Eu acordei com o barulho dos animais e da rotina matinal da fazenda. Inspirei o ar puro e olhei para o meu amor que dormia ao meu lado numa cama de solteiro que fora da mãe dele. Era incrível como o ar do pantanal alterava o meu humor matinal.
Eu estava começando a apreciar esta diferença.
Com beijinhos no pescoço comecei a despertar o meu amor.
Eu o beijava nos lábios e ele respondia com paixão.
Do andar de baixo vinha um aroma delicioso de café sendo coado.
Nos levantamos, fizemos nossa higiene pessoal e fomos para o piso terreo. A vó Maria Augusta preparava o café da manhã enquanto vô Antônio sentado comia um pedaço da broa do dia anterior.
-Bom dia! -Ecoamos em uníssono.
Sem querer correr o risco e deixar passar novamente a oportunidade, Leonardo sem cerimônia alguma perguntou:
-Eu gostaria de saber quem é o meu pai. Minha mãe nunca disse nada sobre ele. Vocês sabem quem ele é?
-Neste momento, Augusto que retornava da suposta noitada e já havia aberto a porta da cozinha respondeu a pergunta:
-Um idiota que mora na fazenda ao lado. O nome dele é João Marcos.
-E não é que vocês são mesmo a cara de um o fucinho do outro? Como é que eu não percebi isso antes? - Disse um Antônio perplexo olhando para Leonardo.
-Meu Deus! Não é que é verdade?- Dona Maria Augusta completou igualmente surpresa por só agora notar a semelhança.
Neste momento ouvimos barulho de trote de cavalo e olhando pela janela vimos um homem vindo a galope em um cavalo marrom escuro de porte tão elegante quanto o negro de Augusto.
-Ora! E não é que é ele? - O senhor Antônio disse e completou coçando o queixo. - Mas o que ele veio fazer aqui justo hoje?
-Eu contei à ele. - Disse um Augusto reticente
O homem em questão apeou do cavalo e tirou o chapéu enquanto subia os degraus da escada indo rumo a porta da entrada.
Assim como o meu pai bilôgico era a minha cópia envelhecida, ele era a cópia de Leonardo também, só que nada velho.
-Mas ele deve ter uns 28 anos no máximo!
Disse Leo refletindo o meu pensamento em suas palavras.
Não. Ele trinta e quatro. Vinte e oito, tenho eu. - Respondeu um Augusto irritado.
-Mas então meu pai só tinha 14 anos quando...
-Exato - Disse Augusto cortando Leonardo.
Eu não entendia toda a irritação de Augusto. Hum! Havia mais caroço naquele angú do que se supunha.
Quando chegamos na sala dona Maria já estava pedindo que João Marcos se sentasse.
Mas ele ao nos ver passando pelo batente da cozinha ignorou dona Maria e veio até Leonardo dando um pequeno sorriso.
Então é verdade? Eu tenho um filho homem? - Começou a rir como um bobo. Olhando Leonardo como se ele fosse a coisa mais especial que já vira. Depois olhou para Augusto e disse ainda sorrindo.
- Você tem razão. Ele é a minha cara nessa idade.
Leonardo estava meio que mudo e sem saber o que fazer, então esticou a mão dizendo:
-Éh..Muito Prazer Senhor!
João Marcos, visivelmente surpreso com a atitude formal de Leonardo, pegou em sua mão e disse em um lamento:
-Eu não sabia. Se soubesse não teria deixado você passar um único minuto longe de mim.
Dizendo isso puxou Leonardo e o abraçou.
Leonardo comovido com a atitude de João Marcos também o abraçou.
Todos nós tinhamos os olhos humidos, inclusive Augusto.
Marcos queria saber tudo sobre Leonardo.
Começou perguntando, um pouco constrangido se era verdade que nós eramos casados.
Leonardo me olhou e sorriu. Eu retribui o seu sorriso.
- Bem, nós tivemos uma cerimônia de casamento bastante privada, mas não tem valor legal. Então nosso advogado também redigiu uma declaração de união estável que já foi registrada em cartório. Esta tem reconhecimento legal.
-Então já é possível dois homens se casarem? - Perguntou joão Marcos com verdadeira surpresa.
-Ainda não é com todos os direitos que um casamento hétero tem, mas já estamos caminhando para isso. - Leo respondeu feliz que seu pai se interessasse pelo assunto.
João Marcos olhou para Augusto que o olhava fixo, como se quisesse... Hum! Acho que o pai de Leo tinha um interesse no assunto, maior do que apenas o bem estar do filho e algo me dizia que isso tinha haver com Augusto.
João Marcos perguntava sobre tudo.
Leo contou novamente toda a historia de sua infância. Ambos choravam abraçados e João Marcos lamentava que não soubesse da sua existência, por que do contrário jamais teria permitido que seu menino fosse parar em um orfanato.
Então João Marcos sorriu e disse para Leonardo:
-Vocês tem que vir comigo para casa. Você precisa conhecer Sofia.
-Quem é Sofia. - Perguntou Leonardo curioso.
-É a sua irmãzinha caçula ela tem apenas cinco anos.
Leo deu neste momento o sorriso mais luminoso que eu já tinha visto nele.
Meu coração se enterneceu.
De um dia para o outro ele foi de menino órfão para alguém que tinha. Avô, avó, tio, pai e até mesmo uma irmãzinha.
Certa vez ele me contou que quando criança ele sonhava que seu pai o vinha buscar no orfanato e trazia um monte de irmãos e todos diziam que a vida toda procuravam por ele.
Agora ele descobria que era tudo real. Que ele nunca foi abandonado. E tudo isso acontecera por que sua mãe fora uma grande cabeça dura orgulhosa.
Augusto nos levou na caminhonete para a casa de João Marcos. A sua fazenda era um dos locais mais bonitos que estivemos em todo o nosso passeio. Parecia uma dessas fazendas de cantores de música sertaneja, que passa na televisão. Apesar do ambiente ser rústico, tudo era muito bonito, rico e moderno.
Descemos todos do carro, enquanto João Marcos chegava por um atalho lateral montado em seu cavalo.
Eu filmava tudo com a câmera nova.
Queria registrar aquele momento para mostrar para Bilóca, Alice e Daniel.
Entramos na casa e logo uma garotinha de cabelos longos levemente ondulados veio correndo e abraçou João Marcos, chorando e dizendo:
-Papai, papai! Onde você estava?
Pensei que você me deixou também.
Segurando ela no colo, João Marcos respondeu:
-Não meu amor. Papai foi buscar uma surpresa bem grande para você.
O rosto da garotinha então se iluminou com um enorme sorriso que fazia aparecer covinhas no rosto, assim como o do pai e do irmão.
- E que surpresa é? - Ela olhou ao redor e paraceu finalmente nos notar.
- Quem são eles papai?
Leonardo olhava para a garotinha de forma admirada e ansiosa.
-Bom, você não vive me perguntando se eu não vou te dar um irmãozinho?
Sofia sacudiu a cabeça afirmativamente com um enorme sorriso.
-E se eu te disser que eu te trouxe um irmão grandão pra você conhecer?
-Grandão? - Virou para Leo e perguntou:
-Que nem ele?
-É meu anjo. Pra dizer a verdade esse moço bonito aqui é meu filho também. Assim como você é minha filha. Ele se chama Leonardo e ele é seu irmão.
Sofia sorriu para Leo e perguntou:
-Você tem a música da galinha pintadinha?
Sem fazer idéia de o que era a galinha pintadinha Leo respondeu:
- Não. Você tem?
Pelo sorriso de Sofia deu pra perceber que ele deu a resposta certa.
- Você quer que eu te mostre? - Leo respondeu afirmativamente.
Somente então Sofia pareceu me notar.
-E você? Também é meu irmão?
Sem pensar duas vezes respondi.
-Eu sou o marido do seu irmão. Então você pode dizer que eu também sou seu irmão.
A pergunta que veio a seguir surpreendeu a todos.
-Você é marido dele? Então você beija ele na boca?
-Beijo sim- Respondi rindo.
Ela fez um sinal de afirmação como quem confirma algo que já sabia. Virou para Leonardo e declarou com a simplicidade da lógica constrangedora que só as crianças de cinco anos tem.
-Meu pai era marido da minha mãe, ele beijava ela na boca, mas aí ela foi embora. Aí eu vi meu pai beijando o Augusto na boca. Então agora acho que eles são maridos também. Mas eu nunca beijei ninguém na boca. Por isso eu não tenho marido.
João Marcos ficou branco, Augusto escarlate, Leonardo que até aquele momento não tinha percebido nada, de queixo caído e eu, que ainda segurava a câmera na mão, caí na gargalhada.
Nesta hora para alívio principalmente de João Marcos. Jussara, a governanta, entrou chamando a todos para um desjejum um pouco tardio.
Augusto pediu desculpas alegando que tinha muito serviço.
Tenho quase certeza que João Marcos sussurrou a palavra "covarde" em seu ouvido quando Augusto virou rumo a porta.
Augusto apenas sorriu e acenou levantando o chapéu.
O dia voou. Nós Nadamos na piscina, conversamos sentados na varanda e Leonardo não desgrudou um segundo do seu pai e de sua irmã.
No dia seguinte tinhamos que partir. Me arrependi de não haver falado a verdade sobre a razão da nossa viajem no primeiro dia. Assim Leonardo teria desfrutado mais tempo com eles.
João Marcos, que estava especialmente orgulhoso pelo desempenho acadêmico do filho, falou que fazia questão de fazer o que faria qualquer pai. Daria, apesar de com dois anos de atraso, um carro da escolha de Leonardo para comemorar sua entrada na úniversidade. E até que ele completasse todo o seu estudo, no caso de Leonardo seria o doutorado, seu pai lhe daria uma pouposa mesada.
Leo a principio recusou, mas João Marcos com os olhos cheio de lágrimas usou um argumento que Leonardo não teve coragem de refurtar.
Meu filho, a vida já me levou o privilégio de te ter no colo e cantar para você dormir quando era bebê de te ver aprender engatinhar, dar seus primeiros passos, ouvir você balbucear as primeiras palavras, te ensinar jogar bola, andar de cavalo, pescar... Não me tire o pouco privilégio que me restou. Metade do que eu tenho é da sua irmã, a outra metade é sua.
Qual é o mau de usar o que já é seu por direito?
Leo olhou para mim de forma interrogativa e eu acenei positivamente.
Não que eu mesmo não quisesse ajudar financeiramente meu marido, mas seu pai tinha razão. A sua herança, assim como a minha era parte do que o definia como quem ele era.
Leo sorrindo, finalmente concordou e João Marcos anotou seus dados para depósito no celular.
Leo abraçou João Marcos e disse:
-Pai, você pode me ensinar a pescar e a cavalgar, quando eu voltar.
Satisfeito e emocionado por ser chamado de pai, João Marcos que mais parecia um irmão mais velho, abraçou e beijou a testa de Leonardo.
Nos despedimos na manhã seguinte com a promessa de que nos visitaríamos mutuamente em breve. Leo lamentou não poder aguardar o retorno dos pais de João Marcos que estavam em uma viajem fora da cidade.
Conhecer os avós paternos de Leo, ficaria para quando retornássemos.
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CONTINUA
Torno a agradecer à todos que vem acompanhando o meu conto votando, comentando, ou apenas lendo no anonimato.
Resposta aos comentários do capítulo anterior:
Sheilinh@ emersous e Amon ❤️ Adorei saber que vocês tenham ficado"pretéritos" ao ler sobre o pai e o tio do Leonardo. Acho que no capítulo de hoje até o Leo ficou...rsss.
cintiacenteno Obrigado por estar sempre presente, amore!
Sheilinh@ Não se preocupe minha linda. Eu adorei que você tenha feito o comentário. Este tipo de participação e troca é muito estimulante para quem escreve. Bejão!
Amanhã tem mais gente.
Beijos a todos!
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