- Como você pretende exatamente fazer isso? – Perguntei curioso.
- Bom, a gente tem que usar o que a gente tem nas mãos – Mariana sorriu para mim.
- O que seria isso, exatamente?
- O fato de você ser bonito
- Creio que ele não liga pra isso... – Ela riu.
- É verdade. Mas tem uma coisa que você pode fazer...
- O que? – Perguntei animado.
- Uma coisa que eu sei do Théo, é que ele é extremamente grato.
- Como assism? – Perguntei ainda mais curioso.
- Tipo, igual ontem. Ele falou que você cuidou dele, e por isso ele estava te vigiando. Eu tenho certeza que ele não sairia dali enquanto você estivesse ali...
- Será? – Perguntei.
- Sim. Então esse é o nosso primeiro passo. Faça boas ações com ele. Não seja um babaca. Mas finja que não saiba disso. Fingi que é expontaneo.
- Ok, teacher! Mas e depois?
- Depois nós vemos o fluxo das coisas.
- Tudo bem. Ei, o que você quer almoçar? Eu vou fazer comida.
Depois disso nós ficamos conversando apenas trivialidades. Fiz um bife a cavalo para a gente comer. Ficou “divinamente espetacular” segundo a Marina.
Eu e Marina assistimos um filme juntos. Só assistimos, não rolou nada demais. Depois disso, levei ela em casa e dei uma passada na oficina. Não tinha ninguém lá, mas eu fiz algumas coisas poucas sozinho e fui embora.
Em casa eu vi meu whatsapp. O Caio tinha me mandado uma mensagem sobre a noite anterior. Eu respondi qualquer merda e taquei o foda-se. Decidi que seu eu quisesse o Théo, também deveria parar de ser assim.
Dormi tranquilo a noite.
Acordei com os mesmos rituais na segunda. Acordei, corri, academia, cozinhei. Oficina, escola, casa. Foi o mais do mesmo. Exceto talvez por uma peculiaridade. Théo me cumprimentou quando chegou na aula e eu levei ele embora depois.
Meu carro ficou com um perfume tão bom. Mas muito bom mesmo. Fiquei um bom tempo dentro dele só sentindo o cheiro dele no meu carro.
Quando eu cheguei em casa, abri meu computador para revisar os proximos passos do projeto do baja. Eu estava estranhando. Tudo estava perfeito demais. Isso não é comum.
E então eu vi. Basicamente falando, tinha um tubo completamente deslocado na suspensão. Olhei e refiz as simulações de suspensão. Um erro sutil, mas gravissimo. Comecei a me bater pensando “como eu deixei passar esse erro?”.
Na hora levantei num pulo da cadeira. Mandei uma mensagem no grupo do baja falando do problema. Ninguém me respondeu. Mas era madrugada, a maiora das pessoas trabalhavam no outro dia cedo.
Fiz uma garrafa de café e comecei a reprojetar o que estava errado. Refiz alguns calculos, refiz algumas paradas. Enquanto eu checava o regulamento, para ver se eu podia fazer algo, meu celular toca. Entretido na leitura, nem vi quem me ligava. Apenas atendi.
- Alô?
- Fer? – Minha espinha gelou. Só uma pessoa no mundo me chamava de Fer. E era o Théo.
- Sou eu – Não consegui responder nada mais do que isso.
- Cara, o que houve na suspensão? – Ele me perguntou.
- É complexo. Uma série de erros. Eu sei que o tubo ia romper assim que a gente colocasse o carro no chão.
- Nuss.. Como a gente vai resolver isso? – Ele perguntou. “a gente” sorri bobamente para mim.
- Já estou resolvendo, Théo – Ele ficou em silencio. Muito tempo em silencio.
- Quer ajuda? – Ele perguntou depois de um tempo. Gelei. Dele? É claro que eu queria. Queria muito.
- Eu estou reprojetando ela, mas sem modificar o padrão. Seria bom alguem aqui – Silencio novamente. Mais silencio.
- Eu posso ir até ai? – Ele perguntou. Quase engasguei. Não consegui responder...
- Fer? Ta ai?
- To, desculpa, tava lendo aqui no regulamento. Pode sim cara, quer que eu te pegue ai?
- Não cara, é do lado!
- Mas é perigoso mesmo assim... Você sabe disso.
- Eu sei. Mas eu sei me defender. E eu vou levar o Thor. Ele me protege. – Eu ri. É verdade. Ninguem ia chegar perto dele com aquele baita cachorro bravo.
- Ok então, te espero aqui – Na hora que ele desligou o telefone corri para a cozinha e coloquei uns pão de queijo pra assar. Eu já tinha eles prontos na geladeira.
Sentei e continuei a ler, tremendo de emoção.
Em menos de 5 minutos a campainha tocou. Abri a porta e vi Théo lindo como sempre, com o Thor na coleira. Assim que Théo soltou o Thor da coleira ele pulou em mim e me lambeu. Thor, não Théo, infelizmente.
- Até hoje eu não sei como Thor te ama tanto... Você é o unico de fora da familia que ele gosta.
- Talvez cães tenham uma sensibilidade maior sobre algumas coisas do que nós humanos.
- Como o que?
- Não sei. Mas eu queria saber – Depois dessa curta conversa, fomos até meu quarto, que era onde eu projetava. Peguei uma cadeira para ele, que se sentou ao meu lado.
Pra quem pediu nos comentários, acho que essa é a melhor hora para descrever novamente o Théo.
Enquanto ele lia fiquei olhando para ele, todo concentrando ali do meu lado. Sua pele clara, seu cabelo encaracolado cor de mel. Seus traços finos que combinavam perfeitamente com seu rosto.
Ele me olhou para tirar uma dúvida e sem duvida seus olhos eram a coisa mais linda nele. Um tom de caramelo que eu nunca tinha visto em outra pessoa. Nossos olhares se econtraram e ele esboçou falar algo, mas parou.
Nos encaramos por alguns instantes, depois disso Théo desviou o olhar. Voltei a ler o que eu estava lendo.
- Fer...
- Diga.
- Nessa perte aqui, eu não entendi muito bem o que o regulamento quer dizer – Era só uma duvida.
Eu e Théo continuamos a ver o projeto e fazer alterações até bem tarde. Comemos o pão de queijo que eu tinha assado e bebemos o café. Thor ficou o tempo todo dormindo no pé da minha cadeira.
Depois que finalizamos o possivel de ser feito, eu e Théo sentamos na sala.
- Você trabalha amanhã?
- Não, amanhã eu to de folga... Com essa crise meu chefe diminiu nossa jornada de trabalho.
- Foda né? Quer beber um whisky?
- Oi?
- É, um whisky. Black Label... – Falei, mostrando a garrafa.
- Mano, são quase 5 da manhã!
- E qual o problema nisso? – Ele esboçou uma resposta mas não falou mais nada.
- Vou aceitar um copo.
- Gelo ou puro? – Ele me olhou sem jeito e perguntou:
- Tem energetico? – Torci a cara. Energetico estraga o whisky... Mas era o Théo. Fiz uma força e coloquei whisky com energetico pra ele.
Brindamos e eu sentei no sofá ao lado do dele. Thor deitou em cima de mim. Fiquei fazendo carinho na cabeça dele enquanto a gente bebia. Logo logo o silencio ensurdecedor se instaurou sobre nós.
Théo me olhou. Nossos olhares se cruzaram e ele perguntou:
- Cara, você tá bem?
- Em que sentido? – Perguntei.
- Sei lá... Você mudou muito mesmo desde... desde que você foi embora para Itajubá...
- Eu sei...
- E também teve o négocio do seu pai e... sua mãe... Isso deve fuder com a pessoa – Não respondi. Fiquei só pensando.
- São coisas que eu tenho que lidar sozinho.
- Não precisa ser sozinho... Você pode ter ajuda!
- Sim eu posso. Mas no fundo, quem tem que aceitar que meu pai morreu e minha mãe não fala mais comigo sou eu. Ninguém pode fazer isso por mim.
- Você tá certo nesse ponto... Mas eu não sei o que eu faria no seu caso – Ele falou, tomando mais uma dose de whisky.
- Eu também não sabia. Nunca sabemos, as coisas simplesmente... acontecem... – Falei.
Depois disso eu e o Théo ficamos só jogando conversa fora. Depois que o sol estava quase nascendo ele me falou:
- Nossa.. Hoje foi realmente legal. Eu tinha me esquecido de como é bom conversar com alguem diferente da maioria das pessoas daqui.
- Eu também...
Théo ficou me encarando por um longo tempo. Aqueles olhos me deixavam louco.
- A gente era tão amigo... O que aconteceu pra gente se odiar tanto? – Ele perguntou. Respirei fundo, olhando o vazio.
- Eu cai da besteira de me apaixonar por você.
- Você ainda me ama?
- Mais do que você possa imaginar...