Asfalto - Penúltimo Capítulo

Um conto erótico de Lord D.
Categoria: Homossexual
Contém 1980 palavras
Data: 12/01/2016 19:33:12

Capítulo 20

Orações para Miguel

Os dias agora são cinzentos. Parece que a noite se tornou eterna. Seu corpo... Aquele corpo que toquei e beijei com tanto amor, sentindo seu calor me envolver em uma onda de energia, se foi. Miguel está tão frio, sem vida, pálido. Seus lábios não mais vertem o doce néctar que saciava minha sede. Estou só, com frio, com fome, nu. E tudo me lembra ele, mas por mais que o procure não o encontro mais. Meu Miguel... Minhas mãos estão vazias. Só restou a minha dor. Não. Eu sou a dor em si, por isso só restou à carcaça daquele que eu fui. Conrado Lima Jadão não existe sem Miguel. O lobo não suportou a ausência de seu cordeirinho.

Caminho pelas ruas, e procuro o seu rosto em meio à massa cinzenta que não cansa do seu vai-e-vem. Procuro-o nas minhas lembranças... Oh, meu Deus. Ele agora é apenas lembranças. Será que um dia vai se tornar apenas um sonho distante, e que vou duvidar de sua existência? Seu sorriso me persegue, em tudo que vejo.

Sinto meu corpo pesado, chumbado. Estou afundando lentamente e não quero tentar me salvar, espero que essa dor lancinante me devaste e confisque de mim o direito imerecido de continuar entre os vivos. Quero estar com ele. Quero o de volta. Quero ser emaranhado pela sua doçura e sua luminosidade. Onde você está Miguel?! Por que não me responde?! O silêncio é tão doloroso. Eu estou a sua espera... Miguel?!!! MIGUEL?!!!

- Conrado – Júlia o acordou.

- O que aconteceu? Cadê ele? Onde está o Miguel?! – Conrado estava muito agitado.

- Por favor, tente-se acalmar – Júlia o segurava pelo braço.

- Eu não quero me acalmar! – Conrado arrancou seu braço da mão de Júlia, abruptamente. – Onde ele está?

- Está na sala de cirurgia com seu pai – disse Júlia. – Você ficou muito agitado, até violento, e tivemos que te dar um calmante.

Conrado sentou-se na cama do quarto onde estava.

- Estou ainda confuso – ele pareceu mais calmo.

- Você esteve a mais ou menos três horas desacordado – informou Júlia.

- Três horas? Todo esse tempo?

- Sim. Mas não se preocupe, não temos nem uma notícia da sala de cirurgia.

- Em que estado ele foi trazido pra cá?

Júlia abaixou a cabeça, se esforçando para se manter tranquila.

- Me responde Júlia?

Ela fez sinal negativo com a cabeça, comprimindo os lábios.

- Estamos no tudo ou nada – disse Júlia por fim.

Conrado se lançou no pescoço da madrasta, e despejou rios de lágrimas, não mais sufocando seu sofrimento, o deixando exposto em carne-viva.

Na sala de espera, Silvia chorava no ombro de Fernando, enquanto Christiane observava os dois, também em desespero.

- Ivy está inconsolável – disse Silvia. – Tive muito trabalho de convencê-la a ficar em casa com a babá.

- Nosso Miguel é forte, ele vai superar tudo isso – disse Fernando.

- Eu tenho certeza – afirmou Christiane.

- E o Antônio? Alguém o avisou do que está acontecendo? – perguntou Silvia.

- Pra quê? – indagou Christiane,

- Ele é o pai, e apesar de tudo que fez, tem o direito de saber sobre o estado de Miguel – disse Silvia. – Além do mais, Miguel com certeza queria que ele estivesse aqui. Falou sobre o pai em todos esses últimos dias.

- Certo – Christiane se convenceu. – Eu vou então.

- Tem certeza? Não acha melhor eu...

- Não. Eu assumo essa tarefa – ela se pôs de pé. – Qualquer notícia, me avise imediatamente.

- Não se preocupe – disse Silvia.

No carro, enquanto dirigia rumo à casa do pastor, Christiane ensaiava uma fala, mas logo percebeu que o melhor seria uma abordagem direta, até porque ela não sabia fazer rodeios sobre assunto algum.

Chegou mais rápido do que desejava de fato. Parou o carro em frente à casa do pastor Oliveira e observou o interior iluminado. Pelo menos ele está acordado, ela pensou, como se isso reduzisse sua ansiedade.

Cinco minutos depois, Christiane estava fazendo algo que jamais faria se não fossem as circunstâncias atuais; ela tocava a campainha da casa do seu tio. Tocou umas quatro vezes, até que uma mulher veio atendê-la. Era Ana, a empregada.

- Boa noite Christiane – disse a mulher que já a conhecia. – Confesso que estou muito surpresa em vê-la há essa hora aqui.

- Eu também, Ana – suspirou Christiane, demonstrando pressa. – Quero ver meu tio.

Ana fez uma cara de quem não tinha entendido.

- Entre, vou chamá-lo – disse a empregada.

Christiane ficou em pé no meio da sala, enquanto a empregada sumiu pela casa.

Distraída com um quadro de uma paisagem, ela nem percebeu quando o pastor se aproximava.

- Ora, ora, então minha querida sobrinha resolveu visitar o tio inválido – o pastor entrou na sala em sua cadeira de rodas.

Christiane o encarou por alguns segundos, com o rosto sério.

- Aconteceu – ela disse.

- O que aconteceu? – ele perguntou.

- Miguel está nesse momento na mesa de cirurgia – ela respondeu.

O semblante severo do pastor relaxou lentamente.

- Se ele está sendo operado, então está recebendo cuidados, eu não posso fazer nada. Se for só isso, pode ir embora – o pastor ia virando sua cadeira, mas Christiane bloqueou sua passagem.

- Não! Não era só isso – ela falou em tom severo. – Seu filho passou esses últimos dias perguntando por você, sofrendo por não tê-lo ao lado dele, enquanto via sua vida sendo definhada.

O pastor engoliu em seco.

- Ele chegou até se culpar pelo distanciamento de vocês – Christiane continuou. – E o que ele fez para merecer seu desprezo? Amar? Como consegue dormir a noite pastor? Seu filho está em cima de uma mesa de cirurgia com quase nada de chances de sobreviver. Você pode fingir que não é humano, mas eu sei que dentro de você existe um coração, por mais que se esforce para acreditarmos que não.

O pastor começou a chorar.

- Ele está morrendo, e precisa de você ao seu lado – Christiane moderou o seu tom de voz.

Os dois ficaram em silêncio durante algum tempo, até que o pastor suplicou:

- Leve-me até ele – ele soluçava. – Leve-me até o meu Miguelzinho. Meu garoto.

***

Conrado conversava algo com Silvia, em voz baixa. Sempre balançando a cabeça em sinal de não, como se tentasse afastar de si qualquer ideia ruim. Silvia tentava deixá-lo calmo, mas sua vontade era de gritar também, e extravasar sua indignidade com a vida e suas injustiças, mas Conrado já estava abalado de demais.

De repente, Christiane adentrou a sala empurrando a cadeira do pastor. Quando Conrado o viu, seu sangue ferveu, e ele perdeu completamente a razão, partindo com violência para cima de Antônio.

- Não, Conrado! – Christiane o barrou com o corpo.

- O que você está fazendo aqui?! – Conrado bufava de raiva. – Você não é digno de estar no mesmo local que ele. Deve estar feliz, não é? Você nunca o amou!

- Conrado pare com isso! – Silvia entrou na confusão.

- Não, Silvia! Eu não posso ficar inerte diante desse homem – Conrado espumava. – Ele fez de tudo para me separar do Miguel. Eu não quero esse desgraçado aqui!

- Ele é o pai de Miguel, Conrado – Fernando tentou remediar.

- Ele é um porco! Um monstro! – Conrado estava furioso. – Sai daqui agora, ou eu te ponho pra fora a pontapés!

Todas as pessoas, que também aguardavam na sala de espera, assistiam a gritaria. O pastor, que ouviu tudo calado, e com a expressão de dor, se aproximou de Conrado com uma humildade canina, e pegou em sua mão, mesmo contra a vontade do rapaz.

- Você sabe orar? – o pastor perguntou.

- O quê?! – Conrado fez uma casa repulsa.

- Perguntei se você sabe orar – repetiu o pastor.

Conrado foi se desarmando lentamente, até que disse de cabeça baixa:

- Ele me ensinou.

- Então vamos fazer isso – o pastor levou sua cadeira para junto de Silvia e Fernando, e segurou na mão da ex-esposa e na de Conrado, novamente. Todos se juntaram a corrente de oração.

“Divino pai, nos dirigimos humildemente ao senhor e suplicamos que intervenha por nosso amado Miguel. Segure nas mãos do médico que o opera, e dirija essa cirurgia da melhor forma possível”, começou o pai de Miguel.

“Sabemos do seu imenso amor por seus filhos, e que és um pai de grande bondade. Conheces bem teu filho Miguel, e sabes que esse mundo ainda necessita muito dele, sabes que eu preciso dele com o mesmo desespero com que precisamos do ar para respirar. Eu o amo Pai, e sei que não vai existir amor maior que esse”, Conrado continuou.

“Já estive frente a frente com morte, mas fui beneficiada por sua imensa misericórdia, e recuperei a vida novamente, por isso suplico ao Senhor, mais uma vez, afasta à morte de Miguel, e o faça recuperar novamente a vida”, Silvia concluiu.

- Amém – disse Conrado.

Eles ainda ficaram de olhos fechados, e mãos dadas, murmurando suas próprias orações particulares.

Segundos se tornaram minutos. Minutos se tornaram horas. E as horas seguiram a fio, a demora por notícias era enorme. Era o que se esperava de uma cirurgia tão delicada.

Felizmente, o clima se tornou de harmonia. Agora os corações de todos eles batiam como um só, e pulsavam por um só objetivo. O pastor manteve-se com a mão entrelaçada na de Conrado, apertando sempre que um médico se aproximava, na expectativa de que fossem receber notícias, mas nunca eram a família procurada.

O silêncio era terrível. O ar parecia ficar cada vez mais rarefeito, como se eles estivessem subindo no cume de uma montanha, sobrecarregados. Ofegavam como um atleta se aproximando dos metros finais de um longo e dificultoso trajeto.

E foi aí que finalmente a espera angustiante acabou. Luciano surgiu no corredor, vindo em direção a eles. Olhava para os pés, caminhando com a postura de um derrotado. Estava cansado, exaurido, tomado por uma fadiga intensa. Sua expressão era de desolação. Ele umedecia os lábios secos com a língua, e limpava o suor que lhe escorria pela testa, balançando a cabeça de um lado para outro.

Todos acompanhavam cada passo dele, cada centímetro aproximado, com o fôlego que se toma antes do mergulho.

Conrado se ergueu e o fitou mais profundamente, mas não era a visão de seu pai que ele tinha. Ele via Miguel andando na rua, na primeira vez que seus olhares se cruzaram, antes do assalto que os levou a se conhecerem. As cenas passavam em flashes, e logo ele o via no hospital ao seu lado pela primeira vez, o ajudando a falar com o homem que tinha atropelado, enfrentando seus amigos, enfrentando até o próprio Conrado. Via a cena de seu primeiro beijo, logo após a morte de Luiza, viu quando fizeram amor pela primeira vez no sítio, suas idas aos Pilares de Deus, o enfrentamento com o pastor, o casamento e a dança final. Uma sucessão de fatos e eventos que se desenrolavam rapidamente, com frases entrecortadas.

O filme que se passava em sua cabeça teve como fim, o sorriso de Miguel surgindo radiante como o nascer do sol em uma manhã de verão, mas parecia se despedir para sempre. Conrado sentiu seu coração ser esmagado lentamente. Sua alma estava chorando.

Luciano se aproximou deles todos, ficando cara a cara com o filho, como fez da última vez, quando operou Clarice a mãe de Conrado. Respirou, comprimiu os lábios e disse:

- Deus existe! Milagres existem!

Uma lágrima escorreu pelo rosto de Conrado, desembocando em uma covinha que se formava em se rosto, onde um sorriso da mais pura felicidade era desenhado. Ele olhou para Silvia, movendo o rosto como se estivesse em câmera lenta. Ela chorava de felicidade.

- Ele é um guerreiro! – disse Luciano rindo como uma criança. – Ele é um guerreiro!

Conrado começou a rir, pular, a euforia era contagiante. O pastor foi até Conrado, e os dois se abraçaram com um afeto inacreditável.

- Foi o amor de vocês – o pastor sussurrou no ouvido de Conrado. – O amor, opera milagres!

Sim, pastor Oliveira, o amor opera milagres. E o maior milagre, é o regresso do ser humano ao seu projeto divino original.

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Comentários

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Nossa não paro de chorar sou nova no cdc mais devo dizer sem medo de errar q esse é o melhor conto q li até agora. Mais uma vez Parabens

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Joseph67, tenta abrir agora. Acho que era o site que estava com problema, mas agora se normalizou. Caso não consiga me avisa, que te envio.

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Meu lindo, meu Lord, não tenho palavras, chorei e estou pasmo com sua arte, não estou conseguindo abrir o último capítulo pode me mandar por e-mail? josephcosta67@gmail.com - te adoro por me proporcionar esse conto maravilhoso, bjs meu Lord

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o ultimo capitulo aqui nao quer abrir, mais alguem com este problema?

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Como escreveste em um comentário alguns capítulos atrás que continuarias "Mario e eu" quando terminasses Asfalto, aguardo ansioso. Um abraço carinhoso,

Plutão

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Nem sei mais o que dizer... Lágrimas escorrendo muito por aqui! Fiquei pensando... Como somos capazes de nos emocionarmos simplesmente com a atividade de ler um texto? Valeu!!!!!!!!!!!!!

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Eu acho que fiquei mais aliviado que todos na sala do hospital.É a primeira vez que eu leio esse conto e só tenho a agradecer por ter tido oportunidade de ler essa obra prima.S2S2S2S2

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Puta que pariu!! Tou arrepiada aqui... Porra... Que venha o final.

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Estou com a mesma ansiedade que fiquei a 4 anos atrás e isso é incrivel. O poder que esse conto transmite é maravilhoso, uma bomba de sensacões, abracos man...

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Cada capitulo mais emocionante q o outro....perfeitoooo.

Obrigada por repostar esse conto e nos dar a oportunidade de ler um conto que mexe comas nossas emoções e opinioes....beijao

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O Deus! Toda a espera, todo o medo se vai ao ler os últimos parágrafos do conto. Mesmo sabendo o final, ainda fiquei surpreendido.

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meu Deus fiquei em extase agora estou muito emocionada.!! essa historia é simplismente maravilhosa.beijo seu lindo.

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