Capítulo 18
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Eu, o Arthur e o Breno fomos até a minha casa para eu tomar um banho e me trocar.
- Você tem 05 minutos Alan – disse meu irmão enquanto eu ligava a ducha.
- Você vai tomar banho comigo? – perguntei me referindo a ele que não me deixava a sós.
- Nunca! – disse ele saindo e batendo a porta.
Tomei o legítimo “banho de gato” e menos de 05 minutos depois eu já estava trocado. Corremos até as churrasqueiras que estavam acesas já. Minha mãe deu uma bronca daquelas por eu ter desaparecido. O Murilo não se encontrara na festa. Talvez estivesse com medo do meu irmão.
- Você não quer fazer um favor de irmão? – perguntei puxando o Arthur de lado.
- Nada que eu tenha que mostrar esse belo corpo que Deus me deu! – disse ele passando a mão no seu corpo.
- Transformaria meu aniversário num show de horrores– disse fazendo-o enrugar a testa.
- Viu? Você pede para eu melhorar e fica ai me tirando.
- Acho que está no piloto automático, sabe? Tantos anos!
- Entendo! Mas diga ai, o que seu irmão pode ajudar? – disse ele todo sorridente.
- Você poderia interfonar para o Murilo e pedir que ele venha até a festa?
- Você tá louco? Por que eu tenho que ligar pra um homem barbado daqueles? – disse ele se afastando e voltando para sua roda de amigos.
- Acho que ele está constrangido em voltar para minha festa – disse me sentando ao seu lado.
- Isso é problema dele. Aliás, isso é comportamento de quem tem “culpa no cartório” – disse ele dando uma golada no seu copo de cerveja.
- Larga à mão Arthur, ele só está sem graça. Ninguém ali estava fazendo nada de errado. Te juro! – disse beijando meus dedos em sinal de juramento
- Está certo! Mas que ele não me convenceu, isso não.
- Ok!
Acompanhei ele ate o interfone e fiquei ao seu lado até ele desligar.
- E então? – perguntei quando ele bateu o interfone no gancho.
- Ele disse que vai conversar com um amigo dele e já vem. Mais alguma coisa irmão? – perguntou ele num tom de deboche.
- Queria que você transformasse essa festa, em “A Festa”. Tem como? – disse implorando a ele.
Eu queria que essa festa ficasse marcada na minha vida.
- Com esse bando de avós, pais, crianças e gente brega? Impossível! – disse ele virando as costas – A não ser que o tema seja “Jurassic Park”
- Qual é Arthur? Eu sei que você pode – disse segurando-o pelo braço.
- Alan, mesmo que eu fizesse um milagre, não teria como tirar o “Jurassic Park” daqui. Pensa nisso – disse ele se soltando das minhas mãos.
- Já eu sei! – disse o Breno colocando a cabeça entre nós dois.
- Seu filha da puta, estava escutando nossa conversa? – perguntei assustado.
- Lógico! – disse o Breno sem ter um pingo de vergonha.
- Mas e um cretinão mesmo? – disse meu irmão socando ele.
- Vocês querem ou não uma festa de verdade? – perguntou o Breno com sorriso safado.
Minutos depois, o Breno, o Bruno e o Arthur apareceram com o aparelho de som dos gêmeos para colocar na festa.
- Por que vocês não ligam essa porcaria? – perguntei quando vi que os aparelhos estavam funcionando.
- Alanzinho, cuidado com essa boca. Não chame essa belezinha aqui de porcaria – disse o Breno jogando um pedaço de carne na minha cara – Afinal, foi o senhor que me pediu.
- Tá, tá, tá, para de drama que você entendeu o que eu quis. Então...?
- Então que a mamãe do Alan disse que se algum ser vivo nessa festa ligar o aparelho antes de ela cantar o parabéns, ela chamaria a S.W.A.T. para prender a gente. Mais alguma coisa? – perguntou o Breno ironicamente.
- Aff – suspirei incrédulo – E você Arthur, não pode convencer a mãe?
- Eu sou Arthur Bortolozzo. Um belo exemplar de irmão – disse ele passando a mão pelo corpo - não um Milagreiro.
- Espera mais uma hora Alan, ela só canta parabéns e depois vai embora levando todos com ela – disse o Breno me confortando.
Concordei e voltei a me sentar com minha turma.
Por volta das 21:30, meu irmão e minha mãe aparecera com o bolo para cantar o “parabéns a você”. Toda a galera foi se reunindo perto da mesa e pelos olhares eu sabia que viria muita piada nesse parabéns. O King que tinha sumido agora estava ao meu lado, com uma roupa limpa e todo cheiroso. Eu estava tão feliz e bem relaxado (tinha bebido cerveja) que nem sabia para quem olha ou dar atenção. E foi nessas “olhadas” que bem ao fundo, no meio de todos, quase escondido, que eu vi o Burrão olhando para o chão, como se tivesse achado algo importante.
Nessa hora, meu mundo parou, meu estômago revirou e nada mais importava para mim, eu o queria comigo. Continuei a olhar, mas ele não tirava os olhos dos pés e, aproveitando o efeito, do álcool fui falar com ele. Quando cheguei perto dele, ele levantou a cabeça e me encarou por uns instantes. Não sorrira, não piscara, apenas continuava a me olhar sem mexer um único músculo, fazendo o meu coração acelerar. Ele estava lindo, usava uma camiseta pólo branca, calça jeans, sapatênis e os cabelos estavam penteados com muito gel no estilo topetinho. Ele não tinha barba no rosto, mas tinha as famosas “penugens” e pelo que pude perceber, ele raspara tudo. A testa dele estava com varias escoriações, sem falar na sobrancelha que tinha perdido alguns pelos. Mesmo assim ele estava lindo. Eu gostava tanto dele que quando cheguei mais perto, não pensei duas vezes em abraçá-lo.
- Que bom que você voltou moleque – disse dando mais um abraço nele e sentindo aquele cheiro gostoso dele.
- É seu aniversario de 21 anos! Seria muito injusto eu não estar aqui nessa data tão importante – e começou a sorrir.
- Pode ter certeza! Saiba que você é muito importante para minha vida – e era mesmo.
Ele sorriu, mas no fundo eu sabia que ele estava receoso.
“Sabe quando o nosso cachorro faz alguma coisa de errado e você, às vezes, da uma chinelada e ele fica o dia todo te olhando de “rabo de olho” com o rabo entre as patas? Cara de piedade? Era daquele jeito que ele estava me olhando. Confesso que fiquei com muita pena dele.“
Se eu pudesse, eu o abraçaria, daria beijos leves no seu rosto e passaria a mão nos seus cabelos até adormecer.
- Obrigado! – ele disse abrindo um sorriso fraco.
- Mas vamos parar de veadice e vem comigo lá cantar parabéns. – eu disse o abraçando. Segurei pelo braço mas ele ficou intacto.
- Prefiro ficar aqui Alan. Pelo o que aconteceu hoje – ele disse com uma cara de dó – desculpa por eu ter acabado com teu jogo.
“O quê?” – pensei.
- Cala a boca Burrão. Você não tem que pedir desculpa de nada – eu disse irritado.
Agora entendi porque ele era o único a estar de calça jeans. Ele estava escondendo os ralados.
- Poxa Burrão, você é meu irmão e não é justo você ficar aqui.
- Sem problemas Alan. Você sabe como eu gosto de você. Só que hoje, estarei aqui atrás te observando – e apontou para o Murilo que estava olhando para nós.
- Mas é você que sai comigo todos os dias, que fica até madrugada aqui embaixo batendo papo, que sabe tudo da minha vida e até meus gostos e mania. Não é justo comigo e com você estar no final da fila.
- Alan, meu irmão – disse ele me segurando meus ombros – prometo fazer o que você quiser fora daqui, mas agora ficarei melhor se eu ficar um pouco afastado – disse me puxando e dando um abraço muito apertado. Como era bom aquele abraço, com o cheiro dele – Vai lá guri, todos estão esperando por você.
- Está bem Burrão, mas depois tu vem comigo. Quero tomar “umas” com você, ok? – e sai de perto do Biesso voltando para mesa.
Fui até a mesa do bolo para cantar logo o parabéns e voltar para a festa.
“Cantar “Parabéns a você”, caros leitores, é meio nostálgico para mim. Sou do tipo de pessoa que não gosta de saber que esta envelhecendo, mas voltando ao texto...”
Eu estava aguardando o resto das pessoas se reunirem, quando o Murilo, com todo aquele jeito rinoceronte de ser, pulou e me deu um “daqueles” abraços que ele acostumava a dar nas pessoas, só que estava bem mais forte que o normal. Abraçando-me daquele jeito e cheiroso como ele estava, ia me excitar rapidinho. Soltei-me dele e dei um sorriso amarelo.
- Ué, não posso te abraçar? – ele perguntou carrancudo.
- Lógico que pode! Quer dizer, sei lá! Ah, sei lá Muca! – eu disse sem jeito.
- Você abraçou a festa inteira e não pode me abraçar? – ele ainda estava irritado.
- Lógico que pode! Só estou meio bêbado eu acho! – eu menti.
- Nossa, foi ótima essa mentira! – ele disse sorrindo.
- De boa Murilo só fiquei meio “sei lá” – eu disse fazendo-o arquear a sobrancelha.
- Tá bom, sem abraços! – ele disse abaixando a cabeça.
- Lógico que pode me abraçar, para de graça – eu disse e ele abriu um sorriso.
- Ebaaaaaaaaaaa! – ele disse e me dera outro abraço apertado.
Quando ele me soltou, percebi que ele estava rindo. Só que era uma risada baixa, uma risada de algo que ele disse para ele mesmo.
- Que foi da graça? – perguntei.
- Uma teoria nova – ele disse rindo – uma teoria que eu já havia pensado.
Eu fiz cara de não entender nada.
- Deixa para lá – disse ele continuando a rir.
“Legal ele. Detesto perguntar coisas as pessoas e elas não responderem. Mas quando eu olhei de lado eu pude entender.”
“Filha da puta!” – pensei.
O Murilo é o ser mais filha da puta de todos. Quando eu olhei de lado o Burro estava me encarando com cara de nojo.
“Então era isso! Agora o Murilo vai dar de cuzão para cima do Burro!” – pensei.
Eu olhei de volta para o Murilo que ainda estava com um sorriso sarcástico.
- O que aquele panaca quer? – disse bem baixo ao pé do meu ouvido.
- Do que é que você está falando Murilo? – perguntei.
- Sei lá. Fica parecendo um cachorrinho sem dono e fica todo “melosinho” para cima de você – ele disse.
- Murilo, pega leve com ele cara. Eu adoro o Burro!
- Burro? – perguntou ele rindo – quem é que chama seu amigo de Burro? – repetiu ele, mas agora fazendo todos ouvirem.
- Não é Burro de burro. É Burro por causa do filme Shrek.
- Credo! Que apelido ridículo! – disse ele as gargalhadas.
- Para com isso. Já disse que o adoro! – disse me afastando dele.
- Adora? Só por que ele é um playboy, jogador de futebol e bonitinho? – e comecei a perceber que ele estava ficando mais sério. – Vou dar uns corretivos nele.
- Murilo, sinceramente, eu queria saber o que o Biesso te fez?
- Primeiro, entenda o que você quiser do que eu vou dizer agora. Segundo, só estou marcando território – disse e deu as costas para mim.
“Caralho! Não era que ele realmente ficou com ciúmes?” – pensei excitado.
A boa noticia é que talvez eu pudesse dormir na casa dele hoje à noite, e lá, completar tudo aquilo que paramos de fazer no vestiário.
“Como que eu vou conseguir me concentrar na festa?” – pensei.
E realmente não consegui. Dei muitas olhadas na sua bunda enquanto cantávamos parabéns e mais ainda enquanto íamos de um lugar para o outro conversar com nossos amigos
“Eu acho que ele esta gostando dessa brincadeira?” – pensei.
“Caros leitores, tenho certeza que muitos de vocês estão dizendo: “Nossa, que cara lerdo!” ou “Se fosse eu já teria pegado, etc...” Mas pessoal, não sei por que eu travo sempre quando vou falar com homens. Será que sou o único? É bem engraçado, quando estou numa balada ou ambiente propício para rolar algo é automático como minha postura muda. Tomara que um dia vocês tenham oportunidade de me ver em uma balada. E bem assim: estou eu lá sorridente, dançando, descontraído até que chega um rapaz e, bum. Tudo muda. De descontraído eu passo a ficar estático, sério e com cara de “quem bate em veado”. Muito dos rapazes se assuntam, já outros adoram. Será que um dia vou conseguir ser tão “atirado” que nem uns amigos meus?”
Eu já estava me assustando com as brincadeiras do Murilo. Estavam ficando cada vez mais diretas e quentes. Teve um momento que eu estava indo falar com minha mãe e ele me seguiu. Quando ninguém estava olhando, apertou minha bunda e saiu dando risada.
“Eu preciso parar antes que alguém perceba.”
Um pouco tempo depois, os mais adultos começaram a ir embora.Depois de despedir dos meus parentes, voltei para onde estavam meus amigos. E o Burrão veio ao meu encontro.
- Alan, vim me despedir. – ele disse meio triste.
- O quê, agora que todo mundo foi embora que a festa vai ficar boa? – disse bravo.
“Todos que eu digo eram os meus parentes e pais dos meus amigos que moravam no prédio.”
- É que você trouxe uma “Celebridade” para nossa festa e ele esta se sentindo “O cara” – disse ele apontando o Murilo com a cabeça.
Mas eu sabia que não era por isso. Ele queria embora por estar com medo do Murilo fazer dele o centro das piadas.
- Burro, você sabe como eu quero que você fique aqui. Por favor, fica pelo menos mais um pouco e fica andando comigo?
Ele me fitou, ficou pensando por um bom momento.
“Poxa, o cara era meu melhor amigo e acho de direito ele ficar comigo na minha festa, independente de qualquer idiota que aparecesse.”
- Não Alan, você está muito ocupado dando atenção aos outros. Não que eu esteja reclamando, mas é seu aniversário. É o seu dia. – ele disse olhando para o tênis.
Realmente ele estava encanado com o Murilo. Tanto que fechou a cara e fez um bico, que nem criança quando leva bronca da mãe.
“Mas qual solução que eu daria se eu quisesse o Burro e o King na minha festa? Se eu ficar perto do Burro, o King com toda certeza iria usá-lo como saco de pancadas. Se eu ficasse perto do King com certeza o Burro ficaria chateado comigo. Pensa no lado bom Alan, amanhã o King irá voltar para o I.T.A. Já o burro ficaria com você pelo resto da vida. Porém, se eu ficar com o King, poderei ter chances em finalizar aquilo que começamos nos vestiários.”
- Burro, fica aqui. Você não tem mais nada de importante pra fazer do que ficar na minha festa. Ou você quer passar o resto da noite em casa jogando Playstation?
- Ok! Só que não queira que eu seja educado com aquele palhaço – disse olhando para o Murilo que estava num canto com um bando de garotas.
- Fica frio! Ninguém aqui vai te encher o saco. Prometo – eu disse fazendo sinal com mão para ele me acompanhar.
Ele ficou parado me olhando.
- Vem pra cá logo seu besta – eu o chamei, fazendo-o rir.
Não sei se era o álcool ou outra coisa, sei que o Murilo deixou o Burro sossegado por um bom tempo. Achei ótimo. Até porque meu intuito era se divertir. Durante várias vezes na festa o Murilo foi falar com o Burro, sentava perto dele para fazer uma piada, ou quando o Burro dizia alguma coisa interessante, lá estava o King interrompendo-o e complementando suas ideias.
“Dá para acreditar que aqueles dois, que era como gato e rato, unidos, contando piadas e rindo juntos? Sei lá, nem eu acreditava!”
- Se você não fechar essa boca vai encher de mosquitos – disse o Bruno, irmão gêmeo de Breno.
O Bruno tinha um comportamento intrigante. Pois não era tão palhaço quando o irmão. Ele era muito mais quieto. Tão quieto que mal ouvíamos a sua voz na roda de amigos. O que intrigava não era apenas essa diferença de personalidade que os irmãos tinham, sendo um extremamente quieto e o outro extremamente divertido. Ambos eram loiros escuros e olhos verdes claros. O que realmente intrigava, era a forma que ele se vestia. Sem falar que ele usava as roupas mais TOP’s, fazia inúmeros penteados que a turma sempre copiava, foi o precursor do piercing na sobrancelha aqui no condomínio. Na minha festa ele usava um bermudão surfista, camiseta regata para mostrar os músculos, piercing na sobrancelha, barba por fazer e um moicano de dar inveja para qualquer um. Os adultos apontavam para ele dizendo ser um maloqueiro. O que eles não sabiam, era que os gêmeos eram muito mais ricos que o Murilo. Sempre que o Bruno mudava seu estilo, dias após o Breno copiava. Ele via o tanto que o irmão fazia sucesso e logo começava a usar as mesmas roupas, penteados, etc. Ele dizia que o Bruno era lindo, porém, muito lerdo em relação às mulheres. Então, o Breno copiava seu “look” para fazer aqui que o Bruno não tinha coragem.
- Só estou abismado com dois amigos que não se falam, hoje, estão se falando! – disse apontando para o Burro e o Murilo.
- Entendo!
- E esse moicano? – perguntei passando a mão nos cabelos arrepiados que nem se mexiam por causa do gel cola.
- Curtiu? – perguntou ele dando um longo gole de cerveja – É para contrastar com meu look maloqueiro, como andam falando de mim aqui na festa – disse ele dando uma gargalhada.
- Te ver gargalhando é mais raro do que ver aqueles meus amigos ali juntos – disse fazendo rir novamente.
- Cerveja meu amigo, cerveja!
Nunca tive uma oportunidade de estar um palmo da sua pessoa. Aqueles olhos verdes combinavam perfeitamente com o brilho do piercing. Ele estava tão lindo que eu mal conseguia tirar os olhos dele.
- Que foi? – perguntou ele sem graça, abrindo um sorriso com dentes brancos e perfeitos. Aquela barba loira por fazer.
- Cerveja! – respondi envergonhado – Estava vendo seu piercing.
- Pior saber que meu piercing vai virar “carne de vaca” daqui uns dias. Hoje ninguém usa e recrimina, amanhã todos estarão usando.
Lá no condomínio nós classificamos os adultos como “Os Grandes” e, dentro dessa classificação, tinha “As Véia” e “Os Véio”.
“As Véia”, geralmente ficavam nas festas até um certo horário e depois iam para suas respectivas casas. Já “Os Véio”, eles ficavam até mais tarde, bebendo e jogando truco.
Quando “As Véias” foram embora, meu pai aparecera na nossa churrasqueira e deixou uma caixa de cerveja para a gente beber a vontade.
“Agora Leitores, pensem bem se meu pai tem juízo?”
Óbvio que Sim! Ele dera ouro aos pobres! E começamos a beber descontroladamente. Quando “Os Véios” subiram, deixaram o baralho para nós jogarmos. Ou seja, cerveja mais baralho, igual à zona.
Lembro que ficamos jogando até à 01:00 da manhã e, para meu azar, de todos os sorteios de duplas que tivemos, não “cai” nenhuma vez com o Burro ou o Murilo. E nem os dois jogaram entre eles. Quando estávamos jogando a partida que definiria o “Campeão dos Campeões”, algo aterrorizante aconteceu. Primeiro, um barulho de explosão, seguido de um clarão. Depois houve gritaria de moradores que estavam em seus apartamentos e dos guris que estavam na festa. Eu levantei num pulo e corri para tentar ver a cena.
No condomínio, tinha uma área destinada à coleta do lixo e, a mesma, estava em chamas. Com sacos de plástico, restos de comida que geravam gases e materiais recicláveis, o fogo se alastrou rápido, fazendo da montanha de lixo, uma imensa bola de fogo e fumaça. Os seguranças e os meninos agiram rápido e foram até o hidrante, onde eles ligaram e apagaram a bola de fogo com facilidade.
“Vendo por este ponto de vista, Leitores, não pareceu nada grave, mas vendo pelo lado do pós-incêndio, o estrago fora gigantesco”.
O fogo queimara árvores e o jardim de rosas que lá tinha. A fumaça, por causa do isopor e do plástico das sacolinhas, produzira uma fumaça negra que grudara na parede do prédio. E o plástico que derreteu, grudou no chão que precisou ter o concreto retirado, pois manualmente não saía. Meus pais desceram rápido para prestar “apoio”. Quer dizer, foi o que eles disseram. Pois eu sabia que eles só tinham aparecido para certificar que o fogo não fora culpa minha. Quando era 03:00 da manhã, estava praticamente os 220 moradores do condomínio na minha festa. Até a polícia aparecera. O Mais grave aconteceu com carros que estacionados em frente à lixeira. Infelizmente, um deles era do Murilo. O Carro dele fora atingido por respingos de plásticos queimados, estilhaços e restos de comida da explosão, acabando com a lataria Audi A3 preto.
Não fora grande coisa, mas para os carros que estavam perto infelizmente tiveram prejuízos. Depois da conversa, entre os policiais, sindico e moradores – tudo em alto e bom tom – o pessoal começara a voltar para casa. Ficaram apenas aquelas pessoas que foram “indiretamente” atingidos pelo fogo. Quando era 04:00 da manhã, estava apenas alguns guris que tinham ido a minha festa. Na verdade uns dez apenas, pois a maioria dos pais não permitiu que eles continuassem na festa. Já os que ficaram, não estavam lá tão felizes. Lógico que ninguém teria mais ânimo para minha festa. Todo mundo estava cabisbaixo comentando sobre o incêndio. O papo estava até interessante, quando fomos interrompidos mais uma vez.
- Não acredito! – disse uma voz as minhas costas. Era o Murilo – Não acredito que foi esse filha da puta – novamente passando por mim e indo em direção ao vulto que vinha em nossa direção.
Agora que eu reconhecera. O vulto era o Burro que vinha em nossa direção. Mas nem de longe parecia o cara bem vestido do começo da festa. Ele estava suado, com as mão e as roupas sujas de fuligem. Os moleques, sem entender nada, se levantaram e foi ver o que estava acontecendo. O Murilo estava gritando. Eu me levantei e fui ao encontro deles para tentar acalmá-los.
- Olha o que você fez, seu estúpido, babaca, filha da puta! – gritava Murilo.
- Para Kingão, ele nem estava aqui na hora – falou um amigo meu que segurava ao Murilo.
- Eu sabia. Eu sabia sim! Ele me odeia esse veado mal comido – dizia ele indo para cima do Burro que estava olhando para baixo.
“Não, não, não, não. O Burro ter ateado fogo na lixeira para atingir o King?” – pensei.
Na hora ate me deu ânsia de vomito.
- Foi você Biesso? – perguntou outro amigo nosso, fazendo o Burrão erguer a cabeça – Responde Biesso. Pelo amor de Deus, foi você? – meu amigo perguntou indo ao lado dele.
- Eu nunca faria isso – disse ele quase sem voz.
- Fala alto sua bicha do Inferno! Admita que foi você quem queimou a porra do meu carro, seu lazarento! – gritava o King.
- Não fui eu Murilo– ele disse chorando – Tinha um cara. Um cara alto mechendo nas lixeiras e jogando um liquido. Quando o vi, ele me bateu na cabeça e... acabei desmaiando.
- Tá bom! Conta a do português agora – disse o Murilo ironicamente.
- Olha Kingão, o Biesso não faria isso cara. Ele é o cara mais “cabeça” da turma – disse o Guilherme ao meu lado.
- Foi você Burrão? – eu perguntei.
Ele olhara para mim, como se eu fosse a coisa mais nojenta do mundo. Obvio que não era ele. Ele nunca fez mal para uma mosca.
- FOI VOCÊ QUE FEZ ISSO? – eu gritei.
Ele apenas fez sinal negativo com a cabeça.
- O que está acontecendo aqui, Garcia? – perguntou uma voz estranha.
Era o pai do King.
Só para recordar, o nome completo do Murilo era: Rafael Garcia.
- Nada pai, apenas conversando sobre o ocorrido – disse o Murilo na maior cara de pau. Com uma voz de santo.
- E você jovem, por que está todo sujo de fuligem? – perguntou-o para o Burro.
- Porque eu ajudei a apagar o fogo e me sujei – disse ele quase sem voz e olhando para o chão.
- Isso é verdade? – perguntou o pai do Murilo.
- É sim, senhor! – disse o Burro começando a chorar.
- Besta! – disse o Murilo fazendo alguns rirem.
- O que você disse Rafael? – perguntou o pai dele virando em sua direção.
- Não pai. Apenas, sei lá! – disse ele rindo.
O pai dele então foi a sua direção e ficou poucos centímetros dele. Como se fosse o beijar na boca a qualquer instante.
- Apenas “sei lá”, o quê? – perguntou ele com cara de pitbull após ter suas bolas chutadas.
- Sei lá... quis dizer, olha lá. Olha as mãos dele sujas de fuligem. Olha como ele cheira a álcool. Você não acha que tá muito suspeito? – perguntou o Murilo com medo.
Era a primeira vez na vida que eu vira o Murilo com medo.
- Um Engenheiro da Aeronáutica, com 25 anos, no meio da molecada, querendo bancar o detetive ou sei lá o quê? – disse o pai do Murilo fazendo o corar – você deveria estar atrás de mulher e sossegar essa cara.
- O cara sumiu da festa e depois apareceu todo cheio de fuligem. Eu não preciso bancar detetive algum para saber que foi ele quem acabou com o meu carro – disse o Murilo apontando para o Burro.
- Cale sua boca quando estiver perto de mim – disse o pai do Murilodando um tapa forte na sua cara – Nunca mais responda ao seu pai.
O Murilo apenas afirmou com a cabeça. Na lateral do seu rosto foram formando a marca dos dedos do senhor Garcia.
- Isso foi um acidente. Ninguém aqui é culpado de nada, entenderam? – perguntou o pai do Murilo com uma expressão furiosa.
- Sim senhor! – responderam imediatamente todos.
- Agora, tem umas garrafas ainda na piscina de gelo. Quem quer brindar o aniversário do nosso amigo Alan? – perguntou o pai do Murilo, colocando a mão no meu ombro e rindo para fazer todos descontrair.
O Murilodeixou a turma e foi até o seu carro.
- Deixe o para lá filho – disse o pai do King.
- Acho que o Murilo bebeu um pouquinho a mais senhor Mauro – disse olhando para o grande rapaz que rodeava o carro todo estragado.
- Exatamente por isso que eu quero que vocês se divirtam. Ele bebeu demais e está se achando o Rei. Mas deixemos o meu filho para lá e voltemos ao seu aniversário. Poderia pegar uma cerveja na piscina para mim?
“Piscina de gelo era o apelido que dávamos para o lugar onde gelávamos as bebidas. Uns dos pais compraram aquela piscina de 1.000 litros e a enchera de gelo. Depois, jogaram dezenas de dúzias de garrafas de cerveja, refrigerante e água. Pronto, estava feita a diversão dos adultos”
A galera inteira concordou com o Senhor Mauro e fomos brindar ao meu aniversário. O pai do Murilo, por mais ameaçador, terrível, intimidador que fosse, era também um cara bacana. Ele ficou apenas uns 10 minutos conosco e depois se despediu da galera. Deu um abraço no Burro, um abraço forte em mim e depois foi despedir um a um dos meninos da turma.
- Alan, meu bom menino – disse o senhor Mauro todo alegre pelo álcool – Quero lhe desejar tudo de bom e que conquiste tudo aquilo que sonhas. Lógico, precisa de saúde para correr atrás dos sonhos. Tenha uma boa noite – ele disse dando um abraço apertado.
- Obrigado senhor! – sorri sentindo as orelhas queimando.
- Só mais uma coisa. Se o Murilo abrir a boca em relação ao incêndio, você me interfone IMEDIATAMENTE, combinado? – disse ele dando um tapa no meu ombro.
- Pode deixar senhor. Acho que agora todo mundo já esqueceu o que aconteceu – eu disse sorrindo.
- Isso mesmo que eu quero. Até mais – disse ele indo embora.
Quando passou pelo Murilo, fez um sinal com os dedos tipo: “tô de olho em você”. Bom, ele deve saber exatamente o filho que tem.
- Alanzito... – precipitou o Breno vindo em minha direção - ...vamos aproveitar que o sargento aí está indo embora para nós irmos também!
- Mas já? – bufei – nem mal começamos a festa?
“Se o Breno fosse embora, significaria que ele levaria o som dele junto.”
- Não digas que sentirá a minha falta?
- Jamais! – respondi imediatamente, arrancando gargalhada gostosa dele – Estou falando do seu som mesmo.
- E você acha que eu não sei? – perguntou ele me puxando para um abraço e me dando vários socos – Já pedi ao Guilherme para que pegasse o som dele.
- Pelo menos para isso você presta! – disse ganhando mais um soco dele.
- Olha só Arthur? Seu irmão tá ficando abusadinho demais.
- Por mim você pode espanca-lo! – disse o Arthur abraçando o Breno.
- É com essas palavras de carinho que sinto o seu amor por mim! – ironizei.
- Não pense que eles vão deixar a sua festa, porque eles não vão! – disse o Bruno atrás de nós – Eles apenas irão me levar embora. Já meu irmão voltara para sua casa – completou-o rindo da cara de espanto dos garotos.
- Porém, não pretendemos ficar no meio da pirralhada! Além do mais, Arthur e eu somos bem mais velhos e temos que ir atrás de mulheres!
- Como é que é? – disse indo até o Breno – Na hora de vocês combinarem a festa, ninguém mencionou nada de pirralhada.
- Sejamos sinceros Alan. Você já sabia de tudo! – disse o Arthur.
- Será que a mãe sabe de tudo? – perguntei arrancando uma cara amarrada.
- Nossa! Tudo tem que falar para sua mãe?
- Não tudo. Apenas o que o Arthur disser! – disse fazendo o Bruno rir.
- Engraçado ele, não gente? – disse meu irmão me agarrando por trás.
Ficamos brincando por mais uns 10 minutos, até o Bruno perder a paciência com irmão e pedir para ser levado em casa. Era contrastante a diferença que o Breno tratava o meu irmão e tratava o Bruno. Parecia que ele fazia questão do irmão não ser irmão dele. Algo que me fazia sentir pena daquele rapaz tão bom.