Eu nunca - nunca mesmo - em toda a minha vida gostei de dormir com alguém na minha cama. Nem Fellow e Muphin podiam. Sempre achei super chato. Nas férias vez ou outra primos vinham passar dias em minha casa e era um inferno porque não havia cama pra todo mundo. As vezes ou eu dividia a cama com alguém ou então ia dormir no sofá. Sou muito espaçoso na minha cama. Mas nas últimas três noites eu sentia uma vontade desesperadora de ter alguém do meu lado. Abraçava o travesseiro como se pudesse sentir o peito de alguém alí embaixo.
Eu estava apaixonado pelo Rômulo e era uma coisa completamente nova pra mim. Digo, quando a gente gosta de alguém a gente sempre pensa estar apaixonado. Daí você gosta de outra pessoa e percebe que todos as suas "paixões" passadas não eram tão paixões assim. O que eu sentia no meu peito sobre o Rômulo era uma coisa quente, divertida, me fazia rir sozinho, me fazia ter bom humor todos os dias, me fazia chegar na hora na faculdade, me fazia estudar, me fazia abraçar os gatos mais que o comum, rodopiar pela casa, limpar meu quarto, ajudar minha mãe com as flores...
- Você tá entrando em equilíbrio. - ela disse de olhos fechados fazendo uma posição de yoga no meio da sala.
- Como é? - eu continuei mexendo o creme para um pavê no fogão.
- Pensa que eu não tenho percebido tudo o que tem feito nos últimos dias?
- Só estou bem.
- Bem até demais. Eu li as cartas.
Nem isso me irritava mais.
- E daí?
- E daí que não tem mais nada lá pra você receber. Ou já recebeu ou perdeu.
- Como assim?
- Não sei... Não está mais lá.
- Deve ter sido a luva que ganhei.
- Hum... E o Rômulo?
- Eu ganhei o Rômulo por acaso? - eu ri provando com o dedo um pouquinho do creme.
- Tô perguntando se tem notícias dele.
- Não. Nós trocamos algumas mensagens esses dias mas nada muito importante...
- O tarot também disse que... - ela fez outra posição - você vai precisar ser forte. Uma provação vem aí.
- Provação?
- Não tenho a menor ideia. Só tome cuidado. Acho que a provação vem pelo fato de você ter recebido algo. Agora você precisa mantê-lo.
- Que medo... - eu ironizei.
- Você deveria levar isso mais a sério.
- E a senhora deveria parar de ler essas cartas pra mim.
Ela fez outra posição e permaneceu nela. Eu desliguei o fogo e comecei a montar o pavê numa travessa.
- O que mais ele disse? - eu perguntei.
- Agora você quer saber?
- Só pra ouvir.
- Que você está entrando em equilíbrio. Que está no ritmo certo do universo. Só que pra manter esse ritmo e a tal coisa que você recebeu precisa passar por uma provação. O bom é que se passar tudo ficará bem. Tem diversas coisas boas pela sua frente. Uma imensidão. Tanta que não consegui distinguir. Fiquei até feliz em saber. Não vi além disso. Eu estava cansada... As cartas pararam de fazer sentido.
- Como assim pararam? Quando tava ficando bom elas pararam?
- Pararam. Você olha e não vê nada. Não entende nada. Não vem nada na sua cabeça. É como se as cartas voltassem a ser só cartas de papel.
- Hum... Isso mostra o quanto que isso aí é falho.
- Não deveria duvidar tanto do tarot. Além disso as previsões são com base no seu momento de hoje. Com base nas suas escolhas de hoje. Amanhã elas podem mudar. Como está sua mão? Cadê a luva?
- Quase perfeita em 5 dias. Não preciso mais da luva.
- Que bom.
- A única coisa que recebi foi um assalto. Passei por uma "provação" porque conheci o Rômulo e tudo ficou bem... É. Talvez esse negócio acerte mesmo.
Ela riu.
- Vocês tem se dado muito bem, não?
- Ele é muito legal.
- "Ele é muito legal" - ela me imitou e se levantou vindo pra cozinha.
- O que foi?
- Existem vários motivos que podem deixar uma pessoa em equilíbrio com o universo. Se curar de uma doença grave. Alguém que consegue um emprego que queria e daí vive de forma melhor. Alguém que sobrevive a um acidente terrível e muda a forma de viver... Mas ninguém precisa passar por coisas assim sempre. Se apaixonar é uma ótima forma de ver as coisas de outro jeito e então entrar em equilíbrio.
Eu continuei calado. Ela continuou falando e esperando minha resposta.
- Imagine que seus sentimentos são como vírus. Por onde você passa quando está contaminado, você o deixa. Quando você está com raiva sua comida não sai boa, as coisas dão errado, os espelham quebram, você cai, bate o dedo menor no pé do sofá, perde o ônibus, pega chuva... Quando você tem o coração cheio de amor é igual. As coisas dão certo, você se sente bem, tem um sorriso sincero pra dar a qualquer um, não fica doente com frequência, os animais gostam de você, você contagia quem está a sua volta... Pensa que eu não sinto sua energia? Eu sinto a casa toda quente por onde você passa. Você vibra amor, Victor.
Eu me virei e a encarei. Ela me devolveu um olhar do tipo "Acertei, não foi?"
- Nós só somos amigos mãe.
- Eu acho que você tem outras preocupações mais urgentes que isso.
- Eu não tô descuidando dos estudos...
- Também... Eu tô falando sobre você viver uma realidade bem diferente da dele. Tem que ir com calma com isso. Não quero você magoado.
- Ele é rico. Eu sei.
- Rômulo é um garoto muito bom, Victor. Desde pequeno quando cuidei dele. Ele era uma criança adorável. Um menino de ouro. Tudo isso junto ao fato dele ser rico e filho único geram uma super proteção encima dele. Cuidado ao se aproximar. São realidades diferentes. Você vai sentir um baque, vai ver.
- O Rômulo não é filho único. Aquele outro garoto da mesa é irmão dele. O César.
- Irmão? Dr. Otávio só teve um filho com a dona Ângela. Só se for de outro casamento que eu não saibaxxDr. Otávio não havia se casado de novo. O Rômulo havia me confirmado isso quando saímos dias atrás. Então o César era adotado? Porque pelo o que minha mãe falava ela trabalhou lá tempo suficiente pra saber disso. De todo jeito tanto faz... Muita sorte dele de ser adotado por uma família tão bacana quanto a do Rômulo. Não a conhecia mas pelo o que minha mãe falava a mãe dele era uma ótima pessoa.
Durante a semana eu troquei várias mensagens com o Rômulo. Não era sobre muita coisa, mas o suficiente pra não perdermos o contato. Era muito bom falar com ele. Acabei descobrindo o seu gosto musical, filmes que ele já havia assistido, livros que ele recomendou e um monte de tumblrs de fotografias que ele acompanhava.
“As artes são lindas. Algumas são photoshops mas outras são reais mesmo. São legais pra você colocar como wallpaper seja do computador ou do celular.” – ele dizia na mensagem.
Eu acessava todos os dias os tumblrs e selecionava as que eu mais gostava. Salvava todas no meu celular e de alguma forma as imagens não faziam mais parte da internet. Agora as imagens faziam parte da concepção que eu tinha de quem era o Rômulo. Era como se elas traduzissem a personalidade dele.
Mandava algumas pra ele pelo Whatsapp e ele sempre tinha a preocupação de comentar sobre. Como ele me ensinou numa noite, enquanto conversávamos no Whatsapp, as imagens dos tumblrs eram artes abstratas. Como era mesmo? É... Daquelas que vocêapenas olha e tenta traduzir. Isso faz com que a imagem gere um significado único. Só seu. Um significado que de certa forma tem parte da tua personalidade nele. Porque você não consegue exprimir opinião sobre nada sem colocar parte do seu eu naquilo.
- Entendi. Isso é muito interessante.
Ele fez uma pausa.
- Eu vou te mandar uma e quero que você me diga o que pensa. Ok?
- Ok.
Esperei um pouco e logo vi que ele estava digitando. A imagem chegou. Eu baixei e era de um céu escuro. Poucas estrelas. Tão escuro que mesmo com a lua timidamente no cantinho da figura não iluminava nada.
Não parecia photoshop ou imagem do tumblr. Era como se a lua estivesse bem pequenininha mesmo. Parecia uma fotografia.
- Não posso mais falar agora. Vou sair com uns amigos. Mas vê e pensa. Depois você me diz o que te veio à cabeça, tudo bem?
- Tá ok.
Ele ia sair naquela noite. Isso me deixou um pouco pra baixo. Não é como se ele não pudesse mais sair, mas a gente fica pra baixo quando o alguém que você gosta vai sair com outras pessoas pra lugares que você não sabe onde fica e tudo mais... Primeiros indícios de ciúme.
Ele ficou off-linexxMinha mãe colocava as flores pra pegar sol no quintal enquanto eu me arrumava no quarto. Era sábado. Dia do almoço na casa do Rômulo. Eu havia acordado cedo mesmo havendo marcado com ele pra 10h daquela manhã. Eu procurei no meu guarda roupas a melhor roupa possível. Mais uma camisa que eu tirava a etiqueta e passava perfume no intuito de não deixar aquele cheiro característico de confecção nova ser percebido. Na noite anterior eu escovei feito um escravo um dos meus tênis preferidos pra poder usá-lo naquele dia. Não era nada demais mas além dele ser super discreto de uma cor sóbria eu me sentia bem calçando-o.
8h eu estava pronto.
- São oito horas Victor. Nem eu saí ainda. – minha mãe disse tomando um chá na sala terminando de acender um incenso.
- Eu sei... Só tô ansioso.
- Eu tô sentindo daqui. Não precisa disso meu filho. Se e somente se o Rômulo for gostar de você ele precisa gostar do Victor como ele de fato é todos os dias.
- Não posso ir na casa dele de qualquer jeito. Preciso de uma boa roupa.
- Não tô dizendo pra você ir se desarrumar não. Só que você não dê a impressão errada pra ele.
Eu sabia que minha mãe estava certa. Eu só não sabia como fazer aquilo.
- Vai dar tudo certo, Victor. – ela disse percebendo minha indecisão.
Eu chequei o Whatsapp umas duzentas vezes vendo a hora de visualização do Rômulo mas ainda era daquela mesma hora da noite anterior quando nos falamos pela última vez. O que me fez pensar que ele tinha curtido uma noitada incrível e ainda estava dormindo. Eu nunca tinha me visto tão inseguro assim.
Como é possível a gente tratar como nosso algo que ainda não é?
- Victor... 10h. Eu tenho que ir. – minha mãe avisou.
Eu olhei mais uma vez o Whatsapp e nada do Rômulo checar.
- Tudo bem...
- Ele vai vir. Pessoas atrasam as vezes... É normal. Ele deve vir logo. Querer que ele esteja aqui às dez em ponto como marcado é demais também né! A casa dele é longe.
- Eu sei. Pode ir...
Ela me deu um beijo e saiu.
Eu fiquei em casa esperando e esperando.
10:00.
10:30.
11:00.
11:30.
12:00.
O Rômulo não vinha. Não checava o Whatsapp nem nada. Eu me senti horrível naquele instante. Tão bobo de ficar alí ansioso esperando por ele como se houvesse de fato alguma esperança de alguém como ele querer algo a mais com alguém como eu.
Ele havia saído na noite anterior. É óbvio que deveria estar de ressaca e desmaiado no quarto. Deveria ter até levado alguma menina pra casa dele.
Estava muito calor. Eu ia tirar aquela roupa. Meu celular tocou. Era ele.
- Alô.
- Alô. Victor?
- Oi.
- Cara eu atrasei!
Nossa... Não havia percebido.
- É... Pois é.
- Mas eu já tô indo. Foi só um imprevisto. Me espera que eu já tô passando aí. Tô no seu bairro já.
- Tá...
Nem 2 minuto depois daquela ligação ele chegou. Eu fechei tudo e saí.
O carro, agora um Hilux SW4 preta, me esperava. Eu entrei e bati a porta. Com quantos carros eu já o vi mesmo? Aquele era o terceiro, certo?
- Bom dia e foi mal antes de qualquer coisa!
- Tudo bem.
- Vamo que já tem um monte de gente lá em casamonte de gente?
- Você não faz ideia.
A provação havia começado.
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Desculpem o atraso. Tive uns imprevistos durante o fim de semana. Imprevistos relacionados à saúde então não deu mesmo de chegar perto do computador. Mas já está tudo bem. Ainda pensei de pedir pro Kaio postar aqui mas ele não sabe direito e além disso eu gosto de responder os comentários então preferi deixar pra hoje... Tá aí.
Monster, Yan700: O César ainda vai mostrar bem mais.
SafadinhoGostosoo: É o contrário sim. Rômulo é mais velho que ele dois anos.
Tozzi, esperança, LiloBH,: Obrigado! Isso é muito bom!
Higor Gonçalves: Não sei. Ele é estranho. Tô esperando pra ver o que rolar nesse almoço aí.
Ru/Ruanito: Sim. Meus capítulos normalmente tem de seis a sete folhas no Word com fonte Arial doze. O capítulo passado teve treze.
AllexSillva: Exato. Troye Sivan!
Drica Telles(VCMEDS) e Lytah : Eu tenho muitas suspeitas quanto ao César. Muitas mesmo.
Isso é tudo pessoal. Até mais!
Abraço.
Igor.
kazevedocdc@gmail.com
