- Bom dia! Me chamo William. Vim trazer a documentação para a bolsa em arquitetura.
- Ah, sim. Me lembro. Estávamos esperando você Sr. William - Disse ela, a quem eu achava ser a Diretora da universidade.
Quase me esqueci de me apresentar! Meu nome é William Novais, e estou aqui na universidade Águia Dourada, a instituição mais renomada do Amazonas, que ganhou o prêmio de a melhor universidade do país, levando em consideração a qualificação e tudo mais que uma instituição poderia passar para que os alunos se tornassem os melhores profissionais em qualquer lugar.
Em consequência de todo esse prestígio, os filhos do maiores empresários do país vieram morar em Manaus, onde a universidade está localizada, para dar sequência aos estudos no ensino superior.
- Eu estou aqui! Nem acredito. - Disse para mim mesmo enquanto a gestora saía pra levar os documentos para um rapaz atrás do computador numa sala próxima a dela, em que as paredes eram de vidro.
Eu sempre fui um aluno muito aplicado, pois morava somente com minha mãe, devido meu pai ter nos deixado quando eu tinha 3 anos. Ele fugiu com uma outra mulher, e isso foi uma barra para minha mãe, que teve que nos sustentar sozinha.
Ela trabalhava com vendas de lanches numa praça aqui perto de casa, com iguarias bem regionais. O dinheiro que ela recebia com essas vendas dava pra ela comprar os materiais para a próxima venda e nosso almoço, já a janta era o que sobrava de sua barraca. Isso quando sobrava.
Já meus materiais escolares eram dadas por Felipe, um amigo que conheci no sexto ano.
Felipe me disse que já me conhecia, mas eu não lembro, falou-me que quando eu estava ajudando minha mãe na barraca, o pai dele sempre parava lá com ele pra comer algo, já que seu pai quase nem tinha tempo pra almoçar. O pai dele o pegava na escola e ia até a barraca de minha mãe, comia algo, e depois o deixava na casa de sua mãe, pois seus pais eram separados. Sua mãe era rica, e seu pai tinha um ótimo salário, embora trabalhasse muito para mantê-lo.
Depois de um tempo vejo a Diretora vindo, e me vejo obrigado a parar de pensar no passado.
- Esta aqui o teus documentos e número da sua sala - disse ela entregando-me os mesmos.
Agradeci e me levantei. Antes mesmo de chegar até a porta de saída ouço uma voz.
- William!
Olho pra trás pra ver do que se tratava, e vejo a senhora diretora de pé com um sorriso.
-Volte aqui e sente-se. - Diz ela
- Ok. - Respondi, voltando a me sentar.
- Olha William, você sabe que só houveram cinco bolsas disponibilizados esse ano para o curso de Arquitetura. Embora sejamos uma universidade particular, temos convênios com o governo brasileiro e alguns estrangeiros nas filiais nos Estados Unidos e na França, então, quero lhe dizer que se dedique, faça o seu melhor, pois muitos querem estar no seu lugar. E você está aqui apenas por um motivo, por ser o melhor aluno do estado. Agora pode ir. - Finalizou ela ajustando o óculos em seu rosto.
- Farei isso, pode ter certeza! - Falei me levantando logo em seguida.
Fui até a porta e saí. Fiquei sentado num banco próximo a diretoria, pensando em diversas coisas.
Felipe estava matriculado no mesmo curso que eu. Aliás, eu influenciei ele a cursar isso.
Quando eu entrei no sexto ano, o conheci. Ele veio falar comigo e disse que já havia me visto antes, quando eu estava na barraca com minha mãe, mas como não me lembrava, preferi me manter calado, já que ele sabia que eu ajudava minha mãe, então deduzo que seja verdade.
A partir daquele momento, ficamos muito próximos. Comecei a frequentar a casa da mãe dele, que me tratou com uma mãe trataria um filho, da melhor maneira possível, mas acho que ele já havia falado de mim pra ela, porque ela sabia que estava ajudava minha mãe na barraca e tudo mais.
No fim do sexto ano, a mãe dele me chamou para almoçar em sua casa. Como já havia feito aquilo antes, não estranhei, apenas fiquei curioso. Após o almoço fomos para a sala e dona Sarah disse;
- William, você quer estudar inglês e francês?
Não entendi aquilo. Foi totalmente estranho.
- Como assim? - Perguntei confuso.
- Soube que você é o melhor aluno da turma. O Felipe me disse! Ele também me falou que você gosta de desenhar, e que sonha fazer arquitetura. Então como irei por o Felipe na escola de idiomas no turno da tarde, você poderia ir com ele. Você faz bem pra ele, e não quero os dois afastados. - Diz ela.
- Dona Sarah, me desculpe, mas não posso aceitar. Um curso desse é muito caro, e minha mãe não pode pagar. - Expliquei nervoso.
- E quem falou que ela iria pagar, William. Eu irei pagar, eu posso e quero fazer. - Argumentou.
- Mas você teria que falar com a minha mãe. Não sei se ela acreditaria que alguém faria isso sem pedir nada a ela em troca. - Retruquei.
Falei isso porque conhecia minha mãe. Desde que meu pai foi embora, ela guarda uma mágoa muito grande, e deixou de acreditar nas boas intenções das pessoas.
- Não se preocupe com isso, eu me disponho a ir falar com ela amanhã pela parte da manhã, enquanto vocês estarão na aula. - diz ela.
- Então tudo bem. Se você a convencer, eu agradeceria. Sei o quanto isso seria bom pra mim. - comentei feliz.
Após a conversa, Felipe me chama para ir para o quarto jogar game. Ficamos jogando por cerca de uma hora, até eu cansar e deitar na cama.
- Não quero mais jogar, Felipe, estou cansado. - Resmunguei.
- Eu também não, então vamos deitar um pouco. - ele disse já se jogando na cama.
Ficamos deitados por um bom tempo, e não lembro de quando apaguei, mas quando acordei, Felipe estava com a cabeça sobre meu peito. Pensei em acordá-lo, mas preferi não o fazer por algum motivo, e acabei dormindo novamente. Acordamos com Dona Sarah batendo na porta, o que acabou se tornando frequente durante a semana.
Assim passaram os dias, e de fato a mãe de Felipe convenceu minha mãe de eu ir estudar na escola de idiomas. Me senti culpado logo no inicio, pois na tardes eu sempre ia ajudar minha mãe ou fazia companhia a ela. Muitas dessas vezes Felipe ia comigo, mas com as aulas, não dava mais.
Quando eu chegava em casa, já era sete horas da noite, e minha mãe já estava preparando alguma coisas para a venda do outro dia.
Numa noite, a chamei para conversar e explicar que se precisasse, eu parava no curso. E ela só teve uma resposta.
- Não!
- Como? - Eu disse.
- Você não irá parar esse curso e vai me prometer que irá até o fim, se dedicando para que realmente aprenda. - disse ela num tom de choro.
- Certo mãe, eu não irei parar. - Concordei.
- Meu filho, a única coisa que eu posso te dar é educação, e deixar que você seja educado da melhor maneira possível. Mesmo que quem esteja te dando essa oportunidade, seja alguém que não nos deve nada. Na verdade, eu que estou devendo à ela por essa oportunidade. Mas sei o bem que você fez a seu amigo. Então siga em frente. - Disse ela com os olhos marejados.
Eu fiquei pensando, pois Sarah já havia falado sobre o bem que fiz a Felipe, e agora minha mãe está falando o mesmo.
Sempre soube que Felipe era carente de amizade, e muito fechado no começo, mas mudou aos pouco. E assim foi durante os três anos seguidos no ensino fundamental, até terminarmos o curso de idiomas e entrarmos no ensino médio, quando as coisas começaram a dar errado.
Minha casa só tinha uma cozinha pequena, onde só cabia a pia, a geladeira, o fogão, e algumas poucas panelas que ficavam próximas a mesa, um banheiro próximo a cozinha, e um quarto, que eu dividia com a minha mãe.
Quatro horas antes de ir pra casa, eu estava na escola. Fui ver com o Felipe qual em qual sala eu ficaria no primeiro ano, e se ainda estudaria com ele, o que graças a Deus aconteceu, me deixando feliz, mas logo em seguida ele disse que precisava falar comigo, então eu o seguir até o banheiro. Ele observou se estava realmente vazio, então eu disse:
- Você está me assustando desse jeito. - declarei nervoso, dando um pequeno riso.
- Não precisa ter medo, afinal, eu estou aqui. - Disse ele num tom de risos, coisa que eu odiava quando ele fazia. - É o seguinte, sua atitude resultará em algo que será bom pra nós dois. - Ele disse.
Olhei como se nada estivesse entendendo, afinal, eu realmente não estava.
- Feche os olhos. - disse ele.
Fiz o que ele pediu, mas sem saber o que receberia. Não era meu aniversário, mas sem medo, fechei meus olhos, até porque não havia mais ninguém no mundo em que eu confiasse mais do que ele, a não ser minha mãe, Leonor. Mas me surpreendi, e fiquei sem reação alguma quando sentir seus lábios tocando os meus. Ele nunca havia tentado nada comigo, nem em nossos momentos de intimidade. Não contei, mas já havia dormido e até tomado banho com ele, mas nunca, nunca aconteceu nada!
Nesse momento, só o que pude pensar era no que estava acontecendo. Seus lábios estavam frios, o que me agradava, amo o frio, mas quando caí em mim, só o que fiz, foi pôr minha mão em seu rosto, e empurrar para traz, e dizer:
- Nunca mais, na sua vida, faça isso comigo!
Então saí correndo, com os olhos cheios de lágrimas, imaginando o porquê daquilo ter acontecido, e de não conseguir entender o motivo, mas sabia que alguma hora teria esse tempo de pensar no ocorrido. Quando cheguei em casa e entrei no quarto, vi minha mãe deitada no chão, inconsciente. Não sabia o que fazer, só peguei ela no colo, a deitei na cama, fui até o telefone público que havia em frente à minha casa, e liguei para o hospital, quando a ambulância chegou, minha mãe já estava acordando, mas o susto pior foi quando recebi a notícia de que minha mãe não poderia mais fazer nenhum tipo de esforço excessivo, pois estava com problemas cardíaco. O coração dela estava aumentando, e é ela teria que fazer um tratamento continuo.
Eu não sabia o que fazer, então fui até a casa de Felipe, falar com ele, mas ele não estava, e seu pais estavam preocupados. O pai dele estava na sala com Sarah, a espera do filho, e logo imaginei o porque dele não vir, talvez pelo fato de eu ter o rejeitado. Mas minha mente estava tão cansada, que falei o motivo de ter ido lá. Contei sobre minha mãe, e o pai dele se propôs a ir comigo até ao hospital enquanto Sarah esperava por Felipe.
Marcos, como se chamava o pai de Felipe, se encarregou de tudo no hospital, e transferiu minha mãe para um hospital particular, por falta de equipamentos no público. Logo após a nossa chegada no hospital particular Santa Luzia, Sarah chega com Felipe e uma menina que estudava na sala ao lado. Eles estavam de mãos dadas.
Só o que pude sentir naquele momento, foi angústia. Mas tudo piorou quando ela o beijou na boca. Meu mundo pareceu desabar naquele momento e me perguntei o porquê de tudo isso acontecer naquele momento.
Meu olhos se encheram de lágrimas.
- O que aconteceu? - perguntou Sarah.
- Minha mãe está doente. - falei apenas isso.
Ela me abraçou e disse que a tudo iria ficar bem. Marcos falou que já havia tomado as devidas providências. Felipe me abraçou e sussurrou no meu ouvido:
- Desculpa, aquilo não vai mais acontecer. E eu estou aqui, sempre estarei.
Aquilo me doeu, mas foi pior quando lembrei do beijo que a menina deu nele, e ele retribuiu.
Após uma semana e meia, voltamos pra casa. Minha mãe já estava se sentindo melhor, e os pais de Felipe se dispuseram a dar todos os medicamentos necessários.
Depois disso eu comecei a trabalhar e conseguir manter a casa, mas não tinha mais o tempo de antes com Felipe. Eu trabalhava em turno integral numa loja roupas. Dava pra sustentar a casa e ajudar minha mãe, mas eu não tinha tempo de ir na casa de Felipe, porém, sua mãe sempre ia nos ver e conversar com a minha. Muitas vezes eu chegava em casa, e via Sarah e Marcos com minha mãe.
Acho que eles estavam se reconciliando, mas não tinha certeza.
Sara dizia que o filho sentia minha falta, e que ele estava se comportando de maneira estranha, que até teve uma briga com a namorada.
Expliquei que tinha que trabalhar e estudar muito pois pretendia entrar na Universidade Águia Dourada, porque soube que eles tinham bolsas para alunos excepcionais, ou que tinham notas elevadas.
Assim foi durante todo o primeiro ano. No segundo e terceiro ano, eu já não tinha mais contato com ele, mas até onde soube, minha mãe ainda falava com a dona Sarah.
Agora eu estou aqui, dentro da universidade sem saber o que me espera.
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When you're down and troubled
And you need a helping hand
And nothing, whoa nothing is going right.
Close your eyes and think of me
And soon I will be there
To brighten up even your darkest nights