- Eu não acredito que você saiu com ele. – minha mãe falou me olhando com aquele olhar característico de quando ela me dava uma surra quando pequeno.
Eu continuei calado fingindo não entender.
- Victor, você me mandou uma mensagem dizendo que ia sair com o Rômulo?
- Qual o problema?
- Você tava há dias chateado pelo o que aconteceu e agora volta a sair com ele? Victor, você tá apaixonado por ele!
- Mãe...
- Victor, você vai sofrer mais uma vez.
- Não. Eu já entendi que o Rômulo não quer nada comigo. Nós só vamos ser amigos.
- Será mesmo Victor? Você acha que eu não te conheço? Você vai se iludir!
- Mãe, não ajuda a senhora falar isso.
- E eu tô mentindo? Eu quero o seu bem. Eu tô te alertando. Eu não quero você choramingando pelos cantos de novo.
- Eu já disse que entendi. Nós só vamos ser amigos!
- Victor, meu filho... – ela suspirou e veio em minha direção. Tomou a minha mão e me puxou pro sofá – Eu já te contei diversas histórias sobre Deuses. Você sabe como nasceu o Cupido?
- Eros?
- Eros ou o Cupido, tanto faz.
- Lembro de algo sobre um banquete. Afrodite se deitou com...
- Ares. Exato. Victor, isso é só uma alegoria pra explicar uma coisa pra você. Afrodite é a deusa do amor, das paixões, dos sentimentos fortes, das emoções mais profundas e arrebatadoras que alguém pode sentir. Ares é o deus da guerra, da luta, das grandes batalhas. Tudo nessa vida tem dois lados. Nem todo amor que Afrodite causa é bom. Nem toda guerra que Ares causa é ruim. O Cupido quando acerta alguém desperta as duas coisas na pessoa. Tanto o amor arrebatador como o conflito e a guerra interior. Isso leva a qualquer um ficar confuso. Você precisa achar o meio termo nisso. Se o Rômulo já disse que não quer algo mais com você só cabe a você aceitar e seguir em frente.
- Mãe, eu já disse que entendi.
- Não Victor. Você acha que entendeu. Só acha. Eu quero ver amanhã, semana que vem, mês que vem. Como você vai estar se sentindo. Ficar do lado do Rômulo, ser amigo dele, trocar mensagens, saírem juntos...
- Não vai acontecer nada.
- Ver o Rômulo ficar com outras pessoas?
- Eu já disse que não vai acontecer nada. Tá tudo bem.
- Posso confiar em você?
- Pode.
Ela me abraçou e enquanto eu coloquei meu queixo sobre seu ombro e olhei pra parede branca com os olhos marejados.
Eu nunca havia mentido tanto numa só conversa com minha mãe.
_________________________xxx___________________________
Era sábado. As coisas haviam voltado ao normal. Digo, a correria na faculdade, cada vez mais assuntos pra estudar e meu pai voltou a trabalhar. O que também havia voltado era o César todo enigmático e o Victor que voltou a falar comigo como antes.
- Uuuuhuuuuul!
César veio correndo e subiu no trampolim saltando em direção à piscina.
- Eu estou estudando... – eu disse da área coberta pra ele.
- Problema seu. – ele disse embaixo da cascata.
- Como você consegue levar o curso de medicina assim?
- Assim como?
Ele falava como se não entendesse. Eu já tive essa conversa um milhão de vezes com o César.
- Assim! Hoje é sábado, você deveria estar estudando, revisando o assunto da semana, sei lá.
- Já fiz isso. – ele dizia calmamente.
- Como já fez?
- Ontem à noite. Eu dormi quase 3h da manhã revisando tudo.
Como o César conseguia? Ele era a pessoa mais super dotada que eu conhecia. Ele pegava o assunto da faculdade com muita facilidade. Da faculdade não. No colégio já era assim. Essa facilidade toda em pegar o assunto fazia o César parecer relaxado pra maioria das pessoas. Ninguém o via como alguém que estudava muito pelo seu jeito mais relaxado. Em contraste a isso ele tinha o boletim impecável e já carregava no currículo um artigo aprovado pra um evento de medicina em Londres. Coisa que eu também tentei e não consegui.
- Eu não te vejo estudando.
- Quer rancar a porta do meu quarto agora e vigiar meus passos 24h?
- Você anda tão estranho que é uma opção a se considerar.
- Se você é lento o problema não está em mim. Estude ora essa... – ele dizia brincando com umas bóias da piscina.
- É difícil com você gritando ao pular na piscina.
- E vou gritar em todos os pulos. Gostou do trampolim?
Ele havia mandado montar um trampolim na piscina. Não era muito alto mas já era suficiente pra cair mais pro meio da água.
- Pra quê esse trampolim César? Que besteira.
Ele saiu da piscina e mais uma vez correu sobre a taboa.
- Uuuhuuul!
O barulho do mergulho ecoou pelo pátio.
- É pra isso que serve o trampolim. – ele disse saindo da água e jogando o cabelo pra trás.
- Eu não vou estudar nunca assim.
- Eu estudo com música no fone de ouvido.
- Você só pode estar brincando...
Ele ria convencido.
Saiu mais uma vez da piscina e veio até a área coberta passando por mim bagunçando meu cabelo indo até a geladeira. Eu então mandei uma mensagem pro Victor.
“Não consegue estudar, é?” – ele respondeu.
“Como que estuda com o César me atrapalhando?”
Mandei uma selfie em que no fundo o César aparecia de costas no balcão.
“Como o César está?”
“Super dotado.”
“Oi?”
“Esbanjando inteligência.”
“Isso é bom.”
“Queria eu ser assim.”
“Manda um abraço pra ele.”
César havia conseguido se redimir com o Victor pelo jeito. Que bom então.
- Victor está mandando um abraço.
- O seu poodle? Diz que qualquer diz a gente se esbarra pra tomar sorvete e ele é quem vai fazer as bolas nas taças. – ele respondeu enquanto chacoalhava o que pelo som parecia ser um copo de drinks vedado.
- Você poderia parar de chama-lo de poodle por favor?
- Não.
César se virou e veio com dois drinks de frutas prontos e batidos com leite condensado. Ele sabia que eu adorava.
- Me dá o celular, deixa eu mandar uma mensagem pra ele.
Eu entreguei achando interessante. O som de gravação de voz no WhatsApp deu um bip.
- Eaí Victor. Olha, você é um cara legal mas eu agora preciso conversar com o Rômulo então dá licença.
- Meu Deus! – eu levantei apressado pra tomar o aparelho dele.
- Mas vocês podem continuar tricotando daqui uns minutos. É rápido, eu prometo. Tchau.
Ele enviou a mensagem.
- César!
- Romildo. – ele sugou o canudo.
- Porquê você faz essas coisas?
Uma mensagem de voz do Victor chegou.
Ele ria no início. “Fiquem a vontade. Até mais tarde.”
O Victor não havia se importado com aquela mensagem do César? Porque eu achei que ele ia sim.
- Tá vendo? Porquê você leva tudo tão a sério? Senta aqui anda...
- O que foi?
- Achei o processo administrativo da minha mãe na prefeitura.
- O que? – eu perguntei incrédulo. Não é possível que ele tenha encontrado no meio daquele tanto de papel.
- Achei Rômulo! Eu achei! Eram pilhas enormes mas eu consegui.
- Você teve muito trabalho então...
- Você não imagina quanto. Foram semanas, mas o que importa é que eu consegui. – ele recostou na cadeira satisfeito com o drink na mão tirando os óculos escuros.
- E aí? O que tem lá?
- Não analisei com cuidado, não tive tempo. Mas já dá de ter o nome de casada dela, endereços antigos e número de documentos. Também tenho o nome dos outros envolvidos e posso ir atrás deles pra chegar até ela.
Eu engoli um seco. Meu Deus. Eu nunca tinha depositado muita fé nessa busca do César mas com isso ele poderia chegar até ela num piscar de olhos. E depois?
- Nossa... Então você está bem perto, né? – eu perguntei receoso.
- Poderia encontrar ela agora mesmo se eu quisesse. Mas eu estava ocupado. Estudando hein! Daí não tive como ir atrás Mas eu devo mexer com isso daqui uns 15 dias quando as provas passarem.
- Ainda bem. – eu soltei despercebido.
- Ainda bem? – ele me olhou estranho.
- É... Ainda bem que você vai se preocupar primeiro com as provas e tal...
Ele continuou me olhando estranho enquanto eu sugava o drink.
- Mas depois você vai encontrar com ela. Vai sim. – eu tentei remediar.
- É. Eu vou. Já aguardei até agora então posso aguardar mais quinze dias.
- E depois que você encontrar com ela?
- Não sei... Quero conhece-la, saber da vida dela, se tenho irmãos...
- Saber porque ela nunca foi atrás de você...
- Como é?
- É César. Saber porque ela nunca foi atrás de você.
Ele já me olhou irritado.
- Ela nunca foi atrás de você, nunca tentou contato, no orfanato tem o contato do papai e da mamãe. Ela poderia ter vindo até a gente quando quisesse e nunca fez. Você por outro lado continua procurando por ela sem parar.
- Ninguém sabe porque ela não fez isso.
- Você vai saber. E se ela nunca veio atrás de você porque simplesmente não quis? E se ela teve outros filhos e ficou com todos eles mas mesmo assim não veio atrás de você? Se ela for uma drogada que você deveria dar graças a Deus de não ter em sua vida?
- E se tudo o que você disse agora for justamente o contrário? São suposições! Pode ser como pode não ser. Ela pode ser uma pessoa humilde, que se arrepende, que não teve condição de me criar e até hoje vive uma vida difícil...
- Alguém que se envolveu em corrupção, que foi demitida...
- Alguém que se envolveu de forma indireta!
- Era obrigação dela denunciar! E isso não muda o fato dela mesmo assim nunca ter ido ao orfanato saber quem te adotou.
- Porquê você é tão contra eu acha-la?
- Porque não vejo sentido nessa busca idiota e descabida! Essa mulher não é ninguém na sua vida!
- Qual o problema de e querer achar a minha mãe?
- Meu Deus César! Porque ela NÃO é a sua mãe. A mamãe é a sua mãe! Se você não considera a nossa mãe como sua mãe então o papai não é o seu pai e eu não sou seu irmão.
- Não é isso que eu tô falando.
- É sim! Você tá pegando uma pessoa estranha, uma pessoa da rua que te largou, te desprezou, nunca deu um telefonema e tá chamando de mãe sem nunca nem ver a cara dela! Isso é um absurdo! A mamãe deve se revirar no túmulo ouvindo isso. Quando encontrar com ela agradeça por todo o amor que ela lhe deu, por todos os beijos, o carinho, por toda a maravilhosa vida e principalmente a presença que ela lhe deu.
Eu levantei já querendo chorar e saí dalí com os livros. Queria dar um soco nele assim como fiz em outra discussão com o mesmo assunto. O César não sabe como essa porcaria de busca mexe com a gente.
_________________________xxx_______________________
Idiota. Idiota e tapado. Eu ia encontrar minha mãe e se ela fosse uma pessoa que nunca quis nada comigo tanto faz... Eu só queria saber quem ela era. Já estava juntando pedações da vida dela e ia conseguir encontrá-la. Eu ia ter a conversa que sempre quis com ela, nós iríamos nos entender e pronto. Eu saberia quem era a minha mãe. Era só o que eu queria. Saber da minha origem.
Não é que eu não amasse minha família adotiva. Eu amava sim e amava muito. Meu pai e principalmente o Rômulo são tudo pra mim. Tudo mesmo. Esse idiota não sabe o quanto eu o amo, por isso ele fala isso. Mas eu queria sim saber da minha origem biológica. É um buraco, um vazo que precisa ser preenchido. Isso não sou eu que estou dizendo. Qualquer pessoa adotiva, por mais pouco que seja, quer sim achar sua família biológica. As vezes não quer contato, mas quer pelo menos saber quem é.
Enfim, tanto faz. Por mais chateado que o Rômulo fique eu vou continuar minha busca daqui há quinze dias. Até lá eu tinha provas e trabalhos pra me preocupar. Naquele instante eu terminei meu drink e peguei o restante do copo do Rômulo.
- Só pode ser muito tapado pra desperdiçar... – eu disse pegando o copo no outro extremo da mesa e levando à boca.
Passados uns minutos uma mensagem de número desconhecido chegou no meu celular.
“Oi.”
“Quem é?”
“Sou eu. Victor.”
“Quem deu meu número pra você?”
“O Rômulo. Desculpa... Eu não queria incomodar.”
“Hum... O que você conta?”
“Nada de novo... Só queria ter seu número aqui pra manter contato.”
Agora ele vai me dar bom dia todos os dias?
“É. Legal.”
“Levou o papo com o Rômulo?”
“Não deu muito certo, mas levei.”
“Vocês brigaram?”
“Sim. Mas eu bati mais nele que ele em mim então tudo bem.”
“kkkk”
“Não foi uma piada. É sério.”
“Sério?”
“Sim.”
“Sério mesmo??”
“Não. Kkkkk”
“Engraçado...”
“Tô imaginando sua cara acreditando em mim. Ingênuo.”
“Ingênuo, eu?”
“Demais. Mas não vamos entrar nesses assuntos.”
“Como assim?”
“Você é muito bobinho...”
“Porquê acreditei na sua piada?”
“Também.”
“Mas você disse que era sério!”
“Que respaldo eu tenho na sua vida pra você acreditar de cara em mim assim? Poderia ser mais cauteloso, especialmente com quem já te tratou mal uma vez.”
“Nossa. Foi mal...”
“Sempre se desculpando... Você é tão previsível que eu já consigo quase adivinhar o que você vai falar.”
“”
“Não fique triste poodlezinho do Rômulo... Não quero que ele venha brigar comigo de novo.”
“Poodlezinho????”
“kkkkk. Ok. Desculpe por isso... Mas o Rômulo te trata como um poodle. Todo cheio de cuidados...”
“Nada a ver... Você é doido.”
“Eu não te trato como um poodle. Eu te trato como uma pessoa.”
“Você idealiza muita coisa. Isso é estranho.”
“Não Victor... Eu não preciso ser fresco com você como o Rômulo é. Ele é assim com todo mundo. Eu tenho o meu jeito grosseiro mas eu gosto das pessoas e não preciso mimá-las nem ser mimado.”
“Você gosta das pessoas? Não parece....”
“Pois saiba que eu gosto! Deixa eu ver... Eu gosto... Espera... Eu gosto... Ah, do Rômulo! ”
“Há-Há! Muito engraçado.”
“Dessa vez foi sério mesmo. Não foi uma piada. Eu gosto do meu irmão. Kkkk.”
“Porque a conversa de vocês não foi boa?”
“Porque a gente discutiu. Mas eu vou já falar com ele... É sempre assim. Rômulo é o sensível e não me toque. Eu tenho a obrigação de ir atrás dele, sempre.”
“Foi muito feio?”
“Não houve palavrões. Isso é um bom sinal.”
“Porquê discutiram?”
“Não é assunto pra agora.”
“Ok.”
“Eu poderia jurar que você ia pedir desculpas...”
“Então talvez eu não seja tão previsível assim.”
“Quer ir numa festa comigo?”
“Oi???”
“Oi. Tudo bem? Como vai?”
“Uma festa? Com você?”
“Há algumas mensagens atrás você sabia ler, não?”
“Eu não sou de ir a festas... Não sou exatamente popular.”
“Não preciso que seja candidato a prefeito pra andar comigo. Só estou te convidando pra dar uma volta e você está me fazendo ficar arrependido. Pode só aceitar ou não?”
“Onde vai ser a festa? Festa de quê?”
“Na sexta que vem. Na casa de uma amiga. 21h. Me espere.”
“Eu nunca saí só com você. Você é meio doido. Eu tenho um pouco de medo, sabia?”
“Não usaremos drogas. Prometo.”
“Tudo bem então...”
“Não dessa vez.”
“Deus me livre!”
“kkkkk. Flw!”
Desliguei a tela do celular e fui “pedir desculpas” pro Rômulo. Eu sabia que ele gostava de quando eu o adulava. Sempre o “primadonna” da família. Então fui lá fazer o papel que já fiz diversas vezes quando brigamos...
Sobre a festa na sexta, bem... Eu tinha umas surpresas pro Victor. Vamos ver como ele iria se sair.
________________________
Olá galera! Desculpem o atraso. Pra quem é do meu estado e também pra quem não é, sabiam que segunda, 19, é dia do Piauí e consequentemente feriado de novo no meu estado. Então eu aproveitei e viajei ontem com o Kaio pra casa dos meus pais que já fazia um tempo que não os via. Aqui a internet do nada para de funcionar então não tive como postar ontem. Agora são exatamente uma da tarde e estou postando da casa e uma tia roubando a internet dela por alguns minutos antes de ir curtir uma piscina com o meu namorado.
Espero que estejam gostando do conto e aproveito pra avisar que terminei de revisá-lo. Então talvez eu libere mais de um capítulo por semana. Já que eu também estou muito ansioso pelo desenrolar de tudo.
Tozzi: Rancou as palavras da minha boca. Ansioso!
LiloBH: Gente, sério, se vocês conseguem lembrar do meu nome da mesma forma que lembram do Biel Sabatine então estou super feliz com minha "fama". Eu adorava os contos dele na época em que tinha mais tempo pra acompanhar.
tavinhoo: No mínimo intrigante.
Edu19>Edu15: Será?
SafadinhoGostosoo: Sugestão super válida.
S2DrickaS2, esperança, LUCKASs,
Marcos Costa: Gostei da sua falta de pretensão com "bem amigos" ao invés de casal como o pessoal já diz aqui.
Hiding: kkkk Não odeie! Eu vou acelerar!
Drica Telles(VCMEDS): Meu Deus, eu começo a ler o teu comentário achando que você não tá gostando do conto kkkk Obrigado! Vamos ver o que virá!
Monster e guisandes: Gostei do humor ácido! César e Victor seria como o quê? Doce e salgado?
Malévola: Dia 13 foi o dia do escritor? QUe máximo! Adorei saber disso. Imagino que você deve ter me xingado um bocado ontem não? Não fiz o capítulo especial porque não sabia da data kkk
Jardon: Ainda bem que faz imaginar! As vezes eu ainda acho os detalhes muito poucos, sabe? Que bom que está gostando.
Abraço a todos.
kazevedocdc@gmail.com