Capítulo Único
TEMA : 12 DE JUNHO - CALCINHA PRETA
Eu sempre me perguntei porquê não podemos mandar no coração. Porquê tinha que ser assim ? Porquê não mandamos nos nossos sentimentos ? Porquê diabos nós gays nos apaixonamos por heteros ? Não dá pra essa desgraça do gaydar funcionar e só nos apaixonarmos por quem curtir ? É, parece que estou fadado ao sofrimento. Sofrendo desde que fui expulso de casa, apaixonado por um hétero, sem visão nenhuma de mudança.
- Agora a gente vai embarcar no mais profundo romantismo - adorava ver aquelas séries românticas que me faziam embarcar no mais profundo choro por não ter um amor perfeito como aquele dos filmes. Eu sempre soube que algo assim era impossível na nossa sociedade, mas algo próximo não é. Algumas pessoas alcançam esse algo próximo. Já eu ? Estou aqui, encalhado, sofrendo por um cara que não gosta de homens e vive sofrendo atrás de uma vadia. Que karma esse meu ein ? Mas eu não conseguia evitar. Ele era extremamente apaixonante.
- Eric ? - sempre que ouvia aquela voz meu coração alterava-se.
- Fábio ? - e então via mais uma vez aqueles olhos azuis próximos a mim.
Fábio é um garoto extremamente bonito. Filho de gaúchos, é loiro, dos olhos azuis bem claros, bem branco, com algumas pintas sexys e um corpo bem malhado. Diz, quem em sã consciência e alta confiança em si mesmo resistiria a um garoto com esse ? Meu, o garoto é tão bonito que se ele piscar é capaz de você desmaiar, sem exageros. Não tinha ego o suficiente pra aguentar isso, como resultado estava sofrendo por não conseguir aguentar uma paixão.
- Ei garoto, presta atenção ! - foi assim que eu o conheci, tropeçando nele.
- Meu celular ! - falei, vendo o bichinho cair no chão.
- Ah, quebrou ? - falou, mudando o tom assim que viu eu derrubar tudo o que tinha nas mãos.
- Acho que sim - ele esticou a mão comigo para pegar o celular, e foi quando elas se tocaram. Sim, nosso primeiro contato foi um toque de mão. Quando virei o rosto e olhei em seus olhos, corei. Como ele era bonito ! Ainda mais bonito, com uma cara de criança mas super másculo - mas foi culpa minha - falei, recolhendo o aparelho e juntando rapidamente as folhas que carregava.
- Se você quiser eu poço levar na assistência pra você...
- Seria muita petulância minha. Muito obrigado pela consideração - estava extremamente envergonhado comigo mesmo. Normalmente eu não era assim, mas estava com muita vergonha de estar ali.
- EI, qual o seu nome ?
- Eric.
- O meu é Fábio !- escutei assim que cruzei o corredor principal.
Desde então nos aproximamos.
- Olha só, o garoto do celular - dizia ele chegando na mesma parada de ônibus que eu esperava o meu - Eric não é ?
- É... - ele ficou ao meu lado, segurando nas alças da mochila enquanto esperava o ônibus - como ficou o celular ?
- Mandei consertar. Ficou bom.
- Ah, que ótimo !- meu Deus, porquê tanta perfeição numa pessoa só ? Pra completar ele tem um cheiro indescritível, um perfume natural misturando com um artificial. Era uma Fofura sem tamanho.
- Você faz Jornalismo não é ?
- Como sabe ?
- Eu vi que aqueles papéis que carregava eram autorizações de uso de imagem.
- É... Tem razão, faço Jornalismo - ele sorriu.
- Faço Direito.
- Sério ?
- Humrum. Mas faço mais porquê meu pais me obrigam. Eu, por mim queria fazer História, mas segundo eles não dá futuro - minha mente ainda carente imaginava milhões de coisas que eu poderia fazer com aquele branquelo. Logo meu ônibus passou - é o que vai pra Zona Norte ?
- É
- Então é o meu também - não acreditei quando ouvi que teria que ficar alguns minutos e sentir o cheiro daquele homem próximo a mim. Ele já estava me enlouquecendo mesmo sem eu o conhecer. Entramos no coletivo, pagamos passagem e sentamos no fundo. O ônibus estava com todos os bancos ocupados naquela noite. Sentamos nos dois últimos vazios, lado a lado.
MINUTOS DEPOIS
- Sério que você assiste ? - se referia a um programa da Multishow bem engraçado.
- Assisto, é bem legal - ele sorriu.
- Eh sim ! - em pouco tempo de contato com aquele garoto, pude descobrir algumas coisas dele.
- Então amanhã eu trago o pen drive com as músicas de rock que você quer.
- Ah, valeu ! - de repente ele puxa uma das minhas fichas e escreve nas costas.
- Aqui está, o nome do livro que falei e o meu número, caso precise de mim - estranhei o fato dele dar o número a alguém quase desconhecido, até criei esperanças. Mas logo elas sumiram quando vi ele olhar pra uma mulher de shortinho, mostrando boa parte das pernas. Quase Babou. "Ih, ele é hetero !" . Um batalhão de sentimentos dentro de mim ficaram tristes, mas era a realidade. Apenas aceitei.
E fomos nós tornando amigos. Ajudava ele em algumas coisas, ele me ajudava em algumas, principalmente depois que fui expulso de casa. Ele não sabia a verdade, disse apenas que eles me expulsaram. Passei a morar com uma tia, e pouco tempo depois ele fez uma proposta pra mim.
- Mano ? - dizia, pelo telefone.
- Sim Fábio.
- Ei... O cara que morava comigo aqui vai sair. O quarto está vago, não quer vir pra cá ?
- Sério ?
- Humrum... Aceita vai, vai ser legal.
- Nossa... - não pude conter o sorriso, eu sempre quis ficar perto dele - tudo bem. Então eu vou para aí !
Eu não criava expectativas, tinha jogado na minha mente que ele é hétero e não devia realmente pensar outra coisa. Mas ele não era um amigo como qualquer outro. Ele era diferente.
- Mano ? - mais uma vez ele me acordava.
- Ah... O que ? O que foi... - dizia eu, com os olhos pesados.
- Você tá se sentindo bem ? Tá muito quente ! - dizia ele, tocando minha testa, meu braço.
- Aí... Não... - disse, espirrando em seguida.
- Ihh... Não vou te deixar doente aqui não Mano - dizia ele. Naquele dia ele iria sair com uns amigos.
- Não Mano, é só uma gripe qualquer. Vá e se divirta.
- Mas... E se você piorar ?
- Não vai acontecer nada.
- Ah não Mano, prefiro ficar - falou, mandando mensagem pra alguém enquanto sentia minha temperatura novamente.
Como o apartamento só tinha um quarto, dividiamos uma cama de casal. Eu adorava fazer isso, mas me surpreendia pela madrugada. Ele ficava tão lindo dormindo, de olhos fechados. As vezes pegava no sono olhando pra ele, apenas de cueca do meu lado. Não sabem toda a vontade que eu reprimia de passar a mão pelo corpo dele, algo impossível de se fazer. A surpresa que eu tinha era que as vezes seus braços estavam sobre mim. Suas pernas entrelaçadas nas minhas, seu corpo colado ao meu, sua respiração na minha nuca. Sempre que olhava pra trás, ele estava dormindo. De manhã, fingia não saber de nada, e ele não falava nada também. Sempre Achei aquilo muito estranho, mas acontecia bastante, não entendia o porque. Comecei a desconfiar que sempre que ele sonhava com alguém me abraçava como tentativa de materializar o sonho.
E assim fui me apaixonando por aquele loiro branquelo. Um garoto gentil, simpático, bonito, nada boçal, atencioso, interessante... Eu não conseguia me controlar. Enquanto ele estava solteiro, eu não sofria. Isso foi até o momento que ele apresentou aquela vagaba.
- Eric ?
- Na cozinha Fábio - estava cozinhando. Ele havia pedido para cozinhar, imaginei que fosse trazer um familiar como das outras vezes.
- Tenho que te apresentar uma pessoa Mano - falou, me fazendo virar. Mas me deparei com alguém inesperadamente diferente. Uma mulher, bunduda, peituda, bonita, com cada de safada. Ele devia estar orgulhoso de si com aquela mulher - esta é Bárbara, minha namorada.
- Namorada ? Uau - fingi um sorriso, mas a verdade é que fiquei muito triste com aquilo.
Desde que começou a namorar, nossa relação diminuiu. Ele saia bastante de casa, não trazia ela pra casa só porquê eu estava ali. Começou a demonstrar que eu estava começando a atrapalhar. Dentro da minha cabeça já começava a se formar uma opinião de que se eu me afastasse dele seria melhor pra todos. Aparentemente aquela mulher seria a melhor pessoa pra ele, estava o fazendo feliz e eu, o amigo sempre apoiador estava estorvando o casal. Isso, até eu descobrir que ela era uma vadia. Isso mesmo, descobri que ela fazia faculdade no mesmo campus que eu e todos os caras confirmaram.
- O que ? Aquela lá ? - dizia Jorge, um amigo nosso apontando - ela é a maior piriga Mano, cai fora que isso aí é furada, deve ter até DST essa mulher de tanto que já foi usada.
Eu não iria falar nada. Mas não iria desgrudar o pé. Tinha plena consciência que um dia ela iria deixar a máscara cair, e ele iria precisar de alguém pra ajuda-lo. E, pensei nele mesmo no sofrimento.
TEMPOS ATUAIS
- Mano, a gente tem que conversar - olhei meu reflexo no espelho a minha frente. Tinha cabelos castanhos lisos, pele branca, olhos idem, não era hiper bonito, mas tinha minhas qualidades.
- O que foi ?
- Eh que sabe... Eu e a Barbara estamos ficando cada vez mais próximos e eu pensei que...
- Já sei. Quer que eu vá embora - ele baixou a cabeça - OK. Apesar de eu sempre ser a pessoa que mais esteve ao seu lado, quer que eu vá embora... - eu já esperava que um momento ele fosse pedir isso, tava cada dia mais claro que ele me queria longe - pode deixar Mano, amanhã bem cedo eu vou embora. Mas só digo uma coisa, abre o olho, aquela mulher não é tudo o que você pensa !
Fui arrumar minhas coisas sofrendo, com o coração estilhaçado. Porquê tínhamos que sofrer tanto por causa de um amor ? Depois de ter me envolvido tanto, de ter me deixado apaixonar, agora era expulso pelo meu maior objeto de paixão. E o pior, eu continuava gostando dele. Cheirava seu lado da cama, em busca de encontrar aquele cheiro diferente que eu gostava bastante de sentir. O pior é que eu via meu amigo se metendo numa roubada e eu não podia fazer nada, um apaixonado é cego ! Ele nunca acreditaria em mim, mesmo eu tendo sido seu apoio durante este último ano. O que eu devia fazer ? Me contentar e ir embora de cabeça baixa.
TEMPO DEPOIS
Terminava de guardar os livros da faculdade. Já tinha pra onde ir, quando de repente ele abre a porta.
- Mano ?
- O que foi ?- não olhei pra ele. Fiquei muito magoado com o que ele tinha feito.
- Me perdoa ? - perguntou, me abraçando por trás de repente.
- Perdoar o que ? - perguntei, já nervoso pelo abraço.
- Tudo isso. Tentar te fazer ir embora... Por causa de alguém que não vale a pena - disse, encostando sua cabeça na minha costa.
- O que você descobriu ?
- Ela me traiu. Eu vi ! Eu... Que idiota eu sou ! Expulsar alguém que sempre se importo comigo por alguém que só mentiu pra mim - sorri comigo mesmo. A dias esperava por esse momento, o momento em que ele descobriria que ela não presta. Coloquei minha mão em seu braço, e por alguns segundos o acariciei, mas decidi ser hora de deixar aquilo pra trás.
- Que bom que você descobriu a pessoa que estava se metendo Fábio. Mas... Meu ciclo aqui já acabou - falei, puxando seu braço e me soltando. Eu já não podia mais ficar ali. Aquilo iria acontecer de novo, ele não ficaria mais sozinho pra sempre, e eu não queria sofrer.
- Do que está falando ?
- Preciso ir embora Fábio. Um momento em vai arranjar uma namorada, vai querer casar e eu vou estar aqui atrapalhando.
- Mas... Eu não quero que vá - falou, segurando meu braço.
- Nem sempre acontece o que queremos Fábio. Além disso, eu... Eu não quero mais sofrer ! - falei, de cabeça baixa.
- Sofrer ? Mas porquê ?
- Esqueça. É besteira minha - falei, pegando minha mala e caminhando até a porta. Ele me deixou ir até lá - tchau Fábio. Até a próxima, amigo - deixava pra trás um ciclo, um coração, milhões de sentimentos novamente. Abri a porta, e de cabeça baixa já ia sair quando de repente ele mete a mão na porta e a faz fechar novamente - porquê fe... - de uma hora pra outra ele me empurra pra parede e me beija. Não acreditei quando vi que isso realmente estava acontecido, que os lábios dele estavam colados ao meu. Queria gritar de tanta surpresa e alegria.
- Você mesmo que eu vou deixar... A única pessoa que Me valorizou sair por esta porta ? - perguntou, se separando da minha boca, juntando nossas testas - garoto bobo - mais uma vez acariciou meu rosto - te quero !
FIM
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