Faz Tempo Que Te Amo I

Um conto erótico de Irish
Categoria: Homossexual
Contém 1551 palavras
Data: 13/05/2015 18:00:50

A trilha ingreme e estreita levava-nos à cachoeira cujo som, ainda um tanto distante, parecia o de uma maquina gigante em pleno funcionamento. Começava a cair a tarde, mas logo a alcançariamos.

Tiago ia à frente, o bone' preto com a aba virada para tras, sem camisa, exibindo seus musculos trabalhados, transportando a mochila Kipling azul marinho. Ouvia seu MP3, assobiando uma melodia que eu nao lembrava bem qual era; alcancei o cara, segurando no chaveiro de macaquinho que balançava no ziper da mochila.

- Abra isso ai, estou com sede _ falei, fazendo -o parar; ele mesmo tirou de dentro da mochila a garrafa termica com o chà gelado _ Vai querer tambem?

- Opa! _ disse ele, tirando os fones de ouvido; pegou copos retrateis de um bolso lateral _ Escuta, acho que logo escurece. Vai ser so' o tempo da gente nadar um pouco e jà montar acampamento.

- E a lenha para a fogueira, veado? Vamos ficar no escuro no meio do mato?

- Tá com medo, trouxa? _ ele gargalhou, jogando o resto do chá fora e me dando uma chave de braço por palhaçada, como faziamos um com o outro desde novinhos; do jeito que eu era forte, tanto quanto ele, era facil me livrar e dar o troco, mas como eu gostava daquele calor rigido, suado e perfumado dos musculos dele me prensando, me deixava ficar, deliciado...

- Sai pra là! _ empurrei o cara, fazendo com que ele cambaleasse; o bone' caiu de sua cabeça, ele riu, pegou, arrumou sua cabeleira castanha e o vestiu de volta; logo seguimos viagem.

Afinal atingimos a cachoeira, feita de aguas esverdeadas e espumosas que rugiam furiosas por causa do temporal que tivemos em Campinas naquela semana. Tiago nao perdeu tempo, foi logo arrancando a roupa e o tenis, afoito; usava uma sunga branca super justa que evidenciava seu suculento volume frontal e traseiro, que vi centenas de vezes mas que sempre fazia meu coraçao acelerar e a boca secar. Nas suas costas amplas e bronzeadas, a tatuagem do dragao vermelho parecia caçoar do meu desejo secreto e inutil.

Tambem me despi e pulei na agua. Minha sunga era preta, estilo boxer, mas eu poderia estar nu e de pau duro que ele nao se importaria. Eu era o "irmao", o melhor amigo "intocável", e embora fossemos gays assumidos para todos, ele sempre frisava que eramos parceiros de alma, nada alem disso. Amor fraterno. Mas para mim era tao insuficiente, eu que o amava desde os catorze anos.

No fundo da agua rodopiavam folhas mortas e escuras, e raizes de plantas. Mergulhando e vindo à tona, eu fugia das molecagens do Tiago que queria me dar "caldos" e puxar minhas pernas. Apostamos nado de uma margem a outra, e obviamente levei vantagem graças á pratica frequente de nataçao no Club Polo's.

- Assim nao vale, Daniel _ disse ele enquanto descansavamos sentados na pedra ainda morna do sol que ia embora _ Voce sempre foi bom nisso... Quero ver me vencer no futsal de domingo.

- Nisso nao. Voce sabe que sou ruim com bola... Mas pelo que sei, voce e' bom num monte de coisa, no futsal, na matematica, em desenhoem por os moleques pra mamar _ completou com uma gargalhada _ Em tratar bem uma bundinha de macho...

- Sacana!

Escurecia depressa, tratamos logo de nos arranjar ali por perto. Enquanto Tiago saiu á procura de galhos secos para a fogueira, montei nossa barraca com lugar para dois. Nao havia porque me constranger, sempre dormiamos juntos quando acampavamos sozinhos, e em nossa adolescencia era frequente dormirmos na mesma cama aos finais de semana ou nos dias em que havia trabalho de escola ate tarde. Nunca tinha acontecido nada, porque eu nao tinha coragem em botar a perder aquela amizade tao preciosa, e pela evidente falta de interesse dele. O cara curtia moleques, bichinhas dengosas e playboyzinhos no armàrio, daqueles com carro do ano, polo Lacoste e cigarro mentolado na boquinha gulosa; fingiam interesse em meninas, mas gostavam mesmo era de rebolar a noite inteira em paus dispostos. Campinas estava cheia deles, peguei alguns; eram metidos, futeis, insaciàveis na cama, chupavam igual biscate. Valorizavam musculos, beleza e dinheiro, e como no ultimo quesito eu deixava a desejar, peguei raiva deles, enquanto Tiago curtia pra caramba. No final das contas, eu nao era o tipo dele, creio que por sermos parecidos; eu tambem era grande, forte, sarado, sem barba e com os braços e costas tatuados, com alguns tribais e simbolos celtas que ele me ajudou a escolher; meu cabelo era preto, eu depilava quase que o corpo todo. O idiota nao notava que eu era louco por ele, que queria ser seu homem, seu macho pra vida inteira, e mandar para o inferno aquelas bichinhas universitarias e os moleques tarados que viviam atras dele. Ele nao via que eu arrastava um transatlantico por ele e que, no fundo, era tao covarde que tinha um medo gigante de perder sua amizade e por isso me calava, à espera de sei lá o que.

Tiago arranjou a fogueira relativamente depressa. Era jà a terceira vez que acampàvamos naqueles lados, à margem da cachoeira. Foi convite dele, um passeio so' nosso, escapar do stress do dia-dia e daquele povo chato da cidade.

- Trouxe barra de cereal, suco de caixinha, banana, biscoito de polvilho... e bolinho de saquinho _ disse ele abrindo a frasqueira.

- Esses bolinhos se chamam twinks, cara _ sorri com malicia _ Como aqueles moleques gostosinhos dos pornos...

- Adoro um twink _ ele sorriu, abrindo um saquinho do bolinho com os dentes _ Bom demais de comer...

Esfriava um pouco com a chegada da noite. Vesti meu moletom e a calça da academia, enquanto Tiago tirou a blusa amarrotada de dentro da mochila. Vestiu-se e passamos a dividir o pacote de biscoito de polvilho e o suco de laranja à beira do fogo. Ouvia-se apenas o som peculiar da mata, o ruido poderoso da cachoeira e o crepitar da fogueira. Quando acabamos, Tiago ficou cutucando o fogo com um graveto, pensativo, um sorriso de tonto na cara; fazia uns dias que ele estava asim, aereo, jeito de bobo, encantado com alguma coisa. Nao perguntei nada, ele que me falasse. Mexendo no seu MP3, selecionava alguma coisa para ouvirmos; o cara gostava de coisa boa: Pink Floyd, System Of A Down, U2... Coloquei em uma de minhas preferidas, "Please, Please, Please Let Me Get What I Want", e deixei num bom volume para ele ouvir. Era tao bonito e triste... parecia falar exatamente como meu coraçao falaria caso pudesse:

"Entao, uma unica vez na minha vida

Me deixe ter o que quero

Deus sabe que seria a primeira vez"

- Daniel _ ele falou assim que a musica acabou; largou de cutucar o fogo e veio se sentar ao meu lado, fazendo o idiota do meu coraçao disparar todo alegre, pensando sempre que "agora vai" _ Tenho uma coisa pra contar pra voce, cara...

- Fala _ olhei para o fogo e em seguida para os olhos dele, que de verdes, pareciam amarelo- translucidos à luz da fogueira.

- Voce lembra daquele moleque que eu levei lá em casa no sabado passado? Aquele... baixinho, cabelo cacheado...

Lembrava, claro. O moleque gritava igual uma puta a noite inteira, levando vara do Tiago. Isso, somado ao ciume e à raiva, nao me deixaram dormir naquele sabado, porem no outro dia fui simpatico com o carinha. Ele era bonitinho, a copia do ator Emile Hirsch no filme "Milk, Voz da Igualdade". Aquele mesmo cabelo castanho cacheado, oculos de grau grandes, nanico, branquinho, jeito de safadinho. Me deu uma secada quando nos encontramos na cozinha na manha seguinte, me observando enquanto eu fazia cafe' so' de cueca, ainda meio umido do banho... Ate me deu tesao, mas aquela era a caça do Tiago, e por uma regra severa e velada nao mexiamos na mercadoria do outro, nunca.

- O que tem ele? _ perguntei, sem achar nada demais no caso; era uma bichinha como as outras, e Tiago jà tinha pegado piores e melhores do que aquela.

- Luigi, o nome dele e' Luigi _ disse o cara, e o sorriso de bobo estava de volta em seu rosto _ A galera chama ele de Lu... Entao, Daniel, eu... nao paro de pensar nele, cara. A gente andou se falando nessa semana, na quinta-feira almoçamos juntos, e ontem fomos ao shopping à tarde... Ele e' tao educado, tao divertido, tem um jeitinho doce, e na cama... caramba! Parece um profissional. Eu acho, amigo, que estou apaixonado, pela primeira vez... To fissurado nesse moleque, mas vai alem de sexo, saca? Quero ele pra mim, vou assentar a poeira um pouco, sair da putaria, viver uma coisa legal, sabe? Jà tá na hora de criar vergonha na minha cara e me ajeitar com um doido ai... E quero que seja com ele, mano.

Olhando para a fogueira, calado, eu lembrava daquele trecho do poema de Camoes sobre o amor: "fogo que arde sem se ver". Poderia ser tambem "que queima ate matar", porque foi assim que me senti nessa hora, com a dor de uma queimadura profunda no peito. "Que merda, hein Daniel? Moleque azarado da porra", pensei comigo, com vontade de chorar de raiva.

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Oi, gente! Espero que curtam este.

Opinem à vontade!

Bj!!

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Comentários

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Você deixou um comentário no meu conto. Me senti na obrigação de ler os seus. Poxa, gostei muito! Rico em detalhes, sutil, simples e objetivo. Já gostei desde o início e já estou shippando TiDan desde já. Parabéns!

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Irish meu amor. Quanto tempo. Faz pouco tempo q cnsegui meu celular novo e olhando uns contos descubro q vc ja tem mais dois completos. Vc é incrível e obrigado por existir. Vc sabe q é uma ótima escritora. E eu fiquei eufórico com esses contos. Linda

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Excepcional! O melhor que eu li aqui. Nunca tinha lido algo seu e realmente gostei muito. Metáforas precisas, narração leve, objetiva. Você sabe onde quer chegar no texto. Lerei mais da sua obra. Um grande abraço!

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O Daniel devia se declarar logo, afinal ele eh lindo. Mas ele teria q ser passivo neh rsrsrsrs

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O Daniel devia dar um beijo no Tiago e transar com ele de um jeito que ele nunca viu!

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Ebaaaa. Que triste. Um pouco mais achei que ele ia falar que engravidou o luidi kkkk sqn

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Nossa, espero que o Daniel supere essa barra, continue.

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OiLinda!QueBomQueVcVoltouANosPresentearComSuaMaravilhosaEscrita.Beijinhuuuu

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Arrasando novamente!!! Nossa, que balde de água fria! Acho que deve ser uma sensação de chão se abrindo sob os pés, escutar da pessoa por quem você está gamado que ela está apaixonada por outra!!! Que dor!!

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lindo mais triste esse Tiago não vê que o amor está ao lado mas quando percebe é tarde de mais, que triste Daniel amar sem ser amado continua logo...

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