Sankofa: o retorno e o recomeço (cap. 10)

Um conto erótico de Mmaah
Categoria: Homossexual
Contém 2465 palavras
Data: 28/05/2015 23:19:31
Última revisão: 29/05/2015 13:54:25

A Thy continuou falando sei lá o que, mas eu simplesmente não consegui falar mais nada. Meu mundo parou exatamente naquele momento. Milhares de lembranças me vieram a cabeça: o dia que nos falamos pela primeira vez, nossos passeios, nossa amizade, gargalhadas. Lembrei também da minha vó, e do quanto essa doença maldita estava levando as pessoas que eu amava. A Thy continuava falando, e me cutucando, como se esperasse alguma reação minha. Mas eu conseguia apenas chorar. O carro começou a se movimentar e quando dei por mim estávamos numa rua movimentada, numa das avenidas principais, próximas ao local onde Ci trabalhava. Thy saiu do carro e voltou com ela. Eu sequer conseguia lhe olhar nos olhos. Tudo que eu sentia naquele momento era uma dor profunda, não importava se ela estava com um tumor pequeno ou grande, ela tinha um câncer e iria se submeter a um tratamento difícil. As duas falavam alguma coisa do lado de fora, Ci quis me tirar do carro. Relutei. Eu queria apenas chorar, e tentar amenizar toda aquela dor. Insistiram para que eu tomasse água, mas eu não queria. Eu só queria acordar daquele pesadelo. Depois de um tempo, Ci voltou e as duas entraram no carro. Conversaram durante o caminho algo que eu sequer conseguiria entender. Paramos na rua da casa dela e eu continuava a chorar. Descemos do carro, as elas quiseram me levar a UPA.

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Eu: Dá pra vocês pararem? Eu não vou pra porra de UPA nenhuma.

Ci: Pronto. Sabia que era só falar em levar ela pro hospital que ela ia acordar.

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As duas começaram a rir. Eu continuei a chorar. Me virei, e agora eu estava com o corpo reclinado para o carro, na porta do carona. Chorava tanto, que molhei os vidros. Sentia uma dor profunda na alma. Me sentia nadando num mar revolto, com ondas altas. Era um choro assim, desesperado mesmo. Ci se aproximou de mim.

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Ela: Mah, olha pra mim. Eu estou bem. O tratamento já começou.

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A abracei desesperadamente, como se ela fosse uma criança que precisasse de colo. Mas seu corpo estava tenso, eu a apertava contra meu corpo, como se quisesse sugar todo mal para mim. Chorava em seu ombro, a mantinha presa a mim, por mais esforço que ela fizesse para sair.

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Thy: Mah, você não tá ajudando desse jeito. Ela tá bem. Olha pra Ci. Ela agora precisa da nossa força. Eu não sei porque, mas foi da vontade de Deus que isso acontecesse.

Eu: Pois a vontade dEle está errada.

Thy: Não. A vontade de Deus nunca é errada não. E pare de agir como uma criança birrenta. Você sabe que meu pai morreu de câncer. Acha que estou falando isso pra você à toa?

Continuei chorando.

Ci: Eu nunca esperei que ela fosse reagir dessa forma.

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Largou do meu corpo e eu virei para junto do carro outra vez. Voltei a chorar, e minha dor era tamanha que eu me debatia contra o carro. Chorei como se quisesse secar minha alma.

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Ci: Olha pra isso, fica aí se debatendo no carro. Tá querendo "comer" o carro? kkkkkkkkk

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A Thy deu um riso meio sem graça, mas ela sabia que aquilo não era hora para piadas. Eu não entendia como ela podia brincar com aquilo. Por mais que a visse ali bem, sabia que ela já havia por diversas vezes passado mal, vomitado sangue. Sabia que talvez seu cabelo começasse a cair, e eu queria apenas estar do lado dela e poder cuidá-la.

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Thy: Mah, ela tá bem. Agora a gente precisa colocar o pé no chão, e ver a melhor maneira de ajudá-la. Olha.. porque a gente não faz assim... Ci, dorme lá em casa hoje. A gente conversa melhor.

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Olhei pra Thy com um olhar de gratidão. Ela apenas balançou a cabeça, como se dissesse: Tudo bem!

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Ci entrou em casa e foi pegar algumas coisas. Voltou com uma mochila nas costas. Seguimos para buscar a Ruth na igreja, ela estava nos esperando já tinha algum tempo. Thy havia contado pra ela da situação toda, então ela já estava consciente que Ci estava doente. Embora eu já estivesse mais calma, continuava chorando em silêncio no banco do carona. Chegamos na frente da igreja, e eu estava com a cabeça apoiada no cinto de segurança. Thy dirigia e Ci estava no banco de trás. Ruth entrou no carro e já foi falando comigo. Colocou a mão no meu ombro.

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Ruth: Minha filha, se acalme. Olhe, Deus sabe o que faz. Você sabe minha história, sabe do que eu passei. Mas Deus está aqui, me sustentando. Fique calma.

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Apertei sua mão como se respondesse: muito obrigada,

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Ruth cumprimentou Ci e seguimos pra casa. Passamos na lanchonete e compramos algo pra comer. Já em casa, eu enrolei e depois de umas mordidas, deixei meu lanche pra lá. Entrei no banho e precisava dividir aquilo com alguém, e a primeira pessoa que me veio a cabeça foi a Lolo (Gente, a Lolo é a Lois, que escrevia o conto Amando e Amadurecendo. Trocamos e-mails, depois Whats, e volta e meia estamos nos confessando e pedindo conselhos, rs... A Lolo virou uma amigona pra mim, embora nunca tenhamos sequer nos falado ao telefone. Lolo, amooo você um montão. Obrigada por tudo).

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Eu: Lolo, boa noite, tá aí?

Ela: Oi Mah. Tô sim

Eu: Encontrei com Ci hoje. Infelizmente ela tá doente mesmo.

Ela: De boa, to aqui fazendo nada, ouvindo muskinhas...

Eu: Nem sei o tanto que já chorei.

Ela: Eita. O que essa menina tem?

Eu: Câncer de mama.

Ela: Calma, Mah. Entendo sua tristeza e preocupação.

Eu: Eu desconfiei que fosse algo assim. Mas não tinha certeza. E tbm pensei que pudesse tá fazendo algo pra chamar atenção e tal. Mas é verdade mesmo.

Ela: Como ela descobriu? Tá no começo ainda?

Eu: Ela já tá tratando. Começou a quimio tem 1 mês já. A Thy me contou hoje.

Ela: Tah.

Eu: Daí fomos lá. A vi, chorei muito. Muito mesmo. Nos abraçamos.

Ela: Eu imagino Mah.

Ela: Daí a Thy quis trazer ela pra dormir aqui em casa, pra gente conversar. Elas estão ali fazendo suco e eu vim aqui te contar.

Ela: Calma Mah. Primeiro.. o que ela precisa nesse momento é de atenção e carinho. Cuidados médicos ela já está tendo. E você, cabeça no lugar primeiro. Assim você pode ajudá-la apoiando no tratamento pra que ela não desista e faça tudo direitinho. E claro checa se a família tá a par de tudo mesmo e como ela tá se cuidando pq quimio é muito agressivo.

Eu: Lolo, a família dela não sabe.

Ela: Vamos orando e colocando nas mãos de Deus.

Eu: E ela me fez prometer que eu não contaria. Até entendo. Eles nunca deram muita atenção pra Ci.

Ela: Mah, a família dela precisa saber. Você tem que a convencer disso.

Eu: E a mãe dela é doente. A gente namorou, e eu sei que em parte ela tem razão.

Ela: Eu sei, flor. Mas é muita coisa só pra você.

Eu: Eu vou cuidar dela, Lolo. Te garanto.

Ela: E vai ter uma hora que ela não vai dar conta sozinha. Eu imaginei que faria isso mesmo. No seu lugar faria o mesmo. Mas repito: é muita coisa pra você sozinha.

Eu: Eu me viro. Cara, perdi minha vó pra essa doença maldita. No mesmo hospital que ela tá fazendo tratamento.

Ela: Mah, faz assim. Você tá com a cabeça quente. Amanhã pense devagar. Lembrei da sua vó enquanto você falava. Eu sei que é barra, por isso calma.

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Nos despedimos e fui pro banho. Cai de cabeça no chuveiro. Sentia meu corpo quente, tomei um banho bem gelado. Saí do banho, dei um arrumada nos colchões. Ci entrou no meu quarto, e foi tomar banho. Vi que a Thy se dirigiu para o outro banheiro também. Então sentei, e fiquei esperando ambas saírem. Cara, que situação que eu me encontrava agora. Minha ex-noiva com câncer, e minha melhor amiga com quem eu estava começando um relacionamento assistindo todo o meu sofrimento pela ex. Ci saiu do banheiro e apesar do banho continuava com a mesma roupa.

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Eu: Vai dormir assim?

Ela: Esqueci a roupa de dormir.

Eu: Te empresto uma.

Ela: Não. Não precisa.

Eu: Ci, vai te apertar. Você tá de calça.

Ela: Eu não quero. Vou dormir assim.

Eu: Por favor, larga de ser teimosa.

Ela: Não, Mah. Para. Era por isso que eu não queria que você soubesse. Olha aí, vai ficar me tratando agora como uma criança.

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Baixei a cabeça. Ela deitou no colchão ao meu lado e ficamos conversando um pouco, enquanto a Thy não saia do banheiro.

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Eu: Você tá bem?

Ela: Tô ótima. Tá tudo bem. Eu vou ficar bem. Logo eu vou tá de boa novamente você vai ver.

Eu: Deus lhe ouça;

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Como a Thy estava demorando demais, estranhei e fui atrás dela.

Vi a luz do quarto dela ligada e fui até lá. A vi deitada na sua cama.

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Eu: Hey, tá fazendo o que aqui?

Ela: Vim dormir.

Eu: Como assim? Você vai dormir conosco. Lá.

Ela: Não, Mah. Eu não vou.

Agachei do lado da cama dela, olhei bem nos seus olhos e segurei sua mão: Vamos, por favor. Eu não tenho nada pra esconder de você. Minha história com Ci acabou. Se eu estou assim, é porque nunca imaginei que isso pudesse acontecer. Mas não significa que vamos voltar. Entendeu?

Ela estava com os olhinhos marejados e apenas balançou a cabeça.

Thy: Estou indo já. Me dá 5min.

Eu: Se em 5min você não for, venho te pegar.

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Voltei pro quarto e Ci e eu voltamos a conversar.

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Eu: Dói?

Ela: O que?

Eu: A quimio.

Ela: Ah... normal. Tenho que me acostumar. É duas vezes por semana. Terça e quinta. Volto meio enjoada sempre.

Eu: Jamais pensei que isso pudesse acontecer.

Ela: Nem eu. Mas aconteceu. E eu vou passar, você vai ver.

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No meio desse papo, a Thy entrou no quarto. Fiz sinal e ela entendeu. Ficou entre nós. Nos ajeitamos e dormimos. Ou melhor tentamos. Me virei a noite inteira, foi horrível.

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Já pela manhã, nos levantamos e eu fui tomar banho para ir trabalhar. Era uma sexta, feriado do dia primeiro de maio, desse mesmo mês que nos encontramos.

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Dias antes havia sido aniversário da Malu. Eu acho que nunca falei da Malu por aqui. A Malu era uma amiga minha da universidade, que Ci conheceu uma vez quando foi me visitar. Ela era da turma da Thy, e Ci e Malu ficaram muita amigas. A Malu passava sérios problemas em casa, então nós sempre a poupávamos de algumas coisas. Ci nos fez prometer que não falaríamos nada pra ela. E que iríamos comemorar o aniversário dela a noite, como se nada tivesse acontecido. Combinamos e assim foi. O dia passou muito devagar. A noite quando larguei, a Thy estava me esperando de carro para irmos pra lá. Chegamos e a Malu veio correndo me abraçar. Dei um abraço gigante nela.

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Eu: Aqui tá seu presente.

Ela: Oow Mah, não precisava. Olha, vocês são de lascar. Essa doida me fez vir aqui, dizendo que ia ao médico e me perguntou se eu não podia acompanhá-la. Aí eu chego aqui e não tem consulta nenhuma. Pense numa raiva.

Eu: Rs... Era o único jeito de fazer você vir nos ver (ela morava em outra cidade). Desculpa o papo furado, mas a gente tava com saudade de você, maga safada.

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Ficamos ali comendo. Ci havia comprando salgados, mandou fazer uma torta, tava rolando um churrasco também. Eu tomei um pouco de refrigerante e comi umas coxinhas. Não pude deixar de perceber quando Ci colocou uma dose de rum no copo e acrescentou refrigerante. Mas como toda discussão era pelo fato de eu não tratá-la como criança, me calei. A Thy foi lá, discretamente, e tomou o copo da mão dela. Enrolei a Malu pra ela não perceber a Thy ralhando com a Ci. Ela tava fazendo quimioterapia e ainda queria tomar álcool. Me calei o máximo que pude, mas nesse cenário, fiquei introspectiva, pra variar. Ci começou a reclamar de dores e já estava rouca pela friagem. Então decidimos ir embora. Caminhamos até o estacionamento e as 4 entraram no carro. Já na frente da casa de Ci, desci do carro e abracei as duas (Malu ia dormir lá). Thy desceu também.

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Eu: Vamos tirar uma foto. Quero registrar esse momento. Vocês são muito especiais pra mim.

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Juntamos e tiramos uma foto. Demos aquele abraço destrambelhado de 4 pessoas, e Thy e eu seguimos pra casa. No caminho, continuei em silêncio.

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Ela: Tá preocupada, neh?

Eu: Estou. Ela não tá se cuidado, Thy. Você viu? Ela até bebendo tava. Cara, Ci, é teimosa.

Ela: Pois é. Tomei o copo dela, mas ela ainda queria me enrolar.

Eu: Não sei o que fazer. Me sinto de mãos atadas. Ela não me deixa ir a quimio. Diz que não quer que eu sinta pena dela. É complicado.

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Chegamos em casa, ela colocou o carro na garagem e entramos. Como mal havia comido lá, Ci havia colocado num pote alguns salgados e bolo também. Sentamos na mesa para conversar um pouco mais. E ficamos assim, comendo e conversando.

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Eu: Cara, ela é teimosa pacas. Não deveria tá fazendo essas coisas.

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Ruth entrou na cozinha: E a menina?

Eu: Ela é teimosa. A senhora tinha que ver. Queria beber. Ainda bem que Thy tomou o copo da mão dela.

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Ela ficou em pé, bem na nossa frente e disse: Prestem atenção, vocês duas. Você é minha filha legítima, e você - se referindo a mim -, eu adotei no meu coração como minha filha também. Eu amo vocês e me preocupo demais com as duas, embora vocês já sejam duas mulheres. Mas preciso dizer uma coisa. Tem algo de errado com essa moça. Meu marido morreu de câncer, embora a gente precise de auto-estima pra encarar as coisas, essa moça não aparenta nenhum pouco estar doente. Ela está esbanjando saúde. Filha - olhou para mim -, você estava de fazer dó ontem, quando entrei no carro. Lhe ver chorar machucou meu coração. Mas aquela moça ria de você, fazia piadas. Isso é atitude de alguém que está doente? Ela está mentindo. Ontem eu não consegui dormir um pingo, com ela no mesmo quarto que vocês. Deus incomodou meu coração a noite toda, como se vocês estivessem em perigo. Ouçam: Vocês, são suas bobinhas. Essa menina é macaca velha na vida. E eu não quero mais vocês com ela. Entenderam?

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Por hoje é isso. Muito obrigada por estarem me acompanhando. Vou deixar um e-mail de contato para quem quiser escrever: mahcdc@hotmail.com

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Beijos

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Mah

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Sankofa

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Comentários

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Esse conto tá cada dia melhor...Estou curiosa para saber o que de fato aconteceu...Continua.

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Ah florzim... vc eh 10, jah disse rs, torco pela sua felicidade na primeira fila rs, vc merece... Tu tb mora no meu coracao e nao paga aluguel kk.. tb te curto muitao... Mas revendo essa parte da sua historia foi punk... tensa msm, inda bem q passou neh muleh rs? Bora continuar que tah bao dimais de ler... bjokas.

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nao faça isso continue!se essa ci esta mentindo ela e pior do que eu imaginava mentira vicia

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