Narrado por Andréa
Uma e meia da manhã. Levantei-me da cama, afinal, não conseguira dormir nem por um casal de macacos. Pudera, grande coisa é um casal de macacos, rs. Meu marido deveria estar certo quando, horas antes, afirmara que as palavras nos definem, pois a palavra que eu mais dizia era 'juízo' e a palavra que o nosso filho mais dizia, era 'relaxa'.
Sentada na sala, com o coração inquieto, eu esperava pelo Alec, que, apesar de todos os conselhos dados, fora à casa da Sofia, para pedi-la em namoro. Enquanto o Vanderley dormia solenemente, eu estava ali, chorando baixinho, tendo nas mãos a pulseira de chapinha que o Alec usava, quando era um lindo bebê gorducho. Meu único filho e, por duas vezes, quase o perdi! A parede da minha memória continha quadros que dariam uma exposição peculiar. Via-me, aos dezessete anos, a paquerar o rapaz que meu pai contratara para capinar o nosso quintal. Na nossa casa, éramos pobres remediados. Ele era ainda mais pobre que nós, mas era distinto e polido, educadíssimo, como poucos rapazes saberiam ser, de forma que me fez perceber a diferença entre instrução e educação. Qualquer um é capaz de ser instruído, porém, ser educado é o fruto do berço, da escolha e, infelizmente, sempre foi para poucos.
Meu pai não era nem um pouco bobo, percebeu meus olhares para o dito rapaz e também percebeu que o rapaz correspondia, pois, apesar de residir num bairro bastante afastado, dali em diante, todos os dias, passava pela nossa rua, na esperança de me ver, mesmo que de longe. Pois bem, no maior dos sigilos, meu pai procurou se informar acerca do rapaz, de sua família e guardou as informações a sete chaves.
O rapaz era amigo do Gilberto, noivo da minha amiga Sônia e não tardou a fazer a conexão, pedindo a seu amigo que pedisse à sua noiva que me entregasse uma carta. Assim foi feito e eu me apaixonei pela escrita do Vanderley, na mesma rapidez e intensidade com que tinha me apaixonado por ele e não duvidava, por um segundo sequer, de que realmente viria a ser advogado - seu sonho. Prosseguimos a nos corresponder, com a ajuda do Gilberto e da Sônia e respondi afirmativamente à carta em que meu amado perguntava se podia me pedir em namoro, ao meu pai. Na noite do pedido, Vanderley não contava com a astúcia de seu futuro sogro, que lhe respondeu:
-Meu rapaz, é impossível dizer sim ao seu pedido. Você é trabalhador e disso, eu tenho certeza. Sei que é um modelo de pontualidade e bons serviços, pro seu patrão. Sei que você passa a semana carregando e descarregando caminhões, capina quintais aos fins de semana e ignora o cansaço, para estudar. Isso é louvável. Sei que é honesto, não tem dívidas e vai crescer, na vida. Seu esforço para progredir é digno de ser imitado. Mas... seu pai, que também é honesto e trabalhador como um leão, vive nas mais variadas aventuras amorosas e eu sei que você o acompanha. Você frequenta prostíbulos desde que era menor de idade e, até hoje, só não foi obrigado a se casar, porque ainda não encontrou nenhum pai resoluto o bastante para fazê-lo ou porque esses pais entenderam o mesmo que eu entendi: seu pai trai a sua mãe descaradamente, com qualquer vagabunda, e você não se importa. Se não respeita a sua própria mãe, como poderá respeitar a minha filha? Você acha que sou doido de aceitar que a minha filha entre para uma família onde é normal que as mulheres sejam massacradas? Minha mulher e minhas filhas tem orgulho de mim, pois vivo para elas. Não tenho luxos para lhes dar, mas lhes dou uma riqueza muito maior: minha companhia e minha lealdade. Tenho certeza de que muitas mulheres que ganham diamantes de seus maridos, mal podem ver o brilho das pedras, maculado pelas repetidas infidelidades e pelo descaso. Minha resposta ao seu pedido é que não posso, não quero e não vou te dar a mão da minha filha, em namoro.
-Mas senhor... isso não é justo! Eu mudei! Desde que vi a Andréa pela primeira vez, nunca mais acompanhei meu pai, a não ser ao trabalho, nem fiz nada que fosse indigno do pedido que lhe faço! Se quer ter certeza do que digo, peça à sua filha que mostre as cartas que lhe enviei. Nelas, só há amor, porque até a minha imaginação e o meu inconsciente a respeitam. Quando sonho com ela, está sempre vestida de noiva. Reconheço que o meu comportamento era desprezível, mas isso ficou no passado.
-No passado quer dizer há dois meses?
-No próximo mês, serão três e assim, sucessivamente. Eu não vou falhar.
-Lamento, Vanderley. Eu seria um irresponsável, se aceitasse.
-Não faça isso comigo, senhor. A sua filha despertou em mim o melhor que posso ser e foi por ela, que revi meus conceitos. Além disso, o senhor está desconsiderando não só os meus sentimentos, mas os da Andréa. Eu não vou sofrer sozinho e... não... tenho... vergonha de... estar... chorando..., porque... não posso perdê-la!
-Veja bem, meu rapaz... Como nunca se deve dizer 'desse pão não comerei e dessa água não beberei', vou te dar uma oportunidade. Viva por um ano, de forma coerente com a dignidade necessária a pretender a mão da minha filha e voltarei a analisar o seu pedido. Mas durante esse ano, você não vai escrever uma linha sequer, à Andréa, não vai mandar recados e não vai ficar rondando a porta da minha casa. E não ouse tentar fazer isso pelas minhas costas, porque nelas, tenho olhos e ouvidos biônicos. Eu não vou te procurar, pedindo que venha. Se aceitar as minhas condições, no prazo de um ano e neste mesmo horário, esteja aqui.
-Eu estaria, mesmo que fossem os quatorze anos que Jacó serviu, por Raquel! Aceito o prazo e vou provar que o meu amor pela sua filha é imortal.
Naquela noite, chorei como nunca. Primeiro, porque não tinha ciência da vida pregressa e da devassidão do Vanderley, sendo um choque ouvi-lo pela boca do meu pai. Depois, porque morria de medo de que durante o tal ano, ele desistisse de mim e também porque fui proibida de continuar estudando e de sair sozinha, à rua. Fiz menção de rasgar o vestido novo, o qual só tinha sido usado duas vezes: no natal e naquela noite, mas minha mãe me impediu, dizendo que não havia dinheiro para mandar fazer outro, o que era a dura realidade. Cada vez que saía com a família, usando aquele vestido, era uma pequena morte.
Decorridos trezentos e sessenta e cinco penosos dias, contra todas as expectativas, o Vanderley estava, novamente, na nossa sala. Minha mãe e eu fomos chamadas para assistir à conversa. Obviamente, eu preferia passar cem trouxas de roupa (sempre odiei passar roupas) a estar presente, pois não sabia o que esperar do meu pai, que nem mesmo à minha mãe, confidenciara qualquer coisa que fosse, sobre o assunto.
-E então, meu rapaz, o que você tem de bom para me dizer sobre este ano? - perguntou meu pai.
-Nada, senhor. Eu precisaria ser muito ingênuo para acreditar que não se informou acerca de cada detalhe da minha vida e do meu procedimento. Então, nada me resta a acrescentar. A minha vida falou por si. Quero apenas lhe mostrar duas coisas importantes. A primeira, está nesta pasta. Veja, senhor: meu diploma de conclusão do curso Técnico em Contabilidade. Daqui a duas semanas, começam as aulas e estarei na faculdade de Direito. Vou me matar de trabalhar, a fim de custear meus estudos, mas estou certo da escolha que fiz. E quero lhe mostrar algo infinitamente mais importante que qualquer diploma do mundo. Abra e veja.
Dizendo isto, Vanderley estendeu uma caixinha retangular aveludada, azul marinho, ao meu pai. Tremi nas bases e imaginei que fossem as nossas alianças. Meu pai abriu a caixa e o que viu, o deixou com os olhos vermelhos e sem fala. E eu, que nunca tinha visto meu pai se emocionar, mal podia aguardar para saber do que se tratava.
Quebrando o silêncio, o Vanderley dissera:
-Isto pertence ao seu neto, senhor Emilson. É assim que penso na sua filha, desde que a vi: a mãe dos meus filhos, a escolhida do meu coração. Eu poderia ter comprado um par de alianças, mas tinha certeza absoluta de que desta forma, o senhor poderia compreender melhor a natureza dos meus sentimentos.
Incapaz de articular uma sílaba que fosse, meu pai entregou a caixinha nas minhas mãos. Continha uma pulseira de ouro e na chapinha, estava gravado o nome 'Alec'. Aquele era o nome que eu daria ao meu filho, seguindo a tradição da família materna, que eu achava linda, ligando-nos através dos milênios. Caso viesse a ter uma menina, minha filha se chamaria Esperanza. Eu sabia que minha mãe, Beatriz, queria ter nos dado nomes segundo a sua genealogia, mas meu pai a impediu, escolhendo-os: Marta, Andréa e Eunice, então, para mim, era o sonho vindo dum profundo chamado do sangue, que meus filhos pudessem se chamar Alec e Esperanza. Quando meus dedos tocaram a chapinha da pulseira, toda a emoção represada, se derramou. Chorei por tudo o que tinha vivido, até ali. Chorei porque, a exemplo do meu pai, minhas irmãs consideravam a nossa tradição uma bobagem. Chorei pelo sonho da minha mãe, que estava materializado na palma da minha mão. Chorei pelos sacrifícios que o Vanderley deveria ter passado, para comprar aquela pulseira e porque ele, que, um ano atrás, tinha sido acusado de não se importar com a própria mãe, dava a prova cabal de carinho e respeito, à minha mãe. Que, aliás, foi a única pessoa, entre nós, a manter a serenidade e comentou:
-É um lindo gesto, que me faz muito feliz, mas... e se eu tiver uma neta?
-Dona Beatriz, quando mandei fazer a pulseira, pensei muito, mas segui meu coração. Tenho tanta certeza de que meu primeiro filho será um menino, quanto tenho certeza do meu amor pela sua filha e Deus o sabe muito bem.
Naquela noite, só houve lágrimas de felicidade. Meu pai aceitou o pedido de namoro e pediu perdão ao Vanderley, por tê-lo impedido de me dar amor e carinho por um ano. Pediu-me perdão por ter me impedido de estudar e disse que eu poderia retomar o curso Normal. Pediu perdão à minha mãe, por ter demorado tanto para entender o valor de sua tradição. Perdões solicitados e concedidos, o Vanderley pediu-me a caixinha com a pulseira, que entregou ao meu pai, dizendo:
-O senhor será o guardião dessa pulseira. Não sei quantos anos vou levar para me casar com a sua filha. Preciso estudar e não acho justo tirar a Andréa de um conforto que, por ora, não posso lhe dar. Mas sei que o nosso dia chegará e que no dia em que o Alec nascer, o senhor estará lá, para lhe colocar a pulseira.
Nove anos se passaram, entre a aceitação do pedido de namoro e o nosso casamento. Quando me casei, a Nice, que era dois anos mais nova que eu, já estava casada há três anos e já era mãe da Aninha. Mas, enfim, casei-me com tudo o que tinha direito. Na noite de núpcias, pedi ao Vanderley que deixasse de usar preservativos (apesar do rigor e da vigilância dos meus pais, nove anos não são nove dias, então, dávamos as nossas escapulidas, rs), pois eu tinha vinte e sete anos e me sentia preparada para engravidar.
Três meses depois do nosso casamento, tive a certeza de estar grávida e fizemos uma surpresa aos meus pais e sogros, que não sabiam dos nossos planos: preparamos um jantar e os convidamos. Assim que todos estavam assentados à mesa, entreguei uma caixinha à minha mãe e outra à minha sogra, que as abriram imediatamente. Na caixinha da minha mãe, havia um par de sapatinhos azuis e um cartão, onde escrevi: 'Parabéns, vovó Beatriz e vovô Emilson.' Na caixinha da minha sogra, sapatinhos iguais e o cartão que dizia: 'Parabéns, vovó Vanda e vovô Irineu.'
Meus pais e sogros não sabiam se nos abraçavam, se trocavam abraços, se sorriam ou se choravam, o fato é que a notícia de que o Alec estava a caminho foi recebida com felicidade e emoção imensas. Ninguém desconfiara de que eu estava grávida, pois desde o casamento, só fazia emagrecer, dando margem às especulações das minhas irmãs, que riam, dizendo que eu deveria estar levando uma surra de pica atrás da outra, inclusive, atrás, pois até a minha bunda grande, estava notavelmente menor, rs.
Se o início da gravidez foi tranquilo, a continuidade foi complicadíssima. A partir do quarto mês de gestação, minha pressão disparou a subir, sentia enjôos e se insistisse nas atividades do lar, sentia cólicas, razão pela qual vivia mais deitada que de pé. Nessa época, minha sogra me ajudou com um carinho tão incrível, que nossos laços se estreitaram. Há cerca de cinco anos, meu sogro tinha, finalmente, acordado para o fato de que a vida estava passando e resolveu dar o devido valor à sua mulher, acabando com as infidelidades. Todavia, por mais que analisasse, eu não alcançava as razões que levaram Vanda a suportar tantos anos de traições, concluindo que ela deveria ser apenas uma mulher acomodada, sem força e sem opinião. Uma subserviente a mais, neste imenso mundo, até o dia em que, dado à nossa nova e crescente intimidade, tive ocasião de lhe perguntar e ela esclareceu:
-Eu sei que todo mundo me julga, porque meu marido me traía tanto e nunca paguei na mesma moeda, nem lhe fiz nenhum mal ou o deixei, mas a verdade é que o amo, só sabia e só sei lhe fazer o bem. A escolha era minha, não de quem me julgava. E não me arrependo de nada, Andréa.
Com lágrimas, a abracei, senti vergonha pela pobreza dos meus pensamentos e, dentro do coração, disse a Deus que se Ele me desse ao menos metade daquela determinação, para amar, eu poderia fazer minha família imensamente feliz.
Quanto mais a gravidez avançava, mais o meu estado se agravava. Aos seis meses de gestação, minha pressão vivia alterada, apesar de todos os cuidados. Comecei a inchar muito, apresentava perda de proteína, pela urina e fui diagnosticada com pré-eclâmpsia. Eu também achava a minha barriga muito pequena. Na verdade, todos achavam, mas ninguém falava, para não me assustar ainda mais. Meu médico repetia que os bebês de mulheres hipertensas, em regra, são pequenos, mas eu não acreditava, pensava que ele estava me escondendo algo e lá se ia a minha pressão, para as alturas, fazendo-me correr o risco de evoluir para a eclâmpsia e ter uma convulsão fatal.
Pela misericórdia de Deus, cheguei aos sete meses de gestação. Não pude chegar aos oito. Faltando duas semanas, entrei em trabalho de parto, quando o Vanderley estava fazendo uma audiência. Quando a minha sogra o avisou, dizendo que chamara meu cunhado Evandro (o marido da Marta) para me levar ao hospital, ele ficou desesperado. A pauta de audiências era longa e seria um dia de muito trabalho a realizar. Mas o Juiz foi compreensivo, ao saber da minha delicada situação e redesignou todas as audiências em que meu marido patrocinava os interesses de alguma parte.
No hospital, meu médico se via em apuros. Minha pressão estava altíssima, eu não tinha dilatação suficiente para o parto normal, também não podia ser operada com a pressão vinte e dois por dez mmHg e já havia perdido todo o líquido, visto que a bolsa se rompera. Eu mal compreendia o que estava acontecendo. Minhas forças físicas e emocionais tinham desertado, de forma tal, que não sentia sequer o pavor de morrer. Mais um obstetra e o anestesista se uniram ao meu médico. Não faço ideia de quantos e quais medicamentos me aplicaram. No corredor, em franco desespero, meu marido, meu cunhado, meu pai e meu sogro choravam, abraçados, pois a família tinha sido avisada de que talvez não fosse possível salvar nem a mim, nem ao meu filho e se um de nós sobrevivesse, seria um milagre. Minha mãe e minha sogra, ajoelhadas na capela do hospital, rezavam, segurando, juntas, a caixa com pulseirinha do Alec.
Quando, enfim, meu médico surgiu para conversar com a família, ele disse que todos deviam louvar a Deus, pois o duplo milagre acontecera: minha pressão havia cedido, eu tinha sido operada, estava viva e também o bebê, que nascera perfeito. Eu logo poderia ser levada ao quarto, mas o bebê, que nascera com 1,600kg e passara pelos primeiros exames de pulmão e coração com bons resultados, estava na incubadora, respirando sozinho, como um anjo guerreiro.
Quando acordei, no quarto e dei-me conta de que meu bebê não estava ali, foi desesperador. E ouvir que provavelmente, eu voltaria para casa sem meu filho? Virgem Santíssima, como poderia entrar em seu quartinho, preparado com tanto amor, sabendo que ele estava no hospital? Como iria ver seu berço vazio? Como?
Ao ver meu desespero, meu cunhado saiu de fininho e, rezando todas as orações que sabia, foi parar na casa da Eunice. Chegou lá afobadíssimo, pois as horas avançavam e era preciso correr, para que desse tempo de fazer o que pretendia.
-Nice, por todo o amor sagrado que você tem à sua filha, me ajude! A Andréa está em pânico, seu sobrinho nasceu com apenas 1,600kg e na hora em que a sua irmã vir o filho, vai se apavorar em dobro, porque, com certeza, o Alec cabe quase inteiro numa perna dos macacõezinhos que ela comprou. Você tem que me ajudar, porque a Marta ficou sozinha, cuidando do açougue. O médico falou que o menino está respirando sozinho, então, ele é forte e não deve demorar nem um mês, na incubadora. Vamos comprar outras roupas agora, para a sua irmã não ser obrigada a pensar nisso e para o Vanderley não precisar sair de perto dela.
-Mas eu não tenho com quem deixar a Aninha, Evandro!
-Vamos levá-la e peça a ela pra ir rezando, porque oração de criança é poderosa.
Assim foi feito. Nice, Evandro e Aninha foram a todas as lojas da cidade, em busca de roupas, meias, luvinhas e toucas bem pequeninas, adequadas a um bebê prematuro. Tenho uma eterna dívida de gratidão para com o Evandro, por ter se apercebido da questão antes que fosse levantada, por ter agido em silêncio e por ter pedido as orações da Aninha, pois novo embate se aproximava: tive hemorragia puerperal e, mais uma vez, quase parti.
Quando, finalmente, fui autorizada a sair do quarto, para ver meu filho, ele já tinha três dias de nascido, tinha tomado do leite de outras mães e pude ver o quanto era pequenino. Mas, não obstante outros leites o tivessem nutrido, aquele era o MEU filho, o meu sonhado Alec e isso era maravilhoso! Estendendo as mãos de forma bem próxima, por sobre a incubadora, eu lhe disse:
-Meu filho, você é um bebê pequenino, mas o nosso amor é gigante. O menino Jesus e sua mãe, Maria, irão te proteger. Ele te alcançará com seu amor e ela te cobrirá com seu Manto Divinal, até que eu possa voltar. Amo-te, meu Alec!
Naquele momento, coloquei meus braços na posição de tomá-lo no colo (embora estivesse dentro da incubadora) e, espiritualmente, o recebi. Abaixei minha cabeça e, simbolicamente, o beijei. Saí, amparada pelo meu marido, que estava ao meu lado, calado, mas nos enviando forças e amor. Eu sentia, perfeitamente.
Enquanto saíamos, uma das mães de UTI, que tinha sua cadeira ao lado da incubadora onde seu filho estava e outra, que retornava do lactário, fofocavam, baixinho. Mas meu ouvido 'de tuberculoso', como diria a minha mãe, a tudo escutava:
-Coitada, né? Ela só pode estar surtada, pra se enganar daquele jeito, fingindo que abraçava e beijava o filho!
-Pois é. Eu até fui ao lactário, sem necesssidade, só pra não ter que ver a ceninha da infeliz.
Detalhe: os filhos das duas estavam entubados e cheios de agulhas, enquanto o meu, respirava sozinho e só portava um soro. Senti-me exatamente como a minha sogra: julgada por amar, nem mais nem menos. Em que mundo pirado nós vivemos! Viável fosse e eu faria uma ligação para Marte, cantando 'Alô, Alô, Marciano', já que, na Terra, eu não fizera e nem faria parte da high society das mães de UTI que se autoproclamavam heroínas, nem das que deprimiam por estarem cada vez mais down, down, down, passados os seus cinco minutos (na verdade, segundos) de fama. O que se faz de bom, raramente alguém lembra. Eu seria a mãe do meu Alec e ponto final. Não precisava que ninguém me achasse forte ou uma heroína. Meu filhinho era o eixo central do meu mundo e eu só queria ser feliz, ao seu redor.
Mas alguma coisa eu tinha que tirar de bom, do exemplo daquelas mulheres. Jesus disse a seus discípulos que se a justiça que viviam, não excedesse a dos fariseus, não estariam fazendo porra nenhuma. Tá, Jesus não falou 'porra', mas todo mundo entendeu, e é isso aí, rs. Então, decidi usar da atribuição de caminhar a próxima milha e pude entender que aquelas mulheres tinham deixado suas vidas de pernas pro ar, pois talvez, aqueles dias, fossem os únicos que tivessem com seus amados pequeninos. Talvez tivessem chorado, implorando a Deus que a primeira gota de leite saísse dos seus seios. Que se fodesse, o fato de terem me achado uma coitada maluca e infeliz: eu rezaria para que Deus e seus anjos cuidassem dos seus filhos da mesma forma que cuidariam do meu Alec. Eu não sabia seus nomes, ainda, mas... e daí, se nunca viesse a saber? Deus sabia e isso era o que me importava. O departamento das preces era comigo e o dos milagres, com Deus.
Meus pais e sogros insistiram que Vanderley e eu fôssemos para as suas casas. Agradecemos, declinamos dos convites e fomos para a nossa casa. Adiar o enfrentamento da situação não seria saudável.
Chegando em casa, meu marido precisava contactar algum colega para substituí-lo, mas, primeiramente, foi me dar atenção, dando-me um banho especial, com muito carinho. Vanderley escolheu um dos meus vestidos favoritos e me sugeriu não usar camisolas, pois não estava doente e, uma vez me sentido bela, isso me faria bem. Aceitei. Meu marido pegou cremes corporais e faciais que nem sabia para o que serviam, etiquetou-os com esparadrapo e pediu: -Escreva a finalidade, assim, quando você pedir e só nós dois estivermos, eu saberei o que queres.
Escrevi em cada um, feliz por ter um marido que me entendia. Entreguei-lhe os cremes, que ele guardou e, num lampejo, eu sabia o que tinha que fazer:
-Amor, venha aqui. Preciso de você.
-Sim, Déa. O que queres?
-Você vai me tirar esse vestido, o sutiã e vai sugar meus seios, com força.
-Déa, não posso fazer isso! Você quase morreu!
-Disse muito bem. Quase. Estou viva, preciso amamentar nosso filho e você vai sugar até o leite sair.
-Não podemos, amor! Você tomou montes de remédios! Se o Alec beber do seu leite, nem quero imaginar!
-Por isso é que preciso da sua ajuda! VOCÊ vai beber ou vai cuspir, nem quero saber o que vai fazer, se cuspir, não vai me entristecer. Só quero que estimule meus seios a produzirem leite e me ajude a limpar o organismo desses remédios.
Meu marido aceitou, despiu meu vestido, o sutiã e começou a sugar meu seio esquerdo. Senti que ele estava com medo de me machucar, pois eu estava operada, então, pedi que sugasse mais forte. A sucção se intensificou e os olhos do Vanderley se arregalaram: tinha saído uma secreção, do meu seio esquerdo. Qual era o gosto? Ele nem sabia descrever, engoliu por reflexo e passou a sugar-me o seio direito. Mamou esfomeadamente e, usando da teatralidade comum aos advogados natos, ocultou o momento em que saíra a secreção, continuando a mamar, quando, todo orgulhoso, abriu a boca e a exibiu:
-Você tem leite, amor!
Sua língua branca não deixava dúvidas: eu tinha leite, sim! Feliz, observei que não apenas o brilho dos olhos do meu marido tinha despertado: seu pau estava duríssimo e babando. Sua roupa estava molhada e a mancha era grande. Pudera, há quantos meses ele tinha sido forçado a esquecer o que era o sexo, comigo? Se trepava, deveria estar cortando uma volta muito longa, visto não haver comentário algum. Ao contrário dos meus pais, jamais acreditei em fidelidade eterna. Acreditava no casal que se supera em tudo, inclusive, em suas fodas, dia após dia.
Quem disse que amor e putaria não combinam? Quem levantou a mão, aí? Ô, buceta, vá enfiar essa mão no meio do olho do seu rabo, cutucando lá no fundinho do furico! A putaria escrachada é o complemento natural do amor! Sem esse tempero apimentado, casal nenhum vive junto e satisfeito. Uma escapulidinha aqui, outra ali ou até os dois juntos, só agregam valor. Mas... não era disso que eu estava falando, rs... Meu marido parecia ter se mijado, enquanto sugava meus seios. E eu sabia que aquele aroma não era de urina, mas de macho excitado. O homem devia estar subindo pelas paredes, pois, em regra, mulheres procuram foder QUANDO se sente bem, mas homens trepam PARA se sentirem bem. Ô, clitóris, acho que eu também devia ser advogada, rsrsrs. Estava defendendo muito bem a causa do meu marido tarado, rs, então, sem lhe dar tempo para pensar, disse-lhe que se despisse e voltasse a mamar meu seio esquerdo, enquanto eu lhe bateria uma punheta.
Meu homem ponderou se isso me faria mal. Pro caralho, tesão só faz bem. Eu era péssima em bater punheta, afinal de contas, não tenho pau e não posso adivinhar de que jeito é gostoso, se ninguém me disser. Mas mesmo assim, o Vanderley adorou ter seu pau nas minhas mãos e entendi que eu só era desajeitada no seco. Meus dedos sabiam perfeitamente quando pressionar, quando afrouxar, quando usar só polegar e indicador, formando um anel, quando usar toda a mão, ou quando usar três dedos em seu pau e dois em seu saco. Aquela baba maravilhosa facilitava tudo, mas meu marido só costumava relaxar o bastante para liberá-la quando da penetração e minha boca de baixo não tinha língua, para sentir-lhe o sabor, razão pela qual, a provei, demoradamente, concluindo que viciaria em deixar meu marido todo molhado. Ele me revelou que tinha vergonha de ficar tão lambuzado, mas lhe falei que tinha adorado, que meu grelo estava teso, minha xana, piscando e minha boca, ansiando pelo seu pau melado e brilhante.
Meu marido se assustou. Disse que mulheres não costumam ser tão diretas, tampouco costumam pensar em sexo, ao acabarem de parir. Imediatamente lhe respondi:
-Ah, é, você já pariu? Quem sabe o que é 'normal'? Eu estou aqui, te desejando e você está pensando no que os outros dizem que é ortodoxo? Relaxa e goza, amor. Mama e curte a sua mulher piranha, parida, com leite nas tetas e te batendo uma punheta! E se quiser gozar na minha boca, é só fodê-la. Você não é tão safado? O que ia fazer, nos puteiros? Dar o cu? Queria casar comigo pra que, se não fosse pra me foder gostoso? Fode a minha boca, safado, porque eu, por você, fodia até duas mulheres ao mesmo tempo!
Resultado: o homem ficou doido, desatou a mamar nos meus seios, engolindo todo o leite e seu pau babava de pingar. Parecia um menino pela primeira vez acariciado por mulher. Com o polegar e o indicador, apertei um pouquinho a cabeça daquele pau gostoso, que nem era grande (16cm), mas era grosso e saboroso. Senti meu marido se contorcer, indo mamar no meu outro seio. Apertei meus dedos um pouquinho mais, acelerei a punheta e seu pau jorrou em quantidade. Fiquei doida. Que saco poderoso, para produzir tanta porra! Não foi à toa que me casei e logo engravidei. Bastaram poucos cruzos no pelo, rs.
Após um novo banho e muitos beijos apaixonados, dormimos. No dia seguinte, o Vanderley preparava o nosso café da manhã, quando ligaram. Pensamos que só podiam ser os nossos pais. Nem. Era o Raul, um de seus amigos, que se oferecia para fazer as audiências da semana. Meu marido aceitou, agradecendo e quando vi a bandeja que nos trazia, notei que só havia uma xícara. Meu marido disse que seu leite estava nos meus seios (ele detestava café, da mesma forma que adorava leite puro), e tomamos um desjejum cheio de carinhos apaixonados, antes de nos banharmos, para irmos ao hospital.
Na UTI neonatal, as mulheres se admiraram, ao verem que eu estava tão refeita, retornando para dar leite ao Alec e mais ainda, ao notarem como ele era guloso e sorvia depressa daquele leite, que parecia cheio dum borogodó diferente. E era! Meu marido passara a mamar em mim, todas as noites, eu o punhetava e meu macho, sem nenhuma frescura, me acariciava horrores. Gozo é vida, gozar não era proibido e Vanderley e eu nos reinventávamos, na masturbação mútua.
Claro que eu jamais poderia revelar tal coisa às mulheres que haviam me chamado de doida e de infeliz, mas chegou o dia em que a mulher que disse ter fugido para o lactário para não ver a minha 'ceninha', não tinha mais uma só gota de leite. Seu nome era Alessandra e o de sua filha, Gisele. Apesar de ser prevalente a sobrevivência das meninas, na UTI neo, o Alec encorpava e a Gisele estacionava. Ofereci do meu leite, Alessandra aceitou e nos tornamos amigas. O bebê da Natália (a mulher que me chamou de 'surtada') partiu para o céu e eu chorei com ela, segurando suas mãos. Ao fim de um mês e dois dias, Alessandra e eu saíamos juntas, da UTI neo. Nossos filhos atingiram os dois quilos e comemorávamos o memorável marco, que nos abria as portas de casa. Naquele dia, meu pai foi ao hospital, pôs a pulseira em seu neto, que estreava uma das roupinhas compradas pelo titio Evandro e, feliz da vida, observou que o Alec tinha os nossos olhos grandes. Eu sorria com a alma, observava o meu filho e via: olhos como os meus e os do meu pai, minhas sobrancelhas, minha testa e minhas orelhas. A pele morena, o nariz e a boca do Vanderley. Os pés e as mãos grandes, como os do meu sogro. As mesmas duas pintinhas castanhas que minha mãe tinha no pescoço. A enérgica atividade da minha sogra, que não podia parar quieta. Agradeci a Deus porque todos podiam se alegrar, encontrando um pouco de si, no nosso amado bebê.
Enfim, Alec iria para o seu quarto. Tá, eu confesso: iria porra nenhuma, pronto, falei, rs. Mãe de UTI não quer deixar seu filho dormir sozinho nunca mais e eu não fui exceção: Alec dormiu na minha cama até os cinco anos, foi pro seu quarto aos seis, parou de chupar chupeta aos onze e de tomar mamadeira aos doze, embora, noutras áreas, fosse extremamente independente. Cedíssimo, aprendeu a comer sozinho, a gostar de tomar banho sozinho, a se vestir, calçar e até a ir ao banheiro sozinho, imitando o seu pai. Como meu filho era esperto! Mais uma vez, tive que encarar os julgamentos alheios e, por incrível que pareça, a segunda vez doeu tanto quanto a primeira. Pessoas diziam que o Alec era muito grande, gordinho e esperto, para ter nascido prematuro, ou seja: eu só podia ter me casado grávida e ter perdido as contas. Se dissesse que meu filho era prematuro e correu risco de vida, eu era doida. Se era alto e forte, eu tinha dado a buceta, rsrsrs. Certo, eu dei mesmo. Que o povo pensasse, rs! Aprendi com a minha sogra. Se ela jamais respondeu às provocações, por que eu o faria? Tomar no fut!
Meu médico disse ao meu marido e a mim que eu seria obrigada a retirar as trompas, para não voltar a engravidar, pois correra risco de vida. Meu marido lhe respondeu que Deus não fez as mulheres com trompas sem ter razão e que eu não ia tirar órgãos sadios só porque o governo brasileiro gozava pela olhota, ao receber tributos. Na época, fiquei chateada, pois ele falou por mim. Hoje, quase trinta anos depois, vejo que, coincidências à parte, quase todas as minhas amigas operadas estão uns ebós, enquanto eu ainda mantenho a frescura da pele, a lubrificação íntima, a disposição para dar, os cabelos sedosos, as unhas fortes e nunca deprimi. Envelheci, sim, mas ainda chamo a atenção e dou bom caldo, rs. Passei a refletir sobre quantas mulheres caem no conto da laqueadura, afinal, eu nunca mais engravidei. Sonhei com um casal de filhos, mas sabia que Esperanza não podia vir, como, de fato, com a prevenção adequada, nunca veio.
O tempo voava, Alec crescia, se desenvolvia e eu constatava que era um moleque fogoso dos trezentos diabos. Deveria ter uns onze anos e ainda não tinha deixado de tomar sua mamadeira antes de dormir, quando descobriu as delícias da punheta. Como sua primeira ejaculação ainda não ocorrera, a 'festa' durava horas, rs. Quase todas as madrugadas, eu o ouvia a gemer e morria de vontade de rir, lembrando-me de como eu esperava minhas irmãs dormirem, para enfiar o travesseiro no meio das pernas e mexer os quadris, quando tinha a mesma idade, rs. Vi meu filho começar a ficar, aos treze anos e notei que iniciou a vida sexual bem cedo. Não sei informar a data exata, mas ele deveria ter perdido a virgindade entre os quinze e dezesseis anos, ficando com mulheres adultas. O safado do moleque se amarrava nas mais experientes e isso deixou o Vanderley com cabelos brancos, rs. Aos dezoito anos, Alec encerrou o ensino médio. Aos dezenove, iniciou o pré-vestibular. Aos vinte, a faculdade a aos vinte e um, aconteceu o acidente. Meu Deus, como coração de mãe sofre!
O primeiro silêncio da minha vida, fora quando da imposição do meu pai, para que o Vanderley se afastasse por um ano. O segundo, foi quando do nascimento do Alec, pois não havia garantia alguma. E o terceiro, se deu no acidente. Meu ÚNICO filho de volta a uma UTI, correndo risco de vida. E... como o meu marido vivia no encalço dos médicos, eu não tinha mais ninguém, para me ajudar a rezar! Meu pai assistiu à festa de um aninho, do Alec, e, dias depois, partiu. Meses depois, foi a minha sogra. Meu sogro, ao se ver sem a esposa, reconciliou-se com Valmir, seu filho mais velho e resistiu por dois anos, ao fim dos quais, se despediu deste mundo e foi encontrar sua amada, que, no fundo, sempre fora a doce e diplomática Vanda. Dona Bibia, minha mãe, foi quem mais resistiu. Após o falecimento do meu pai, decidiu morar com Marta e Evandro (que nunca tiveram filhos - ele era infértil), mas quando o casal se mudou do Estado, levando-a, foi demais pro seu coração e Bibia se despediu, indo ao encontro de seus antepassados.
Na capela do hospital, o que me restava era, sozinha, botar a cara no chão do Santíssimo (LITERALMENTE!) ser julgada como louca (novamente!) e pedir a Deus forças para continuar, por amor ao meu filho, que precisava das minhas orações mais sinceras. E eu, desvairada, quase aos gritos, dizia ao meu Pai do Céu, que queria o meu menino comigo, DE QUALQUER JEITO QUE ELE FICASSE!
Só Deus sabe o quanto o meu coração se acalmava porque nunca exerci uma profissão, preferindo cuidar do meu filho. Eu tinha todo o tempo do mundo, para estar ali. Depois de vinte e um anos, o Alec voltava a depender de mim, como se fora um bebê. Quem lhe dava água, alimentos, quem o limpava e trocava, era quase sempre eu, visto que meu marido só podia estar conosco após o trabalho e aos fins de semana. No dia em que meu filho conseguiu se sentar, movia as pernas e os médicos (que o viram praticamente morto), emocionados, diziam que era excelente que pudesse se sentar sem se sentir asfixiado e sem desmaiar, ao que o Alec, sorrindo, acrescentava que, em parte, podia sentir da cintura para baixo.
Quando, enfim, pudemos levá-lo para casa, é que me lembrei exatamente do quanto o Alec era levado. Tentava se transferir da cadeira de rodas, sem saber e caía no chão, ora arrancava (sozinho) a sonda fixa, que dizia estar incomodando e sangrava, ora se masturbava com a sonda recolocada e sangrava do mesmo jeito... Meu filho aprontou todas e mais um pouquinho. Vimos vovó pela greta, com sua natureza destemida. Pensei que o Alec ia passar uns dois anos só na cama e na cadeira. Errei feio: com a reabilitação, a fisioterapia e a atividade física, logo aprendeu a usar as muletas, ganhou independência, se cuidava sozinho, entrou na autoescola, vendeu o carro que lhe demos ao passar no vestibular, financiou um carro adaptado, através do Banco e voltou para a faculdade. E, uma vez na faculdade, conheceu a Sofia. Quarto silêncio da minha vida. Duas e meia da manhã e cadê o filho duma puta? Nem a sombra e eu ali, rasgando o nicodemos, por temer o preconceito alheio! Na casa da Sofia, havia três homens e, portanto, três pares de afiadas garras, prontas e a postos, a fim de protegerem sua menina. Será que eles seriam capazes de erguer seus olhares para além do horizonte da deficiência? Será que veriam a essência, o potencial e as qualidades do Alec, ou olhariam apenas para Berenice e Bernadete? No começo, eu achava absurdo que meu filho desse nomes às suas muletas, mas...
-Mãe... Mãe... Ei, mãe, acorde!
Abri os olhos, despertando e vi o Alec, que sorria, sentado numa cadeira, de frente para mim e me estendia uma linda rosa branca.
-Sofia tirou esta rosa do centro do buquê que lhe dei e mandou para a senhora, com muito carinho.
Emocionada, perdi a coragem de zangar com meu filho, pela sua demora. Seus olhos espargiam luz, ele estava tão feliz, tão radiante!
-Ué, mãe... minha pulseira... Estava recordando os tempos em que eu dormia entre a senhora e o pai, empatando todas as fodas, rs?
-Rs, empatava nada, seu pai era criativo e eu também, rsrs. Pois então, filho, recordar é viver. Um dia, eu te conto a história da sua pulseira.
-Não sabia que existia uma história além do meu pai tê-la comprado e dado ao meu avô, para guardar e que meu avô a colocou no meu braço no dia em que saí da incubadora.
-Pois tem. Seu pai, que trabalhava numa casa de materiais de construção, passou um ano descarregando caminhões e capinando quintais dos outros, para te dar essa pulseira. O primeiro presente que ele comprou não foi para mim, foi para você, filho. Até hoje, guardei a sua pulseira, mas a partir de agora, quem vai guardá-la é você, para começar a sonhar com seus filhos e para nunca se esquecer de que a eles, só oferecemos o nosso melhor.
-Será que vou conseguir ser pai, mãe? - disse Alec, tomando a pulseira na palma de sua mão direita, enquanto as lágrimas molhavam suas faces.
-Oh, meu filho, não precisa chorar! Claro que vai! O que você não consegue? Um dia, você vai me dar uma netinha linda. Não se esqueça, hem? Tenha quantos meninos quiser, mas quero uma menininha, para curtir as mesmas coisas que eu, rs. Vamos fazer coleções de esmaltes, maquiagens, roupas, sapatos, bolsas, perfumes, rsrs...
-Pedido anotado, dona Andréa! Um dia, eu te darei a sua Esperanza.
-Sofia jamais consentirá que a filha de vocês tenha esse nome.
-Já consentiu, rsrsrsrs.
-Alec, PELO AMOR DE DEUS, pare de fazer essa cara! Para quem estava chorando, com medo de não poder ser pai, você está com muita cara de quem emprenhou sua namorada!
-Relaxa, mãe, não 'emprenhei', rs. Credo, que palavra chula, rsrsrs.
-Rsrs... tá... com palavra chula ou sem, se te der assunto, vamos conversar por todo o resto da madrugada e eu estou morta de cansaço. Já tomou seus remédios? Já tomou a colher de mel? Sua coluna está doendo? E os pés? Vá tomar seu banho e nem pense em não colocar as meias, pois eu vou lá, para conferir...
-Rsrsrs... puta que pariu!
-Puta é a senhora sua mãe, ouviu? Calce as meias ou você vai levar uma chinelada, rsrsrs.
-Rsrsrsrs... tá, mãe, vou calçar. Prometo, rsrsrs...