Paulo baixou a cabeça, e as lágrimas foram inevitáveis. Seu choro vinha da alma e dilacerava tudo por dentro. Não dava mais pra fugir. Ia ter que enfrentar a família... Ele respirou fundo, e com os olhos cheios de lágrimas, desabafou.
- Sim. Eu me relaciono com outro homem. Na verdade, ele é o meu amante!
A mãe dele arregalou os olhos e levou a mão ao coração. Seu espanto e perplexidade, assim como o do irmão dele, o fez desmoronar.
- O que você está dizendo?... Meu irmão... Meu único irmão virou... – ele pausou a voz e sem pensar duas vezes, partiu pra cima do Paulo. – Seu desgraçado! Pervertido! O que deu e você pra fazer uma barbaridade dessas?
Paulo não reagiu, nem se moveu. Apenas sentiu as dores dos golpes do irmão. A mãe o tirou de cima dele.
- Meu Deus, como isso foi acontecer? – ela chorava e chorava; quase a sua voz não saia de tanto soluçar. – Você se casou com uma mulher linda, eu sonhei em ter netos, e que você seria o primeiro a realizar o meu sonho... Porque meu Deus, porque?
- Mãe, eu queria me explicar com vocês. – ele estava desesperado. Parecia uma criança desprotegida, prestes a ser condenada. Seu coração batia acelerado e sua cabeça doía muito. Ele tentou secar as lagrimas, mas elas não paravam de cair. O seu mundo havia se desmoronado.
- Se o Papai tivesse vivo, ele morreria de tanto desgosto. Como foi capaz de trair a sua mulher com outro homem?... Tudo uma farsa! O casamento, o noivado, seu namoro com a Julia... Como pôde enganá-la durante todo esse tempo? Você não tem vergonha e nojo de si mesmo? O que você fez e o que se tornou, é difícil de aceitar... – o irmão dele o atingiu ainda mais. Paulo se sentiu a pior pessoa do mundo, e se pudesse morrer naquele momento, ele não pensaria duas vezes.
- Meu filho, olha pra sua mãe. Diz pra mim que você se enganou. Que este rapaz fez a sua cabeça, mas que você vai retomar a sua lucidez e tudo voltará como era antes. Diz pra mim! –ela estava perplexa.
Ele começou o desabafo. As palavras saíam com dificuldade...
- Eu não sei explicar mãe. O Gustavo não tem culpa. Simplesmente aconteceu e quando me dei conta, eu já estava apaixonado por ele. Eu juro mãe, não teve um só dia, que eu me condenasse por isso. Me crucifiquei, quis até me matar... Chorava todas as noites e quando eu olhava para a Julia, minha culpa aumentava ainda mais. Só que de nada adiantou... Pedia a Deus que arrancasse este desejo que eu sentia por ele, mas de nada adiantou. – ele chorou. – Eu o amo. Eu amo o Gustavo com toda a força que há dentro de mim. Me perdoem. Me perdoem... – ele ajoelhou-se para desabar em suas lágrimas.
- Imundo! Nojento! Seu viado ridículo! – a mãe do Paulo, segurou o irmão mais uma vez.
- Você acabou comigo. Machucou profundamente o coração da sua mãe. O que vou dizer as pessoas agora? E quando este escândalo se espalhar? E quando a família da Julia souber?... Meu Deus, que pesadelo. – ela levou as mãos à cabeça. – Saia dessa casa. Esqueça que você tem família. Jamais serei mãe de um... – não conseguiu dizer a palavra.
- Levante-se desse chão e suma daqui! Sai e não volte nunca mais! – o irmão dele gritou.
Paulo estava com a sua estrutura emocional mais do que abalada. Ele não sabia nem mesmo para onde ir. Saiu dali e vagou pelas ruas, com o rosto inchado de tanto choro. Até que, no meio da noite, foi para o seu escritório e se jogou no sofá. Nunca se sentiu tão frágil e sozinho na vida. Ele queria morrer, sumir!
*******
- Oi filha. Posso entrar? – Gustavo abriu a porta do quarto da Luíza. Estava na hora de preparar a sua filha...
- Claro pai. O que aconteceu O senhor está chorando. Brigou com a mamãe? Não me diga que vocês dois vão se...
- Não meu anjo. É que eu te amo tanto, que tenho medo de magoar você. Você é a minha jóia rara. O meu bem mais precioso. – ele estava emocionado.
- Pai, estou assustada! Me fala o que aconteceu. Porque está chorando? Desse jeito vou chorar também.
- Sabe meu anjo, nós seres humanos, temos tantos defeitos, tantos pecados... Que não somos capazes de fugir deles. Mas também existem outras coisas boas e que nos prende e invade o coração da gente, que nos torna incapazes de fugir. Estou falando do amor... Sem ele, não conseguimos andar, viver, sonhar... Às vezes meu anjo, o nosso coração nos coloca em momentos da vida, em que o nosso destino se revela para nós de uma forma tão clara... O amor é válido de toda a forma e jeito. Ele é sublime e incapaz de causar mal. Seu pai meu amor... – ele respirou fundo. As lágrimas começaram a cair. – Desculpa. Eu não devia está chorando na sua frente.
- Pai. – ela segurou a mão dele. – O senhor ama outro homem, não é isso?
Ele quase caiu para trás. Como ela sabia? A Amanda não tinha contado nada.
- Não precisava fazer esta cara. Sabe pai, eu já tenho quatorze anos e sei muita da vida. Eu já sabia que você sentia atração por rapazes, desde quando me levava para escola. Eu via a forma como você olhava, quando passava um cara bonito na rua. No inicio, achei estranho, confuso... Mas um dia, eu peguei você e a mamãe conversando sobre este assunto, e ouvi, quando disse a ela que estava apaixonado por outro cara. Eu fiquei chocada! Não podia acreditar que o meu pai era gay. Mas depois de defender o meu melhor amigo, de homofóbicos no colégio, eu pensei: ele é o meu pai. E eu o amo de qualquer jeito. É o meu herói e será pro resto da vida.
Gustavo chorava sem parar. A Luíza conseguiu desarmá-lo completamente. Nunca esperava ouvir tudo aquilo da filha. Á estava preparado para o pior, mas por obra do destino, as coisas tomaram um novo rumo.
- Eu só preciso saber uma coisa... – Eu sou filha adotiva?
- Não! Claro que não meu amor. Eu e a sua mãe, bom... Nós fizemos você. É a nossa princesa. Eu estou tão feliz meu amor, porque você não julgou o seu pai. Eu e a Amanda, sempre tivemos um casamento muito feliz, independente de qualquer coisa. E o seu bem estar, a sua felicidade, estava acima da nossa... Nada vai mudar. Eu amo a sua mãe. Somos parceiros pra toda a vida.
- Eu te amo pai. Sempre vou te amar! – ela o agarrou, e lhe deu um beijo no rosto.
- Eu te amo mais ainda meu amor. Você se comporta como uma adulta! Eu me surpreendo com você.
Eles foram interrompidos por Amanda.
- Estou atrapalhando?...
- Não mãe. Entra!
- Então... Bem, eu...
- Ai, mãe! Eu já sei o que você veio fazer aqui. Vou logo adiantando: eu já sei que o papai gosta de rapazes. Mas ele também te ama, então fica rilex. Outra coisa, agora, eu posso perguntar não só a senhora, mas também ao meu pai, sobre um garoto, um namorado...
Eles riram e Amanda ficou passada com a naturalidade da filha. Conversaram mais um pouco, na verdade tudo! A historia era longa e existiam outros pontos a serem acertados. Gustavo havia tirado um peso dos ombros. Ele sabia que agora, tinha forças para enfrentar a família, ou seja, os seus pais.
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Gustavo ligava para o celular do Paulo, mas ninguém atendia. Paulo havia dormido no sofá do escritório, e naquele dia de trabalho, ele foi surpreendido por sua secretária, que abrira a porta e o encontrou jogado no sofá, num estado deplorável.
- Senhor Paulo, acorde! Não quer ir pra casa descansar um pouco? O senhor dormiu aqui na empresa... Aconteceu alguma coisa?
- Sim. Aconteceu... Estou sem chão.
CONTINUA...