Goiânia pouco depois das 11:00. Fui em casa apenas para guardar a mala e segui caminho para o prédio do Caio. Quando cheguei, como sempre, subi sem interfonar pois o porteiro a tempos já me conhecia. Quando entrei no apartamento percebi que ele estava parcialmente bagunçado. A sacada estava suja, ainda havia recipientes de bebida alcoólica na pia, o safado havia feito uma festa na minha ausência, pensei. Enquanto caminhava pro seu quarto decidi fingir que estávamos bem e bancar o irmão pentelho, acordar ele cantando e abrindo a janela, porquê ele deveria estar morrendo de ressaca e provavelmente iria ficar muito puto. Sorri sozinho.
E a primeira imagem que vi quando parei na porta do quarto de Caio fez o meu sorriso sumir do meu rosto, e logo deu lugar a uma lagrima que molhou meu rosto. Caio estava de cueca, e Fernando pelado, na mesma cama. Fiquei por alguns segundos vendo aquela imagem que me perturbou, e quando Caio acordou e olhou nos meus olhos, após ter se sentado na cama, eu não agüentei. Apenas virei as costas e saí da li.
Tem momentos em nossas vidas que gostaríamos que tudo simplesmente acontecesse como nos filmes, e acabasse bem. Mas não foi o que aconteceu. Caio não saiu correndo atrás de mim, e não nos demos um beijo romântico após termos esclarecido tudo e nos entendido. Eu voltei pro meu prédio, sem derramar um única lágrima, porquê eu sabia que eu não tinha o direito de reclamar de qualquer coisa, o cara era solteiro, e talvez nem ao menos soubesse que eu recentemente havia descoberto que sentia algo a mais por ele. Além do mais, a bem pouco tempo eu havia aprontado a mesma coisa. E para falar a verdade, eu não sabia oque queria fazer, mas tinha certeza que não ia ser naquele exato momento que eu iria conseguir me abrir com ele. Mas a dor de imaginar que o Caio tinha passado a noite com outro, e ainda por cima um cara que eu teria que ver sempre, me partia o coração. Eu fiquei simplesmente arrasado.
Chorei apenas em casa, depois de ter vestido meu pijama e ter deitado na cama, e daquele jeito mesmo eu dormi, sem nem ao menos comer. Porquê eu não sentia nem um pingo de fome. Acordei só depois que meu pai entrou no meu quarto fazendo barulho. Passei o resto do dia com ele, que sempre me perguntava se algo havia acontecido, pois eu estava muito calado, sem expressão, e alheio a tudo, quase a todo momento.
Quando já me preparava pra dormir, recebi uma mensagem de Caio. “Precisamos conversar. Tenho que esclarecer algumas coisas.” Eu não respondi, não sabia se eu queria ouvir o que ele tinha pra me dizer. No dia seguinte fui para a faculdade por obrigação, meu pai foi embora logo cedo e como eu já estava acordado mesmo, resolvi não perder aula. Quando cheguei na sala Caio já estava lá, Fernando não. Sentei na ultima cadeira, e Caio estava sentado em uma das primeiras, coloquei meu fone de ouvido e baixei a cabeça. No final da aula, quando eu percebi que todos já estavam saindo, levantei a cabeça e após recolher minha mochila segui pra fora da sala, quase sendo o último a sair. Percebi que Caio já tinha saído, e me espantei quando ao cruzar a porta ele me puxou pelo braço, me pegando totalmente de surpresa.
- Você vai ficar me ignorando? – Ele me perguntou em tom sério. Olhando em meus olhos. Fiquei sem palavras, e após alguns momentos, respondi:
- Estava com meu pai ontem, por isso nem tive tempo de responder.
- Eu te mandei mensagem meia noite Lipe, para de palhaçada. Aposto que seu pai já devia até estar dormindo. – Ele falou, e eu fiquei calado. Mas continuei no mesmo lugar pois ele ainda segurava meu braço. Ficamos nos olhando por um tempo, e ele continuou. – Sobre o que você viu ontem, eu e o Fer... – eu o interrompi e disse:
- Você não precisa me explicar nada Caio, você faz o que quiser Caio, eu não só fui embora por que não queria atrapalhar, ser inconveniente – Eu disse, tinha muito medo de escutar qualquer coisa que me provasse que ele e Fernando estavam mesmo tendo algo.
- Se você soubesse escutar as coisas que as pessoas tem a te dizer, tudo seria mais fácil.
- Olha aqui Caio, se você ta de lance com esse garoto, que bom! Bom pra você, e vê se continua deixando ele botar coisa na sua cabeça ta? Você pensa que não te conheço né? Essas suas atitudes recentes não são nem um pouco a tua cara! Eu to adorando esse seu comportamento. Não ta doendo nem um pouco em mim essa sua indiferença! – Eu falei com rispidez. Quando me calei, Caio me arrastou pelo braço que ele ainda segurava, pra dentro da sala de aula e bateu a porta com força, fechando-a.
- E VOCÊ ACHA QUE EU GOSTO DE COMO VOCÊ SE COMPORTA? Garoto, presta atenção, você não tem dado uma dentro. UMA! Só vive de dar vexame, só se envolve com vagabundo e caras que não te dão um pingo de valor, e além de não se respeitar, agora desrespeita até seus amigos que fizeram tudo por você sempre! Você não sabe a tamanha decepção que você me fez sentir quando teve aquela atitude ridícula com o Fernando na festa, se tinha alguma coisa contra ele, porquê não chegou e conversou?!
- Agora você vai defender esse idiota? Deve ter te convencido até de não me chamar pra sair com vocês...
- CALA A BOCA QUE EU AINDA NÃO TERMINEI! Eu nunca falei com você desse jeito, e espero nunca mais falar, mas você precisa ouvir algumas coisas. Porquê você fez tanta questão de ser chamado pra sair por mim se uma noite antes você me deixou ir pra casa passando mal, sozinho, só pra chamar um carinha que você mal conhece pra sua casa? Logo eu Felipe! Logo eu que já levantei da minha cama dezenas de vezes pra te buscar alta horas em alguma festinha que você encheu a cara e passou mal? E tem mais, se eu tivesse te chamado, você deixaria de ir com ele pra ir comigo? E ainda foi embora com ele, PODRE DE BEBADO! Já pensou se ele fosse algum Leonardo da vida? Quem era que ia te ajudar, te salvar em?
- Você não tem direito de falar assim comigo Caio! Eu só fiz oque eu quis...
- ENTÃO É ISSO FELIPE? Você fez? – Suas voz foi diminuindo de tom, como se tivesse embargando. Eu não respondi, e ficamos nos olhando por algum segundo. Fiquei vermelho de vergonha, e o arrependimento a que a muito me assolava retornou. Abaixei a cabeça e só então ele soltou meu baço.
- Quer saber, eu acho que não tenho direito mesmo...
- É só você que pode fazer o quiser com seus amiguinhos não é? – eu perguntei, forçando uma risadinha debochada.
- Eu não fiz nada com o Fernando – Ele me falou e ficou me olhando. Sua expressão era de incredulidade total. – Eu sou homem Felipe, não transo com bêbado.
Caio deu as costas pra mim, abriu a porta da sala e saiu. Voltei pra casa mais derrotado do que já estava nos últimos dias. Eu me sentia um lixo.