Marcel olhou por um momento para o irmão e depois fixou o olhar num ponto cego dentro do quarto do mesmo. Ele estava tenso e antes de falar tirou a camiseta que usava e levantou do chão e sentou na poltrona ao lado do armário embutido. Nesse meio tempo Bernard regulou o Ar Condicionado e sentou na própria cama de frente para o irmão e esperou o seu momento.
_ Quando de dor e sofrimento você acha que um simples garoto pode aguentar na sua vida, mano?
Essa pergunta de certa forma assustou o mais velho que no momento não soube o que responder.
_ Acho que muito, sabe? Eu apesar de ser um garoto ainda e olha que eu sou alto - esboçou um sorriso após essa frase - já acumulei um monte de sofrimento.
Bernard notou que o irmão tava nervoso por esfregar as mãos continuamente e sua voz estava começando a embargar... " Deus como deve estar sendo difícil tudo isso pra ele " foi tudo o que Bernard pensou enquanto não tirava o irmão do seu foco de jeito nenhum. E Marcel Continuou...
_ Eu tinha feito 16 anos de idade e duas semanas após o meu aniversário me envolvi numa briga de rua e um cara mais velho três anos que eu me ajudou a escapar de uma surra que com certeza poderia ter me matado pois a turma rival era bem mais forte do que os amigos com quem andava e com certeza eu e meus amigos levaríamos a pior se esse cara praticamente não tivesse nos salvado.
Eu ainda o olhava cheio de surpresa e orgulho por sua coragem e ao mesmo tempo tava com uma vontade incontrolável de lhe abraçar e proteger mais ainda. Esperei um pouco mais pois ele tinha que colocar pra fora o tudo...
_ Seu nome era Ted, pelo menos foi o único nome que ele me deu durante todo o tempo em que durou a nossa amizade. Ele era um cara mais forte que eu, mais alto que eu e sua pele era toda desenhada por tatuagens que lhe davam um ar mais sério e malvado ao mesmo tempo. Eu nunca o tinha visto na vida e com o passaar do tempo a gente foi se aproximando e pra suprir a saudade que eu sentia de você, por pensar que havia te perdido para os teus amigos da Faculdade, eu passei a sair com ele, a desejar sua companhia e quando eu menos esperei me refugiei no mundo das drogas e ele me ajudou muito na minha luta pessoal contra a tristeza e o abandono que eu sentia. Na minha mente, eu tinha que seguir sozinho porque você já não queria mais a minha companhia e o meu amor. Eu sei que fui um burro e um garoto muito estupido, mas aquela era a minha dor, a dor de não mais me achar importante pra você, pra mamãe e pro papai. E$u quis sumir da vida de vocês de uma vez por todas... Pensei em me matar e só não fui até o fim nessa ideia porque o Ted me mostrou um outro jeito de viver e que a gente, eu e ele, sempre iríamos ajudar um ao outro.
Ele não aguentou mais as próprias lembranças e começou a chorar. Confesso que tudo o que meu irmão me falava começou a doer em mim... Me senti omisso e deixei meu próprio irmão, um garoto, pra lá enquanto tentava caminhar pela minha vida perseguindo apenas os meus sonhos e ideais... Chorei junto. E Marcel praticamente correu e me abraçou.
Ficamos longos minutos ali abraçados em cima da cama e quando o abracei forte o trouxe pra cima do meu peito e fiquei fazendo carinho em seu cabelo.
_ Foi a partir daí que passei a ser problemático e assim que entrei em férias do Colégio passei a fazer todo tipo de arruaça e vandalismo na Cidade. Papai antes de ficar impossibilitado de sair da cama por causa da doença chegou a me bater várias vezes e a me tirar da Delegacia de Menores outras tantas. Eu acho que papai nunca desistiu de mim, mano... Ele apenas não pode mais me salvar porque já estava bem doente. Mamãe também não podia estar todo o tempo atrás de mim e o Ted de certa forma passou a ser mais que o irmão que havia perdido, o amigo que sempre me ajudava e me dava cada vez mais droga pra consumir. E foi por conta disso que passei a pagar pelos erros que tava cometendo e não tinha como sair daquela situação. Nós éramos um casal e com o passar do tempo ele me dominou completamente. Ele começou a arranjar coisas pra eu fazer em pagamento da minha dívida de drogas e quando os delitos e pequenos furtos que era mandado fazer não mais supriam o pagamento que ele havia estipulado para cada semana, ele me apresentou ao mundo da prostituição.
_ Ah, meu molecão... Por favor, isso não, meu pequenininho... Meu Deus isso não... Me perdoa mano, me perdoa... Esse maldito tem que pagar o que fez... Me perdoa meu molecão, me perdoa...
O meu desespero aumentou em dez vezes mais e a única coisa que pude fazer foi abraçá-lo com toda a força que pude pra tentar lhe mostrar a determinação e o poder da minha proteção sem falar no tamanho do meu amor por ele. e sem dúvida nenhuma eu agora já tinha uma ideia de quanto sofrimento um garoto de 16, 17 anos podia aguentar.
Ele chorava de maneira calma e continuou...
_ Acho que mamãe me ouviu falar com ele ao telefone no dia de sua morte. Você havia ligado pra falar com ela sobre nossa ida na sua colação de grau e como eu já tinha recusado por ter raiva de você e do que esse evento significava, combinei ir num programa que ele havia arranjado para o início daquela noite. Ela foi atrás de mim, deve ter se desesperado por conta do que provavelmente ouviu e terminou morrendo por minha causa. Muita coisa esse cara me deve, só que ele jamais vai conseguir me pagar. Ele é que passou a ser o meu devedor. Ele sumiu pouco tempo depois e nunca mais o vi.
Após mais um tempo sendo embalado por mim, Marcel voltou a falar...
_ Eu sou gay, mano. Eu tinha muito medo de você me deixar de vez ao saber de mim. Eu aceito qualquer punição que essa vida me apresentar para vivê-la... Menos... Ficar longe de você. Eu sei que destruí nossa família, mas você é tudo o que me restou... Sem você não dá, mano. Me perdoar... Você consegue?
_ Ah, molecão sou eu quem precisa te pedir perdão. Olha o que eu fiz pra você, Marcel... Olha o tanto de sofrimento que já vivemos juntos... Não me peça perdão... Não há necessidade de você fazer isso...Eu preciso de você na minha vida, na minha estrada, no meu campo de visão, sempre... Amo você meu Molecão lindo. Olha pra mim...
Ele após mais alguns instantes se soltou do meu abraço e levantou a cabeça até seus olhos fitarem os meus...
_ Eu amo você e vou sempre amar você incondicionalmente. Você só me encheu de orgulho ao se abrir sem medo ou culpas... E ao me contar suas verdades só me fez re admirar mais ainda porque hoje você pra mim se tornou um vencedor.
Ele limpou as lágrimas que deslizavam pelo meu rosto e me beijou na bochecha. Assim que sentou na minha cama e fez menção de sair eu lhe perguntei:
_ Tá indo pra onde, molecão?
_ Vou pro quarto pois tá na hora de dormir.
_ Posso te fazer um pedido? Ele acenou afirmativamente com a cabeça...
_ Dorme aqui hoje?
_ Tem certeza disso? Ele me perguntou em expectativa...
_ Certeza absoluta. Respondi.
Fastei o edredom para que ele voltasse pra cama e assim que apaguei a luz do quarto, Marcel deitou novamente a cabeça no meu peito e dormiu tranquilo e sereno até o dia seguinte.
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Falar com meu irmão me tirou a tonelada que carregava sobre os ombros. Levantei com o seu despertador me chamando pra vida e Bernard com a cara toda amassada me desejou bom dia e fomos vencer juntos as batalhas daquela sexta-feira.
Quando desci da van que me levava todo santo dia pra aula, um carro preto já conhecido por mim tava parado novamente no outro lado da Avenida. Mario estava novamente ao volante e uma garota que era da minha série numa sala diferente desceu e lhe sorriu. Eu corri pra falar com ele e quando bati no vidro pra que ele abrisse a janela eu disse:
_ Ta me seguindo, é Mário? Bom dia pra você. Sorri de puro contentamento.
_ Olha só que já vejo antes das oito da matina... É você mesmo Marcel? Bom dia, garoto.
_ Veio deixar sua filha no Colégio, é? Perguntei e já fiquei apreensivo com sua resposta.
_ Vim deixar uma filha sim, só que de um casal de amigos que mora no meu prédio. Esse é meu caminho diário e não custa nada deixar a garota, né mesmo?
Sua resposta de certa forma me deixou bem aliviado.
_ Garota de sorte essa, viu!!!?
_ Ué, se você quiser eu passo na tua casa e te trago também. Você só mora a três ruas da minha casa.
_ Nada disso. Caso eu aceitasse essa sua ideia, perderia sua amizade pois você com certeza iria abusar de me ver pela manhã e à noite lá na Academia. Deixa como tá... Venho de van.
_ Se você quiser a carona ela sempre estará de pé. Agora devo ir pois o dia será cheio. Tá tudo bem com você ou as dores musculares estão te incomodando? Perguntei por saber que ele tava todo dolorido... Na verdade eu queria somente mais alguns minutos com ele.
_ As pernas tão pesadas que só e quase que não consigo subir no transporte em frente de casa. Você vai hoje pra Academia?
_ Claro. Tenho que ajudar você a entrar em forma.
O sinal para os alunos soou uma primeira vez.
_ Tenho que ir agora, disse.
_ Fazer o quê, né/ Eu também. Bom dia então garoto. Te vejo mais tarde.
_ Estarei lá. Pode contar com isso.
Mario ligou o carro e eu só entrei quando seu carro dobrou na esquina do sinal. Enquanto subia a rampa pra sala de aula estava rindo feito bobo porque meu amigo Mario estava junto comigo, pelo menos na minha cabeça.
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Meu querido povo do lado esquerdo, o papo secreto entre nós ocorrerá s[´na postagem de amanhã. Por conta de uma medicação que tomei eu tô quase dormindo em cima do teclado. Sintam-se beijadas e abraçados por mim. Nando Mota.
