Dentro da casa...
Nunca imaginei que estaria nessa situação, sem ninguém, sem nada, minha casa seria tomada pelos credores, por ser de menor eu teria que ir para um abrigo, não tinha dinheiro, minha mãe e meu pai morreram em um acidente de carro a quase oito anos pouco depois de meu irmão quase ser morto. Lucas era a única coisa que me restou, o atentado que ele sofrera tentando salvar uma senhora que seria brutalmente assassinada o deixou paralitico e não surtiu muito efeito pois a senhora morreu mesmo com todos os esforços de Lucas. Sem meus pais ele era tudo pra mim, sempre sorridente e alegre, ele nunca desistiu da vida mesmo vindo lutando com problemas decorrentes das balas que ficaram alojadas perto de seu peito e em sua coluna vertebral, muitos médicos o desenganaram dizendo que ele não resistiria muito tempo, mais contrariando tudo e a todos ele se recuperou bem a tempo de me dar todo o apoio que precisava para superar a morte dos nossos pais.
Nunca se quer namorou pois disse que seu coração só pertencia a uma pessoa e que nunca o trairia, nunca tive preconceito com meu irmão por ele ser gay e até achava heroico o amor que ele sentia por alguém que eu suponho que nem exista. Em seu ultimo pedido ele me entregou uma carta e disse que era pra ser entregue para o primeiro forasteiro que aparecesse no seu velório. Aquilo me pareceu estranho mais nunca iria contra a vontade dele e guardei a carta para fazer sua vontade, por uns momentos quis muito abrir para ler mais me comprometi e nunca iria fazer isso com Lucas. Agora estou ao lado do meu melhor amigo e irmão em sua despedida, com uma carta na mão com os dizeres Capitão no envelope, que nem sei quem será o destinatário, na sala da minha casa com o padre da cidade e alguns curiosos da vizinhança olhando pra Lucas, os algodões no nariz e a palidez não importam pra mim pois eu ainda o vejo como ele era antes de falecer, forte e alegre, feliz... e agora o que a vida me reserva?.
Fora da Casa...
Nunca parei para imaginar como seria minha vida se não tivesse escolhido esse caminho, tudo na minha vida foi muito difícil, e mesmo passados oito anos da ultima vez que estive na cidade onde nasci, sinto-me com um sentimento estranho, o mesmo estranho sentimento que senti quando sai daqui.
Apesar de o que me trouxe aqui novamente ser completamente diferente da situação em que tive que sair. Oito anos atrás minhas condições eram bem diferentes. Sou filho único de mãe solteira, nossas condições nunca foram as melhores, desde que o meu pai nos abandonou a situação que já era muito ruim ficou pior, minha mãe afundada em dividas e eu sem poder fazer muita coisa pois ainda estava com dezesseis anos e não trabalhava pois minha mãe sempre me ensinou que a melhor forma de ajudar era estudando pra ser alguém na vida.
lembro-me como se fosse hoje o dia em que sai daqui, era uma quinta feira, 30 de janeiro de 2007, era um dia nublado em que fui acordado por minha mãe.
- Vamos filho acorde! Acorde!
- Droga mãe! Calma já estou acordado! Não precisa me balançar como se o mundo tivesse acabado!
- Vamos filho, você precisa fazer suas malas!
- Porque mãe? O que aconteceu?
- Nada de mais meu filho! Mais você vai passar algumas semanas na casa do seu tio em São Paulo.
Aquilo não estava certo, algo tinha acontecido, minha mãe jamais se separaria de mim sem que alguma coisa seria tivesse acontecido. Eu estava fazendo as malas com minha mãe que estava muito nervosa e apressada, quando eu lhe perguntava sobre essa viagem e questiona a o motivo de tanta pressa para ir para a casa de um tio que eu nem sequer sabia que existia ela sempre virava o rosto ou desconversava.
- Meu filho, preciso que você se comporte bem e que seja obediente ao seu tio, ele lhe tratara muito bem e tenho certeza que não lhe faltará nada na sua estadia - falava minha mãe com os olhos cheios de lagrimas enquanto fechava minha mala e arrastava para a sala.
- Mas mãe, me fala o que aconteceu? Porque eu tenho que ir tão rápido? Porque a senhora esta chorando? Me fala por favor o que esta acontecendo? - falei enquanto seguia ela rumo a porta de saída da nossa casa.
- Não temos tempo pra isso, aproveite as ferias e me prometa uma coisa!
- O que mãe?
- que você vai aproveitar todas as oportunidades que essa viagem possa lhe proporcionar e que em momento nenhum se sinta triste pois estarei com vc em seus pensamentos - falou minha mãe me abraçando com força e praticamente me jogando dentro de um taxi que já estava parado na frente de casa.
- tchau filho, se cuida e vê se não esquece de escovar os dentes e vestir cueca limpa todos os dias.
- Certo, mais e o Lucas? Ele vai ficar com raiva de mim quando souber que eu fui sem falar com ele!
- Calma eu explico tudo a ele, vai com Deus!
O carro deu partida e saiu deixando pra trás minha mãe e minha vida antiga. Depois daquele dia nunca mais vi meu melhor amigo Lucas e nunca mais tive a chance de abraçar minha mãe. Duas semanas depois que cheguei em são Paulo pra morar com tio Alipio recebi dele a noticia de que minha mãe havia sido assassinada na manha em que sai de la e que outra pessoa ficou gravemente ferida tentando protege-la, o baque foi imenso, passei meses sem sequer falar, meu tio me protegeu de todas as formas nesse tempo e sempre que pode me impediu de voltar, o problema é que ele veio a falecer a um mês e como não tinha nenhum filho eu fui seu herdeiro, a cerca de uma semana recebi uma carta do meu amigo a muitos anos perdido, nela ele dizia que estava morrendo e que precisava da minha presença em cinco dias na nossa cidade, e que mesmo se ele não estivesse lá eu receberia instruções de um desconhecido qualquer e saberia o que fazer para ajudá-lo. Esse seria o seu ultimo pedido... a dois dias recebi a noticia do falecimento de Lucas, não consegui chegar a tempo...não deveria ter esperado pelo dia exato para ir vê-lo, o seu velorio era o motivo que faltava para eu regressar a minha terra natal.... E aqui estou, com meu carro parado na frente da casa do meu melhor amigo para o seu velorio, o que será que a vida me reserva agora?.
Dentro da Casa...
O clima estava pesado dentro da sala, a hora que o velorio sairia para o cemitério. De repente me pego pensando na minha vida, na vida que teria que deixar pra traz por conta do destino. Ele nunca foi tão bondoso comigo mais dessa vez a pancada foi muito forte e não sei se conseguirei me recuperar, perdi minha vida, minha casa e meu irmão ao mesmo tempo, o destino não me ajudou nesse tempo todo e acho que não começaria agora.
- Droga Lucas! Você nao tinha o direito de me deixar agora! Não tinha! - gritei batendo no seu peito.
Eu precisava sair daquela sala para respirar se não eu morreria ali mesmo. Ao sair passei pela porta e cheguei no jardim, de cabeça baixa andei ate o portão quando abro foi de cara com um rapaz, alto, de cabelos negros e corpo esbelto, pele morena clara, com um óculos escuros que escondiam seu rosto porem não escondiam lagrimas que escorriam por suas bochechas. Não sabia quem era, passou por mim e foi em direção a porta de entrada da casa, pra mim não passava de um completo desconhecido.
- Deus do céu! A carta esta em com do caixão! - sai em direção a entrada correndo e quando rodo o trinco para entrar me deparo com dona judite.
- Luan meu querido! Você esta bem? - falou a gorda tampando a passagem.
- Estou sim obrigado agora preciso entrar! - falei tentando me esquivar
- Quero que saiba que pode contar comigo sempre jovem! - falou me abraçando e impedindo totalmente minha entrada
Quando a gorda veio me soltar já era tarde de mais, a carta ja não estava mais onde deixei, somente a figura do desconhecido estava la, quando me aproximei para tentar descobrir quem era ele simplesmente saiu porta a fora rumo o jardim...
Fora da Casa...
Eu precisava de ar puro imediatamente, não foi nada fácil ver o meu melhor amigo de todos os tempos deitado em um caixão, ele ainda continuava igual, os cabelos loiros espetados como sempre usou desde a época da escola, dessa vez ele tinha barba e estava bem mais forte, mais estava bonito como sempre. Em cima do seu corpo encontrei uma carta com o nome capitão no envelope, eu sabia que era pra mim, mais como aquela carta ficou lá e ninguém pegou? Quem colocou a carta lá? Abri o envelope com cuidado e comecei vagarosamente a ler a carta, por ser bem extensa e ter varias folhas demorei um pouco pra entender toda aquela enxurrada de informações, quando dei por mim estava chorando rios de lágrimas com meu coração partido, sentindo falta de tudo que eu perdi sem e sem sequer saber o porque. Peguei meu telefone no bolso e disquei o único numero fora o meu que sabia decorado, tinha certeza que ela me ajudaria a consertar tudo.
- Alo!
- Oi Ariel, Como está ai no velório? eu sinto muito viu!
- Está bem mais embaraçoso do que imaginava! Mais preciso de você aqui!
- Ok mais em que posso te ajudar?
- Lucas deixou uma carta e nela tem muitas explicações e alguns pedidos, eu preciso resolver uns problemas em são paulo urgente pra preparar tudo e preciso que você venha pra cá, alugue um helicóptero ai, gaste o que for preciso mais você tem que estar aqui até as dez da noite de hoje!
- Ok me manda os detalhes pelo WhatsApp que estou indo agora!
- Certo! e mais uma vez Obrigado por tudo!
- Nada lindo, o que é que você me pede chorando que eu não faça sorrindo!
Desliguei o telefone e sai da casa correndo, entrei no meu carro e cantei pneus rumo a São Paulo, precisava resolver tudo Hoje.
Dentro da Casa...
Eu consegui estragar tudo, perdi o único desejo que meu irmão deixou, eu sou um idiota, mereço a morte, talvez eu que devesse estar no lugar do Lucas agora.
- Luan, está na hora de seguir para o Cemitério! - falou o padre pondo a mão no meu ombro.
- Ok! vamos agora então!
Foram os vinte minutos mais longos da minha vida, o caixão dentro de um carro funerário e o cortejo de menos de cinco pessoas o seguindo pela cidade rumo o cemitério, nesse meio tempo pensei em tudo que meu irmão me ensinou estava decidido a por tudo em pratica, independente do meu futuro.
Ao chegarmos no cemitério e fazer todo aquele prólogo que me enchia o saco, eu já não estava mais triste ou com medo, eu já não sentia mais nada, eu estava anestesiado. Depois que o caixão desceu e eu dei meu ultimo adeus já era tarde, não tem mais volta, eu havia perdido meu irmão, e consequentemente minha vida. ao dar as costas olhei para o fundo do cemitério e lá estava o desconhecido, braços para traz e olhando em minha direção, logo ele tirou do bolso da calça um papel, levantou na altura do seu rosto e o balançou, como se quisesse me mostrar, depois deu as costas entrou em um carro esportivo desses de cinema e arrancou saindo do cemitério e levantando poeira. A principio não entendi e também não estava com cabeça para isso.
Chegando em casa, provavelmente minha ultima noite nela pois teria que entregar a chave para um oficial de justiça que me encaminhara para um abrigo na manha seguinte. eu já estava exausto. todos os cantos da casa me lembravam Lucas e a nossa vida, me deitei no sofá e adormeci...
Na manha seguinte...
Adocei com a porta quase sendo derrubada.
- Calma! Não precisa derrubar! - falei abrindo a porta.
- Bom dia, Luan de Castro por favor!
- Sou eu!
- Bem, sou Alvaro, Oficial de justiça que veio aqui para recolher o senhor para um abrigo e a chave da casa para ir pra leva-lo para um abrigo!
De repente surge nas costas do oficial uma mulher, bem nova aparentemente, morena de cabelos longos e olhos verdes escondidos atrás de um óculos, e com vários papeis na mão.
- Ele não vai a lugar nenhum! - falou a moça tirando o oficial da frente e estendendo a mão para mim.
- Oi sou Luana e vim para preparar tudo e leva-lo para sua nova casa com o seu tutor!
- Como assim tutor! - falamos juntos eu e o Oficial de justiça.
A moça puxou um papel de dentro de uma das pastas e entregou ao oficial de justiça que simplesmente virou as costas e saiu.
- Pronto! um problema resolvido agora só resta um! - falou Luana respirando fundo olhando pra mim.
- e qual seria esse problema? - falei convidando ela pra entrar.
- Você fazer as malas em dez minutos porque o helicóptero esta ligado e com a crise o combustível esta caro então corra! - falou se sentando no sofá e puxando o celular do bolso.
- Mais o que esta acontecendo? posso saber?
- Claro que pode! mais não agora, agora você tem que arrumar sua mala vamos!
Eu não tinha nada a fazer a não ser seguir a ordem da moça, já que eu não tinha dinheiro e nem aonde ir eu não tinha escolha. Subi e rapidamente arrumei tudo e desci correndo quando cheguei na sala ela estava no celular e pude ouvir um pouco da conversa.
- Sim! ele já esta comigo! estou indo pra são Paulo agora estarei lá em menos de uma hora ok, nos encontramos lá!
Quando ela me viu ficou meio sem jeito e veio me ajudar com as malas.
- Posso saber aonde vamos?
- Vamos pra casa meu caro Luan, Vamos pra casa!
...