Todos os dias recebia visitas de inúmeras pessoas. Diziam-se amigos ou parentes, mas, sinceramente, não sabia quem eram ninguém. Minha memória não estava ajudando muito para identificar as pessoas, mas as vezes, eu tinha fleches de lembranças aleatórias. O engraçado era que sempre tinha a menina que tinha vindo me ver quando eu acordei, que depois vim saber se chamar, Maria Cecília. Ela sempre estava lá no hospital comigo, mas ainda não sabia muito bem "o que éramos", só que ela era bem próxima e sempre me ajudava. Eu gostava da companhia dela, me fazia bem, além de ser linda.
Mas depois de um tempo, comecei a notar que ela devia ser algo minha além de amiga, porque ela sempre cuidava das minhas coisas, de documentos meus, de plano de saúde, sabia tudo sobre mim. Eu não sei porque o médicos decidiram deixar por minha conta (da minha memória, na verdade) de tentar lembrar sozinha das pessoas. Alegavam que seria melhor eu ir lembrando aos poucos do que "decorando" as pessoas, mas isso já estava me incomodando. Me tratavam como se eu fosse uma criança que acabou de perder os pais e que tinham que tomar cuidado com o que diziam pra mim. Eu quase não falava direito com Maria, apesar de ela sempre estar comigo, mas agora eu queria saber as coisas direito. Esperei chegar a noite, que é a hora mais tranquila pra conversar com alguém, e ela sempre ficava um pouco comigo antes de ir embora.
Eu - Fica um pouco mais aqui hoje?
Ela me olhou meio sem entender - Fico, sim. Tá sentindo alguma coisa?
Eu - Não, só gosto de ficar com vc.
Ela ficou me olhando, parecia meio sem jeito. Vi que ela tentou reprimir um sorriso. Ela foi pegar um cadeira pra se sentar mas eu pedi pra sentar na cama comigo. Ela ficou sem jeito de novo e sentou, com cuidado.
Eu - Quero te perguntar uma coisa e queria que vc fosse sincera e não igual aos médicos.
Ela - Ok.
Eu - Eu não concordo de ficarem esperando eu lembrar as coisas e ninguém me contar. Eu fico sem saber em quem posso confiar ou não, quem é de verdade ou não. E eu notei que vc sempre tá aqui, cuidando de mim, mais do que os outros. O que vc é minha?
Ela demorou um pouco pra responder, mas finalmente, falou.
- Sou sua noiva.
Quase cai da cama. Eu estava noiva?! Gente, que doideira. Mas na mesma hora me senti muito mal. Agora eu entendia porque ela sempre estava lá, o problema é que eu não tinha certeza se eu tinha amor suficiente por ela pra continuar sendo a noiva dela, eu não me lembrava da nossa história. Mas ao mesmo tempo eu sentia algo, muito forte, por ela, queria ela sempre perto de mim, ela me trazia paz, era companheira e eu viajava naqueles olhos.
Sai dos meus devaneios e vi que ela estava chorando de cabeça abaixada.
- Ei, por que tá chorando?
Ela - Eu sei que vc não lembra da gente e não vai ser a mesma coisa daqui pra frente, então vou entender se vc não quiser mais nada.
Eu - Ei, olha pra mim. Eu vi que vc era especial pra mim desde o dia que eu acordei. Apesar de eu não lembrar de vc, eu sempre gostei de ter vc por perto, mas vc nunca deu chances de eu me aproximar e vc de novo e vc nunca tentou nada também. Por que?
Ela - Eu achei que vc não iria lembrar mais de nada. Estava tentando me conformar de não ter mais vc .
Nessa hora eu peguei a mão dela e senti uma anel. Olhei e vi que era um de noivado, lindo.
Eu - Cadê o meu? - Disse olhando para o anel. Ela ficou me olhando e olhando para o anel até abrir um sorriso, lindo. Talvez aquele sorriso deve ter sido um dos motivos de ter me feito querer casar com ela.
Ela, então, puxou um cordão que usava que estava escondido dentro da blusa e mostrou. Lá estava o anel.
- Eu pus aqui pra ter vc sempre comigo.
- Mas agora vc não precisa fazer isso porque eu já estou aqui.
Ela tirou e me deu, e eu coloquei.
Eu - Me ajuda a lembrar. Eu sinto que preciso de vc.
Ela deu mais um sorriso e acariciou meu rosto. Eu sentia que estava fazendo a coisa certa, que eu tinha que ficar com ela.
Eu - Olha, se eu não lembrar da gente, nós fazemos outra história nossa.
Ela não disse nada, apenas me beijou.