Esta é a continuação do conto “Entregue a Adair” e de outros anteriores a ele.
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Durante a semana, me deixei levar pelas lembranças daquele domingo e dos preparativos para a nova ida à sauna, no domingo seguinte. Aquelas seis ou sete horas que passei na companhia de Adair, além de me renderem incontáveis masturbações nos dias seguintes, haviam me ensinando e me mostrado muita coisa.
Até então, eu me considerava um gay muito experiente. Começara tarde – perdera a virgindade já na faculdade –, mas achava que a frequência à pegação compensara esse atraso. Tinha dado prazer a dezenas de homens – sei lá, talvez algumas centenas – e, claro, num leque bem amplo de experiências. Também não tinha preconceitos, tanto de tipos físicos e classe social quanto de experimentar práticas novas. Homem gostoso é homem gostoso, seja feio ou bonito, rico ou pobre – desde que, claro, seja ativo, dotado e com atitude. E, se o macho conquistava minha confiança, pensava duas vezes antes de não fazer alguma coisa que ele sugerisse (e não duas vezes antes de fazer, hehehe).
Eu era um puto; sabia que era e gostava de ser assim: “puto” é como a gente chama um gay que procura viver e vive o mais intensamente a sua sexualidade. Mas aquela tarde com Adair desfez essa imagem: me dei conta de que era um puto pela metade.
Comecei a me achar travado, preso a limites que eu mesmo construíra e que não eram reais. Os outros frequentadores do banheiro não percebiam o quanto, apesar de me achar discreto, eu me atirava para agradar um macho? Não tinham certeza que eu era passivo, ao me verem com o pinto molinho e meio escondido e de olhos esbugalhados num pauzudo ao meu lado? Mesmo sem me verem em ação, não tinham certeza que, ao sair ou ao me esconder num canto com um macho, eu não iria ficar de joelhos no chão saboreando seu cacete até satisfazê-lo por completo? Qual o sentido de buscar uma imagem de comedimento se todos ali adivinhavam que meu reto era deformado pelas metidas dos machos, já que sempre saía com aqueles que tinham o dote acima da média?
“Os outros que se fodam”, Adair dizia quando queria que eu me soltasse mais. Claro que para ele era mais fácil, sendo ativo e tendo aquele tacão entre as pernas. A situação do passivo é sempre mais frágil; ele é sempre mais vulnerável. Uma coisa é ser visto metendo uma boa pica, outra é ser visto levando essa boa pica. Mas, afinal, quem está na chuva não é pra se molhar?
Começava a entender também outro desafio. Guiado por Adair, exposto por ele, entregue a ele, eu tinha que vencer esses medos, esses limites criados por mim mesmo. Mas tinha também que decidir, ou melhor, assumir o que eu queria dele. Adair era uma puta transa, mas estava na cara que eu queria que ele fosse mais do que isso. Não me via apaixonado, mas sem dúvida mais interessado do que simplesmente num pau grande e bonito e num homem que sabia usá-lo muito bem: eu queria conhecê-lo, estar com ele, entrar no mundo dele. Mas conseguiria levar à frente esse outro tipo de relação se ele mesmo não se constrangia em demonstrar que “não era egoísta”, me oferecendo a um amigo, vendo com naturalidade que eu me entregasse a outros homens? E eu conseguiria, se ele não tinha qualquer pudor em comer outros caras, se não só achava natural estar com eles na minha frente como ainda me convidava a lamber seu saco enquanto fazia isso?
Adair não tinha os limites aos quais eu me acostumara. Provocara o atendente do hotel, me expusera frente a ele ou me mandara lamber o cu do outro passivo com um sorriso que, por mais inusitado que seja, não tinha outro adjetivo: um sorriso inocente! Não me mandava fazer aquelas coisas, e não as fazia também, porque eram “proibidas”; porque eram “erradas” e ele estava sendo um safado. Não: fazia e me mandava fazer simplesmente porque elas eram gostosas de fazer. Sem culpa alguma por fazê-las.
Ele não tinha culpas. E para estar com ele, ou mesmo assumir que eu queria estar mais com ele além da cama, eu tinha que abrir mão do conforto da culpa. Teria que esquecer essa noção. Eu conseguiria? Estava disposto a tentar fazer isso?
Uma semana era muito pouco tempo para ter essa resposta. Principalmente porque, afinal de contas, o gosto do cacete dele não me saiu da boca nos dias que se seguiram, e ficava difícil pensar em outra coisa que não fosse a hora de ficar novamente de quatro para que ele se satisfizesse.
Durante toda a semana, continuei a usar o consolo grosso para tentar manter a dilatação que ele me dera. Comprei mais camisinhas, já que ficara sem nenhuma porque havíamos abandonado tudo na cabine, após a última trepada, na sauna a vapor. À medida que se aproximava o fim de semana, fui dosando a alimentação para facilitar a digestão e evitar o excesso de gases. Passei horas numa loja escolhendo um hidratante corporal que garantisse o máximo de maciez. Providenciei uma pequena nécessaire para guardar o estoque de camisinhas junto com o lubrificante, um perfume e outros apetrechos. Lamentei diariamente por ter apenas o sábado para reforçar a marquinha do calção, me bronzeando na praia. Só pensava no novo encontro com Adair.
Acordei no domingo ansioso para começar a preparar-me pra ele, depois que confirmamos tudo na véspera, pelo telefone. Tomei um café da manhã forte, mas que em nada pudesse vir a comprometer a higiene das trepadas da tarde. Cheguei à fachada da sauna às duas horas em ponto e fiquei dando voltas no quarteirão por ter vergonha de ser o primeiro cliente. Entrei na portaria às duas e oito. No vestiário, percebi que já tinha mais de dez caras lá!
Consegui a cabine preferida dele, troquei o lençol e arrumei a nécessaire entre o colchão e a mesinha lateral, como Adair fazia. Ele não marcara uma hora certa para chegar: “chego depois das duas, lá pelas duas e meia”, dissera. Desenrolei a toalha da cintura e a dobrei para que ficasse um pouco mais curta, tal como vira no domingo anterior aquele gostosão bronzeado usar.
Desci para o bar do primeiro andar. Peguei uma mesinha que me permitia ver a portaria. Pedi a primeira cerveja, depois a segunda. Antes de uma terceira, pedi uma dose de vodca com gelo, como havíamos tomado no hotel.
Perguntei a hora e já eram três e cinco. Subi ao vestiário e confirmei no celular. Liguei para ele.
– Meu docinho, vou te dar um bolo...
Eu gelei.
Explicou-me que a mãe sofrera uma alta de pressão pela manhã e que ele tivera de levá-la ao hospital. Preocupado, não queria que ela passasse o resto do dia sozinha.
– Mas a gente se vê no outro domingo. Pode deixar que vou compensar.
– Poxa, que pena – respondi, na falta de outra coisa pra dizer.
– Trepa muito por mim aí, então.
– Não. Vou embora – retruquei, como se não visse nada demais no que acabara de escutar.
– Embora? Playboy... – notava um sorriso maroto na sua voz. – Eu já te conheço... Você tá com esse cuzinho perfumado, se preparou todo pra mim, tá prontinho pra levar ferro bem gostoso... Pagou a entrada; pagou a cabine. E depois disso tudo, vai embora?
Fiquei calado.
– Não é uma babaquice?
– É... Não sei... Não pensei em estar aqui sem você.
– Nem eu. Mas, já que taí...
Sentei num banco do vestiário. Adair tinha razão. Eu me prepara a semana inteira... Estava todo depiladinho, todo macio, com quase nada no estômago, cheio de camisinhas... e numa sauna gay, caralho! Ia embora?
Não, não sabia se ia ou não. Na dúvida, desci e pedi outra vodca ao balconista. O gostosão bronzeado surgiu e parou, em pé, parecendo estar à procura de alguém. Olhei, sendo discreto, mas querendo não sê-lo. Ele percebeu, também olhou e me dispensou. Merda. Pelo menos se ele me desse mole valeria a pena ficar. Terminei a vodca e troquei de bar: fui para o terraço.
– Adair não vem hoje? – perguntou o atendente, enquanto me dava a garrafinha de cerveja.
– Não... – respondi, surpreso.
Eu nem reparara no cara no domingo anterior, e ele se lembrava de mim e com quem eu estava? Eu já era conhecido, só porque passei uma tarde lá com o Adair? Dei de ombros pra mim mesmo e sentei. Garcia passou, aproximou-se e me cumprimentou com um sorriso, mas seguiu para outra mesa. “Até que ele dá um caldo”, pensei, imaginando que talvez ele hoje quisesse tentar me comer, o que justificaria minha permanência na sauna.
Desci para consultar novamente as horas no celular e decidir, afinal, se ia ou não embora. Mas, ao fim do primeiro lance da escada, me veio a curiosidade: havia passado várias vezes pelo quarto andar, mas não o explorara, e estava justamente nele. Não me chamara a atenção, porque nada parecia muito interessante: era uma área relativamente grande com algumas espreguiçadeiras – na verdade, uns divãs revestidos com algo como curvim, disfarçados de espreguiçadeiras por terem o encosto um pouquinho reclinável. Mas lá estavam as duas portas que davam acesso aos quartos-escuros – fora outras duas que, mais tarde, viria a saber que davam acesso a áreas de uso interno da casa. Chamavam aquele espaço de “área de relaxamento”. No fundo, não passava de uma antessala para os quartos-escuros.
Nunca fui muito fã de quarto-escuro, apesar de já ter ido a alguns para caçar. Não gostava da ideia de chupar um pau sem vê-lo, tanto por uma questão de higiene como por tesão mesmo (uma boa mamada, pra mim, inclui contemplar o membro). Tanto que o único quarto-escuro ao qual fui mais de uma vez, numa boate tão tosca quanto divertida, não era tão escuro assim, graças a uma leve penumbra que, por descuido, vinha do corredor que lhe dava acesso.
Resolvi entrar.
Era o tal “labirinto”, palavra que ouvira umas duas vezes quando estava bebendo. E era isso mesmo: uma área generosa, cheia de divisórias – destas comuns, usadas em escritórios mais simples – que formavam corredores estreitos que aqui e ali se alargavam para estreitar-se novamente e, depois, transformarem-se em saletas e se bifurcarem. Mais tarde, percebi que a área não era tão grande assim e que era fácil se localizar ali dentro. Nesta primeira visita, porém, pareceu-me um extenso e intrincado labirinto mesmo. E gostei: não era mesmo um quarto-escuro, porque havia tantas placas luminosas indicando o percurso de saída – imagino, para o caso de incêndio ou alguma emergência – que havia alternância entre áreas de meia-luz, de mais penumbra ou efetivamente de escuridão. Era mais um “quarto-meio-escuro”.
Fui entrando com cuidado, esbarrando aqui e ali com algum cliente. Imagino que um mais gordo deveria causar sérios problemas de tráfego. Percebia cacetes à mostra, caras ajoelhados chupando, outros sendo encoxados e mais outros simplesmente esperando alguma coisa. Nas passagens mais estreitas, era impossível não ser sarrado ou roçar o pau em alguém que passasse. Mas o melhor estava por vir: em vários módulos das divisórias, havia-se feito buracos, dos mais diversos diâmetros e nas mais diversas alturas: glory-holes!
Glory-holes me fascinam. Mas nunca encontrei um lugar que tivesse um que fosse como eu desejava: um buraco onde um cara encaixasse o pau e eu pudesse mamá-lo e dar-lhe o máximo de prazer sem que um soubesse quem era o outro – nem antes, nem durante, nem depois. Ou seja: uma chupada (ou, quem sabe, até uma foda mesmo, através do buraco) completamente anônima de ambas as partes. Nos poucos locais onde vira glory-holes, não havia a menor dificuldade de esticar a cabeça e ver quem estava do outro lado, ou dar dois passos e encontrar o outro. Ali não!
Poucos estavam sendo utilizados. Na verdade, só vi um cara pegando num pau – e percebi que se abaixara para chupá-lo – e mais outros dois ocupados: ou seja, de onde saíam cacetes a meia-bomba para serem desfrutados por quem quisesse. Um deles, numa área menos escura, era negro, e de bom tamanho. Eu o segurei.
Notei um movimento no cara atrás da divisória. Apalpei, para senti-lo melhor. Era macio, gostoso de pegar, e não estava molhado nem úmido – um bom sinal. Abaixei e o cheirei (podem me chamar de fresco, mas não abro mão de cuidados elementares). Sabonete.
Abocanhei. Cresceu muito rapidamente na minha boca. Sem tirá-lo, fui percorrendo-o com a língua. Queria caprichar, e agradei: não sei se um leve tremor, ou uma mudança de posição, mas aquele desconhecido reagiu de forma que parecia aprovar. Quando ia ajoelhar, uma mão alisou minha toalha e logo a levantou, acariciando minha bunda – que, pela posição, estava arrebitada. Deixei. O toque era suave, investigativo, me sondando. Mantive a posição, para que ele prosseguisse. Estava gostoso.
Continuei mamando aquela pica, agora bem dura. Não olhei pra trás: apenas deixei aquele outro desconhecido chegar ao meu cuzinho, rodeá-lo com o dedo, acariciá-lo. Propositadamente, tirei um pouco o pau da boca e deixei escapar um arfar. O cara atrás de mim pareceu animar-se com isso.
Separei um pouco mais as pernas. Mamei o cacete com mais ardor. O cara do outro lado começou a movimentar-se vagarosamente, pra frente e pra trás. O outro pressionou meu botão. Cada um do seu modo, os dois homens começaram a me explorar mais: um aumentava o ritmo e agora me fudia pela boca, enquanto o segundo me penetrava vagarosamente com um dedo e, depois, percebendo minha dilatação e a lubrificação, com dois. Eu não sabia quem era um e, apesar de poder simplesmente virar o rosto, não queria distinguir quem era o outro – se gordo ou magro, alto ou baixo, velho ou novo.
Percebi as pernas de alguém que chegava e observava. Depois outro. Um terceiro. “Fodam-se os outros”.
O pau que eu chupava era gostoso e entrava e saía incessantemente mas na medida certa, sem me fazer engasgar; a penetração que o outro fazia com os dedos era como se acariciasse um veludo. Eu imaginava o que os outros caras viam: o passivo de rosto encoberto tendo prazer em ser usado por dois desconhecidos. Aquilo estava bom demais.
Mas o macho atrás da parede aumentou perigosamente o ritmo. O detrás de mim tirou os dedos e logo senti seu pau tocar meu cuzinho. Eu não tinha camisinhas comigo. Em breve, viria porra.
Não.
Levantei-me e, desvencilhando-me da rodinha que se formara, segui em frente. Meu coração batia forte e, se duvidar, meu corpo todo estava trêmulo. Excitado. Excitado demais.
Parei numa área mais escura, que parecia sem ninguém. Soltei o corpo contra a divisória atrás de mim. Ela estremeceu, mas me suportou. Fiquei ali encostado por um tempo.
Desenrolei a toalha. Não fechava o comércio, mas meu corpo não era feio. Meu pinto estava gracioso, todo depiladinho. Minha bunda não era redondinha e arrebitada, mas também não era feia. Eu era um passivo e estava todo preparado para agradar um homem ativo. Ali havia meia-luz, fraca mas suficiente para que notassem o que eu tinha a oferecer. Sob os letreiros, poderiam até me apreciar melhor. Que me vissem. Que me desejassem. Que quisessem me usar, me fuder, me mostrar quem eu era e do que eu gostava.
Segui em frente, com a toalha mal arrumada sobre um ombro, o corpo exposto, a penumbra que aumentava e diminuía. Passei por vários caras – talvez alguns tenham me olhado, talvez alguns tenham me ignorado. Aquilo me deu um enorme prazer. Olhem, me desejem; desejem o passivo com pintinho lisinho; desejem o passivo que se entrega para o prazer do Adair.
Então, passei por um divisória que tinha um buraco com um diâmetro grande, e na altura do meu pinto. Por ele, passava um pouco mais de luz – não muita, mas suficiente: certamente era possível do outro lado ver bem o que fosse exposto ali.
Então, encostei de frente. Levantei os braços, para ficar o mais rente possível. Do outro lado, veriam meu pinto sem dificuldade, minha pele macia, uma nesga do início das minhas coxas. Queria que agora alguém me servisse mais uma vodca com gelo. Queria que agora Adair tomasse meus ovinhos e meu pinto com uma só mão e os apertasse, como fazia de vez em quando.
Nada aconteceu por um bom tempo. Depois, senti que deram uma balançadinha com o dedo, seguindo em frente. Mais um tempo e alguém o abocanhou. Chupou, chupou, e nada aconteceu: aquele pintinho continuou murchinho. Foi embora. Descobri que me excitava demais: era um prazer me sentir desprezado como macho.
Percebia que do outro lado passava um ou outro cara. Talvez olhassem, mas não davam importância. Aquele não era um pau de verdade; não reconheciam um macho por trás da divisória. Era eu: o Flávio que Adair chamava de Flavinho; o tal “docinho” que ele tinha arrombado, desvirginado de verdade, mesmo já tendo sido fudido por tantos caras por tantos anos. O playboy marrentinho, o cara com jeito de macho que enganava como ativo mesmo não querendo, e que se esmerava frente a um macho de verdade para ser o melhor passivo do mundo, o passivo mais perfeito, o passivo perfeito.
Alguém apalpou meu pinto, cuidadosamente. Depois, parecia acariciá-lo, sem se importar com o fato de ele não endurecer. Apertou-o gentilmente, como se certificasse que ali não havia risco, que ali não havia potência alguma. Mantive-me submetido ao exame daquele desconhecido. Então, ele desistiu do membro inócuo e sua mão dirigiu-se ao meu saco. Como fez com o pinto, apertou-os sem muita pressão, apenas para sentir meus ovos. Foi mais além, fazendo com que eu arqueasse um pouco mais as pernas, e no movimento a pouca luz refletiu no anel que ele tinha em um dos dedos.
Avançou mais. Encontrou meu botão. Com a ponta do dedo, o acariciou. Eu arfei, mas ele provavelmente não ouviu. Ou talvez tenha notado. O cuzinho retraiu-se, depois relaxou. Ele reparou, passando a rodear as bordas, pressionar um pouco. Ali, sim, estava a área sensível da bichinha escondida por trás da divisória.
Ele deveria estar agachado do outro lado, para poder alcançar meu cuzinho. A posição lhe deveria ser incômoda. Afastei-me, torneei o corpo e, então, arrebitei minha bunda e, encaixando-me o quanto pude no buraco, expus a cuceta para ele.
Os minutos que se seguiram, ou talvez apenas segundos, foram indescritíveis. Aquele homem desconhecido – talvez um velho broxa, talvez um idiota nojento, talvez um macho gostoso de pau grande, talvez Adair, talvez um Adair mais fácil de eu lidar – usufruiu o que pôde daquele cuzinho lisinho, tenro, cheiroso e claramente preparado pra levar pica. Senti sua língua. Ele tomava conta de mim com suas lambidas.
Então atinei que ele o besuntava de saliva. E, antes mesmo que eu realizasse o significado do que fizera, cravou o pau em mim.
Saí em disparada, seguindo as placas luminosas que indicavam a saída, enquanto mal e porcamente enrolava a toalha para tentar me cobrir. Voltei à área de relaxamento. Tinha só um cara ali, deitado. Havia luz. Queria que houvesse um bar; que me dessem mais vodca com gelo como Adair gostava, ou pelo menos uma cerveja. A entrada para o outro quarto-escuro estava próxima, protegida por uma pesada cortina preta. Entrei.
Breu total. Mantive-me parado, sem avançar, tentando fazer com que minha visão se acostumasse e eu pudesse distinguir alguma coisa à minha frente. Demorou algum tempo, mas consegui: apenas as toalhas, brancas. Parecia ser uma sala sem nada mais do que muitos homens.
Libertei novamente o corpo da toalha, largando-a num ombro. Dei um passo. Dois, três. Uma mão percorreu minha cintura. Um boca envolveu meu pinto, enquanto outra acariciou minha bunda e logo procurou meu cuzinho. Não sei quantos caras eram: eles me tomaram e suas mãos esquadrinharam todo o meu corpo. Entreguei-me àquele bando de homens que, talvez, na luz, eu desprezasse – mas que, ali, naquele momento, eram os melhores homens do mundo. Não demorou até que dois, três, cinco, sei lá quantos constatassem que o que eu tinha de melhor não estava na frente.
Pressionaram meu pescoço; fizeram me curvar. Um enfiou o pau na minha boca. Depois, outro. A olhota recebendo o dedo de um, a carícia de outro, mais um molhando-a com cuspe. Escapei mal pressenti que se preparavam para me enrabar. Era o momento certo: mais um segundo e talvez dessa vez eu não conseguisse fugir, porque naquela sala abafada não faltariam cúmplices para uma curra.
Voltei ao terraço. Pedi a vodca ao filho da puta que perguntara por Adair. “Tá, eu sou sim a mulherzinha do Adair. Algum problema?”, quis dizer. Ele me atendeu como nunca tivesse me visto.
Bebi e desci, pensativo e excitado. Fui para a cabine. Eu invejava os caras que se agachavam e davam para cinco, dez homens, sendo sodomizado continuamente. Com a porta fechada, isolado, notei que ainda estava trêmulo. A primeira vez que vira um cara dando para uma fila fora num parque, numa madrugada. Era um cara bonitão, desses magros com o corpo definido em academia. Moreno, tinha o cabelo meio liso, mas aparentemente grosso, castanho, cortado um pouco à moda indígena, com a forma próxima de uma cuia. Seus os olhos eram vivos; as sobrancelhas, espessas. Um rosto bonito.
Estava de pé, com o torso nu, as calças arriadas até os tornozelos, a bunda levantada e as pernas espaçadas. Eu caminhava a certa distância – talvez dez, quinze metros –, procurando um bom pau pra me meter após uma noitada que não rendera coisa alguma. Ele me olhou nos olhos e eu jamais entendi o que quis dizer: se me convidava, enganado pela minha involuntária postura de ativo, ou se via em mim um cúmplice da sua submissão.
Um macho o comia violentamente e ele tentava se manter rígido, resistindo para não cair mesmo sendo sacolejado. Quase perfilados, outros aguardavam. Naquele rápido momento em que cruzamos os olhares, o cara que o socava pareceu gozar e, empurrado por outro, cedeu o lugar. O dono do olhar que por segundos se concentrou em mim recebeu nova estocada. Muitos deviam já tê-lo comido; outros muitos rodeavam sua bunda, meio numa fila, à espera da vez.
Eu o invejei, como invejei alguns outros poucos que vi na mesma situação, em outras pegações. Saciar tantos homens, ter uma fileira de falos prontos e aguardando o momento para me possuir: eu desejava viver isso. Queria, queria ser apenas um cu – um cu a serviço do prazer de homens que queriam aliviar seu tesão, e que não queriam nada mais além disso.
Eu invejava esses malucos. Muito. Mas, ao mesmo tempo, não queria viver efetivamente aquilo. Significava ser esporrado por vários homens; receber o esperma talvez até de passivos que, não tão convictos como eu, queriam tirar uma onda. Receber o esperma de quem poderia estar infectado sem saber, ou que poderia estar infectado e não tinha o cuidado de não infectar um semelhante. Não queria isso pra mim. Era uma fantasia; mera fantasia. Realização impossível.
Mas eu estava na cabine iluminada de uma sauna. Lá fora, machos perambulavam, sedentos por um cu. Havia alugado aquela cabine para estar com meu homem, e ele não tinha aparecido. Não pudera ou, talvez – sabe lá –, tivesse simplesmente me dispensado.
Naquela cabine eu poderia me oferecer sem tanto risco, pondo todas aquelas camisinhas em torno de mim, indicando que meu cuzinho poderia ser de quem quisesse, desde que eu estivesse protegido. Essa seria a única condição. Num banheiro, num parque, num quarto-escuro, seria impossível contar com qualquer garantia. Ali, não.
A luz me protegeria. Com ela, eu teria como saber se o cara tinha vestido ou não a camisinha. E, se forçasse a barra, havia a possibilidade de rechaçá-lo sem dificuldade, porque ninguém correria o risco de ser contido à força após os berros de outro cliente.
Peguei a nécessaire, tirei as camisinhas e as empilhei num canto da cama. Passei a toalha de papel no cuzinho, depois o dedo e o levei ao nariz: nenhum resquício da saliva do outro, nem do suor dos demais. Pus mais lubrificante, inserindo uma boa quantidade até o que pude alcançar do reto. Peguei outra toalha de papel e tirei o excesso das bordinhas. Borrifei um pouquinho de perfume, para que os machos me elogiassem além da conta.
Fui até a porta e a abri. Encostei um pouco, deixando-a apenas entreaberta – mas de modo que fosse bastante fácil me ver do corredor. Peguei novamente o frasco de perfume e pulverizei um pouco o ambiente. Pus-me de quatro na cama, de costas para a porta, ensaiando a posição com a qual me ofereceria.
Ali, diferentemente do hotel, não havia espelho à minha frente. Eu não contaria com uma visão panorâmica para perceber o que aconteceria atrás de mim, mas contaria com a luz para olhar de soslaio. Com o tato, para tocar a base do membro que me penetraria e verificar se estava mesmo com camisinha. Com a audição, para acompanhar o que se passava e tentar adivinhar o próximo movimento do desconhecido que viria. Abaixei completamente o volume da música, que até então tocava baixinho.
Peguei as camisinhas e espalhei-as em torno de mim, pondo a maioria entre minhas pernas. Ao desejarem meu cu, eles a veriam. Entenderiam o recado; saberiam qual a única condição para que se aproveitasse de mim.
Adair não poderia de jeito algum aparecer naquela hora. Ou talvez eu quisesse que ele me flagrasse agora e, me tomando nos braços, acabasse me cravando mais uma vez aquele caralho grosso.
Não. Eu era o “Flavinho”, como ele me batizara, e queria estar sozinho. Sozinho com um bando de machos que se realizassem comigo, sob eles.
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Este conto teve início com o texto “Admirando o calibre de Adair”.
A história completa se desenrola nos seguintes textos, em ordem cronológica
(Os links para cada um dos textos estão na página do meu perfil de autor, em
http://www.casadoscontos.com.br/perfil/:
1. “Admirando o calibre de Adair”
2. “No hotel, com Adair”.
3. “O preço para ter Adair”
4. “Guiado por Adair”
5. “O desafio de Adair”
6. “Exposto por Adair”
7. “Sob o teste de Adair”
8. “Entendendo Adair”
9. “Entregue a Adair”
10. “Presença de Adair” [você está aqui]
11. “Além de Adair”
12. “Adair, dono de mim”
13. “Um outro Adair”
14. “Marcado por Adair”