É impressionante como um banho quente muda toda a estrutura de um homem. Principalmente quando clima está bem ameno, mais pra frio. A água bate no cangote e trás uma sensação de conforto impressionante. Estávamos nos dois ali, compartilhando deste mágico momento. Estávamos abraços sob a água quente curtindo um ao outro.
- Aonde você vai Enzo ?
- Me deu vontade de fazer cocô.
- Ah não cara ! Você... eu to aqui no banheiro poxa. Espera eu terminar meu banho pelo menos.
- Capaz ! Não vou segurar. Será que quando a gente casar eu não vou poder cagar enquanto você toma banho e a gente conversa ?
Achei fofo ele ter dito isso, era a primeira vez que havia tocado no assunto "casamento", mesmo que de forma aleatória e totalmente inocente.
- Mas isso é porquice.
- Isso é amor. Se você me ama tem que aceitar eu como eu sou. E fim de papo por que você tá me desconcentrando.
Não tinha como não rir.
- Aff, não to acreditando nisso ?
- Ai cara, a gente tá numa viagem, curte e relaxa. Tô terminando já.
- Tá né.
Deixei minha cabeça sob a água quente e relaxei. Naquele instante um filme começou a passar na minha cabeça, de como tinha sido tão rápida a forma como as coisas aconteceram. Conheci meu primo tão pouco e já ouvia ele dizer que me amava. Assim como eu também dizia a ele. Foi tão rápido e tão intenso, tão espontâneo. Parecia que estávamos apenas esperando o momento certo. Essa viagem seria ótima para nós, para esquecer os problemas por parte de família dos país de Enzo, pra nos aproximarmos e nos conhecermos melhor.
- Amor, vou me vestir e te espero. Vê se não enrola muito aí por que quero que conheça um lugar
- Tá bom Gabriel. Já já vou.
Estávamos num hotel entre o Soho e Convent Garden, que na minha opinião são os locais mais charmosos da cidade.
Enzo já estava pronto. Peguei minha câmera, peguei sua mão, ele me olhou, riu, descemos.
- Aquele povo do hotel ficou olhando...
- E você deve alguma coisa pra alguém Enzo ?
- Nada, eu não ligo. Na verdade você que liga, lá no natal você morria de medo, era cercado de cuidados, até desviava o olhar do meu quando eu tentava te flertar com medo de te descobrirem - Enzo riu - daí acho estranho, engraçado talvez. Mas se quer saber eu adoro.
- Eu sou retardado. As coisas são diferentes agora.
- Entendi, mas, aonde estamos indo ?
- Soho Square. Já estamos perto. Vai andando ...
Soltei da mão de Enzo e pedi para ele ir caminhando em minha frente. Eu adorava fotografá-lo. O danado era fotogênico pra caralho. Ele estava na calçada, andando apressado. Se virava e vinha correndo na minha direção, me abraçava e depois corria de novo já que algo novo havia despertado sua atenção. Eu registrava tudo, atento a cada movimento seu. Ele estava lindo com o sobretudo que tinha comprado em Goiânia. Estava com uma touca folgada e o nariz bem vermelho. O sorriso não saía de seu rosto.
A Soho Square nada mais era que uma praça, cheia de palmeiras, que é bem popular no almoço. Tem uma grande quantidade de pubs e cafés. Enzo estava morrendo de fome, então pedi que ele escolhesse onde comer. Ele ficava rodando tentando escolher algum lugar que mais lhe agradasse. Mas era difícil manter o foco. Enzo adorava cinema e a praça em que estávamos possuía diversos prédios com arquitetura bastante antiga, arrisco século 18 mas não tenho certeza. Nesses prédios ficavam produtoras de cinema famosas e de menor porte. Enzo ficava louco, apontava o dedo e fazia pose para que eu o fotografasse ele em tal lugar. Era bizarro. Sentamos num lugar chamado Italian Grafitti, que o Enzo escolheu.
- Tô com fome de comida.
Repetia ele insistentemente. Como era insuportável isso.
- Good afternoon, how can i help you ?
Disse o garçom, que era um pão, ruivo dos olhos verdes, alto, forte, costas largas. Pedi a especialidade da casa, peixe espada grelhado com alho e azeite. Enzo queria pizza. Infernizei a cabeça dele falando que pizza ele come todo dia no Brasil e não faria sentido comer aqui. Ele me elaborou toda uma teoria das pizzas e me convenceu. Comemos e nos divertimos, arrancando muitas risadas um do outro. Estava tudo tão bom ali. Tudo tão perfeito. Eu queria viver aquele dia todos os dias de minha vida. Sentia que nada nem ninguém podia nos abalar. Levantamo-nos e fomos caminhar. Decidi apresentar um pouco de onde estávamos. Eram quase 16:30 quando saímos do restaurante, não daria tempo de fazer quase nada. Caminhamos pela rua unidos. Eu estava com a mão nos bolsos do meu casado e Enzo estava com a cabeça escorada em meu ombro, entrelaçando seu braço entre o meu e caminhando ao meu lado. Ele estava cantando Frank Sinatra. Era bizarro. Nós andávamos pela rua e as pessoas nem nos notavam e quando notavam sorriam. Me sentia tão bem e acolhido por conta disso. Outros gays passavam pela gente, nos secavam e murmuravam alguma coisa positiva que eu não conseguia entender. Andamos e conhecemos juntos coisas novas daquele lugar, rindo, parando para fotos, admirando as lojas e a população do local. Descobrimos um lugar chamado Patisserie Valerie, que era um café que tinha uma variedade enorme de bolos e tortas. O croissant era ótimo. Lembro-me de ter comido dois. O lugar era um charme, meio francês, repleto de pôsteres Terroni, ao melhor estilo Lautrec. Estávamos perdidos depois disso. Pegamos um taxi e voltamos ao hotel.
- Caraca, tô cansadão. Mas pensei que fossemos conhecer o BigBen, a roda gigante... Esses clichês sabe ?
- E nós iríamos se não tivéssemos acordado tão tarde né Enzo ? Iremos amanhã.
- Mal vejo a hora. Só que tô tão cansado. Queria dormir por dois dias...
- Mas você tá pensando em dormir ? Eu estou tirando minha roupa. Você tem certeza.
Ele me olhou, me comeu com os olhos e disse:
- Tenho, boa noite.
Virou para o lado e cobriu a cabeça.
- Como quiser Lorenzo. Tá cheio de britânico gato lá em baixo que adoram o fogo brasileiro.
- Ah, é ? - Respondeu ele descobrindo a cabeça - então você tá desejando outro cara, nas minhas costas ?
- Não amor, na sua cara mesmo, aqui só tem gatos, desculpa ...
- Ah, então vai lá com seus britânicos. O pinto deles devem te satisfazer mais. Britânicos tem pauzão né ?
Nós dois rimos.
- Amor, tem um pub aqui perto que queria te levar hoje a noite. Você tá muito cansado ?
- Ah Gabs, tô um tiquinho. Mas agora são oito horas. Podemos dormir até umas dez, dez e meia, daí vamos.
- Fechado. Posso te pedir uma coisa ?
- Pode Gabs.
- Deixa eu dormir então no seu peito ? Queria um cafuné.
- Isso você não precisa nem pedir meu amor. Não precisa...