Fiquei sozinho e totalmente perdido em pensamentos que em nada me ajudavam. Não ousei me levantar duela cama novamente e muito menos me olhar no pequeno espelho que ficava na parede ao lado da porta do banheiro. A noite avançou e finalmente me perdi num sono tranquilo onde pude apagar momentaneamente meu erro de mim mesmo.
Acordei cedinho como sempre fazia. Ajoelhei ao lado da cama e fiz minhas orações como sempre fazia. O quarto e tudo que ali havia se tornaram meus cúmplices e o que mais desejei naquele momento foi sair dali o mais rápido possível.
Tomei banho, vesti uma bermuda jeans velha e rasgada na barra, coloquei uma camiseta simples de algodão, escondi meus olhos no escuro das minhas lentes e saí na direção do refeitório da pousada... A fome estava gritando dentro de mim.
Sossegadamente tomei o café e comi algumas frutas tropicais que havia na mesa. Levantei após uma segunda xícara de café com creme e fui andar enquanto tentava convencer a mim mesmo de que nada havia acontecido para que me comportasse daquela maneira... O fato de ser um homem de Deus não alterava o que estava em minha vontade. Só Ele sabia o quanto que lutava todo santo dia para que esse tipo de desejo fosse embora de vez da minha vida. Ele também sabia o quanto que eu era fraco.
Caminhei por quase duas horas na direção de um dos lugares mais lindos da praia e comecei a tomar banho. Minha bermuda e minha camiseta estavam na areia próximas a meus chinelos e óculos que foram usados como peso para que não voassem, uma vez que o vento era bem forte naquele local da praia...
Ao longe alguém entrou em meu campo de visão e com a proximidade soube de imediato que Lucas Brandão estava vindo em minha direção novamente... Nada pude fazer até que ele mergulhou com toda determinação e veio ao meu encontro por baixo d'água...
_ Bom dia Luiz... Ou devo te chamar de professor?
_ Luiz tá bom... Bom dia Lucas.
_ Tá tudo bem com você, coroa?
_ Espero que fique tudo bem comigo...
Seus braços me envolveram e fui silenciado por mais um beijo. Lucas era dominador e possessivo. Sua urgência me desarmava e voltar a sentir sua língua me tocando me fez perder totalmente o pudor, a vergonha ou mesmo a vontade de mandar ele parar com o que fazia... Só que não tive forças e fui levado por ele até a praia onde mais uma vez fui usado e dominado... Não posso dizer que foi ruim ou mesmo que ele me forçou a fazer coisas que não queria.
Gozei em sua boca pois ele queria provar do meu leite e em troca fui inundado pelo seu...
Deitamos na areia molhada próximo a água do mar e ele me confessou...
_ Disse a você que não iria atrás de você de jeito nenhum e só voltaria se você me chamasse... Não consegui. Acredita em mim se disser que tô cada vez mais envolvido por você?
Ao terminar de falar, sentou e me olhou. Repeti seu gesto e antes de falar o olhei cheio de compreensão...
_ Não podemos mais nos ver, Lucas. Há algo sobre mim que preciso te dizer. Eu sou...
_ Não me interessa que você é ou deixa de ser. Se você tiver alguém ou se você morar na lua... Eu só sei que não tô conseguindo ficar longe. Tudo o que vivemos nesses últimos dez dias só me dão certeza de que há algo a mais em nós. Você é um homem lindo, coroa. Eu sei que sou mais novo e que você pode pensar que eu sou um aventureiro.
_ Não é nada disso, garoto. Eu sou comprometido com...
_ Eu fui um garoto criado num orfanato. Não conheci pai, mãe, o escambau... As ruas foram a minha maior escola e devo te dizer que topei com um monte de gente boa e ruim. Fiz coisas que até a mim mesmo causaram surpresas e devo te dizer que ainda faço certas coisas porque preciso viver, pagar um aluguel miserável de uma quitinete onde moro. Não vim de graça pra cá não. Teria que acompanhar um cara que queria minha companhia... Só que na última hora ele não pôde vir e me disse pra aproveitar... Luiz, pela primeira vez na vida tô livre do que me tornei por necessidade. Tudo que tô vivendo e fazendo nessas férias é verdadeiro. Menti pra você ontem quando disse que estava com amigos, e quando falei aquela parada der ser filho de Deputado... Desculpa. Todos nós mentimos, né mesmo? Também escondemos nossas verdades pra poder ficar bem na fita, entende? Tô sendo sincero contigo, coroa. Você pode entender o que te falo e me perdoar por tanta falta de verdade?
_ Não posso te condenar por você ser o que é, Lucas. Só que não tenho como levar adiante o que nós estamos tendo aqui nesse lugar. Quando minhas férias terminarem, voltarei pra minha cidade e retomarei minhas atividades.
_ Eu moro em Diamantina... Pelo menos isso é verdade. Enquanto a gente não tá lá, que tal viver o que tiver que ser? Prometo que não vou te procurar lá...
_ Não prometa ao que não pode cumprir, Lucas. Quanto a viver o aqui e o agora...
_ Prometo que você não vai se arrepender... E dessa vez vou cumprir.
Passamos o resto dos dias juntos. Fazíamos quase tudo juntos. Lucas cumpriu o que dessa vez havia prometido e quando fomos embora do lugar, seguimos por caminhos diferentes no aeroporto de Salvador...
_ Avião é muito gasto e não posso ter esse luxo todo não, coroa.
_ E como você vai fazer pra chegar em casa? Perguntei com certa preocupação.
_ Fica frio que gato que anda em muro com pregos, sabe como fazer pra não se furar...
Apenas o olhei e em seguida o abracei apertadamente...
_ Você tem meu numero, já que disse a você que não te procuraria. Com você quero começar a cumprir com minhas promessas, Luiz. Tá na tua mão voltar a me ver ou não. Tenho certeza que te esquecer, será meio difícil...
Não tive mais notícias do tal garoto por vários dias. Seu numero de telefone estava bem guardado na última gaveta de minha escrivaninha. D. Gregório de nada desconfiava, apesar de me olhar com um certo cinismo no canto da boca ao me ver passar. Na minha mente a visão do belo rosto de Lucas Brandão estava sempre presente cada vez mais. Procurei pensar menos nele e me dediquei as novas funções junto ao Bispo da cidade.
Toda terça -feira meu expediente como Secretário de D. Gregório era feito apenas na parte da manhã e no início da tarde me dirigia a Paróquia de Nossa Senhora do Livramento para ouvir confissões. Logo que cheguei poucas eram as pessoas que lá estavam a minha espera. Troquei de roupa e entrei na cabine para começar a ouvir os fiéis e aplicar a penitência devida. Naquela que seria a oitava confissão, meu coração acelerou...
_ Boa tarde padre.
_ Que o Senhor esteja sempre contigo, filho. Estou aqui para te ouvir e ajudar...Quais os teu pecados?
_ Me perdoa porque pequei padre. Há dias atrás estava em outro estado quando conheci um homem por quem tenho certeza estar apaixonado.
Só reconheci a voz do garoto, Lucas Brandão, quando ele começou a contar a nossa história. Cada palavra que ele dizia da mesma me deixou sem ação...
_ Quando fui contratado pelo velho Bispo daqui, jamais pensei em me apaixonar. Prometi que não procuraria por ele aqui na cidade... Só que desejo fazer isso o quanto antes...
Um silêncio grande se fez por um longo momento até que o ouvi falar novamente...
_ Padre o senhor esta aí? me ajuda, por favor...
_ Saía e siga até a secretária da Igreja, filho. Me espere que já chego por lá... Foi tudo que pude dizer disfarçando o mais que pude a voz para que ele não me reconhecesse...
Ouvi passos fora do confessionário e senti meu coração pesar depois de tentar ordenar tudo o que havia sido dito pelo garoto. Por sorte não havia mais ninguém para confessar e após respirar fundo por várias vezes, segui com passos quase firmes até a secretária da Igreja.
Quando abri a porta, Lucas Brandão estava de costas olhando o grande crucifixo de madeira que havia lá. Ele parecia estar em paz e quando me viu com a batina e os demais paramentos, não conseguiu dizer mais nada...
_ Então é assim que você ganha a vida, rapaz? Quantos iguais a mim você já enganou? O que D. Gregório de Lucena e Brás tem a ver com você e o que vivemos lá no Sul da Bahia?
_ Coroa... Desculpa. Padre eu... Por que você não me disse que era um maldito padre que nem ele?
_ Tentei falar, você não deixou. O dinheiro foi suficiente pra você? Se divertiram muito às minhas custas entre uma...?
_ NÃO... PARA. Sua expressão era de dor e ela jamais seria maior que a minha.
_ Peça perdão a quem possa lhe perdoar, Lucas. Eu não tenho com fazê-lo. Saía daqui e de uma vez por todas da minha vida.
_ Não me manda sair da tua vi...
_ SAIA DAQUI SEU MALDITO...
Ele nada mais disse e seu olhar me mostrou o tamanho do seu sofrimento.
Não o vi por muitos anos. Nunca pensei odiar tanto uma pessoa até odiar mais ainda meu superior...
No dia em que pedi demissão do cargo de secretário e a consequente transferência para outra cidade, D. Gregório de Lucena e Brás me fez ver que assim como ele, eu era um fraco. Me fez ver que era pecador que nem ele e que iria muito longe, mais longe do que eu jamais pensei em ir.
_ Você ficará a meu lado e subirá junto comigo... Agora saía e me deixe trabalhar um pouco mais, Padre Avelar.
Nos anos que se seguiram, ele foi nomeado Arcebispo e pessoalmente intercedeu por mim junto ao Papa e fui nomeado Monsenhor... Quando Sua Santidade lhe nomeou Cardeal Arcebispo viajamos juntos para Roma e ele foi nomeado para um alto cargo na Cúria... E foi no segundo ano em Roma, meu vigésimo primeiro como sacerdote que fui chamado a sua sala.
E nossa conversa teve início e estava perto de um fim...
_ Você sempre foi um metódico, Avelar. O que você tem a me dizer?...
_ Excelência... Será que meu perdão o fará dormir em paz? Na verdade não há o que perdoar... Errei diante de Deus e diante de mim mesmo. Não há um único dia nessa minha vida que não reveja o meu passado e me arrependa dele. Ser confrontado com a minha vergonha da maneira que fui, só reforçou em mim a descrença de que poucos são dignos de perdoar e muitos são os pedintes... O senhor esta muito acima de mim ou do meu perdão que sempre será seu por ver diante de mim uma alma tão ou mais atormentada que a minha... Somos homens da Igreja cheios de erros e vícios. Ouso dizer que são poucos os que vestem nossos paramentos que realmente os mereça usar. Paz entre nós Eminência...
Caminhei em sua direção, me ajoelhei e beijei o magnífico rubi...
_ Já que não há mais nada a ser dito sobre o passado... Quero ser o primeiro a lhe parabenizar... Sua nomeação finalmente foi concedida por Sua Santidade. Amanhã serás conhecido como D. Luiz de Avelar Gusmão, Bispo Diocesano de Diamantina. Retornarei contigo para nossa terra e lá te sagrarei segundo os ritos da Igreja.
Eu não mais o ouvia. Meus sentimentos estavam em ebulição...
_ Ficarás livre de mim, D. Avelar... Finalmente terei que me separar de ti. Agora tratemos dos detalhes para nossa viagem...
Após ter com Sua Santidade uma reunião onde outros vinte nomeados estavam, partimos de Roma numa chuvosa manhã e como D. Gregório me disse, finalmente me li livre dele.
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Mais uma vez o meu agradecimento a cada um de vocês.
Estou tentando assimilar os comentários e o numero grande e e-mails que estou recebendo... Jamais imaginei que causaria tanto alarido.
Em minha defesa só posso dizer que sou humano.
Povo do Lado Esquerdo, nada mudou em relação ao que sinto por cada um de vocês.
Grande abraço. Nando Mota.