Como é de se imaginar eu não consegui me concentrar no restante da aula. Durante o último intervalo João Felipe percebeu meu olhar desfocado e vazio predominar quase o tempo inteiro, ele não perguntou o que havia ocorrido, primeiro por saber que não iria gostar da resposta e, segundo, por saber exatamente qual seria a resposta. Ele me convidou para almoçar em sua casa, e por lá mesmo passar a tarde, assim que a hora de voltar pra sala chegou. Eu estava indeciso, tinha medo de Henrique descobrir, e não sabia se eu queria ou não ter companhia naquele dia, afinal eu estava machucando, física e psicologicamente, cansado e triste. Resolvi aceitar, porquê a amizade daquele amigo tão solicito, carinhoso e atencioso me fazia muito bem.
Seguimos cada um para nossas respectivas sala. Eu cursava Publicidade e Propaganda, João Felipe cursava Engenharia Civil. No final da aula eu procurei o meu irmão e avisei a ele que ia embora com o João. Durante o percurso Consolação – Morumbi, onde se localizava a casa para qual a pouco tempo a família de João se mudara, uma trilha sonora com musicas do Cazuza tocava, e o poeta dizia: “eu não sei em que hora dizer, me dá um medo...”. Ele cantava e batia os dedos de leve no volante do carro, divagando, enquanto dirigia e por vezes eu o pegava olhando pra mim, me observando por frações de segundo.
Eu ainda me sentia mal, triste, cansado, sentia dores em algumas regiões, mas, apesar de eu não saber o porquê, tudo aquilo parecia diminuir enquanto estava por perto daquele amigo, o melhor de todos. Talvez fosse o carinho, ou sensação de proteção que ele me passava, ou o simples fato de apesar dele sempre me aconselhar, nunca me julgar ou apontar o dedo. A verdade é que João tornava o difícil muito, mas muito mais fácil. Almoçamos, e fomos para o quarto dele, ficamos por um tempo em silêncio e ele, tomado pela impaciência e preocupação, disparou:
- O que você tem? Aparece na faculdade tarde, sendo que eu seu irmão já estava lá, e ainda por cima todo estranho, triste, com o olhar vago... como se estivesse preocupado. – Percebendo que eu havia permanecido calado, olhando nos olhos dele, insistiu – Se você não me contar eu não vou poder te ajudar.
- Você não pode me ajudar – Eu tinha vergonha de contar a ele o que realmente estava acontecendo. Felipe era um garoto bom, não fumava, não usava drogas, bebia socialmente, era organizado, andava nos trilhos. Eu sentia vergonha de compartilhar com ele a situação rasteira a qual eu estava envolvido, tinha medo de que ele ou qualquer outra pessoa descobrisse que eu havia apanhado, que eu havia sido sodomisado até que meu corpo ficasse esfolado pela brutalidade usada no ato. A porra do Henrique em conjunto com meu sangue, que escorriam de mim, ainda me fazia lembra que eu havia sido por quase toda a manhã, a vadia de outro macho.
- Então me conta, pra que eu possa pelo menos te apoiar. – Mais uma vez ele insistiu, demonstrando estar preocupado com o meu sofrimento naquele momento. Eu olhei para ele, depois para o chão, pensei por alguns momentos, e depois voltei a olhar pra ele. Falei e assumi pela primeira vez, uma vontade que eu já guardava dentro de mim por muito tempo.
- Não quero mais ficar com o Henrique. Não quero ter mais nada com ele. – Eu senti uma lagrima escorrer do meu olho esquerdo contra a minha vontade. João Felipe se aproximou de mim, sentando-se ao meu lado em sua cama, passou um braço pelo meu obro e eu pude sentir todo o conforto que ele pretendia me passar, o seu calor humano, o seu cheiro refrescante e adocicado de cravo fresco que eu conhecia muito bem, e a muito tempo.
- Então diga a ele, é o melhor que você faz Dani. – Mais uma vez eu não respondi. Seu olhar passou a transpor revolta. – Não me diga que... a sim, eu entendi. Você tem medo daquele canalha. Olha Dani, o correto seria eu contar ao seu pai faz a você, eu devia contar! Sabia!? Pro seu bem.
- Pro seu bem, seria melhor você fica calado e não tomar nem uma atitude em relação a essa história. Aliás, pro meu bem também. Não se esqueça que o Henrique não gosta nem um pouco do fato de você saber de nós dois.
- E você acha que eu tenho medo dele Daniel? Eu queria ver ele tentar fazer comigo o que ele faz com você – Dizia ele levantando-se, parecia que a impaciência havia tomado conta dele de vez. – EU QUERIA VER ELE ENCOSTAR UM DEDO QUE FOSSE EM VOCÊ, NA MINHA FRENTE!
- Eu não vim pra cá pra falar sobre isso Jo]ao Felipe! Eu vim pra me distrair! Se você insistir com isso eu vou pedir pro meu pai mandar alguém vir me buscar! – Felipe abriu a boca pra falar, mas pareceu pensar duas vezes e resolveu não dizer aquilo que tinha a intenção de dizer.
Depois de nos acalmarmos fomos assistir a um filme ou ao menos tentar, depois de me aconchegar no peito dele acabei dormindo rapidamente. O peitoral dele era aconchegante, definido, macio, largo e quente. A muito tempo tínhamos o hábito de trocar caricias, e João Felipe sempre gostou disso, particularmente, me ter deitado em seu peito para que ele pudesse mexer no meu cabelo. Meu sono foi profundo, calmo, sereno e longo. Eu não se ele também dormiu, mas quando eu acordei ele ainda mexia nos meus cabelos e me observava com atenção.
- Preguiçoso – Ele riu de mim com satisfação, bem baixinho enquanto me olhava. Com um sorriso nos tímido nos lábios escondi meu rosto em seu peito, dei uma mordidinha de leve, carinhosamente e ele afagou meus cabelos.
Que bom seria se a vida fosse feita só de momentos como esse.
CONTINUA!
Olá gente, muito obrigado pelos comentários, pelas críticas e elogios, peço a vocês que se acalmem, leiam a história e com o tempo entenderam o significado do título. Desculpem pelo capítulo curtinho, mas é que esses dois dias estão sendo muito corridos pra mim. No sábado prometo recompensa-los. Abração.
