Cap.3
NARRADO POR EDUARDO
A minha história é bem diferente de muitas. Ao contrário da grande maioria das pessoas, hoje, eu não posso me comunicar. Não posso falar... Não posso dizer o que sinto. Dependo de pessoas que se interessam pela minha condição. Caso contrário, ficaria isolado nesse mundo hostil para pessoas como eu. Até aqui, a minha história parece muito com a de outros mudos. Com um detalhe. Eu não sou surdo.
FLASHBACK
Eu era uma criança normal. Corria, brincava, era extremamente tagarela, extremamente extrovertido.
- Mamãe, Olha o que eu ganhei de um amigo meu na escola... - dizia eu, mostrando um carrinho.
- Olha, que lindinho meu filho ! - dizia ela, deixando em seguida eu correr para brincar.
Não tinha nada de diferente de uma criança normal. E achava que assim seria por muito tempo. Até que aquilo aconteceu...
TEMPO DEPOIS
Estávamos trafegando por uma avenida da cidade. Dentro do carro, um clima agradável. Fora, chovia. O rádio estava alto, com um som de uma partida de futebol.
- Nem para marcarem logo um gol - dizia eu...
- Calma meu filho ! - meu pai dizia. Continuavamos andando, até que um dos times fez gol.
- Gooolll ! Eba ! - comemorei. A felicidade era grande, porém, tudo mudou. O carro derrapou e capotou. Eu bati a cabeça e desmaiei...
DIAS DEPOIS
Quando acordei, já estava dentro de um hospital, numa cama, cheio de fios. A forte luz fez os meus olhos doerem. Olhei ao redor, vi apenas uma enfermeira. Tentei falar, mas por algum motivo senti uma forte dor na garganta. Não saía nenhum som da minha boca. Quando acenei, ela me viu e imediatamente se levantou, atônita.
- Não, não ! Você não deve tentar falar !
TEMPO DEPOIS
No início eu não pude entender o porquê. Apenas sabia que não deveria tentar falar. Porém, quando envelheci mais e pude ter um certo discernimento, minha mãe me disse.
- Aquele acidente deixou sequelas irreparáveis em você. Voce sofreu uma lesão grave nas cordas vocais. Não adianta, você nunca vai poder falar novamente Eduardo !
FIM DO FLASHBACK
E é por isso que hoje, eu não posso me comunicar com ninguém. Dizer uma palavra que seja, eu não posso. Expor meus sentimentos, minhas emoções. Porém, continuo escutando tudo ao meu redor. Pratico os meus ouvidos de todas as formas possíveis. E também desta forma, escutei muitas coisas ruins que não pude retribuir.
FLASHBACK
Entrava mais uma vez na sala de aula, esperando ser excluído como das outras vezes.
- Então alunos, este é Eduardo, seu novo amigo. Ele é deficiente. Então respeitem-o - enquanto andava por entre as cadeiras em busca de uma pra mim, e durante esse tempo, ouvia coisas ruins.
- Porquê esse garoto não procurou uma escola para ele ? - um dizia.
- Agora eu vou ter que ser gentil com uma pessoa que nunca vai falar comigo ! - outro dizia.
- Nem para colocarem em outra turma ! - e assim eu acabei ficando ainda mais tímido e com medo das pessoas.
FIM DO FLASHBACK
É exatamente por isso que hoje eu finjo ser surdo e mudo. Para saber o que as pessoas realmente pensam de mim. E me juntar apenas a gente que goste de mim.
Continua
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