A casa que escolhi para ficar é grande e vazia, abandonada por muito tempo e suja em todos os sentidos da palavra. Aquele local havia sido uma clínica que foi abandonada por algum problema de infestação e ninguém nunca mais a comprou por ser grande demais e muito afastada do centro da cidade. Eu acordo às sete horas da noite quando o sol já está há algum tempo fora de alcance.
Sinto-me novo pelo banquete que tive ontem, embora preocupado com as consequências que aquele desastre pode trazer. Nesse país, as pessoas não costumam a ter porões, o que é complicado para mim às vezes. Decido que vou construir um o mais rápido possível. Dinheiro não é problema. Tive que dormir encolhido na parede mas só antes de ter certeza que a luz do sol não iria entrar por nenhuma freixa do quarto.
Agora saio de casa sem o chapéu e usando o meu sobretudo. Minha rua é escura e muito confortável para mim, mas meus olhos costumam brilhar no escuro e chamar a atenção das pessoas. Quando perguntam, digo apenas que é algum efeito e que possuo olhos vermelhos por causa de uma doença herdada da minha mãe. Ando pela calçada e observo meus vizinhos. Estranhas pessoas cheias de peculiaridades.
Chego ao local da cidade onde tudo já é mais iluminado. Conheço essa rua. Dobrando algumas esquinas chego no beco escuro onde Jesus se escondeu de mim debaixo de um carro e mais alguns ruas adiante o cemitério. Mas pelo outro lado posso ir direto para a praça bem iluminada e movimentada.
Estou muito ansioso no momento de um jeito único que só aqueles da minha raça conseguem ficar. É o sangue humano temporário nas minhas veias que me deixam tão suscetível as emoções humanas.
Quero ouvir alguma coisa a respeito do que aconteceu na noite passada, ouvir se desconfiam de algo, se Niara está bem. Não que me preocupe muito com ela, mas gostarei de saber que a garota tão valente está sendo bem cuidada. Sei que um dia poderei beber seu sangue. Mas são pessoas como ela que decido não tomar o sangue inteiro.
“Bar da Noite” leio em voz alta um bar bem movimentado e luminoso com mesas por todos os lugares, até mesmo na calçada. A música é algum tipo nojento e alto que inferniza meus ouvidos. Ignoro. Passo por algumas mesas cheias e paro na frente do bar encarando o interior. Algumas mesas vazias onde poderei me sentar. Muita gente está olhando para mim nesse momento. Coloco minhas mãos nos bolsos do sobretudo e começo a sorrir para todo mundo. As mulheres são as primeiras a retribuir o meu sorriso. Entro no bar e sento-me numa mesa. Um homem de pele escura e nariz grande vem me perguntar o que vou querer. Ele encara diretamente nos meus olhos. Consigo sentir o sangue correndo por suas veias, doce e delicioso.
‘Eu quero você’ eu sussurro. O homem não me escuta. ‘Eu quero uma cerveja.’
‘É pra já.’
Eu espero.
Concentro-me ao meu redor. Quando as pessoas estão tão perto eu consigo escutar o que falam, mas todo mundo aqui está falando de coisas banais e ultrajantes ao mesmo tempo. Mulheres só falam de homens, homens só falam de mulheres. A música é horrível.
Quero sair daqui. O que vim fazer aqui? Esse é o lugar errado.
Alguém começa a falar de mim. Eu abaixo a cabeça e escuto. A mulher está falando dos meus olhos vermelhos. Ela os acha bonitos e atraentes e o meu cabelo longo é bem diferente do que os homens daqui costumam usar. Agora elas riem do meu jeito introvertido. Eu olho para elas nesse momento e sei que meus olhos estão brilhando. A morena que falava de mim me acompanha com o olhar à medida que me levanto da cadeira e vou até ela, inclino-me e lhe dou um beijo.
Fácil. Fácil demais.
‘Que porra você tá fazendo com minha namorada!’ um homem grita. Eu fico completamente mortificado. Tudo que menos preciso é um escândalo. Mas o homem não pensa da mesma forma. Ele olha para mim e vê que seu porte físico aparenta ser bem melhor que o meu e me empurra.
Eu não me movo, o que o deixa muito confuso e desnorteado. Eu me viro e vou colocar uma moeda de ouro em cima da mesa onde eu me encontrava. O garçom volta com a cerveja e olha para mim surpreso.
‘Senhor? Já vai?’ ele olha para a mesa. ‘Não aceitamos esse tipo de dinheiro.’
‘Não aceitam ouro?’ falo com descrença. Estou perdendo a paciência com essas pessoas estúpidas.
‘Ouro?’ ele parece confuso.
‘É uma moeda de ouro’ explico-lhe, como se falasse com um doente mental.
Alguma coisa de vidro se quebra na minha cabeça. Se eu fosse humano, aquilo seria muito doloroso. Sinto um líquido gelado escorrer pelo meu cabelo e encharcar minha roupa. O gosto é doce. Mas não tão doce quanto sangue. Viro-me para o homem cuja namorada eu havia beijado. Controlo minha fúria. Carnificina não é uma coisa boa nem para um vampiro. É sinal de fraqueza.
‘Eu peço perdão por ter beijado sua namorada’ falo. Ele é um homem feio e bruto. ‘Não tenho nenhum interesse nela. Na verdade, a acho muito fácil.’
Todo mundo ao meu redor começa a rir. Não sei qual é a graça. Estou simplesmente falando os fatos.
‘Eduardo?’ Escuto sua voz e olho para a entrada do bar. Lá está ele, Jesus, radiante, ele entra e me encara com uma preocupação genuína que esquentaria o meu coração se não estivesse morto.
‘Jesus, bom te ver, rapaz.’
‘O que está fazendo aqui?’
‘Sinceramente não sei.’
‘Ele beijou minha namorada.’ Ele diz para Jesus como se o conhecesse. Está confuso pelo fato de que ambas as suas tentativas de me ferir não surtiram efeito algum.
‘O senhor Eduardo?!’ Jesus exclama.
‘Beijei. Foi um erro.’ Admito.
Jesus começou a rir. Eu acho seu sorriso contagiante e lhe dou um dos meus.
‘Bruno, ele é novo na cidade. Pega leve.’ Jesus olha para mim. ‘Precisa de ajuda para se encontrar novamente?’
Eu olho ao meu redor e vejo todo mundo me encarando. Muitas pessoas em minha volta num momento de estresse pode ser extremamente trágico para todo mundo.
Jesus é minha salvação.
‘Seria uma ajuda bem vinda.’
Eu o acompanho para fora do bar. O som de corações batendo tão perto alivia e eu consigo relaxar por pouco tempo, mas logo percebo que o coração de Jesus é ainda mais perigoso de se estar perto.
‘Aonde você deseja ir?’ ele pergunta educadamente.
‘Ao prefeito da cidade.’
‘Não temos prefeito. Uma prefeita. Seu nome é Evangeline e ela é uma pessoa boa.’ Eu não gosto do que ele me diz. Prefiro que ela seja uma pessoa ruim. Assim será mais fácil corromper.
‘Ótimo.’
Jesus olha-me de um jeito divertido. ‘Está todo molhado de cerveja.’
‘Eu sei.’
Ele dá uma gargalhada que me deixa confuso por muitas razões. Uma delas é o jeito que me comove. Deve ser o sangue dos humanos que havia bebido. Falando nisso…
‘Meu amigo Jesus…’ ao falar isso, eu dou uma gargalhada por causa da ironia. Mas isso só o deixa muito confuso. ‘Desculpe-me. Mas eu escutei notícias terríveis de algumas coisas que aconteceram com uma jovem garota ontem à noite? Você sabe de alguma coisa?’
‘Ah sim… Sinto muito que tenha que estar presente logo num momento de tamanha vergonha, senhor Eduardo’ ele diz de um jeito tão parecido como as pessoas da minha época falavam que fico surpreendido positivamente. ‘Conheci a tal garota hoje de manhã. Ela veio à igreja e conversou comigo. Não sei por quê. Ela conversou comigo pessoalmente e me disse que alguns garotos da cidade tentaram fazer uma coisa horrível com ela, uma coisa que não quero nem repetir para o senhor por sentir muita vergonha.’
‘Entendo.’
‘A mãe dela já foi na delegacia e tudo vai se resolver. Quatro dos criminosos já foram pegos e estão sofrendo as consequências. Dois ainda estão desaparecidos.’
‘Desaparecidos?’
‘Sim. Niara me disse que eles podem estar no meio da mata ainda, fugindo da vergonha. Sinceramente, senhor, vai me perdoar se achar isso muito errado, mas eu gostaria que eles não voltassem nunca mais para a cidade.’
‘Meu bom amigo, eu entendo sim.’
Seu cheiro chega ao meu nariz com tanta intensidade que sinto alguns tremores. Mesmo estando bem alimentado, minha sede ataca e eu sinto medo. Medo de machucar esse garoto. Por quê? Não sei. Desejo saber?
É como um aviso de que eu estaria cometendo um grande erro em tocar numa pele tão imaculada como a de Jesus. Mas não me controlo e lambo meus lábios secos. Estou sofrendo por dentro. Jesus fita-me de um jeito preocupado.
‘Tem certeza de que quer continuar? Parece mais pálido do que o normal, Eduardo.’ Ele para abruptamente na rua. ‘Oh, desculpa, Eduardo. Não queria chamá-lo de pálido.’
‘Ora, desde quando pálido é ofensa?’ pergunto, sorrindo. Mesmo em meio às dificuldades, não consigo segurar o sorriso. Já haviamos andado o suficiente para chegarmos a rua da igreja. O que não havia percebido é que a prefeitura fica ali também perto da igreja. Há uma cruz pendurada na porta da prefeitura cujas paredes é decorada com centenas de pequenas cerâmicas amarelas.
‘Você é uma pessoa boa, Eduardo.’
‘Jesus, se me perdoa, já sei onde é a prefeitura, posso ir sozinho. Adeus, amigo. E muito obrigado mais uma vez.’
Ele parece ferido quando me afasto, mas é para o seu próprio bem. Como posso dizer isso a ele? Não posso, nunca poderei. Mas o mais surpreendente de tudo é como aquilo está me ferindo por dentro. Nunca me importara tanto com uma pessoa desde que Verona me acordou dos mortos. Sempre achei impossível que fosse um dia me questionar a esse respeito. Obviamente, muitos da minha raça são bem mais velhos do que eu, mas eu achava que sete séculos eram o suficiente para ter aprendido tudo. Estava errado.
Claro que estou errado. Posso ter andado nesse mundo por muitos anos como uma criatura da noite, mas não amadureci, tenho o mesmo corpo que tinha e meu cérebro não cresceu. É difícil assimilar.
Estou mais confuso do que o normal.
Jesus é diferente. Preciso decidir se devo matá-lo logo de uma vez ou… ou fugir.
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Sr.Chris: obrigado, cara!
S2DrickaS2: obrigado, dricka, agora que continuei eu vou continuar sabe nem q eu tenha q dar um final meio abrupto se ninguém estiver gostando mais
lu6454: demoro só pq gosto de da ruma revisada antes d postar, sou meio desatento
Helloo: oh que lindo, obg
Edu19>Edu15 : valeu edu
Ru/Ruanito: kkkkkkk
crys12: estou aqui! kkk
Yami : oh valeu obg mesmo um bj e um abraço pra ti tbm